INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE NO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO: UMA ANÁLISE DOS RISCOS À SAÚDE DO EMPREGADO

Resumo

O presente estudo visa analisar, sob a ótica do meio ambiente do trabalho,os adicionais de insalubridade e periculosidade sob a perspectiva dos riscos bem como os percentuais questão pagos em razão da exposição a agentes nocivos à saúde do trabalhador.Não se discutirá aqui a necessidade desse pagamento, mas se o percentual adotado encontra-se adequado frente ao real dano à saúde humana, tanto física quanto psicológica. Para tanto será abordado o risco, sua definição, a necessidade de sua avaliação e, principalmente,sua adequação para compensar as condições de trabalhos insalubres e perigosas. Considera-se que mais importante que alcançar respostas é o questionamento da adequação dos percentuais quando, apesar de determinados trabalhadores estarem expostos a ricos, esses muitas vezes não causam efetivamente qualquer dano a sua saúde.

Artigo

INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE NO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO: UMA ANÁLISE DOS RISCOS À SAÚDE DO EMPREGADO

João Theotonio Mendes de Almeida Jr.[1]

Raquel de Lima Mendes [2]

 

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1. O risco de doenças laborais; 1.1 O risco e o meio ambiente do trabalho; 2. Risco no ambiente de trabalho: Insalubridade e periculosidade; CONCLUSÃO; REFERÊNCIAS.

 

RESUMO

O presente estudo visa analisar, sob a ótica do meio ambiente do trabalho,os adicionais de insalubridade e periculosidade sob a perspectiva dos riscos bemcomo os percentuais quesão pagos em razão da exposição a agentes nocivos à saúde do trabalhador.Não se discutirá aqui a necessidade desse pagamento, mas se o percentual adotado encontra-se adequado frente ao real dano à saúde humana, tanto física quanto psicológica. Para tanto será abordado o risco, sua definição, a necessidade de sua avaliaçãoe, principalmente,sua adequação para compensar as condições de trabalhos insalubres e perigosas. Considera-se que mais importante que alcançar respostas é o questionamento da adequação dos percentuais quando, apesar de determinados trabalhadores estarem expostos a ricos, esses muitas vezes não causam efetivamente qualquer dano a sua saúde.

 

Palavras-chave:

Meio ambiente do trabalho, Insalubridade; Periculosidade; risco; adicionais.

 

 

INTRODUÇÃO

O meio ambiente do trabalho e sua importância no direito contemporâneo são inegáveis. Neste sentido a Organização Internacional do Trabalho – OIT, em concomitância com o Direito Humanitário e à Liga das Nações tiveramum papel importante na contribuição no processo de internacionalização não só dos direitos humanos como também das condições de trabalho e de bem-estar daqueles países que ratificaram suas convenções.A Convenção Internacional do Trabalho nº 148, realizada em Genebra, trouxe no seu arcabouço importantes contribuições no tocante a adoção de propostas relativas ao meio ambiente laboral. Nela se verificam pontos importantes quanto à questão da contaminação atmosférica, dos ruídos e vibrações, aplicáveis a todas as categorias.[3]Nesses locais, “o estado de saúdes dos trabalhadores deverá ser objeto de uma vigilância gratuita com intervalos apropriados e exame médico prévio e periódico” (BARROS, Alice Monteiro de. 2010, p. 1068). O Brasil (,) ratificou a mesma em 1982 e a promulgou através do Decreto nº93.413/86.

A OIT também trata do meio ambiente do trabalho na Convenção 155 ao estabelecer nos seus artigos 3º, alínea “a” e 4º item 2, sobre a saúde, que não abrange tão somente as ausências de enfermidades ou afecções, mas também os elementos que podem afetar a saúde física e mental que estejam diretamente relacionados com a segurança e higiene no trabalho; bem como da política de prevenção dos danos e acidentes derivados por consequência do trabalho. Não podemos deixar de elencar outras tantas importantes convenções da OIT ratificadas pelo Brasil: Convenção 115 – proteção contra radiações ionizantes –; Convenção 127 – peso máximo de cargas –; Convenção 136 – proteção contra os riscos ocasionados pelo benzeno ­; Convenção 139 – prevenção e controle de riscos profissionais provocados por substâncias cancerígenas no local de trabalho –; Convenção 148 – proteção contra os riscos provenientes da contaminação do ar, de ruído e de vibrações no local de trabalho –; Convenção 152 – segurança e higiene nos trabalhos portuários ­; Convenção 155 – segurança e saúde dos trabalhadores e meio ambiente do trabalho e o Protocolo de 2002 a respeito do tema –; Convenção 159 – reabilitação profissional e emprego de pessoas deficientes –; Convenção 161 – serviços de saúde e segurança no trabalho –;Convenção 162 – utilização do abesto (amianto) com segurança – e, Convenção 170 – utilização de produtos químicos no trabalho.

