O DIREITO PENAL NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Resumo

O objetivo deste estudo é analisar o princípio da culpabilidade como uma variante do postulado concernente à dignidade da pessoa humana. Procura-se demonstrar a importância de o juiz reafirmar os princípios inspiradores do garantismo, mesmo os que não se encontram expressos na Constituição Federal, mas que são decorrentes da garantia conferida à dignidade da pessoa humana, como o princípio da culpabilidade, compatível com o regime democrático adotado na atual Carta política brasileira. Por essas razões, em estudos preliminares realizados, constatou-se que o conceito de reprovação expresso em nossa legislação penal (artigo 59 do Código Penal) transformou a individualização da pena, nas decisões judiciais, em um processo de execração voltado para a conduta de vida do autor, ao invés de reprovar o fato por ele praticado. Dessa forma, pretende-se neste trabalho demonstrar que esse fato pode ser compreendido em uma perspectiva constitucional garantista, evitando a violação do Estado Democrático de Direito, em que o julgador deve considerar o princípio da dignidade humana como uma variante para amparar a culpabilidade na individualização da pena. No Brasil, as Políticas Públicas nem sempre alcançam o Poder Judiciário no exato momento em que se dá a relação entre o agente que praticou um crime e o Juiz quando da determinação da sua pena, conforme se varia no tempo histórico. Leis dispersas regulam genericamente situações protetivas, principalmente nos dias de hoje; nenhuma delas, seja por razões naturais ou sociais, é avaliada pelo Juiz em função do princípio da vulnerabilidade e, muito menos, tomando a vulnerabilidade como variável determinante da culpabilidade e pena consequente. Assim, realiza-se aqui um esforço de identificar essas situações na linha do tempo histórico, tanto nos períodos autoritários ou democráticos, como nas dimensões circunstanciais da atualidade.

Abstract

The purpose of this paper is to analyze the principle of blame as a variable of the postulate concerning the human dignity. It looks for demonstrating how important is the position taken by the judge in reaffirming the inspiring principles of warrantism, even those that are not expressed in the Federal Constitution, but are arising out of the warrant for the human dignity, as the principle of blame, compatible with the democratic regime adopted in the present Brazilian constitution. For those reasons, in some previous studies, it has been evident that the concept of reproach explicit in our penal legislation (article 59 of the Penal Code) transformed the individualization of punishment, in judicial decision, into a process of loathing directed to the conduct of life regarding the author, instead of reproving the fact practiced by him. So, in this paper there is an intention to demonstrate that such a fact can be understood in a warrantist constitutional perspective, avoiding the violation of the Democratic State of Law, where who judges must consider the principle of human dignity as a variable for supporting the blame in the individualization of punishment. In Brazil, Public Policies not always reach the judiciary in the exact moment in which is stablished the relationship between the agent who committed a crime and the judge when this determines his punishment, according to the changes that come up in historical time. Laws scattered in the legal system generically rule protective situations, mainly in current time; any of them is not evaluated by the judge for natural or social reasons – regarding the principle of vulnerability, but neither he takes the vulnerability as a causative variable of the blame and the consequent punishment. Therefore, an effort is accomplished here aiming to identify the situations above mentioned in the historical time frame, not only in authoritarian or democratic periods, but also in the cir-cumstantial dimensions of the present time.

Artigo

O DIREITO PENAL NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

 

                Kátia Rubinstein Tavares[1]

 

Enquanto existir direito penal e nas atuais circunstâncias parece que haverá ‘direito penal por muito tempo’, é necessário que haja alguém que se encarregue de estudá-lo e analisá-lo racionalmente para convertê-lo em instrumento de mudança e progresso para uma sociedade mais justa e igualitária, denunciando, além de suas contradições, as do sistema econômico que o condicionam. (Francisco Muñoz Conde)[2]

                 

RESUMO: O objetivo deste estudo é analisar o princípio da culpabilidade como uma variante do postulado concernente à dignidade da pessoa humana. Procura-se demonstrar a importância de o juiz reafirmar os princípios inspiradores do garantismo, mesmo os que não se encontram expressos na Constituição Federal, mas que são decorrentes da garantia conferida à dignidade da pessoa humana, como o princípio da culpabilidade, compatível com o regime democrático adotado na atual Carta política brasileira. Por essas razões, em estudos preliminares realizados, constatou-se que o conceito de reprovação expresso em nossa legislação penal (artigo 59 do Código Penal) transformou a individualização da pena, nas decisões judiciais, em um processo de execração voltado para a conduta de vida do autor, ao invés de reprovar o fato por ele praticado. Dessa forma, pretende-se neste trabalho demonstrar que esse fato pode ser compreendido em uma perspectiva constitucional garantista, evitando a violação do Estado Democrático de Direito, em que o julgador deve considerar o princípio da dignidade humana como uma variante para amparar a culpabilidade na individualização da pena. No Brasil, as Políticas Públicas nem sempre alcançam o Poder Judiciário no exato momento em que se dá a relação entre o agente que praticou um crime e o Juiz quando da determinação da sua pena, conforme se varia no tempo histórico. Leis dispersas regulam genericamente situações protetivas, principalmente nos dias de hoje; nenhuma delas, seja por razões naturais ou sociais, é avaliada pelo Juiz em função do princípio da vulnerabilidade e, muito menos, tomando a vulnerabilidade como variável determinante da culpabilidade e pena consequente. Assim, realiza-se aqui um esforço de identificar essas situações na linha do tempo histórico, tanto nos períodos autoritários ou democráticos, como nas dimensões circunstanciais da atualidade.

 PALAVRAS CHAVE: Direito Penal Garantista. Justiça Criminal. Culpabilidade pela Vulnerabilidade.  

ABSTRACT: The purpose of this paper is to analyze the principle of blame as a variable of the postulate concerning the human dignity. It looks for demonstrating how important is the position taken by the judge in reaffirming the inspiring principles of warrantism, even those that are not expressed in the Federal Constitution, but are arising out of the warrant for the human dignity, as the principle of blame, compatible with the democratic regime adopted in the present Brazilian constitution. For those reasons, in some previous studies, it has been evident that the concept of reproach explicit in our penal legislation (article 59 of the Penal Code) transformed the individualization of punishment, in judicial decision, into a process of loathing directed to the conduct of life regarding the author, instead of reproving the fact practiced by him. So, in this paper there is an intention to demonstrate that such a fact can be understood in a warrantist constitutional perspective, avoiding the violation of the Democratic State of Law, where who judges must consider the principle of human dignity as a variable for supporting the blame in the individualization of punishment. In Brazil, Public Policies not always reach the judiciary in the exact moment in which is stablished the relationship between the agent who committed a crime and the judge when this determines his punishment, according to the changes that come up in historical time. Laws scattered in the legal system generically rule protective situations, mainly in current time; any of them is not evaluated by the judge for natural or social reasons – regarding the principle of vulnerability, but neither he takes the vulnerability as a causative variable of the blame and the consequent punishment. Therefore, an effort is accomplished here aiming to identify the situations above mentioned in the historical time frame, not only in authoritarian or democratic periods, but also in the circumstantial dimensions of the present time.

KEYWORDS: Warrantist Penal Law. Criminal Justice. Blame by Vulnerability.

 SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. O PRINCÍPIO DA CULPABILIDADE NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO. 3. LIMITES À ATUAÇÃO DA JUSTIÇA CRIMINAL BRASILEIRA: O PRINCÍPIO DA VULNERABILIDADE NA FIXAÇÃO DA PENA. 3.1. A COCULPABILIDADE 3.2. A VULNERABILIDADE E A CULPABILIDADE 4. CONCLUSÃO.

