Mediação cidadã para a valorização dos Direitos Humanos.

Resumo

A despeito das vertiginosas mudanças tecnológicas, culturais, econômicas e sociais, cidadãos brasileiros da classe desfavorecida têm sofrido sérios prejuízos no tocante à garantia dos seus direitos fundamentais. Portanto, este artigo trata da eficácia da mediação na Defensoria Pública, a fim de promover assistência jurídica aos que estão à margem da sociedade, nos Tribunais de Justiça, como objeto de resolução pacífica de conflitos e de exercício pleno da cidadania.

Abstract

Despite the dizzying technological, cultural, economic and social changes, Brazilian citizens of the disadvantaged class have suffered serious losses in guaranteeing their fundamental rights. Therefore, this paper is about the effectiveness of mediation in the Public Defender's Office, in order to promote legal assistance to those on the margins of society in the Courts of Justice as an object of peaceful conflict resolution and full exercise of citizenship.

Artigo

MEDIAÇÃO CIDADÃ PARA A VALORIZAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

Resumo

A despeito das vertiginosas mudanças tecnológicas, culturais, econômicas e sociais, cidadãos brasileiros da classe desfavorecida têm sofrido sérios prejuízos no tocante à garantia dos seus direitos fundamentais. Portanto, este artigo trata da eficácia da mediação na Defensoria Pública, a fim de promover assistência jurídica aos que estão à margem da sociedade, nos Tribunais de Justiça, como objeto de resolução pacífica de conflitos e de exercício pleno da cidadania.

Palavras-Chave: Mediação. Defensoria Pública. Direitos Fundamentais. Assistência Jurídica. Cidadania.

Abstract

Despite the dizzying technological, cultural, economic and social changes, Brazilian citizens of the disadvantaged class have suffered serious losses in guaranteeing their fundamental rights. Therefore, this paper is about the effectiveness of mediation in the Public Defender’s Office, in order to promote legal assistance to those on the margins of society in the Courts of Justice as an object of peaceful conflict resolution and full exercise of citizenship.

Keywords: Mediation. Public Defender´s Office. Fundamental Rights. Legal Assistance. Citizenship.

1 Introdução

O presente artigo trata da importância da mediação na Defensoria Pública para garantir assistência jurídica integral e gratuita aos cidadãos brasileiros nos Tribunais de Justiça, e mostrar que este método assegura a resolução pacífica dos conflitos e, também, o pleno exercício da cidadania. Neste sentido, cunhou-se o termo “mediação cidadã” para aliançar a mediação, enquanto meio de humanizar o tratamento oferecido pelo Poder Judiciário à população menos privilegiada, bem como demonstrar respeito aos cidadãos nos processos de luta por seus direitos e reconhecimento de seus deveres.

Tendo em vista a temática adotada levou-se em conta a seguinte questão: Até que ponto a “mediação cidadã” assegura a aplicação do direito fundamental à assistência jurídica integral e gratuita nos Tribunais de Justiça brasileiros?

Para dar suporte a essa questão, utilizou-se como referencial teórico os autores, Rodrigues (2010), Azevedo (2012), Mendes e Branco (2014) e Torres (2016), materiais disponibilizados pelo Curso de Mediação Judicial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, além de artigos publicados na rede mundial.

Com advento do Código de Processo Civil (CPC – Lei nº 13.105/2015) e da Lei de Mediação (Lei nº 13.140/2015) houve a necessidade de adequação da Defensoria Pública brasileira, que não era motivada a utilizar os Métodos Alternativos de Resolução de Conflitos em seus atendimentos; por isso deparou-se com um número bastante reduzido de material sobre o tema. Contudo, percebeu-se ser o tema de extrema relevância para pesquisa. Logo, houve esmero em fazê-lo, uma vez que tais métodos são recorrentes na maioria das questões familiares, consumeristas ou até mesmo criminais, e são instrumentos de garantia de direitos fundamentais. Sabendo da importância da mediação enquanto meio de pacificação social, no trabalho realizado pela Defensoria Pública, no que tange à assistência jurídica integral e gratuita, foram investigados casos reais, para exemplificar o assunto.