Importante destacar que os incisos XXII e XXIII do artigo 7º da CRFB, trazem importantes direitos dos trabalhadores em termos de meio ambiente do trabalho. Igualmente no inciso VIII do artigo 200 da Lei Maior, quando trata do sistema único de saúde, contempla a importância da proteção ao ambiente laboral, fazendo menção ao meio ambiente do trabalho. Também o artigo 6º, quando elenca os direitos básicos do cidadão, bem comoo artigo 225, que assegura a todos um meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, impondo ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo.

Diante do princípio da ubiquidade inserido na Lei nº6.938/81, que trata da Política Nacional do Meio Ambiente, não temos como pensar em meio ambiente de maneira desassociada e restrita, pois é necessário que toda a sociedade esteja engajada em prol de sua preservação. Nesse sentido, este princípio traz a ligação do direito ao meio ambiente saudável e seus valores para com o desenvolvimento da sociedade, que é responsável pelo bem estar social, psíquico e econômico de todo ser humano. Desse modo, o meio ambiente do trabalho não fica ausente de análise, pois não se pode pensar apenas na empresa e no ambiente de trabalho. Há que se ter em mente a necessidade de termos condições de uma vida aprazível fora da empresa, pois ela também influenciará nas consequências de eventual acidente no local de trabalho. Todas as cautelas devem ser pensadas, não adianta só que a empresa dê todo o conforto, salubridade, segurança e equipamentos de proteção, a fim de que tudo flua da melhor forma possível, se o entorno está degradado e fazendo adoecer a sociedade.

O meio ambiente do trabalho é considerado como meio ambiente artificial especial, uma vez que inserido dentro do universo de determinada atividade laborativa, pouco importando se a mesma é remunerada, subordinada e sua valoração econômica. Esse espaço urbano habitável constituído de edificações feitas pelo homem, seja ele nas cidades ou no campo tem igual importância assim como o meio ambiente natural e cultural. Para tanto, há necessidade de que o ambiente aonde o mesmo é desempenhado tenha o devido equilíbrio como objetivo, sem se olvidar da salubridade, segurança e ausência de agentes comprometedores de sua integridade e incolumidade física e psíquica (SANTOS, Enoque Ribeiro, 2005, pp. 22-56). Raimundo Simão de Melo (2010), nos ensina que a CRFB nos seus artigos5, XXIII, 21, XX, 182 e 225, trazem no seu bojo o devido tratamento sobre os espaços fechados e equipamentos públicos, destacando sua importância no que tange a sadia qualidade de vida e dignidade da pessoa humana, esta última prevista no inciso III do artigo 1º.

O meio ambiente do trabalho nada mais é do que o local onde o cidadão consegue obter os meios necessários para prover seu sustento, e quiçá de sua família, sempre em harmonia com o equilíbrio com o ecossistema e está intimamente ligado ao meio ambiente em geral, pois poderá afetar a saúde, a segurança e o bem estar das populações, quando por exemplo, houver necessidade da utilização de produtos químicos e no caso de dejetos ecologicamente perigosos.

Rodolfo Camargo Mancuso (1996), ressalta que “quando aquele habitat se revele inidôneo a assegurar as condições mínimas para uma qualidade de vida do trabalhador, aí se terá uma lesão ao meio ambiente do trabalho”.

A CRFB, no seu artigo 200, VIII, demonstra o quão importante é o ambiente onde se desenrola a vida do trabalhador, pois estabelece que é uma das atribuições do Sistema Único de Saúde colaborar na proteção daquele ambiente laboral. No meio ambiente do trabalho devem estar protegidos quaisquer tipos de trabalhadores, sejam eles com vínculo empregatício, autônomos, avulsos, eventuais, etc.