  1. INTRODUÇÃO

            Nosso Direito Penal na atualidade atravessa momentos difíceis. No século XX, a partir dos anos oitenta, passou a predominar uma concepção defendida por setores mais conservadores da sociedade brasileira, a buscar o endurecimento das leis penais, sob o falso argumento de que, com essa medida, a questão da criminalidade seria resolvida. Semelhante discurso assumiu as manchetes de jornais, ocasionando uma verdadeira produção legislativa desatrelada das garantias constitucionais e dos princípios penais e processuais. Ainda, essa ideologia autoritária e repressiva pode ser identificada nas reformas pontuais efetuadas, nos últimos tempos, as quais desorganizam todo o sistema penal.

             Inaugurou-se o novo milênio sob uma metodologia imprimida pelo neoliberalismo globalizante, inspirador dos movimentos de Lei e Ordem, aliado à imposição de uma publicidade opressiva, a produzir múltiplos “tribunais do povo”, os quais julgam influenciados pela mídia, ignorando por completo a causa e as circunstâncias do contexto social.

              Por outro lado, esse quadro expositivo esclarece preliminarmente as razões por que alguns magistrados tenham se contaminado por determinada ideologia ético-social, ainda que funcionalmente engajados, afastam-se do dever da imparcialidade, renunciando à missão social e humana de decidir com base na lei e em nome da Justiça, para condenar pessoas, sem levar em consideração a culpabilidade como elemento na dosimetria da penal.

O tema que pretendemos desenvolver perpassa pelo prisma dos princípios gerais informadores do Direito Penal Constitucional. O nosso objetivo é demonstrar que os princípios constitucionais em matéria penal estão, tacitamente, reconhecidos na hermenêutica da Constituição Federal, sendo equiparados aos princípios fundamentais que são explicitados na Carta Política e, portanto, têm o mesmo efeito constitucional e a mesma carga de positividade. Esses princípios especiais podem ser extraídos de diferentes critérios que possuem seus registros constitucionais. Nesse sentido, sustentamos o princípio da culpabilidade, como uma variante do postulado expresso na dignidade da pessoa humana, referencial fundamental do Estado Democrático de Direito.

            Num Estado Democrático de Direito não convém ao Juiz seguir exclusivamente o modelo positivista distanciado da Constituição, renunciando à independência que se confere ao Poder Judiciário e ao dever de julgar. Sem considerar um sistema de garantias, com o objetivo de assegurar os direitos e postulados fundamentais, que encontra resguardo na exigência da dignidade da pessoa humana e de outros princípios inseridos na Constituição Federal. É o Juiz o guardião desse paradigma garantista, o qual constitui a única resposta possível à crise da justiça e da política.

            Em suma, afigura-se indispensável que se estabeleçam balizas na atividade discricionária de determinação do quantum da pena do condenado, sujeitando-se esse julgador aos princípios inspiradores do garantismo, que se encontram expressos na Constituição Federal, os quais são decorrentes da cláusula conferida à dignidade da pessoa humana e dos princípios sublinhados no artigo 5º da Constituição Federal. Ainda, entre os princípios limitadores, destaca-se o da culpabilidade que limite a intervenção estatal, compatível com o regime democrático adotado na atual Carta política.

  1. O PRINCÍPIO DA CULPABILIDADE NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

     

Como já destacado, é inegável que os liames estabelecidos entre o Direito Penal e a Constituição Federal são estreitos e podem ser estudados sob as mais variáveis perspectivas. Em nosso estudo, o objeto escolhido será examinado pela ótica do reconhecimento de paradigmas constitucionais garantísticos, os quais, embora não estejam expressos na Constituição Federal brasileira, defluem do sentido de outras regras ou princípios constitucionais.

 Esses princípios básicos são reconhecidos pelo Direito Penal, de forma expressa e normativamente, ou pelo conteúdo de normas e preceitos, cuja proposta básica seja assegurar um sistema garantidor, não apenas sob o aspecto formal, mas principalmente sob o enfoque material, que relacione ao conceito de crime os pressupostos legitimadores de intervenção penal – tais como a legalidade, a intervenção mínima, a taxatividade, a lesividade, a retroatividade da lei mais benigna – bem como no que concerne à culpabilidade, humanidade, pessoalidade e individualização das sanções, seguindo as diretrizes de um Estado Democrático de Direito.

A esse respeito Mir Puig se posiciona:

O Estado Democrático de Direito deve assegurar a proteção efetiva de todos os membros da sociedade, através não somente da repressão dos delitos, entendidos estes como aqueles comportamentos que os cidadãos estimem lesivos para seus bens jurídicos, num sentido ético-individual, mas também por oferecer possibilidades de ingerência nos sistemas sociais fundamentais, e na medida em que se considerem graves tais fatos. Este direito é que deve orientar a função preventiva da pena com apoio nos “princípios de exclusiva proteção de bens jurídicos, de proporcionalidade e de culpabilidade [3].

É indiscutível a importância da Constituição de um Estado, sobretudo no que respeita a sua influência nas demais disciplinas jurídicas nele em vigor, já que reflete o ambiente social valorativo de uma comunidade, representando “o estatuto fundamental da ordem jurídica geral”[4]. Por outro lado, o Direito Penal vincula-se à Constituição Federal[5], de maneira necessária, uma vez que esta compreende os princípios fundamentais do Estado e do Direito. A Magna Carta, em verdade, revela-se como a primeira manifestação legal da política penal[6] que se impõe ao Direito Penal, “até com particular incidência e legitimidade, uma vez que entre estes dois planos jurídicos intercedem uma relação mais estreita, em virtude de o próprio Direito Penal contender com os valores mais essenciais à vida do homem em comunidade”[7].

              Ressalta-se que cabe a cada uma das Constituições, ao fixar as condições de existência e funcionalidade dos poderes políticos, determinar como o legislador penal deve qualificar as ações delituosas e estabelecer as respectivas sanções, ditando, também, comandos em relação às normas de procedimentos. Como o Direito Penal tem por objeto a restrição da liberdade dos indivíduos, é certo que ele depende da evolução dos princípios constitucionais inseridos nas Constituições.

              Como já exposto, apresenta-se inegável que das relações formais entre os valores constitucionais e o Direito Penal resulta um conjunto de princípios que podem ou não estar expressos na Constituição Federal, derivados de uma interpretação extensiva de outros princípios formalizados no texto, corolários do reconhecimento da dignidade da pessoa humana, consagrado nos modelos jurídicos adotados pelo Estado Democrático de Direito.

Não se pode examinar a Constituição, como reunião de um texto, onde se congregam títulos, capítulos e artigos, sem que se reconheça a existência de um fio condutor, o qual deve costurar todos os dispositivos constitucionais. Nesse raciocínio, a Constituição Federal brasileira apresenta expressamente os direitos e garantias fundamentais explicitados nos capítulos do Título II. Entretanto, é importante lembrar que tais princípios se relacionam com outras normas estruturais constitucionais.

             Há, em verdade, uma interpenetração entre os direitos e garantias fundamentais que não se esgotam nas fórmulas reconhecíveis na Magna Carta. Existem outros que, apesar de desprovidos de caráter explícito, são reconhecidos no âmbito constitucional. Da interpretação dos §§ 1º e 2º do art. 5º da Constituição Federal brasileira tem-se estabelecido o seguinte: em primeiro lugar, que os direitos e garantias arrolados não excluem outros que decorram dos princípios adotados pela Magna Carta. Ainda, que têm aplicação imediata os direitos e garantias, bem como os princípios constitucionais, mesmo os nãos catalogados.  Nesse sentido, sustentam Canotilho e Moreira que: “haver-se-ão de considerar como direitos fundamentais os direitos extraconstitucionais que sejam equiparáveis, pelo seu objeto e pela sua importância, aos diversos tipos de direitos fundamentais de grau constitucional”[8].