Entendendo que a questão da cidadania tem sido acentuada em nosso tempo como parâmetro a utilizar-se na prática da mediação, pretendeu-se nesse trabalho promover uma dialogicidade entre ambos, já que o exercício da verdadeira cidadania consiste em pressionar o Estado a realizar reformas em benefício da coletividade e cumprir funções e papéis presentes na Constituição. Essa dialogicidade com o Estado, nas suas diferentes esferas, constitui-se tarefa essencial no exercício da cidadania.

Desta feita, apresentar-se-á no segundo capítulo os Direitos Fundamentais apontando sua origem, seu desenvolvimento e sua grande influência no Estado Democrático de Direito. Já no terceiro capítulo, será destacado o modo como o Estado garante a Assistência Jurídica Integral e Gratuita às pessoas hipossuficientes, bem como o brilhante trabalho desenvolvido pela Defensoria Pública nesta nação. No quarto capítulo, mostrar-se-á a Mediação agregada à Cidadania, ressaltando a relevante contribuição ao Poder Judiciário. E, finalmente, no quinto e último capítulo, encerrar-se-á este estudo, incentivando o aprofundamento de pesquisas referentes ao tema.

2 Direitos Fundamentais

Para muitos doutrinadores, direitos fundamentais são sinônimos de expressões como: direitos públicos subjetivos, liberdades públicas, direitos humanos, direitos do homem, direitos básicos. Conforme se depreende do dicionário:

Direitos fundamentais são os direitos básicos individuais, sociais, políticos e jurídicos que são previstos na Constituição Federal de uma nação. Por norma, os direitos fundamentais são baseados nos princípios dos direitos humanos, garantindo a liberdade, a vida, a igualdade, a educação, a segurança e etc. No entanto, o estabelecimento dos direitos fundamentais leva em consideração o contexto histórico-cultural de determinada sociedade. Nesse caso, por exemplo, os direitos fundamentais de diferentes países podem divergir, de acordo com as particularidades culturais e históricas de cada civilização (DIREITOS, 2017).

As teorias contratualistas dos séculos XVII e XVIII enfatizaram a ideia de submissão da autoridade política à importância do indivíduo frente ao Estado, que é considerada uma instituição criada para garantir os direitos básicos dos cidadãos. Em decorrência do exposto, surgiram a Declaração de Direitos de Virgínia (1776) e a Declaração Francesa (1789), que positivaram os direitos inerentes ao homem. Acerca desta temática, Bobbio (1992, p.4) corrobora que:

[…] a afirmação dos direitos do homem deriva de uma radical inversão de perspectiva, característica da formação do Estado moderno, na representação da relação política, ou seja, na relação Estado/cidadão ou soberano/súditos: relação que é encarada, cada vez mais, do ponto de vista dos direitos dos cidadãos não mais súditos, e não do ponto de vista dos direitos do soberano, em correspondência com a visão individualista da sociedade […] no início da idade moderna.

Em função das modificações sociais, os direitos fundamentais são de extrema relevância na maioria das sociedades modernas, visto que limitam as relações entre indivíduos e Estado, além de gerarem segurança jurídica para o Estado Democrático de Direito.

No Brasil, apesar da impossibilidade de os direitos fundamentais serem extintos do texto constitucional, por serem cláusulas pétreas, em situações de “estado de exceção”, como estado de defesa (artigo 136) e estado de sítio (artigo 137), estes direitos podem ser suspensos ou restringidos temporariamente.

Para que alguns direitos fundamentais sejam assegurados, é necessário que o Estado, propriamente dito, aja com o objetivo de diminuir as desigualdades sociais. Em outras palavras, é importante haver prestação positiva do Estado, fazendo algo ou dando algo, com a finalidade de tornar a sociedade mais igualitária.

Vale ressaltar que este trabalho não se ateve a estudar todos os direitos fundamentais em espécie, mas apenas o direito fundamental à assistência jurídica integral e gratuita.