Na Consolidação das Leis do Trabalho encontramos os artigos 154 a 201que tratam da segurança e medicina do trabalho, atribuindo às Delegacias Regionais do Trabalho a orientarem, fiscalizarem e adotarem medidas de prevenção e proteção do meio ambiente do trabalho; aplicação de penalidades; obrigações das empresas ao cumprimento das normas de segurança e medicina do trabalho; obrigações dos trabalhadores a cumprir as normas de segurança, implementa das pelas empresas.

Além desses importantes artigos, não podemos deixar de mencionar a Portaria nº3.214/77 do Ministério do Trabalho, que regulamenta o meio ambiente do trabalho por meio de 30 (trinta) normas regulamentares relativas à medicina e segurança do trabalho(,)e a Portaria nº 598 de 2004 que trata sobre as normas relacionadas com instalações e serviços em eletricidade.

Merece registro, outrossim, a atuação do Ministério Público na promoção do meio ambiente de trabalho hígido, mediante a propositura de ações coletivas perante a Justiça do Trabalho, bem como lançando mão de instrumentos extrajudiciais, como inquéritos civis, procedimentos preparatórios e termos de ajuste de conduta. Como bem ressaltado por Evanna Soares (2004, p. 243):

 

“o meio ambiente do trabalho constitui uma das prioridades  de atuação do ramo do Ministério Público focalizado, com adoção das medidas judiciais já conhecidas e de providências extrajudiciais tendentes a propiciar um ambiente laboral seguro e saudável, em sintonia com os conceitos elaborados pela Organização Internacional do Trabalho, Organização Mundial da Saúde, Constituição da República e legislação ordinária respectiva brasileira”.

 

Nesse contexto, reveste-se de especial importância a Lei nº7.347/85, que disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados, também ao meio ambiente, e constitui instrumento eficaz para a preservação dos direitos dos trabalhadores a um meio ambiente com qualidade como prevê o artigo 225 da CRFB (MURAD, 2009, p.142).

Realizado este breve introito, passemos agora à questão dos riscos de doenças laborais no ambiente do trabalho, sob a ótica da insalubridade e da periculosidade.

  1. O risco de doenças laborais

As doenças profissionais adquiridas pelo empregado durante sua atividade laborativa, quando exposto a agentes nocivos, não são meras fatalidades, mas resultados de causas objetivas.

O risco caracteriza-se por ser uma possibilidade, mas nunca uma certeza de que um evento futuro acontecerá. Risco não se confunde com perigo, tem-se por este último a possibilidade de um dano insuscetível de antecipação possível. Nesteartigo trabalharemos com a noção de risco para desenvolvimento do raciocínio.

Beck afirma que vivemos em uma sociedade de riscos.Nesta sociedade algumas questões são suscitadas como a prevenção, a tentativa de controle, legitimação e distribuição dos riscos que estão associados as novas expressões sociais e políticas, acrescenta ainda que na atual “modernidade avançada” a produção de riqueza é sistematicamente acompanhada da produção de riscos (BECK, 1992, p. 19).

A gestão do risco ou risk management é uma ferramenta de atuação privilegiada para combater as nossas múltiplas fragilidades organizativas e institucionais e consequentemente, se não neutralizar, pelo menos diminuir os riscos no meio ambiente laborativo. Isto se torna importante quando se considera ambientes insalubres e perigosos.

Nesses ambientes, o risco sempre está presente, e por esta razão, todo empregado que trabalhe nessas condições recebe um adicional ao seu salário, que irá variar de acordo com a natureza (insalubre ou perigoso) e a intensidade de exposição ao agente nocivo.

Os percentuais na insalubridade variam entre 10%, 20% ou 40% sobre o salário mínimo enquanto que na periculosidade o percentual é de 30% do salário contratual. Observou-se que em ambas as situações o empregado está exposto a riscos, e, portanto, não se discute o recebimento dos percentuais. Observou-se também que em ambas as situações o empregado está exposto a fatores psicológicos que colocam sua integridade física em situação de risco.

Contudo, também se observou que os empregados que estão sujeitos a agentes insalubres, desde o primeiro dia de trabalho, já se encontra exposto ao agente nocivo, e sofre as repercussões em sua saúde física, podendo gerar sequelas por toda sua vida. Já os empregados que estão sujeitos a agentes periculosos, apesar do risco, não estão em contato direto com nenhum agente nocivo que possa macular sua integridade física; isto só irá ocorrer se acontecer um evento danoso.

