A declaração da liberdade econômica: o primeiro passo para um país com menos burocracia

Resumo

A Lei nº 13.874 de 2019 – Lei da Liberdade Econômica – além de trazer um rol de direitos e garantias do cidadão que deseja empreender no nosso país, inovou ao positivar no ordenamento jurídico brasileiro as figuras do abuso regulatório e da análise de impacto regulatório. Apesar de uma lei apenas não ser suficiente para acabar com o excesso de burocracia do Brasil, é uma sinalização importante de que o Estado deseja diminuir os empecilhos para a atividade econômica e contribuir para o aumento da produtividade.

Artigo

A declaração da liberdade econômica: o primeiro passo para um país com menos burocracia

 

Francisco Siemsen Bulhões Carvalho da Fonseca

Advogado e Deputado Estadual pelo Rio de Janeiro

  

Pilar Wagner Martins

Advogada e Assessora Parlamentar

 Resumo

 A Lei nº 13.874 de 2019 – Lei da Liberdade Econômica – além de trazer um rol de direitos e garantias do cidadão que deseja empreender no nosso país, inovou ao positivar no ordenamento jurídico brasileiro as figuras do abuso regulatório e da análise de impacto regulatório. Apesar de uma lei apenas não ser suficiente para acabar com o excesso de burocracia do Brasil, é uma sinalização importante de que o Estado deseja diminuir os empecilhos para a atividade econômica e contribuir para o aumento da produtividade.

Palavras-chave: Liberdade econômica. Regulação. Empreendedorismo. Desburocratização. Produtividade.

1.       Introdução

 Em 20 de setembro de 2019 foi promulgada a Lei nº 13.874, uma verdadeira Declaração de Direitos da Liberdade Econômica, que surge com o objetivo de fazer valer o fundamento constitucional da livre iniciativa na qual é fundada a nossa ordem econômica.

Embora seja um dos fundamentos da República, prevista no art. 1º da Constituição Federal, a livre iniciativa tem tido dificuldade prática de se firmar no país. E a posição do Brasil em reconhecidas classificações mundo afora corrobora com essa afirmativa: o país ainda figura na 150ª posição no ranking de Liberdade Econômica da Heritage

Foundation/Wall Street Journal, na 144ª posição no ranking de Liberdade Econômica do Fraser Institute, e na 123ª posição no ranking de Liberdade Econômica e Pessoal do Cato Institute1.

Tal desempenho é resultado da premissa atualmente existente de que as atividades econômicas devam ser exercidas somente se presente expressa permissão do Estado, o que faz com que as empresas e empresários, em contraposição ao resto do mundo desenvolvido e emergente, não se sintam seguros para investir, gerando emprego e renda2. A Lei nº 13.874/19 busca mudar essa mentalidade, desconstituindo a lógica utilizada até então para interpretar os vetores da ordem econômica brasileira previstos no art. 170 da Constituição Federal.

Isso porque quando se exige que um empreendedor obtenha do Estado inúmeras autorizações e licenças, muitas vezes em claro exagero, para realizar sua atividade, a execução desta se torna muito mais onerosa. A burocracia tem custos, não apenas pecuniários. Atualmente, tempo vale muito mais que dinheiro. Tempo não se liga apenas a aspectos financeiros. Ao dispor do tempo do outro, dispõe-se da própria liberdade3. Sobre o tema, discorre Julio Cesar Santiago, em artigo publicado no site Jota Oficial:

Quando usamos o tempo para empreendimentos acidentais, que não estão ligados aos propósitos daquela pessoa, há o desperdício de tempo. E desperdiçar o tempo é diminuir a liberdade. É isso que o excesso de burocratização faz. Ele diminui a liberdade das pessoas.

Filas para resolver um problema, esperar uma certidão para realizar uma empresa, aguardar deliberações administrativas para poder agir, são muitas as situações que afetam o tempo de dedicação aos propósitos da empresa. Em uma economia globalizada e cada vez mais competitiva, o tempo das empresas deve ser destinado à produção daquilo para qual surgiram4.