            Destarte, os princípios constitucionais em matéria penal, os quais não estão formalizados na Constituição Federal brasileira e em outras, merecem ser equiparados aos princípios fundamentais que são explicitados na Carta política, aplicando-se a mesma carga constitucional e de positividade. Tais princípios especiais podem ser extraídos de diferentes critérios que possuem seus registros constitucionais. Em particular, sustenta-se o princípio da culpabilidade como uma variante do postulado expresso: a dignidade da pessoa humana. O texto constitucional brasileiro contém dispositivo indicativo, no art. 1º, inciso III, que versa sobre os fundamentos do Estado Social e Democrático de Direito, erigindo como um dos valores a dignidade da pessoa humana.

            Ressalte-se que o conceito de dignidade da pessoa humana, considerado no Estado Democrático de Direito, abrange o aspecto material, não podendo deixar de reconhecer os efeitos concretos de preservação das condições essenciais de sobrevivência e de desenvolvimento digno da pessoa humana.

            A propósito, argumenta Paulo Mota Pinto:

A garantia da dignidade humana decorre, desde logo, como verdadeiro imperativo axiológico de toda a ordem jurídica, o reconhecimento de personalidade jurídica a todos os seres humanos, acompanhado da previsão de instrumentos jurídicos (nomeadamente, direitos subjetivos) destinados à defesa das refracções essenciais da personalidade humana, bem como a necessidade de proteção desses direitos por parte do Estado[9].

O autor ainda assevera: “A afirmação da liberdade de desenvolvimento da personalidade humana e o imperativo de promoção das condições possibilitadoras deste livre desenvolvimento constituem já corolários do reconhecimento da dignidade da pessoa humana como valor no qual se baseia o Estado”[10].

             Assim, no âmbito penal, o art. 5º da Constituição brasileira relaciona uma série de princípios fundamentais expressos, decorrentes do postulado concernente à dignidade da pessoa humana, a saber: punição às discriminações atentatórias dos direitos e liberdades fundamentais (inciso XLI); incriminação da prática de racismo (inciso XLII); inafiançabilidade e a insuscetibilidade de graça ou anistia nos crimes de tortura (inciso XLIII); caráter pessoal da pena (inciso XLV); a individualização da pena (inciso XLVI); vedação de penas desumanas (inciso XLVII); caráter individualizador da execução da pena (inciso XLVII e L); preservação da dignidade e integridade física do preso (inciso XLIX).

Da mesma forma, outros princípios devem ser inferidos, apesar da omissão do Constituinte, segundo as técnicas de hermenêutica, com fundamento no reconhecimento da dignidade da pessoa humana, como a consagração – ainda que de modo implícito – do princípio da culpabilidade e do da humanidade das penas. Nesse propósito, exige-se que a intervenção estatal se imponha, levando em conta o homem que cometeu o delito, bem como as condições e peculiaridades relacionadas com o episódio, graduando a culpabilidade proporcionalmente ao fato e ao agente, já que, dependendo das circunstâncias e do seu autor, a aplicação da pena criminal torna-se, muitas vezes, desnecessária.

            A superfluidade da sanção penal pode resultar da inutilidade da aplicação de uma reprimenda, em face das funções adotadas pelo legislador no art. 59 do atual Código Penal brasileiro. A proposta abraçada pela nossa legislação adota um sistema unitário ou misto, em que a pena deve alcançar a sociedade de forma útil, desempenhando um sentido intimidatório em relação à prática do delito e, ao mesmo tempo, à pessoa que é condenada. Seu objetivo deve ser a reinserção social do preso, dirigindo-lhe a resposta pela conduta ilícita cometida, na medida de sua culpabilidade, impondo-se critérios racionais e de humanidade.

       O legislador brasileiro fornece alguns critérios para essa quantificação quando determina ao julgador que examine a culpabilidade e outras circunstâncias, tais como a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as consequências do crime. Após esse exame resultará a aplicação da pena-base, sobre a qual incidirão as circunstâncias agravantes e atenuantes, e, por último, as causas de aumento e de diminuição eventualmente existentes. Pretende-se, nesse particular, ter em vista as legislações penais dos Códigos em vigor na América Latina.

       O julgador, ao condenar, desenvolve, na realidade, a árdua missão de punir a conduta de um homem, não a de uma ficção. A sentença não pode ser encarada como um mero expediente burocrático. Ao determinar a culpabilidade, como critério individualizador da pena, estabelece o legislador, de forma bem nítida, que uma conduta humana somente será punível quando o agente puder, pelo menos, prever a possibilidade de ofensa a um bem jurídico tutelado, ainda, quando for possível fazer-se recair um juízo de reprovabilidade, diante de suas características pessoais, em face das circunstâncias em que atuou[11]. É necessário operar a individualização da pena “a olho”, recomenda Zaffaroni[12].

                Por isso, em nome do princípio da dignidade da pessoa humana argumenta-se a aplicação da vulnerabilidade como princípio a nortear a determinação da pena pela justiça criminal, permitindo a aplicação do perdão judicial, tal como estatui a regra do art. 121, § 5º, do Código Penal, ao estabelecer que: “o juiz poderá deixar de aplicar a pena se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária.”

                  Não obstante, assinale-se que o conceito de culpabilidade – a reprovabilidade pessoal – encontra-se em crise, na atual conjuntura, em virtude da deslegitimação do sistema penal. A seletividade deste acaba por tornar insustentável a legitimação da reprovabilidade, tanto quanto a da utilização da pena (instrumento da violência validador de um exercício de poder). Ressalte-se a lenta degradação do discurso jurídico-penal, quando se questiona: “Por que a mim? Por que não a outros que fizeram o mesmo? São perguntas a que a reprovação normativa não pode responder”[13].

            Deve-se concordar com a afirmação de Zaffaroni, segundo a qual o princípio de que a pena se mede pela culpabilidade foi, em verdade, um enunciado com vistas apenas a recolocar a questão da periculosidade sob uma abordagem pretensamente ética, entretanto, sem conseguir resolver os problemas com relação ao juízo da culpabilidade[14].

             Por fim, tem-se como realidade que a determinação da pena nos Tribunais depende de eventuais peculiaridades do entendimento de cada magistrado. É ele quem elabora, evidentemente, um juízo de valoração pessoal, também, de entendimento da norma, através do processo de comparação analógico – que pode agravar a punição do réu –, não se examinando a culpabilidade como medida da sanção. É uma falácia afirmar que, no Direito Penal, não existe a analogia contra o réu, pois todo o processo de interpretação judicial corresponde a um raciocínio analógico. Portanto, o reconhecimento do princípio que impõe ao magistrado a estrita observância do grau de culpabilidade, de modo que cada indivíduo receba punição pelo seu crime na medida dela, apresenta-se, necessariamente, no âmbito de uma hermenêutica; por isso, é indispensável que a aplicação do princípio da culpabilidade se imponha de forma harmônica e sistemática, tendo como paradigma à própria Constituição, em seus valores, princípios e garantias.