Diante destes aspectos, indaga-se se os percentuais atribuídos na insalubridade e na periculosidade estão adequados, frente a natureza da atividade laboral que o empregado exerce.

 

  • O risco e o meio ambiente do trabalho

 

Diante destes aspectos, indaga-se se os percentuais atribuídos aos adicionais de insalubridade e periculosidade estão adequados, frente a natureza da atividade laboral que o empregado exerce.

Os riscos estão presentes nas atividades laborais e são a origem das doenças profissionais. A não observância de métodos de controle para evitar ou amenizar as causas das doenças podem causar consequências nefastas tanto para o empregado quanto para o empregador. Neste sentido, o estudo do risco nas atividades laborativas toma grande escopo. A segurança e condições de trabalho devem ser uma reponsabilidade partilhada entre os sujeitos envolvidos, isso abrange não apenas ao empregador, mas, o empregado também.

A análise de risco é seguramente uma das formas mais eficazes para entender e afastar a sinistralidade do meio ambiente do trabalho.

Baixas qualificações acadêmicas e sócio profissionais e a falta investimento em novas tecnologias muitas vezes são utilizadas para justificar índices de sinistralidade.Todos os acidentes de trabalho têm suas causas passíveis de explicação, são fatos objetivos e, não fenômenos de infortúnio. As suas consequências são capazes de influenciar diretamente a produtividade das empresas, tanto de forma qualitativa e quantitativa, inclusive quanto aos seus custos de forma direta ou indireta.

Neste sentido, Carlos Alegre expõe que:

“Trata-se, sempre, de um acontecimento não intencionalmente provocado (ao menos pela vítima), de caráter anormal e inesperado, gerador de consequências danosas no corpo e na saúde, imputável ao trabalhador, no exercício de uma atividade profissional, ou por causa dela, de que é vítima um trabalhador” (ALEGRE, 2000, p. 35).

“O perfil do trabalhador sinistrado é um indivíduo do sexo masculino, de baixo nível de escolaridade, trabalhador por conta de outrem e de uma certa antiguidade na empresa. O trabalho de pé e em espaço restrito é o mais associado à sinistralidade laboral, assim como a variabilidade das tarefas ao longo da jornada ou do ano, a execução de tarefas repetitivas e monótonas em posições dolorosas ou fatigantes. Também aparecem associados à sinistralidade a flexibilidade de horários, o regime de turnos rotativos e uma duração de trabalho superior a 40 horas semanais. No que diz respeito às condições psicossociais, a maior autonomia e responsabilidade do desempenho das tarefas parece associar-se a um menor risco de sinistro laboral ou de doença profissional” (REGO e FREIRE, 2001, p. 29).

 

Segundo os supracitados autores, resta demonstrado que quanto mais fatigante o trabalho, maior a exposição aos mais diferentes tipos de sinistralidades que podem ocorrer no ambiente laborativo e, portanto, maior o risco de exposição a agentes nocivos. Outro importante aspecto são as pessoas envolvidas neste tipo de trabalho, geralmente pessoas com baixa escolaridade são as que mais se submetem a trabalhos fatigantes, pois, os que estudam mais procuram melhores colocações no mercado de trabalho.

 

  1. Risco no ambiente de trabalho: Insalubridade e periculosidade

 

Antes de adentrarmos especificamente na repercussão das consequências do risco no ambiente de trabalho, faz-se mister avaliar o significado de risco. A palavra risco é definida como a probabilidade de ocorrência de um determinado acontecimento, incluindo todas as suas representações e simbolismos sociais (AREOSA, 2003, p. 34). Risco tem sempre a noção de incerteza e probabilidade ligada a seu evento. A noção de risco também não se confunde com a de perigo,pois para esta o acaso costuma ser mais generoso, isto é, tornam-se incalculáveis as possibilidades futuras de um evento acontecer.

Sobre este aspecto, Giddens aponta que:

 

“A noção de risco, devo acentuar, é inseparável das ideias de probabilidade e de incerteza. Não se pode dizer que alguém enfrenta um risco quando o resultado da ação está totalmente garantido. (…) As culturas tradicionais não dispõem do conceito de risco porque não precisam dele. Risco não é o mesmo que acaso ou perigo. O risco refere-se a perigos calculados em função de possiblidades futuras. Só tem uso corrente numa sociedade orientada para o futuro, uma sociedade que vê o futuro precisamente como um território a ser conquistado ou colonizado” (GIDDENS, 2000, pp. 32 e 33).