Com a estrutura inspirada no Bill of Rights do Direito Americano, a chamada Lei da Liberdade Econômica trouxe princípios, direitos e duas medidas regulatórias de extrema relevância: o instituto do abuso regulatório e a exigência da elaboração de análise


2
Loc.cit.1 Exposição de motivos da MP 881/19, disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/medpro/2019/medidaprovisoria-881-30-abril-2019-788037- exposicaodemotivos-157846-pe.html

3  SANTIAGO,   Julio   Cesar.   Liberdade   econômica   e os  aspectos  tributários  –        As 3 mudanças desburocratizantes            da                                        declaração                 de       liberdade      econômica,       2019.      Disponível       em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/contraditorio/liberdade-economica-e-os-aspectos- tributarios-23092019 , acesso em 26/09/2019.

4 SANTIAGO, Julio Cesar. Op cit.

de impacto regulatório na edição e alteração de atos normativos de interesse geral de agentes econômicos ou de usuários dos serviços prestados.

Considerando a realidade enfrentada por aqueles que tentam empreender no Brasil, o art.3º apresenta um rol de direitos essenciais para o desenvolvimento e crescimento econômico do país, dentre eles um que valoriza o tempo do empreendedor, ao estabelecer prazo para análise de pedidos, sob pena de autorização tácita:

Art. 3º São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País, observado o disposto no parágrafo único do art. 170 da Constituição Federal:

IX – ter a garantia de que, nas solicitações de atos públicos de liberação da atividade econômica que se sujeitam ao disposto nesta Lei, apresentados todos os elementos necessários à instrução do processo, o particular será cientificado expressa e imediatamente do prazo máximo estipulado para a análise de seu pedido e de que, transcorrido o prazo fixado, o silêncio da autoridade competente importará aprovação tácita para todos os efeitos, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei.

Já o art.4º do diploma em análise traz um rol de garantias de livre iniciativa. O abuso do poder regulatório restará caracterizado quando as normas editadas pela Administração Pública causarem intervenção excessiva na atividade econômica, de modo a criar reserva de mercado, redigir enunciados que impeçam novos entrantes, exigir especificação técnica desnecessária, criar obstáculos que impeçam a inovação, aumentar os custos de transação, criar demanda artificial, introduzir limites à livre formação de sociedades, restringir o uso de publicidade ou exigir requerimentos no âmbito das atividades de baixo risco.

2.       Regular sem abusar

 Vários setores da economia no Brasil sofrem com a regulação estatal que privilegia os grandes atores já estabelecidos, e dificultam a entrada de empresas novas e inovadoras. É o caso do setor de telecomunicações, no qual as regras determinadas pela ANATEL para o setor de telecomunicações criam barreiras artificiais à entrada de novas empresas no mercado, contribuindo para um ambiente de menor concorrência e maior concentração5. Evitar esse tipo de efeito é um dos objetivos principais da Lei nº 13.874/19.

5 Como as regulações estatais prejudicam os pequenos, protegem os grandes, e afetam os consumidores, Instituto Mises Brasil; disponível em: https://www.mises.org.br/Article.aspx?id=2769 (acesso em: 19/09/2019)

Outro exemplo é o setor bancário, em que as regulamentações impostas pelo Banco Central impediam a vinda de bancos estrangeiros, bem como dificultavam o surgimento de bancos pequenos, o que garantia uma reserva de mercado para os grandes bancos já estabelecidos, que não precisavam arcar com essas formalidades.

Há alguns anos o mercado bancário vem ficando mais aberto, com o surgimento das fintechs, empresas prestadoras de serviços financeiros, que utilizam tecnologias inovadoras em seus negócios.