3 Assistência Jurídica Integral e Gratuita

Quando se fala em assistência jurídica gratuita, as pessoas entendem que há gratuidade somente nas despesas referentes ao processo judicial. Porém esquecem que esta assistência jurídica gratuita é integral, englobando, desta maneira, a prestação de serviços jurídicos processuais e consultivos, o que é de suma importância, pois contribui com o conhecimento dos direitos das pessoas necessitadas, trazendo-as para o convívio de uma sociedade mais justa.

Durante a vigência da quinta Constituição, foi editada a Lei nº 1.060/1950, que veio estabelecer normas para a concessão de assistência jurídica aos mais necessitados. Contudo, com a promulgação da oitava Constituição, a que está em vigor até os dias atuais, o tema da gratuidade de justiça veio tabulado como direito fundamental, em seu artigo 5º, inciso LXXIV, onde abrange o tema de modo integral.

Não obstante a Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) abordar o tema, no dia a dia forense, sempre se fez menção da Lei nº 1.060/1950, posto que regulamentava de maneira minuciosa o referido tema. Entretanto, esta lei foi revogada em sua maioria pelo artigo 1.072, inciso III do CPC, que assegurou a aplicação deste direito fundamental.

A partir da vigência do CPC, tal tema é positivado em sua Seção IV – Da Gratuidade de Justiça, que engloba os artigos 98 a 102, isentando os menos favorecidos de despesas processuais, acabando com o filtro de cunho econômico. Sendo assim, a barreira financeira, que impedia o acesso ao Poder Judiciário foi extinta, garantindo a estes a defesa processual, ou seja, o processo justo. É importante frisar a grande influência da norma constitucional no processo civil, em conformidade com seu primeiro artigo.

Todavia, antes de o tema propriamente dito ser discorrido, deve-se fazer uma reflexão teórica sobre o papel do advogado e, mais particularmente, do defensor público. O advogado é a “[…] pessoa versada em Direito com a função de orientar e patrocinar aqueles que têm direitos ou interesses jurídicos a pleitear ou defender em juízo” (ADVOGADO, 1997, p.51). O defensor, por sua vez, assiste aos mais humildes ou àqueles que possuem condições financeiras mais favoráveis, no entanto teriam o sustento familiar comprometido se tivessem de arcar com custas e honorários advocatícios.

Outrossim, é salutar enfatizar que para ocupar o cargo público de defensor, é necessário ser advogado e se submeter a concurso rigorosamente disputado. Logo, é peça angular, pois oferece acompanhamento processual de excelência para os necessitados terem acesso à informação e saberem do seu direito diante de situações de afronta.

3.1 Defensorias Públicas do Distrito Federal e dos Estados

A Defensoria Pública possui natureza jurídica de Administração Direta e está vinculada ao Ministério da Justiça. Com as Emendas Constitucionais números 45/2004 e 80/2014, a Defensoria Pública foi fortalecida, tendo sido reconhecidas à autonomia funcional, administrativa, financeira, orçamentária e a iniciativa para propor projetos de lei.

A Defensoria oferece assistência gratuita ao cidadão que não possui condição de pagar os honorários de advogado, de perito, custas judiciais ou extrajudiciais, sem prejuízo do sustento próprio e de sua família. O que gera a oportunidade de acesso ao Judiciário, contribuindo, assim, para a sua democratização e exercício da cidadania, que segundo pressupõe Geaquinto (2008) é “[…] o caminho para diminuir a distância das injustiças e das desigualdades sociais (p.15)”.

Assistência integral compreende defesa extrajudicial e consultoria jurídica, isto é, orientação e aconselhamento jurídico. Sendo que na Tabela de Honorários referente ao mês de agosto de 2018, uma consulta verbal sem litígio custa R$1.034,78, em litígio, R$2.379,99 e, se esta consulta for escrita (parecer), custa R$7.657,36 (TABELA, 2018, p.1). Lembrando que o salário mínimo vigente no ano de 2018 regula em R$954,00, o que torna uma simples consulta jurídica verbal inviável para grande parte da população, que, às vezes, não possui condições para custear sequer o transporte.