 

Sob esse prisma aprofunda-se a pesquisa quanto à análise dos adicionais de periculosidade e insalubridade pagos aos trabalhadores que exercem sua atividade laborativa expostos a agentes nocivos, suscetíveis a riscos dos mais variados possíveis.

De acordo com a Consolidação das Leis do Trabalho, em seus artigos 189 ao 197 é definido o que é atividade insalubre e perigosa, respectivamente, dentre outras disposições, abaixo destacam-se alguns dispositivos de maior relevância para a discussão deste trabalho.

 

 Art. . 189 – Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.

Art. 192. O exercício de trabalho em condições insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, assegura a percepção de adicional respectivamente de 40% (quarenta por cento), 20% (vinte por cento) e 10% (dez por cento) do salário-mínimo da região, segundo se classifiquem nos graus máximo, médio e mínimo.

Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:

I – inflamáveis, explosivos ou energia elétrica;

II – roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.

  • 1º – O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa.

Art.194 – O direito do empregado ao adicional de insalubridade ou de periculosidade cessará com a eliminação do risco à sua saúde ou integridade física, nos termos desta Seção e das normas expedidas pelo Ministério do Trabalho.

 

Como pode ser observado na leitura desses dispositivos, o pagamento de adicionais de insalubridade e periculosidade está diretamente ligado ao potencial de risco a que o trabalhador está exposto.

Mas, a pretensão deste estudo é ir além da análise dos riscos quanto ao pagamento de tais adicionais. Isto porque, estar exposto a riscos não significa a materialização de um evento danoso à saúde, física ou psicológica. É o que passaremos a estudar.

A análise e o cálculo de riscos passam por construir estimativas potenciais sobre as perdas e/ou ganhos que possam surgir em razão de determinados eventos futuros.

A interpretação de risco percorre a seara de uma possibilidade da ocorrência de um evento, que está sempre presente, mas da qual não se tem certeza.Em razão desta incerteza, o ser humano procura prever e colocar os acontecimentos vindouros sob seu domínio através de certa regulação ou normalização e eventos futuros.

Porém, no plano da realidade, controlar eventos futuros está longe do alcance humano, isto porque, por mais que o homem tente se precaver de possíveis eventos, eles sempre serão incertos, não há certezas, até mesmo pela própria natureza humana, o fator erro deve sempre ser considerado. O que existem são probabilidades. Então, o máximo que o ser humano consegue aferir é uma alta ou baixa probabilidade de um evento acontecer, mas ainda assim, apenas uma probabilidade.

No dizer de Guibentif :

“Um risco é a possibilidade de um dano, que por ser antecipadamente definido e avaliado de maneira precisa, quanto às suas causas e à sua amplitude, aparece como ligado a uma decisão de quem faz a apreciação antecipada. (…) Um perigo é a possibilidade de um dano insusceptível (sic) de antecipação possível. A concretização deste dano, nesta circunstância, apenas pode ser imputada a factores (sic) externos” (GUIBENTIF, 2002, pp. 251-252).

 

Quando introduzimos o objeto da insalubridade e da periculosidade presente na CLT, o elemento risco pode ser facilmente identificado na tipificação do artigo. Significa dizer que para um trabalhador receber os adicionais de insalubridade ou periculosidade é requisito essencial que a sua atividade laborativa esteja expondo-o a um risco.

Observa-se também que este risco deve ser avaliado, e dependendo da sua intensidade ou probabilidade, o empregado terá direito ao pagamento de um valor proporcional ao risco que supostamente esteja sendo exposto.

Assim podemos brevemente pensar em alguns aspectos. Em ambas as situações, como falado anteriormente, tanto na insalubridade quanto na periculosidade, o fator risco encontra-se presente.

Mas o fato é que quando o empregado está exposto ao fator insalubridade, este fator já se encontra presente no meio em que ele está laborando, de forma real. Quando por exemplo um empregado recolhe lixo urbano, o contato com agentes nocivos a saúde é iminente. Vale lembrar que a utilização de equipamentos de proteção individual (EPI’s) nem sempre é suficiente para neutralizar o dano à saúde humana.

Isto é, o empregado está sempre em contato real com o risco de contaminação ou de causar qualquer dado a sua saúde física e até mesmo psicológica. Utilizando ainda o exemplo do empregado que recolhe lixo urbano, o contato com resíduos cujo descarte foi feito de forma incorreta, como seringas usadas que podem perfurar sua pele, pode causar transtorno psicológico, ante a possibilidade de contaminação e ainda as sequelas que poderão repercutir durante toda sua vida.