Uma das razões que popularizaram as fintechs no país se deve à figura da conta de pagamento, modelo mais simplificado de conta corrente, que não exige atendimento em agência física, não realiza empréstimos, mas pode oferecer cartões e fazer transferência. Várias empresas de tecnologia começaram a oferecer esse serviço, ficando conhecidas como bancos digitais. Porém, é preciso salientar que, apesar do nome, elas não possuem licença de banco e precisam fazer parcerias com bancos tradicionais, seguradoras e outras empresas para ampliar a oferta7. Ainda assim, com essas novas regras, mais flexíveis, ganham os consumidores, que agora têm mais opções de prestadores de serviços bancários.

O setor de transportes aéreos também possui histórico de alta intervenção do Estado. As exigências previstas no Código Brasileiro de Aeronáutica de que 80% do capital com direito a voto fosse pertencente a brasileiros e que sua direção fosse confiada exclusivamente a brasileiros para concessão de serviços aéreos públicos restringia a entrada de novas companhias no mercado. Com a Medida Provisória 863 de 2018 – posteriormente convertida na Lei 13.842 de 2019 – tais disposições foram revogadas. Além disso, em março de 2017, a Resolução nº 400 da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) acabou com a obrigatoriedade de as empresas aéreas fornecerem gratuitamente franquia de bagagem aos passageiros8. Como consequência, desde setembro de 2018, sete empresas aéreas estrangeiras já manifestaram interesse de operar no Brasil sendo que cinco delas (Sky Airline, JetSmart, Norwegian, Virgin Airlines e Flybondi – todas com modelo de baixo custo) já oferecem voos internacionais regulares


8
O Congresso Nacional adicionou um artigo à MP 863/2018 que impunha a obrigatoriedade de disponibilizar franquia mínima de bagagem aos passageiros, porém o Presidente da República vetou esse dispositivo.7 Disponível em https://valor.globo.com/financas/noticia/2019/06/24/banco-digital-acelera-expansao-e- testa-folego-do-segmento.ghtml, acesso em 01/10/2019.

para cidades brasileiras9. Eis mais um claro exemplo de como mais liberdade significa mais atores no mercado e, consequentemente, mais opções para os consumidores, que sentem a diferença no bolso e na disputa pelo melhor atendimento.

Portanto, nos parece evidente que a atuação do Estado como agente regulador da atividade econômica, conforme disposto no art. 17410 da nossa Carta Maior, não pode ser confundida como uma obrigatoriedade de regular cada vírgula e aspecto da vida econômica brasileira. A regulação excessiva que tenha por efeito a inviabilização de certas atividades e a eliminação da concorrência em alguns mercados, prejudicando tanto o consumidor como o desenvolvimento econômico do país, não deve encontrar respaldo constitucional.

Nesse contexto, a Lei nº 13.874/19 contribui para o estabelecimento da justa medida da atuação do agente regulador. Ela coloca o poder regulatório do Estado sob controle, e isso não pode ser visto como algo ruim.

A forte intervenção do Estado na vida econômica se intensificou com o surgimento do Estado Social, de quem são exigidas prestações positivas para assegurar direitos sociais tais como: assistência social, saúde, educação, trabalho, lazer etc.

Por certo, estes direitos são de suma importância para o respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana. Mas igualmente importantes são os direitos de liberdade, cujo titular é o homem individualmente considerado.

Ao contrário do que é defendido por alguns, nenhuma geração de direitos é prioritária em relação às demais. Sobre o tema, muito bem salientam Gilmar Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco:

Esta distinção entre gerações de direitos fundamentais é estabelecida apenas com o propósito de situar os diferentes momentos em que esses grupos de direitos surgem como reivindicações acolhidas pela ordem jurídica. Deve-se ter presente, entretanto, que falar em sucessão de gerações não significa dizer que os direitos previstos num momento tenham sido suplantados por aqueles surgidos em instante seguinte. Os direitos de cada geração persistem válidos com os direitos de nova geração, ainda que o significado de cada um sofra o influxo das concepções jurídicas e sociais prevalentes nos novos momentos.12


10
Art. 174, CF. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.9 Mudanças regulatórias atraem sete empresas áreas estrangeiras, Valor Econômico; disponível em https://valor.globo.com/empresas/noticia/2019/09/25/mudanca-regulatoria-atrai-sete-empresas-aereas- estrangeiras.ghtml, acesso em 26/09/2019.