             Não se olvide que a interpretação judicial é um juízo formal da própria lei; entretanto, não pode o juiz se afastar do “dever de escolher somente os sentidos válidos, ou seja, compatíveis com as normas constitucionais substantivas e, também, com os direitos fundamentais por ela estabelecidos” [15], inclusive os princípios e garantias expressos e implícitos.

            Nesse sentido, apresenta-se uma nova abordagem, o modelo denominado garantístico, defendido com vigor por Luigi Ferrajoli: “o direito contemporâneo não programa somente as formas de produção através de normas procedimentais sobre a formação das leis e dos atos normativos. Programa ainda os conteúdos substanciais, vinculando-os normativamente aos princípios e aos valores inscritos nas Constituições mediante técnicas de garantias”[16].

            Em suma, não convém ao Estado Democrático de Direito o juiz seguidor do modelo positivista, distanciado da Constituição, renunciando à independência que se confere ao dever de julgar, e sem considerar o sistema de garantias que tem por objetivo assegurar os direitos e princípios fundamentais como uma exigência da dignidade da pessoa humana. É o Juiz o guardião desse paradigma garantístico, o qual constitui “a única resposta possível à crise da justiça e da política”[17].

            A propósito do tema em pauta, discorre Jorge Miranda:

A garantia da constitucionalidade é a garantia de que, em cada relação jurídica ou situação de vida, prevalece o dispositivo constitucional e de que se pratica um ato permitido pela Constituição; ou por outras palavras, é a garantia de que cada norma e cada comportamento subordinado à Constituição lhe são conformes. Uma implica a outra, porque a Constituição existe para ser interpretada, aplicada, cumprida, desenvolvida, posta em vigor[18].

              Afigura-se indispensável que o juiz reafirme os princípios inspiradores do garantismo, mesmo os que não se encontram expressos na Constituição Federal, os quais são decorrentes da garantia conferida à dignidade da pessoa humana, como o princípio da culpabilidade, compatível com o regime democrático adotado na atual Carta política brasileira. Portanto, pretende-se demonstrar a importância do tema tratado, inclusive em outras Constituições da América Latina.

  1. LIMITES À ATUAÇÃO DA JUSTIÇA CRIMINAL BRASILEIRA:

O PRINCÍPIO DA VULNERABILIDADE NA FIXAÇÃO DA PENA

O processo de individualização de pena na justiça criminal está atrelado a um prévio juízo de culpabilidade como limitador de sua medida. Logo, a reprovação empregada na legislação penal (artigo 59 do Código Penal) indica o sentido de que a pena aplicada deva ser proporcional ao dano ou perigo do bem jurídico protegido. Entretanto, o conceito de reprovação expresso em nossa legislação penal tem despertado nos julgadores o olhar recriminador sobre o sujeito a quem deveria recair a reprimenda penal, transformando a individualização de pena, nas decisões judiciais, num processo de reprovação e, muitas vezes, de execração com invocações moralistas voltadas para a conduta de vida do autor, ao invés de reprovar o fato do injusto por ele praticado.

Dessa forma, em nossas reflexões, busca-se entender como vem ocorrendo esse desvio, na teoria e na prática do Direito Penal, ao longo dos anos, sobretudo após a constitucionalização dos direitos e garantias estatuídos na Magna Carta, além dos preceitos fixados nos Tratados e Convenções Internacionais ligados aos Direitos Humanos Civis e Políticos. Ainda, é possível argumentar que tal fenômeno evidencia a necessidade de se abandonar o juízo de censura ou reprovabilidade da culpabilidade, já que ele envolve juízo moral para fins de aplicação da pena, suscetível de relativização. Este se revela em dissonância com o fundamento constitucional da dignidade humana, o qual proíbe a objetivação de outro ser humano.

Em estudos preliminares realizados com o escopo de investigar a plausibilidade de nosso tema escolhido neste trabalho, verifica-se que o princípio da pena como medida da culpabilidade, na leitura jurídica e dogmática, constitui uma mera retórica doutrinária, pois é impossível determinar racionalmente essa medida, a não ser através de um processo de interpretação ou comparação analógica feita sempre em desfavor do acusado. Por essas razões, como procuraremos demonstrar, o mesmo fenômeno pode ser compreendido numa perspectiva constitucional garantista, em que o julgador deveria considerar o princípio da dignidade humana como uma variante para amparar a culpabilidade na individualização da pena. Também, no processo de interpretação deverá se utilizar de mecanismos jurídicos constitucionais, internacionais e da criminologia para apontar a culpabilidade, quando se opera a individualização da pena na justiça criminal.

Na prática, em regra geral, ocorre que, eventualmente, alguns julgadores não explicitam o conteúdo do processo de graduação do juízo de culpabilidade do acusado ao fixar sua pena, que deve estar vinculada a limites legais contidos na incriminação do fato. O julgador deveria estabelecer o sentido originário, preciso e racional das palavras do texto legal, na determinação da pena, realizando uma valoração objetiva do injusto. Entretanto, o certo é que nenhuma das concepções sobre a culpabilidade contém um parâmetro objetivo para fornecer ao julgador sua quantificação. Portanto, ele acaba correndo o risco de examinar a culpabilidade com base em suas perspectivas pessoais com relação ao fato ou delito, considerando os valores mal transmitidos socialmente e convertidos num critério subjetivo e preconcebido, em desfavor do acusado, ao empregar expressões contendo juízos morais acerca de sua conduta ou profecias ideologizadas de sua reputação social, tais como “personalidades distorcidas e voltadas para o crime” ou “condutas socialmente reprováveis”.

                  Dessa forma, sustenta-se, com a apropriação de categorias da teoria geral do Direito Penal, do crime e da pena, cuja fonte primária será o Direito Constitucional, mais especificamente os princípios do Direito Penal Constitucional e Internacional, que, na prática cotidiana dos Tribunais, alguns julgadores, ao determinarem a pena, promovem decisões violando postulados constitucionais. Isso porque, na fixação da pena do condenado, não é assegurado o princípio da culpabilidade como um direito fundamental, pois apesar de carecer de positividade expressa no segmento normativo constitucional, tal postulado advém do princípio da dignidade da pessoa humana, sendo este o modelo garantista adotado no regime democrático da atual Constituição Federal.

No âmbito penal, a Constituição, conforme já se sublinhou no presente estudo, relaciona uma série de princípios fundamentais expressos, decorrentes do postulado concernente à dignidade da pessoa humana. Cabe salientar que outros princípios devem ser inferidos, apesar da omissão do Constituinte, segundo as técnicas de hermenêutica, com idêntico fundamento no reconhecimento da dignidade da pessoa humana, como a consagração – ainda que tacitamente – do princípio da culpabilidade, da humanidade e personalidade das penas, proporcionalidade mínima, proibição da dupla punição, destacando-se, ainda, o princípio da boa-fé e pro homine.

Apesar de o texto da Constituição ressalvar expressamente que os direitos e garantias individuais elencados como tais, não excluem outros decorrentes dos Tratados e das Convenções Internacionais em que a República Federativa do Brasil faça parte, é certo que o Supremo Tribunal Federal tem rejeitado a interpretação do Direito Internacional no âmbito dos Direitos Humanos, reduzindo-se as possibilidades de aplicação de normas claras e vinculantes do âmbito internacional no direito pátrio.  Nesse sentido, importa lembrar que a Emenda nº 45, de 8 de dezembro de 2004, trouxe substanciais mudanças, permitindo a aplicação dos Tratados e Convenções sobre os Direitos Humanos, que poderia ser considerada no desenvolvimento deste trabalho referente à culpabilidade pela vulnerabilidade como limite da pena.