Só no Estado do Rio de Janeiro, em 1998, a Defensoria Pública ultrapassou 1.000.000 de atendimentos e estimava-se que 80% das ações judiciais distribuídas neste estado eram provenientes desta instituição. Em 1999, implantou atendimento junto às Delegacias de Polícia e Presídios e regularizou a situação carcerária de cerca de 3.000 pessoas. Com a magnitude deste trabalho, outros países de língua portuguesa, como Angola, Moçambique, Guiné Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Portugal têm sido influenciados em relação à assistência judiciária, para a criação da Defensoria Pública (DEFENSORIA, 2017).

Em âmbito internacional, o modelo de Defensoria Pública adotado no Brasil tem sido reconhecido, visto que em 2011 e 2012, a Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) aprovou duas resoluções (AG/RES. 2656 XLI-O/11 e AG/RES. 2714 XLII-O/12), em que foi recomendada a todos os países-membros a adoção do modelo público de Defensoria Pública, com autonomia e independência funcional.

Gonçalves, Brito e Figueira (2015, p.68) fazem um diagnóstico entre os atendimentos realizados e ações ajuizadas ou respondidas pelas Defensorias de todo o país, onde em 2009 foram realizados cerca de 3.700.000 atendimentos, dos quais mais de 1.100.000 resultaram em ações ajuizadas ou respondidas. Em 2010, mais de 5.000.000 de atendimentos foram efetuados, mas cerca de 1.300.000 ações ajuizadas ou respondidas. Em 2011, quase 6.500.000 atendimentos e cerca de 1.600.000 ações ajuizadas ou respondidas. Em 2012, mais de 7.300.000 de atendimentos e cerca de 1.500.000 ações ajuizadas ou respondidas. Em 2013, mais de 8.100.000 de atendimentos e quase 2.000.000 ações ajuizadas ou respondidas. Em 2014, quase 10.400.000 atendimentos, quer dizer, um acréscimo de mais de 2.000.000 em comparação ao ano anterior. Entretanto, o número de ações ajuizadas ou respondidas foi de cerca de 2.100.000, o que demonstra o bom trabalho realizado nos atendimentos, esclarecendo sobre dúvidas que não geraram ações no Poder Judiciário ou, até mesmo, resolvendo o conflito de forma extrajudicial.

Em relação às formas extrajudiciais de resolução de conflitos nos estados, Gonçalves, Brito e Figueira (2015, p.73) denotam que 85% dos defensores públicos entrevistados responderam que existe prestação de assistência da resolução extrajudicial de conflitos, 74,8% disseram que existe projeto ou ação que estimule formas de resolução extrajudicial de conflitos, e 34,6% falaram que existe forma de controle ou registro do sucesso ou fracasso das tentativas de resolução de conflitos.

Portanto, a resolução de conflitos de forma extrajudicial está sendo estimulada até mesmo dentro das Defensorias, o que demonstra a importância da Mediação, haja vista que pode ser utilizada extrajudicial e judicialmente.

 4 Mediação e Cidadania

 4.1 Mediação

 Embora seja um método de resolução de conflitos recente, vem sendo utilizado nos Tribunais de Justiça da nação brasileira, com grande incentivo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), conforme atesta jurisprudência a seguir:

 

0003163-52.2011.8.19.0210 – APELAÇÃO

DES. CRISTINA TEREZA GAULIA – Julgamento: 23/11/2012 – QUINTA CÂMARA CÍVEL

Apelação cível. Agravo retido. Embargos à execução fundada em título extrajudicial. Cheques. Indeferimento pelo juízo de 1º grau da produção de prova testemunhal requerida pela embargante. Poder discricionário do juiz quanto à necessidade da produção de provas. Inteligência dos arts. 130 e 131 do CPC. Inequívoca demonstração de interesse das partes quanto à realização de audiência de conciliação. Ato judicial que se adequa à garantia constitucional da celeridade processual (art. 5º, LXXVIII, CF). Obrigação do juiz que se insere no mister conciliatório. Inteligência dos arts. 125, IV e do art. 331, caput, ambos do CPC. Posição sobre os métodos alternativos de solução de conflitos que tem sido pauta do CNJ com as semanas de conciliação e com o crescimento da mediação. Error in procedendo. Anulação da sentença para prosseguimento do feito com designação de audiência de conciliação. Desprovimento do agravo retido. Provimento do apelo, na forma do §1º-A do art. 557 do CPC.