12 MENDES, Gilmar Ferreira e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 14ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019; p. 137-138.

Verifica-se, portanto, que o Estado deve garantir uma coexistência harmônica entre os direitos de diversas gerações. No entanto, o que tem acontecido na realidade brasileira é um esvaziamento de diversas liberdades individuais justificado pela urgência estatal em proteger o cidadão. Para evitar que isso ocorra, é preciso que as normas protetivas respeitem o princípio da proporcionalidade. Assim, uma regulação econômica protetiva só é justificável quando for adequada, necessária e proporcional em sentido estrito.

A intervenção estatal na economia não pode ser tão grande a ponto de tornar as atividades administrativas ineficientes, reduzindo significativamente a autonomia dos indivíduos13.

Além disso, é importante que se perceba que os direitos de liberdade também facilitam a persecução da justiça social. Em primeiro lugar, porque a liberdade para investir e produzir estimula novos atores, aumentando a concorrência no mercado. O aumento da oferta de produtos e serviços favorece o consumidor, em especial aquele com menor poder aquisitivo. A título de exemplo, os primeiros celulares à venda no Brasil, fabricados em 1983, custavam em torno de 4 mil dólares (cerca de 9 mil dólares atualmente)14, ou seja, seu acesso era restrito aos mais ricos. Atualmente, além dos aparelhos serem muito mais modernos e leves, só no Brasil há 230 milhões de celulares ativos15. É a busca de cada empresa concorrente por maior fatia do mercado que há muito incentiva a inovação e populariza diversos produtos, ao ponto de alguns hoje serem considerados itens essenciais:

Quando os frigoríficos surgiram, eram tão caros que só era possível encontrá- los em fábricas e restaurantes. As primeiras geladeiras eram um luxo que só magnatas ou sortudos conseguiam ter em casa. Em 1937, o jornal Folha da Manhã, hoje Folha de São Paulo, sorteou aos leitores uma geladeira Frigidaire que custava 15 milhões de réis, ou 62 salários mínimos da época. Hoje, da quinta parte mais pobre da população brasileira, 92% têm geladeira.16

Como se pode perceber, o estímulo à concorrência e à liberdade econômica têm se mostrado grandes aliados da população. Justiça social se faz quando o indivíduo se

13 OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende de. Governança e Análise de Impacto Regulatório. Revista de Direito da Procuradoria Geral, Rio de Janeiro, (Edição Especial): Administração Pública, Risco e Segurança Jurídica, 2014; p. 390-391.

14 NARLOCH, Leandro. Guia politicamente incorreto da economia brasileira, 2a ed. São Paulo: Globo Livros, 2019, p. 21.

15 Disponível em: https://epocanegocios.globo.com/Tecnologia/noticia/2019/04/brasil-tem-230-milhoes- de-smartphones-em-uso.html, acesso em 27/09/2019.

16 NARLOCH, Leandro. Op.cit.,p. 19.

sente valorizado, integrado, livre, respeitado e capaz de ser dono da própria vida e da própria história. Quando a burocracia deixa de ser um fim em si mesma e o Estado passa a entender seu papel de facilitador, articulador e defensor de regras claras para o jogo, temos um ambiente mais justo, democrático e inclusivo.

3.       O instituto da Análise de Impacto Regulatório

 Além da preocupação com a excessiva intervenção estatal, a Lei nº 13.874/19 também prevê a obrigatoriedade da realização de uma análise sobre os impactos de atos normativos sobre a economia, nos seguintes termos:

Art. 5º. As propostas de edição e de alteração de atos normativos de interesse geral de agentes econômicos ou de usuários dos serviços prestados, editadas por órgão ou entidade da administração pública federal, incluídas as autarquias e as fundações públicas, serão precedidas da realização de análise de impacto regulatório, que conterá informações e dados sobre os possíveis efeitos do ato normativo para verificar a razoabilidade do seu impacto econômico.