3.1. A coculpabilidade

 A hipótese deste trabalho reside exatamente na constatação de que entre a redação do dispositivo originário do artigo 42[19] do Código Penal de 1940 (criado pelo Decreto-Lei nº 2.848, de  7 de dezembro de 1940) e a outra Lei nº 7.209, de 11 de julho de 1984, que modificou o Código Penal, no artigo 59,[20] ambas editadas em períodos autoritários, mesmo nessas circunstâncias, ocorreu uma evolução na legislação penal, já que o princípio da culpabilidade como medida da pena veio a sofrer uma profunda alteração, porquanto, explicitamente, na fixação da pena; o legislador determinou que o juiz devesse examinar em primeiro lugar a culpabilidade do criminalizado, ou seja, valorar a pessoa objeto de sanção penal e o seu ato, o que implica que todos os outros elementos indicadores para determinação da pena sejam apreciados posteriormente ou em torno desse fator determinante.

Por outro lado, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei no 3.473, apresentado em 18 de agosto de 2000, que pretende revolucionar a parte geral do atual Código Penal, no seu artigo 59,[21] para incluir a responsabilidade geral do Estado dentre as circunstâncias judiciais a serem apreciadas pelo magistrado, no momento de examinar a aplicação da pena, vislumbrando-se a participação do Estado, enquanto promotor de Políticas Públicas, ao estabelecer, assim, uma coculpablilidade, o que provoca uma reflexão sobre o papel do próprio Estado.

Nessa perspectiva examinada, ao aplicar a sanção penal ao autor de um delito, o juiz deverá verificar, sob o prisma de compreensão adotado em nosso trabalho, as condições de subalternização, marginalização e exclusão do agente, em virtude de fatores como a não integração ao mercado de trabalho, o baixo nível de escolaridade, a deficiente socialização familiar, a ausência de oportunidade de emprego, viabilizando uma menor medida da pena, por corresponder a um grau inferior de culpabilidade, diante da precária ação do Estado. Também poderá examinar quais as oportunidades a ele oferecidas, a fim de averiguar o âmbito de sua autodeterminação, sentando no banco dos réus, ao lado dele, a própria sociedade na qual vive e que influi em seu comportamento. Tal circunstância, denominada coculpabilidade do Estado, introduz as oportunidades sociais oferecidas ao agente para fixação da pena.

Ressalte-se que na América do Sul, Argentina, México, Peru, Bolívia, Colômbia, Equador e Paraguai se reconhece que a condição econômica do agente é critério para a mensuração da pena. Nesses países, a coculpabilidade está prevista na legislação penal e o tema encontra-se regulado no Código Penal colombiano (artigo 56), argentino (artigo 41,2), equatoriano (artigo 29. 11º específico para os crimes patrimoniais) e o peruano (artigo 45, I). A Bolívia prevê a coculpabilidade no Código Penal como circunstância judicial para aferir a personalidade do autor como atenuante, quando o agente pratica o fato impulsionado pela miséria. Na Colômbia, a coculpabilidade é prevista como circunstância que pode até mesmo excluir a responsabilidade do agente. O Código Penal paraguaio prevê que o juiz tem de analisar as condições pessoais e econômicas do agente antes de arbitrar a pena.

Dessa forma, por essa teoria, o Estado deve assumir sua parcela de culpa no delito, pois foi o causador da marginalização do cidadão, na medida em que não cumpriu com sua obrigação constitucional. Em uma sociedade altamente desigual, estratificada e segregada em classes como a brasileira, por exemplo, onde, apesar do programa político-social enunciado na Constituição (que traz como direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia e o lazer, dentre outros), os mais pobres muitas vezes não têm sequer acesso a escola, assistência médica e oportunidade de emprego. Logo, as possibilidades de cometer crimes, em especial os patrimoniais, são disseminadas de maneira desigual na população. Como bem argumentam Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli[22]:

Todo sujeito age numa circunstância determinada e com um âmbito de autodeterminação também determinado. Em sua própria personalidade há uma contribuição para esse âmbito de autodeterminação, posto que a sociedade – por melhor organizada que seja – nunca tem a possibilidade de brindar a todos os homens com as mesmas oportunidades. Em consequência, há sujeitos que têm um menor âmbito de autodeterminação, condicionado desta maneira por causas sociais. Não será possível atribuir estas causas sociais ao sujeito e sobrecarregá-lo com elas no momento da reprovação de culpabilidade. Costuma-se dizer que há, aqui, uma “coculpablilidade”, com a qual a própria sociedade deve arcar. Tem-se afirmado que este conceito de coculpablilidade é uma ideia introduzida pelo direito penal socialista. Cremos que a coculpablilidade é herdeira do pensamento de Marat e, hoje, faz parte da ordem jurídica de todo Estado Social de Direito, que reconhece direitos econômicos e sociais, e, portanto, tem cabimento no Código Penal mediante a disposição genérica do art. 66.

Salvo exceções pontuais, a considerar os posicionamentos dominantes dos tribunais brasileiros ao abordarem o tema coculpabilidade do Estado, as decisões simplesmente mencionam a ausência de comprovação, por parte do interessado, de que os requisitos para a aplicação da teoria estejam presentes, impossibilitando-se, até mesmo, a aplicação da teoria da coculpabilidade enquanto atenuante genérica prevista no art. 66 do Código Penal.

 Modernamente, por causa das diferenças entre os seres humanos e as circunstâncias da vida de cada um diante das constantes transformações sociais, além da constatação das diferentes formas de criminalidade de natureza comum e da absorção jurídica dos crimes de natureza complexa, passou-se a entender que o delito apresenta-se em todos os estratos sociais, ao superar o etiologismo positivista criminológico (que tem por objeto o exercício arbitrário do poder punitivo sobre aqueles que se enquadram no estereótipo criminal)[23].

Muitos criticam a teoria em comento, afirmando que não se pode atribuir essa responsabilidade unicamente ao Estado ou à sociedade pela pobreza, bem como é falsa a afirmação de que a pobreza ocasiona automaticamente crimes (não há uma ligação direta e automática entre esses fatores), Nesse sentido, Zaffaroni[24] assevera:

 A coculpablilidade (Mit-Schuld) é insuficiente porque: (a) em princípio invoca o preconceito de que a pobreza é a causa de todos os delitos; (b) em segundo lugar, ainda corrigindo esse preconceito, habilitaria mais poder punitivo para as classes hegemônicas e menos para as subalternas, o que pode conduzir a um direito penal classista em dois tempos; (c) o terceiro ponto é que seja abastado ou pobre o selecionado, sempre o será com bastante arbitrariedade, com o qual esta tese não logra fazer cargo da seletividade estrutural do poder punitivo.

Em razão das críticas, a teoria da coculpabilidade não foi adiante. No entanto, o senso crítico voltado para a constatação da desigualdade social, aliada à análise da criminalização dirigida à realidade do sistema penal latino-americano, além disso, ao buscar-se viabilizar maior proteção àqueles que estão em condições vulneráveis, tanto pela sua condição social quanto pelas suas insuficiências caracterizadoras nas legislações referentes às ações afirmativas, deu origem a outra teoria bem elaborada, permitindo que a proposta da coculpablilidade pudesse, assim, evoluir além do estudo apresentado sobre a criminalidade.