 

Como não havia lei que tratasse especificamente sobre o tema, o CNJ, em 2010, publicou uma resolução para suprir esta lacuna legislativa, até que o Projeto de Lei da Câmara n° 94/2002 fosse aprovado, a fim de que este método de resolução de litígios pudesse ser aplicado de forma igualitária nos Tribunais de Justiça de todo o país. Todavia, foi publicada a Lei de Mediação, que visa justamente regulamentar a matéria, além de também ser mencionada no CPC, em seu artigo 334, que torna a audiência de mediação obrigatória no processo civil, salvo manifestação de desinteresse expresso por ambas as partes, ou quando a ação não admitir autocomposição.

Para o doutrinador Warat (2001), a mediação está relacionada com controvérsias que possuem grande carga emotiva e comprometida eticamente. Esta maneira de solucionar litígios está intrinsicamente ligada à intervenção emocional. O mediador busca transformar uma relação disputada em uma relação pacífica, em que as partes estando num desdobramento negativo, gerado por determinada situação, busquem o desdobramento positivo em que se encontravam inicialmente.

O mediador judicial, que trabalha nos Fóruns dos Tribunais de Justiça, também exerce atividade jurídica de extrema relevância para a sociedade. Ao participar das sessões de mediação, muitos usuários agradecem por serem simplesmente escutados. Alguns possuem processos judiciais abertos há anos e nunca tiveram oportunidade de expor seus pensamentos e sentimentos. Por isso, o psicólogo Waldemar Magaldi Filho afirma: “Quando a boca cala o corpo fala, e quando a boca fala o corpo sara (apud, Queiroz, 2013, p.8)” e, da mesma forma, Queiroz (ibidem) enfatiza: “[…] a fala é terapêutica; a fala cura (p.11)”. Esta cura, no Poder Judiciário, age como empoderamento para promover solução do conflito que levou a pessoa a estar envolvida em um processo judicial, como para outras situações que possam vir a acontecer no futuro, e poderá resolver suas questões sem auxílio de um terceiro.

A Resolução n° 125/2010, em seu artigo 4° informa que é de competência do CNJ incentivar a pacificação social através da mediação. Os órgãos judiciais devem oferecer este método, como mecanismo alternativo, em conformidade com o parágrafo único do artigo 1°.

4.2 Cidadania

A palavra cidadania vem de “cidade”. Cidade vem civitas, civilis no latim. Cidadania é, portanto, a ação pela qual alguém se torna civil, habitante da cidade e passa a fazer parte da civilização. No que se refere à identidade do homem, ela é dupla – na esfera individual, cada um é único e inigualável; na esfera pública, cada um é cidadão, teoricamente igual a todos os outros. Compreende-se que a cidadania implica um processo: a intuição se submete à razão; a razão e os interesses individuais se submetem à razão pública e aos interesses coletivos. O filósofo Platão afirma que para se gerar o cidadão justo, a política deve ser justa, pois se injusta, deforma o cidadão e o cidadão “deformado” não caminha com dignidade na cidade, na civitas. Para Serrão (1999), a cidadania:

Não se limita a uma palavra, uma ideia, um discurso, nem está fora da vida da pessoa. Ela começa na relação do homem consigo mesmo para, a partir daí, expandir-se até o outro, ampliando-se para o contexto social no qual esse homem está inserido. É uma nova forma de ver, ordenar e construir o mundo, tendo como princípios básicos os direitos humanos, a responsabilidade pessoal e o compromisso social na realização do destino coletivo (p.229).