Parágrafo único. Regulamento disporá sobre a data de início da exigência de que trata o caput deste artigo e sobre o conteúdo, a metodologia da análise de impacto regulatório, os quesitos mínimos a serem objeto de exame, as hipóteses em que será obrigatória sua realização e as hipóteses em que poderá ser dispensada.

A chamada Análise de Impacto Regulatório (AIR) é uma ferramenta utilizada para examinar e medir os benefícios, os custos e os efeitos prováveis de uma regulação nova ou já existente. Essa ferramenta se propõe a servir de técnica de avaliação da qualidade das regulações, por meio de um conjunto de procedimentos administrativos.

A AIR já é implementada por diversos países e é fortemente encorajada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Em seu guia, a organização define o instituto como “um processo de identificar e avaliar, de forma sistemática, os efeitos esperados das propostas regulatórias, usando um método analítico consistente, tal como a análise de benefícios e custos ”17.

Esse instrumento é importante na busca da regulação eficiente, qual seja, aquela que seja suficiente para corrigir falhas de mercado diagnosticadas, mas que não tenha como efeito a geração de falhas regulatórias.

17 Introductory Handbook for Undertaking Regulatory Impact Analysis (RIA), OECD (2008), p.3 (em tradução livre)

Existem diferentes tipos de falhas regulatórias. A primeira – e mais óbvia – é a captura regulatória, quando a regulação acaba atuando para favorecer os interesses dos grupos que dominam o setor regulado em detrimento do interesse público. Outra está relacionada aos problemas de técnica, implementação e fiscalização de regras regulatórias, que implicam num baixo nível de cumprimento destas. Uma técnica regulatória ruim pode significar que a regulação não resolve os problemas inicialmente identificados. E, por vezes, estes problemas não são solucionáveis por meio de uma regulação18. São nessas ocasiões em que a AIR se faz importante, pois ela é capaz de identificar se regular é ou não a melhor escolha para resolver determinada falha de mercado.

Por fim, é preciso destacar que não é todo ato normativo editado pelos agentes reguladores que merecerá uma análise de impacto regulatório, mas apenas aqueles que disciplinam questão que possa repercutir para os agentes regulados, consumidores e a livre concorrência. Ainda, segundo a lição de João Grandino Rodas, a AIR pode ser feita ex ante, para apurar se um ato normativo será eficiente, com impactos positivos e se realmente necessário ou ex post, de modo a averiguar se uma regulação já existente é eficiente ou está causando uma falha de mercado:

O momento de levar a cabo uma AIR poder variar. Seguem-se dois exemplos:

  • no caso de ato normativo, cuja pretensão é estabelecer certo nível de controle de preços com relação a determinada atividade econômica, a AIR deve ocorrer antes de se elaborar a proposta de regulação, com vistas à apurar, previamente, se é preciso nova regulação ou apenas atualização da regulação vigente; e (ii) a avaliação de existência de falha de mercado; a propositura de soluções; e a verificação de eficiências, demandam AIR já formulada, a ser submetida às discussões e sugestões dos agentes regulados, antes de ser transformada em proposta normativa21.

Não obstante a AIR só agora estar sendo prevista em lei, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já vem atuando em consonância com as diretrizes da ferramenta. Com o objetivo de diminuir os riscos de produção de regulações de má qualidade, a agência, por meio da Portaria nº 1741, de 12 de dezembro de 2018, estabeleceu diretrizes de melhoria da qualidade regulatória, como por exemplo: transparência e fortalecimento da participação social; desburocratização, celeridade e

18 Op.cit., p. 7 (em tradução livre)

21  RODAS,  João  Grandino.  É  indispensável  a  avaliação  do  impacto  regulatório.     Disponível em https://www.conjur.com.br/2019-mai-02/olhar-economico-indispensavel-avaliacao-impacto-regulatorio, acesso em 02/10/2019.