 

3.2. A vulnerabilidade e a culpabilidade

 

A criminologia e a sociologia desenvolveram uma ampla e vasta discussão sobre o estado de vulnerabilidade do agente. No âmbito penal, o tema ganhou destaque com o pensamento de Eugenio Raúl Zaffaroni[25], que estuda a situação de vulnerabilidade como um elemento regulador da aplicação da culpabilidade na fixação da pena, o que minimiza a severidade da sanção penal e, ainda, em casos extremos, poderia excluir o crime. Essa matéria tem sido discutida teoricamente em comissões do parlamento, institutos de juristas e sociólogos especializados em criminologia, inclusive nas universidades, e, todavia, apesar de não ter obtido ainda status de Projeto de lei ou como projeto de Política Pública no fundamento legislativo na fixação da pena, tem influído em sucessivos abrandamentos de decisões judiciais.

Nesse sentido, a vulnerabilidade do agente pode ser considerada pelo juiz na avaliação da culpabilidade para aferir o grau de esforço pessoal empreendido de cada um dos sujeitos para alcançar a concreta situação. A vulnerabilidade tem sido considerada, teoricamente, um fator seletivo e de comprovação de que o sistema penal seleciona o agente criminoso, levando em consideração o contexto no qual o acusado está inserido dentro da sociedade e não tão-somente a sua autodeterminação que levou a praticar o delito. Ela busca a igualdade substancial entre os cidadãos, ante a característica marcante da seletividade em nosso sistema punitivo. Dessa forma, sob o prisma do princípio da igualdade, pelo qual os desiguais devem ser tratados na medida de suas desigualdades, o sistema penal precisa levar em consideração o contexto em que se deu a prática delitiva, a fim de promover uma verdadeira e correta individualização da pena.[26]

O estado de vulnerabilidade é composto pelos parâmetros alusivos à classe social do sujeito, sua posição nas relações sociais de produção, como escolaridade, profissão, residência, além da sua posição numa hierarquia social, conforme a etnia, religião e opção sexual, de forma que esses dados referenciais possam servir de aplicação a um estereótipo criminal. Por essas razões, seria possível afirmar que, entre pessoas de classe social elevada e próxima do poder, o risco de criminalização seria pequeno, não em função da sua vulnerabilidade, mas devido à sua força aquisitiva. Isso significa que o princípio da vulnerabilidade mais se aproxima das expectativas das camadas sociais de baixa renda e distante do poder ou em função de suas deficiências ou insuficiências, que a legislação brasileira vem explorando nas ações afirmativas depois de sua adesão aos Tratados Internacionais.

Nos países latino-americanos, em que se constata uma crescente polarização da riqueza, a maioria da população encontra-se em estado de vulnerabilidade ante o poder punitivo, embora o mero status ou estado de vulnerabilidade não determine a criminalização. Não se seleciona uma pessoa por seu puro estado de vulnerabilidade, senão porque esta se encontra em uma situação concreta de vulnerabilidade. Partindo dessa premissa, no estado de vulnerabilidade é que se deve constatar um esforço pessoal do agente para alcançar a situação concreta na qual se materializa a periculosidade do poder punitivo[27].

O estado de vulnerabilidade diz respeito a um dado genérico sobre o sujeito, com base nas suas condições concretas de vida, levando em conta aspectos sociais, de renda, de poder, de moradia, de trabalho, de instrução formal, etc. A princípio, o estado de vulnerabilidade não criminaliza ninguém, pois esse estado permanece latente enquanto não se manifesta o crime. Assim, o estado de vulnerabilidade não determina o crime. Ao contrário, a situação de vulnerabilidade em relação ao poder criminalizante, corresponde a um conceito aferido no caso concreto e específico, que varia conforme as circunstâncias. Em outras palavras, a situação concreta de vulnerabilidade proporcionada pelo ilícito é que possibilita a seleção criminalizante, ou seja, a posição concreta de risco criminalizante em que a pessoa se coloca. É, portanto, a situação fática capaz de gerar a incriminação e punição do agente pelas agências de repressão (juízes, promotores, polícia).

Em síntese: a seleção criminalizante dá-se geralmente em detrimento dos seguintes tipos de pessoas – ao selecionar alguém estereotipado que comete crime grosseiro; ou é alguém fora do estereótipo que comete crime extravagante; ou é alguém que foi escolhido como “bode expiatório” ou como “laranja” nos crimes de colarinho branco. Dessa forma, podemos exemplificar: se um servente de uma empresa subtrair uma impressora, como se trata de uma pessoa mais vulnerável, facilmente será incriminada. Já se for um diretor da mesma empresa que venha a desviar o valor da impressora em seu próprio proveito, será quase impossível sua incriminação. Entretanto, esse diretor, em razão do seu baixíssimo estado de vulnerabilidade, para chegar a uma situação concreta de vulnerabilidade incriminadora, deverá fazer um esforço enorme com desvio de milhões de reais, ou ainda perder uma disputa de poder (alguém que conhece o esquema internamente o delatar) para que chegue a uma situação de vulnerabilidade e seja punido, pois, se isso não ocorrer, dificilmente será investigado, incriminado e punido. Nessa comparação, a culpabilidade do servente deverá ser considerada menor do que a culpabilidade do diretor, visto que esse fez um esforço enorme para que sua conduta fosse percebida e punida. Já relativamente à aferição da punição do servente, que fez um esforço mínimo para se colocar na situação criminalizante, a teoria sustenta que a culpabilidade do fato seja atenuada, podendo até ser excluída.

Na jurisprudência dos tribunais brasileiros, o princípio da culpabilidade pela vulnerabilidade é raramente reconhecido e, quando o é, não há padronização sobre como tal norma jurídica irá funcionar para diminuir a pena do acusado. Entretanto, recentemente, o Juiz da 12º Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Distrito Federal absolveu um acusado, denunciado por tráfico internacional de drogas, havendo em sua bagagem 5,780kg (cinco quilos, setecentos e oitenta gramas) de cocaína com destino a Portugal, ao admitir que o estado de vulnerabilidade emocional, psicológico e financeiro propiciou a prática do delito, afastando a sua culpabilidade, diante de suas circunstâncias pessoais e familiares, reconhecendo não ser exigível atuar de modo diverso [28].

Ressalte-se que a culpabilidade pela vulnerabilidade somente pode reduzir a culpabilidade pelo ato, sendo esse seu limite, mesmo que haja um enorme esforço do agente em baixo estado de vulnerabilidade para se colocar em uma situação de vulnerabilidade concreta. Assim, a culpabilidade por vulnerabilidade cumpre apenas um papel redutor do poder punitivo, e a sua aplicação no Brasil como fator de redução da culpabilidade seria essencial para ajustar o Direito Penal à realidade, para garantir a igualdade material em nosso sistema punitivo.

Finalmente, a questão a ser investigada é a quem serve o princípio da culpabilidade pela vulnerabilidade. A jurisprudência, de forma majoritária, afasta tal teoria, alegando, para tanto, que a essa se alinha uma espécie de preconceito ao reconhecer o crime como ato praticado pelo “desfavorecido economicamente”. No entanto, a teoria da vulnerabilidade como um todo não se aplica tão-somente àquele desprivilegiado economicamente, mas também a quem não teve boas condições familiares, instrução ou educação ou, ainda, em virtude de circunstâncias existenciais, não teve alguém que “olhasse” por ele.