Rodrigues (2010) salienta que a mediação assegura: “[…] espaços de fala, democracia e participação. Isso, tendo em vista ser o papel do mediador de auxiliar as partes na construção de soluções para seus conflitos”. Para ela: “[…] democracia implica algo a mais além da vontade política de melhorar a qualidade da existência individual e coletiva, por meio do estabelecimento de direitos e deveres para os cidadãos, embora sejam os precedentes para uma sociedade democrática (p.254)”.

A mediação que se pretende neste estudo, além de auxiliar a resolução de conflitos, quando unida à cidadania, fortalece, através do diálogo, as identidades coletivas e reforça o sentimento de pertencimento dos envolvidos. Portanto, nomeou-se “mediação cidadã”, o veículo que promove a valorização da identidade e da autoestima dos cidadãos, favorecendo a comunicação através do diálogo franco e aberto, contribuindo, assim, para a convivência e a participação social.

5 Conclusão

Os Direitos Fundamentais evoluíram com o fluir do tempo, segundo as necessidades do próprio ser humano, porém estão intrinsicamente ligados ao contexto histórico-cultural de cada sociedade. Sendo reflexo direto disto, a evolução histórica das constituições brasileiras, que, dependendo do momento político, se quedavam silentes frente aos direitos mais basilares do homem. Porém, na Constituição Cidadã, os direitos fundamentais foram descritos de forma abrangente, o que impulsionou o próprio Estado a agir, de maneira positiva, para que estes direitos fossem garantidos.

No que se refere ao direito fundamental tratado neste trabalho, somente em 1994 (Lei Complementar nº 80) é que a Defensoria Pública foi institucionalizada em todo o Brasil, compelindo a criação em todos os estados da federação, sendo concluída somente em 2012, no estado de Santa Catarina.

Com advento do CPC e da Lei de Mediação, houve maior incentivo na aplicação de métodos alternativos de resolução de conflitos, no qual está inserida a Mediação, que surgiu com o objetivo de solucionar litígios resultantes de relações contínuas, que necessitam ser trabalhadas devido à forte carga emocional envolvida.

Portanto, neste trabalho salientou-se a importância da “mediação cidadã” para garantir o direito fundamental à assistência jurídica integral e gratuita, haja vista que a mediação humaniza o atendimento realizado pelos Tribunais de Justiça, começando desde o acolhimento aos usuários, perpassando pelas sessões, onde há valorização das falas, por meio da escuta ativa, gerando a resolução do conflito e a pacificação social. Isso promove amadurecimento nos usuários, para que estes sejam protagonistas frente a situações posteriores.

De acordo com análise de documentos da Defensoria Pública, constatou-se que a mediação, como mecanismo de pacificação social, é mola propulsora que alavanca o direito fundamental, garantindo à população desfavorecida assistência jurídica integral e gratuita. No entanto, agregada à cidadania torna-se imprescindível para que o usuário tenha atendimento justo e humanizado. Neste sentido, Geaquinto (2008) ratifica que a cidadania: “[…] é a mola mestra do desenvolvimento da pessoa humana, como agente realizador de transformações históricas, na busca do aprimoramento das instituições políticas e sociais e do resgate dos ideais de igualdade […] (p.15)”.

Após estudar, a mediação na assistência jurídica integral e gratuita no Brasil, observou-se que além de garantir os direitos humanos e o exercício efetivo da cidadania, diminui a distribuição de novas demandas judiciais. Por isso, espera-se que este método seja mais incentivado pelo CNJ através de políticas públicas. Entretanto, entende-se que novas vertentes podem ser vislumbradas e estudadas, tais como: ampliação física das Defensorias Públicas e inclusão de matéria sobre Métodos Alternativos de Resolução de Conflitos nas faculdades de Direito de todo o país. Enfatizando que, a informação correta de como resolver mais facilmente os conflitos gera tranquilidade na pessoa atendida e reduz o número de ações judiciais. Sem contar que há grande possibilidade de resolução de forma extrajudicial, sendo detectada a judicialização de conflitos de natureza ínfima, por não fazer parte da cultura brasileira a cooperação, e sim a competição.

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Palavras Chaves

Mediação. Defensoria Pública. Direitos Fundamentais. Assistência Jurídica. Cidadania.