simplificação administrativa; regulação baseada em evidências; coerência e convergência regulatórias, entre outras.22

Além da AIR, outro mecanismo em andamento nas atividades da agência é a Guilhotina Regulatória, que consiste em identificar e revogar atos normativos obsoletos, por meio de despacho do Diretor-presidente ou de Resolução da Diretoria Colegiada (RDC), de modo a reduzir o “estoque regulatório’’ da Anvisa e garantir mais clareza entre as regulações realmente vigentes e que de fato causem efeitos jurídicos práticos.

4.       Considerações Finais

 Apesar de todas os benefícios que a Lei nº 13.874/19 trouxe para o cenário econômico brasileiro, temos que ter em mente que ainda existem muitas questões a serem aprimoradas.

Como bem colocou o economista Marcos Lisboa, é de uma ingenuidade tremenda imaginar ser possível reduzir a burocracia brasileira apenas por meio de uma norma jurídica. Nosso país possui um arcabouço institucional propenso a abarcar uma forte presença do Estado em sua relação com os particulares. Um mero dispositivo legal não é suficiente para alterar por completo essa realidade.

Além disso, um ato federal por si só não é necessariamente capaz de influenciar o panorama do país inteiro. Afinal, também existem legislações municipais e estaduais que interferem sobre o tema, com impacto direto sobre a livre iniciativa. Por esse motivo, é altamente necessário que haja comunicação e ações integradas entre o governo federal e os demais entes da federação.23

De todo modo, há muito o que se comemorar. Mesmo sabendo que a Lei em análise não é uma solução definitiva para todas as nossas dificuldades, ela é, sem dúvida, o primeiro passo em direção a um futuro mais livre, democrático e inclusivo.


23
Sem outras medidas, MP da Liberdade Econômica será inócua na desburocratização, disponível em https://www.jota.info/legislativo/sem-outras-medidas-mp-da-liberdade-economica-sera-inocua-na- desburocratizacao-10052019 , acesso em 26/09/19.22 Boas práticas regulatórias no âmbito da Anvisa, disponível em http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/4534619/Ficha+do+Tema+1.1/8e6708f9-d728-462f-abab- fb78ac70b536.

5.      Referências Bibliográficas

 CÂMARA DOS DEPUTADOS, Exposição de motivos da MP 881/19, disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/medpro/2019/medidaprovisoria-881-30-abril- 2019-788037-exposicaodemotivos-157846-pe.html

INSTITUTO MISES BRASIL. Como as regulações estatais prejudicam os pequenos, protegem os grandes, e afetam os consumidores. Disponível em: https://www.mises.org.br/Article.aspx?id=2769

MENDES, Gilmar Ferreira e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 14ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019;

NARLOCH, Leandro. Guia politicamente incorreto da economia brasileira, 2a ed. São Paulo: Globo Livros, 2019.

 OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende de. Governança e Análise de Impacto Regulatório. Revista de Direito da Procuradoria Geral, Rio de Janeiro, (Edição Especial): Administração Pública, Risco e Segurança Jurídica, 2014;

 ORGANIZAÇÃO PARA COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

(OCDE). Introductory Handbook for Undertaking Regulatory Impact Analysis (RIA), 2008.

RODAS, João Grandino. É indispensável a avaliação do impacto regulatório. Conjur. Disponível em https://www.conjur.com.br/2019-mai-02/olhar-economico-indispensavel- avaliacao-impacto-regulatorio,

 SANTIAGO, Julio Cesar. Liberdade econômica e os aspectos tributários – As 3 mudanças desburocratizantes da declaração de liberdade econômica, 2019. Jota Oficial. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/contraditorio/liberdade-economica- e-os-aspectos-tributarios-23092019

Palavras Chaves

Liberdade econômica. Regulação. Empreendedorismo. Desburocratização. Produtividade.