Não há como manter-se indiferente perante o escândalo político que se exprime no fenômeno da seletividade discriminatória que está presente concretamente no sistema penal, visivelmente nas sociedades de classes. Portanto, em circunstâncias especiais essa teoria deve atender as classes sociais mais pobres ou aqueles que, por questões existenciais e diferenciais, sejam levados a Juízo, não cabendo examinar a questão da vulnerabilidade daqueles que não padeçam de insuficiências sociais e existenciais, mesmo que incorram em idênticos ou maiores injustos diante da inevitável criminalização pela seletividade estrutural; no entanto, cabe reconhecer que as circunstâncias podem favorecer uma flexibilização penal. O princípio da vulnerabilidade é um pressuposto da fragilidade humana, de seu poder e força, mas na nossa leitura esse princípio poderia ser extensível a casos em que o delito não se restringe ao drama existencial do agente, mas também envolve a fragilidade da sua posição social e muitas vezes étnica. A culpabilidade do agente criminoso, sob a perspectiva da vulnerabilidade, é a forma possível de se viabilizarem subsídios para fundamento legislativo de reformulação do Código Penal, no dispositivo que trata da fixação da pena.

  1. CONCLUSÃO

Pode-se, portanto, concluir que a nossa sociedade é estratificada e por esse fato o Direito Penal atinge diretamente os que estão marginalizados. Nesse sentido, a teoria da vulnerabilidade apresenta-se como uma forma de promover igualdade entre os cidadãos quando há ocorrência da prática delitiva. Citamos no decorrer do trabalho que a jurisprudência em nossos tribunais infelizmente não aplica esse instituto, sob a alegação de que o estado de vulnerabilidade não justifica a prática de crimes. Por esse ângulo, urge a necessidade de que se tenha um novo enfoque da análise do artigo 59 do Código Penal a fim de amoldá-lo à realidade brasileira, evitando a violação do Estado Democrático de Direito.

A problemática focalizada em nosso trabalho reside em que no Brasil as Políticas Públicas nem sempre alcançam o Poder Judiciário no exato momento em que se dá a relação entre o agente que praticou um crime e o Juiz quando da determinação da sua pena. Leis dispersas regulam genericamente situações protetivas, principalmente nos dias de hoje, mas qualquer uma delas, mesmo viabilizando a proteção de pessoas portadoras de deficiência, seja por razões naturais ou sociais, não é avaliada pelo Juiz levando em conta as condições de vulnerabilidade e, muito menos, tomando como referência essa circunstância (vulnerabilidade) como uma variável determinante da culpabilidade e pena consequente.

Diante disso, identificamos essas situações na linha do tempo histórico, seja nos períodos autoritários ou democráticos e nas dimensões circunstanciais da atualidade, que poderá evoluir no sentido de se adotar o princípio da vulnerabilidade a ser considerado pelo juiz na avaliação da culpa dos agentes criminalizados, na determinação do quantum da sanção penal, ao aferir o grau de esforço pessoal empreendido por cada um deles, tomando em consideração o contexto no qual o acusado está inserido dentro da sociedade e tão-somente a sua autodeterminação que o induziu a praticar o delito. A vulnerabilidade busca a igualdade substancial entre os cidadãos, ante a característica marcante da seletividade em nosso sistema punitivo. Dessa forma, sob o prisma do princípio da igualdade, pelo qual os desiguais devem ser tratados na medida de suas desigualdades, o sistema penal precisa levar em consideração o contexto em que se deu a prática delitiva, a fim de promover uma verdadeira e correta individualização da pena.

A culpabilidade por vulnerabilidade surge como medida de redução do poder punitivo penal, servindo como nível máximo da violência aceitável. Trata-se de uma teoria que objetiva conter as sanções, devendo sempre reduzir o limite da clássica culpabilidade pelo injusto. Por isso, é preciso esclarecer, dada a visão redutora do Direito Penal, que esta culpabilidade jamais será mais rigorosa do que a aplicação clássica, não sendo verdadeiro o receio de que os detentores do poder serão mais visados pelo Direito Penal.

Sabe-se, por outro lado, que boa parte da criminalidade que atinge uma sociedade tem suas raízes nos conflitos, que ocorrem no seio dessa mesma sociedade. São situações de carência quanto às necessidades fundamentais, desigualdades enormes, disparidades sociais imensas. Uma política social efetiva e contundente converte-se, assim, com certeza, no melhor instrumento preventivo da criminalidade, já que incide diretamente sobre as causas fundantes dos problemas dos quais o crime é uma consequência. Programas de prevenção primária podem constituir genuína e autêntica prevenção, que assegure a todos os seus membros um acesso efetivo a cotas satisfatórias de bem-estar e qualidade de vida, em seus mais diversos âmbitos, reduzindo correlativamente suas conflitividades e as suas taxas de delinquência.

O principal fator determinante da criminalidade tradicional no Brasil tem sua origem no abismo social que afasta os indivíduos das classes e estratos mais oprimidos econômica e socialmente do projeto de bem-estar presente no texto constitucional. Cabe ao Estado promover alternativas eficazes e consistentes no oferecimento de oportunidades de bem-estar social aos que vivem sob tais condições. Portanto, há a necessidade de reconectar definitivamente a questão criminal – e as possibilidades efetivas de enfrentamento do fenômeno – com a questão social, premissa que foi esquecida pela dogmática, ao privilegiar um purismo metodológico orientado a uma assepsia científica do Direito Penal. O grave em tudo isso é que variados outros ramos do conhecimento da área das Ciências Sociais – a sociologia, a ciência política, a psicologia, dentre outros – diferentemente da maior parte da dogmática penal, têm presente, de forma clara e precisa, essa ligação no centro de suas construções teóricas.

Nessa perspectiva, uma aplicação dos postulados da tradição liberal-iluminista, no contexto de um Estado Democrático de Direito, ainda mais quando se fala de um país emergente como o Brasil, constitui-se em um paradoxo, uma vez que, ao propugnar uma diminuição do Estado, está a defenestrar toda e qualquer possibilidade de realização de Políticas Públicas, instrumentos adequados para o enfrentamento das causas da maior parte da criminalidade contemporânea.

Contudo, ao examinar a Constituição Federal pela existência de reflexos iluministas, é visível reconhecer os postulados pela liberdade, igualdade, fraternidade, justiça e humanidade. No que concerne à igualdade, do ponto de vista jurídico atual, que possui respaldo no ideal aristotélico, deve-se tratar desigualmente os desiguais, na medida em que se desigualam. Ao reconhecer a culpabilidade pela vulnerabilidade, o Estado estaria efetivando essa igualdade material, pois pressupõe situações de discrepâncias, a exemplo das socioeconômicas, e outras que dizem respeito à fragilidade humana entre os homens que poderiam cometer o injusto penal. Dessa maneira, conclui-se que o princípio da culpabilidade pela vulnerabilidade também encontra amparo, mesmo que implicitamente, na Magna Carta.

Conforme já analisado, a culpabilidade pela vulnerabilidade está inserida de forma implícita no ordenamento jurídico brasileiro, porém deve ser efetivado partindo-se dos mesmos pressupostos em relação à aplicação dos outros princípios existentes, posto que nada seria mais justo do que proteger aquele indivíduo tratado de forma desigual perante a sociedade, contrariando o dispositivo legal do artigo  da Constituição Federal.

Assim, o caminho inexorável é a concretização de um projeto constitucionalizado de cidadania da população que se encontra mais vulnerável economicamente e, portanto, mais próxima do cometimento das condutas delituosas. O instrumento adequado para alcançar esse fim é a efetivação de políticas públicas voltadas à concretização de direitos sociais como a educação, o trabalho, a seguridade social, a saúde, o lazer, a cultura, uma habitação digna, um salário que suporte as demandas familiares, enfim, uma série de carências que, uma vez atendidas, irão possibilitar a redução de grande parte da criminalidade que hoje ocorre.