Já o empregado exposto à periculosidade, apesar do risco estar sempre presente, não tem contato direto com nenhum agente nocivo a sua saúde até que o evento danoso passe a acontecer no plano da realidade, isto é, o empregado recebe adicional apenas pelo risco aque está exposto, ainda que nunca ocorra evento danoso a sua saúde.

Por exemplo, um motociclista tem direito a adicional de periculosidade em razão do risco de sofrer um acidente ao pilotar motocicleta. Fato é que se ele nunca sofrer este acidente, terá recebido adicional de periculosidade durante todo período que laborou sem nunca ter sofrido nenhum dano a sua saúde. Significa dizer que o recebimento do adicional fica no âmbito da esfera psicológica, não rompendo a esfera da realidade dos fatos.

A discussão que se propõe não é o recebimento ou não de adicional de insalubridade ou de periculosidade, mas o fato de que o trabalhador efetivamente em contato com agentes nocivos à sua saúde, expondo-se ao risco de sequelas por toda a vida, receberá adicional de insalubridadeem percentuais de 10%, 20% ou 40%sobre o salário mínimo, enquanto aquele que está apenas potencialmente exposto à periculosidade, perceberá adicional de 30% sobre seu salário contratual, pelo risco da possibilidade de acontecer um evento no plano da realidade, mas que, enquanto não acontecer, não romperá a barreira do plano imaginário, sem que haja qualquer prejuízo para sua integridade física.

É certo que empregados que ocupam atividades laborativas desta natureza, sujeitas ao pagamento de adicionais de insalubridade e periculosidade, não exercem atividades laborativas como a maioria das pessoas e, portanto, se faz necessário o pagamento desses adicionais, que de certa forma são compensadores dos riscos aos quais estão expostos. Neste sentido Meleiro diz que: “Entendemos então, por riscos no trabalho, qualquer ameaça para a integridade física ou psíquica do trabalhador resultante de um desvio, ainda que mínimo, daquilo que se considere como trabalho normal” (MELEIRO, 1985, p.13).

O questionamento que se levanta é que temos de um lado, pessoas que estão realmente em contato com agentes nocivos a saúde, que poderão sofrer sequelas por toda a vida, os detentores de insalubridade, e de outro os que estão expostos ao risco, mas, que enquanto o evento futuro não acontece, não há qualquer repercussão na sua saúde física, os detentores da periculosidade.

Vale lembrar que o fator psicológico da exposição do risco, está presente nos dois casos, mas apenas em um, o da insalubridade, o empregado já sofre os efeitos danosos a sua saúde desde o primeiro dia de trabalho em contato com o agente nocivo, o que de fato não ocorre com o exposto a periculosidade.

O questionamento que se levanta é quanto aos percentuais pagos a título de insalubridade e periculosidade. Neste ponto a análise não parte do pagamento ou não dos adicionais, mas sim se eles estão sendo pagos com o fundamento e a proporcionalidade corretos.

Fato é que independente do risco a que o empregado possa estar sendo submetido, no caso da periculosidade ele sempre receberá um adicional de 30%, bastando que sua atividade seja definida como perigosa, sem que necessariamente haja qualquer dano a sua saúde.

Já nos casos de pagamento de adicional de insalubridade, o empregado, desde o seu primeiro dia de trabalho já está em contato com agente nocivo a sua saúde, podendo trazer severas consequências para sua vida após anos de exposição, recebe apenas um percentual de 10% ou 20%, percentual menor do que o pago na periculosidade (além de ser o percentual do adicional de insalubridade sobre o salário mínimo, enquanto que o adicional de periculosidade é percentual sobre o salário base), que – frise-se – já está fazendo mal a sua saúde desde o primeiro dia de trabalho.

A exceção está para o empregado que recebe adicional de insalubridade de 40%, superando o de periculosidade de 30%, mas nesses casos o empregado deve estar exposto a um agente extremamente nocivo para sua saúde, sendo, portanto, o risco de contaminação e de sequelas igualmente bastante acentuado.

Mais preocupado do que trazer respostas, o presente estudo tem maior preocupação em levantar tal questionamento, principalmente inspirado na pesquisa de Mary Douglas que ao analisar a gênese do risco procurou trazer um caráter relativo.