  REFERÊNCIAS

BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal: introdução à sociologia do direito penal. Tradução de Juarez Cirino dos Santos. 2. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1999.

BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 1990.

___________.  Cem anos de reprovação: uma contribuição transdisciplinar para a crise da culpabilidade. Rio de Janeiro: Revan, 2011.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes; MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constituição da República portuguesa anotada. Coimbra: Coimbra, 1984.

DIAS, Jorge de Figueiredo. Liberdade, culpa, direito penal. 3. ed. Coimbra: Coimbra, 1995.

FERRAJOLI, Luigi. Jurisdição e democracia. Revista do Ministério Público.Lisboa. v. 72, out./dez. 1997. p…

____________. O direito como sistema de garantias. Revista do Ministério Público, Lisboa, v. 61, jan./mar. 1995. p….

MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. Coimbra:Coimbra, 1985. v.2.

MIR PUIG, Santiago. Derecho penal: parte general. Barcelona: PPU, 1985.

____________. El derecho penal en el Estado social democrático de derecho. Barcelona: Ariel, 1994.

MUÑOZ CONDE, Francisco. Direito penal e controle social. Tradução de Cíntia Toledo Miranda Chaves. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

PIERANGELI, José Henrique. Escritos jurídico-penais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

PINTO, Paulo Mota. O direito ao livre desenvolvimento da personalidade. Coimbra: Coimbra, 1999.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Tratado de derecho penal: parte general. Buenos Aires: Ediar, 1987. t.1.

___________. Em busca das penas perdidas. Tradução de Vânia Romano Pedrosa e AmirLopes da Conceição. Rio de Janeiro: Revan, 1991.

___________. Medidas penales en derecho penal contemporaneo: teoría, legislación positiva y realización práctica. Buenos Aires: Hammurabi, s.d.

___________. Culpabilidade por vulnerabilidade. Discursos Sediciosos, Rio de Janeiro, Revan, ano 9, n. 14. Rio de Janeiro: Revan, jan./dez, 2004, p. 31-48.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl; BATISTA; Nilo, ALAGIA, Alejandro; SLOKAR, Alejandro. Direito penal brasileiro. 1.ed., Rio de Janeiro: Revan, v.2, t.2, 2017.

Notas de Rodapé:

[1] Advogada Criminal. Coordenadora da Revista Digital do Instituto dos Advogados Brasileiros. Doutoranda em Políticas Públicas e Formação Humana pela UERJ. Mestre em Ciências Penais pela Faculdade de Direito da Universidade Candido Mendes, Rio de Janeiro. Especialista em Direito Penal Econômico Europeu pela Universidade de Coimbra, Portugal/IBCCRIM. Professora do Curso de Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal da Universidade Candido Mendes. Diretora do Instituto dos Advogados Brasileiros. Membro do Conselho Superior do Instituto dos Advogados Brasileiros. Ex-Vice-Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros. Ex-Conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Rio de Janeiro. Site: www.tavaresassociados.adv.br/Contato:[email protected]/

[2] MUÑOZ CONDE, Francisco. Direito penal e controle social. Tradução de Cíntia Toledo Miranda Chaves. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 33.

[3] El derecho penal en el Estado social democrático de derecho. Barcelona: Ariel, 1994. p. 37.

[4] CANOTILHO, José Joaquim Gomes; MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constituição da República portuguesa anotada. Coimbra: Coimbra, 1984. p. 168.

[5] Segundo o conceito adequado de Canotilho: “Constituição é uma ordenação sistemática e racional da comunidade política, plasmada num documento escrito, mediante o qual se garantem os direitos fundamentais e se organiza, de acordo com o princípio da divisão de poderes, o poder político”.

[6] Vide ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Tratado de derecho penal: parte general. Buenos Aires: Ediar, 1987. t. I, p. 183 e segs.

[7] LOPES, Maurício Antonio Ribeiro. Teoria constitucional do direito penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 381.

8 Fundamentos da Constituição. Coimbra: Almedina, 1991, p. 116.

[9] PINTO, Paulo Mota. O direito ao livre desenvolvimento da personalidade, Coimbra: Coimbra, 1999. p. 151.

[10] Idem, p. 152.

[11] Cf. PIERANGELI, J. H. Escritos jurídico-penais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 229.

[12] ZAFFARONI, R. E. Medidas penales en derecho penal contemporáneo: teoría, legislación positiva y realización práctica. Buenos Aires: Hammurabi, s.d., p. 29.

[13] ZAFFARONI, R. E. Em busca das penas perdidas. Tradução de Vânia Romano Pedrosa e Amir Lopes da Conceição. Rio de Janeiro: Revan, 1991. p. 259.

[14] Idem, p. 261.

[15] FERRAJOLI, Luigi. Jurisdição e democracia. Revista do Ministério Público. Lisboa. v. 72. out./dez, 1997. p. 14.

[16] Grifos do autor. O direito como sistema de garantias. Revista do Ministério Público. Lisboa, v. 61, jan./mar. 1995. p. 40.

[17] Vide FERRAJOLI, Luigi. Jurisdição e democracia. Revista do Ministério Público. Lisboa. v. 72. out./dez., 1997, p. 19.

[18] MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. Coimbra: Coimbra, 1985. v. 2, p.598.

[19] “Compete o Juiz, atendendo aos antecedentes e à personalidade do agente, à intensidade do dolo ou grau de culpa, aos motivos, às circunstâncias do crime: I – determinar a pena aplicável dentre as cominadas alternativamente; II – fixar, dentre dos limites, a quantidade da pena aplicável”.

[20] “Compete ao Juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime…”

[21] “O juiz, atendendo à culpabilidade, antecedentes, reincidência e condições pessoais do acusado, bem como as oportunidades sociais a ele oferecidas, aos motivos, circunstâncias e consequências do crime e ao comportamento da vitima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente à individualização da pena…” (BRASIL, SenadoProjeto de lei do Senado PLS nº. 3.473 de 18 de agosto de 2000. Altera a Parte Geral do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.camara.gov.br>. Acesso em: 15 mar 2018.

[22] ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 529.

[23] Os termos “estigma”, “etiquetamento”, “estereótipos criminosos”, constituem a chamada teoria do etiquetamento, também conhecida como “labelling approach”, bem defendida por Becker em seu livro Outsiders, que é enquadrada como a “desviação”, ou seja, uma qualidade atribuída por processos de interação altamente seletivos e discriminatórios. Tem esta teoria como objeto os processos de criminalização, ou seja, os critérios utilizados pelo sistema penal no exercício do controle social para definir o desviado como tal (BECKER, Howard S. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. São Paulo: Zahar. 2008).

[24] ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Culpabilidade por vulnerabilidade. Discursos Sediciosos, Rio de Janeiro, ano 9, n. 14, Revan, jan./dez, 2004, p. 31-48.

[25] ZAFFARONI, Eugenio Raúl; BATISTA, Nilo; ALAGIA, Alejandro; SLOKAR, Alejandro. Direito Penal Brasileiro. 1.ed., Rio de Janeiro: Revan, 2017. v.2, t.2, p. 169-172.

[26] Idem, ibidem.

[27] Idem, ibidem.

[28] Data da decisão: 20/07/2018. Procedimento nº 1009383-72.2018.4.01.3400, acusado Luis Alberto Castro Benites, preso no Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, por tráfico internacional de drogas, ao embarcar para Portugal, levando em sua bagagem 5,780kg (cinco quilos, setecentos e oitenta gramas) de cocaína.

Palavras Chaves

Direito Penal Garantista. Justiça Criminal. Culpabilidade pela Vulnerabilidade.