Um viés antropológico é suscitado na medida em que se pode perceber risco a partir de uma perspectiva cultural. O que se pretende é questionar os fundamentos para o pagamento dos adicionais de insalubridade e periculosidade, e apenas isto. Certo de que questionamentos são mais produtivos do que respostas.

Neste sentido, Douglas e Wildasvsky pensaram que: “Na sua gênese o risco tende a assumir um caráter relativo, sendo tomado como “simulações coletivas” (DOUGLAS E WILDASVSKY, 1982, p.186).

Nesta perspectiva das chamadas “simulações coletivas” o risco é devido a fatores sócio-simbólicos específicos de cada sociedade, isto se deve em razão de determinados agentes sociais que tendem a destacar determinados riscos e ignorar outros.

Questiona-se ainda o ponto referencial que atribuiu aparentemente maior valor social, ou simbólico, a quem pratica trabalho perigoso, do que a quem pratica trabalho insalubre. O fator histórico social que fixou o percentual em 30%, em 1977 estaria até hoje cumprindo sua finalidade? O pagamento deste adicional estaria adequado se comparado ao pagamento dos adicionais de insalubridade, sendo que nestes o empregado já esta exposto ao agente nocivo a sua saúde desde o primeiro dia de trabalho, sujeito a sequelas durante toda a vida? Relativizar os postulados é preciso.

 

CONCLUSÃO

 

O presente estudo analisou, sob a ótica do meio ambiente do trabalho, os percentuais atribuídos aos adicionais de periculosidade e insalubridade,levando em conta os riscos a que se submetem os trabalhadores.

É induvidoso que o pagamento de adicionais é plenamente justificado pelas condições de trabalho adversas enfrentadas pelos trabalhadores em contato com agentes insalutíferos ou perigosos. Contudo, a pesquisa demonstrou que em tais atividades, além da presença do fator risco, o fator psicológico também é relevante, uma vez que os empregados sabem que estão expostos a agentes nocivos a sua saúde.

Também se observou que o empregado em condições insalubres está exposto ao agente nocivo desde o primeiro dia de trabalho, sofrendo agressões a seu organismo, além de possíveis sequelas que poderão afetar sua saúde durante toda a vida.

De outra banda, o empregado exposto a periculosidade, apesar do risco e do fator psicológico, não sofre qualquer dano em sua integridade física até que possa ocorrer o evento danoso.

O confronto entre os percentuais aplicáveis aos adicionais de insalubridade e periculosidade sugerem sua inadequação aos riscos inerentes às condições de trabalho a que visam compensar, o que enseja uma reflexão sobre a fixação de novas proporções, via mudança legislativa.

Por tudo que até aqui foi dito, é necessário que as pessoas físicas e jurídicas tenham um olhar atento ao meio ambiente laboral, a fim de que haja um equilíbrio entre as atividades industriais, comerciais e de serviços, pois não se pode desconsiderar sua importância econômica e sua previsão constitucional. Mas, para tanto, é necessário haver o devido equilíbrio e harmonia entre o bem-estar ambiental no trabalho e qualquer que seja a atividade, seja ela remunerada ou não, pouco importando sua valoração econômica.

Relativizar os postulados é o cerne da ciência, se não se pode questionar, não se pode pesquisar, não se faz ciência.

 

REFERÊNCIAS

 

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GIDDENS, Anthony. O mundo na era da globalização. Lisboa: Editorial Presença, 2000.

 

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MELEIRO, José. Sociologia ambiental: A formação de uma perspectiva social. Lisboa: Piaget, 1985.

 

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MURAD, Samir Jorge. Meio ambiente do trabalho no contexto das cidades sustentáveis. Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2009.

 

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SANTOS, Enoque Ribeiro. Direitos Humanos e meio ambiente do trabalho; título executivo constitucional; tutela jurisdicional. Revista Magister de Direito Trabalhista e Previdenciário nº 6, maio-junho, 2005.

 

Notas de Rodapé:

[1]Doutor em Ciência Política pelo IUPERJ/UCAM. Membro da CDA/OAB-RJ.

[2]Doutoranda do PPGSD-UFF. Professora Universitária. Advogada militante.

[3] Convenção 148 da OIT.

Palavras Chaves

Meio ambiente do trabalho, Insalubridade; Periculosidade; risco; adicionais.