QUEERMUSEU: A Atuação Judicial na efetivação de Direitos Fundamentais por meio da arte

Resumo

Este trabalho se insere em um contexto de produção acadêmica essencial dentro do quadro jurídico-político brasileiro atual: demarcado por censuras. Problematizando a repressão e a normatização dos corpos, a exposição Queermuseu resistiu às recorrentes tentativas de recriminá-la e de colocá-la fora das instituições voltadas à promoção da Arte. É sobre essa resistência, considerando a atuação do Judiciário, que este artigo trata. Analisamos primeiramente os rumos da exposição, desde sua recriminação inicial pelos setores conservadores, até a negociação no âmbito do Inquérito Civil. Chegamos posteriormente ao processo judicial em que a atuação do Poder Judiciário foi essencial à efetivação de Direitos Fundamentais. Cada traço pintado, visto de dentro do lugar dos sujeitos queer, se comunica com a liberdade de expressão artística. Por existir e poder ter sido vista, a arte queer demonstra que sensibiliza, por meio de cada uma das obras da exposição, o direito à memória, a relutância dos direitos das minorias e o grito contra a censura. Direitos estes protegidos constitucionalmente e que merecem ser estudados, ainda mais quando consideramos o atual cenário caracterizado pelas recorrentes tentativas de cercear a liberdade de expressão.

Artigo

QUEERMUSEU: A ATUAÇÃO JUDICIAL NA EFETIVAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS POR MEIO DA ARTE

Alexandre Dantas1 Maria Gabriela Fontoura2

Resumo

Este trabalho se insere em um contexto de produção acadêmica essencial dentro do quadro jurídico-político brasileiro atual: demarcado por censuras. Problematizando a repressão e a normatização dos corpos, a exposição Queermuseu resistiu às recorrentes tentativas de recriminá-la e de colocá-la fora das instituições voltadas à promoção da Arte. É sobre essa resistência, considerando a atuação do Judiciário, que este artigo trata. Analisamos primeiramente os rumos da exposição, desde sua recriminação inicial pelos setores conservadores, até a negociação no âmbito do Inquérito Civil. Chegamos posteriormente ao processo judicial em que a atuação do Poder Judiciário foi essencial à efetivação de Direitos Fundamentais. Cada traço pintado, visto de dentro do lugar dos sujeitos queer, se comunica com a liberdade de expressão artística. Por existir e poder ter sido vista, a arte queer demonstra que sensibiliza, por meio de cada uma das obras da exposição, o direito à memória, a relutância dos direitos das minorias e o grito contra a censura. Direitos estes protegidos constitucionalmente e que merecem ser estudados, ainda mais quando consideramos o atual cenário caracterizado pelas recorrentes tentativas de cercear a liberdade de expressão.

Palavras-Chave: Queermuseu, Direitos Fundamentais; Poder Judiciário; Direito e Arte; Liberdade de expressão.

1.   INTRODUÇÃO

 Este artigo objetiva contribuir para o avanço na efetivação de direitos e garantias de minorias, na medida em que adota como foco de análise a exposição Queermuseu – Cartografias da diferença na arte brasileira, que sofreu diversos processos de censura até ser exposta na Escola de Artes Visuais do Parque Lage (“EAV”). Investiga-se em que medida a efetivação de Direitos Fundamentais é observada diante da plena exibição da exposição, muito possibilitada pela a atuação do Judiciário, que reforçou seu papel enfático em prol da liberdade de expressão artística.

1 Graduado em Direito pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (“UFRJ”). Cursa pós-graduação lato sensu em Arte e Filosofia na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (“PUC- Rio”). Foi pesquisador vinculado ao Laboratório de Direitos Humanos da UFRJ por meio da linha de pesquisa sociedade, Direitos Humanos e Arte. Advogado.
2 Graduada em Direito pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (“UFRJ”). Cursa pós-graduação lato sensu em Direito Processual Civil na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (“PUC-Rio”). Advogada.

Primeiramente, serão explicitados os contornos nos quais a Queermuseu se deu, de forma a tratar do seu conteúdo e de todas as tentativas de censura que a mostra sofreu por trazer às instituições de Arte o que não dialoga com as camadas conservadoras da sociedade brasileira. Os processos de censura são estudados e indicados, desde a exibição no Santander Cultural; passando pela atuação do Legislativo de tentar impedir de todas as formas a Queermuseu e o Inquérito Civil instaurado em decorrência disso; até chegar ao processo judicial, ajuizado com o objetivo de censurar mais uma vez a mostra na EAV.

Adiante, o trabalho é delimitado dentro de alguns conceitos teóricos chave, dentre eles a teoria queer, a judicialização dos Direitos Fundamentais e a teoria dos sistemas. Tais conceitos serão desenvolvidos na medida em que se comprova que a Queermuseu contribuiu para a efetivação de Direitos Fundamentais, dentro da salvaguarda da liberdade de expressão artística possibilitada pelo Judiciário.

Em termos práticos, a exposição Queermuseu e os processos de censura que se desenvolveram em seu entorno são a delimitação fática do que se pretende estudar, ao passo em que se entende como a Arte e o Direito podem comunicar-se, a fim de efetivar Direitos Fundamentais de minorias.

A importância da temática posta se revela na medida que o processo político e social brasileiro está em constante retroação no que diz respeito à efetivação de Direitos Fundamentais de minorias e na valorização da liberdade de expressão artística. Pôr o tema em debate, a fim de valorizar as formas e os meios de expressão daqueles normalmente privados das instituições da Arte, pode gerar efeito concreto na valorização de Direitos Fundamentais, que possuem importância central em qualquer tema que se analise no pós-Constituição Federal de 1988 (“Constituição”).

2.   QUEERMUSEU: CARTOGRAFIAS DA DIFERENÇA NA ARTE BRASILEIRA

  • A repressão: do fechamento em Porto Alegre ao Inquérito Civil no Ministério Público do Rio de Janeiro

A Queermuseu é uma mostra de artes plásticas – possuindo pinturas, desenhos e esculturas – que objetiva transgredir3 o lugar comum. Tematiza a diversidade e a expressão da identidade de gênero na arte brasileira, sendo considerada a primeira exposição com abordagem exclusivamente queer4 no Brasil5. A exposição sofreu diversas tentativas de censura6 e foi, por fim, exibida na EAV de agosto a setembro de 20187. A sua função, desde o início, foi discutir e trazer a diferença8 às instituições voltadas à promoção da Arte.

Para além de seu aspecto simbólico, a exposição busca explorar, a partir de diversas obras produzidas desde meados do Século XX, a expressão, a identidade de gênero e a diferença na arte brasileira. Trata-se de mostra que reúne diversidade estética, geográfica e geracional em 264 (duzentos e sessenta e quatro) obras de 85 (oitenta e cinco) artistas.

O papel da Queermuseu é provocar reflexões. Tal como indicado no Manifesto do Conselho Internacional de Museus9, a concepção e a realização de uma exibição de arte implicam propor novos olhares sobre a sociedade e suas facetas históricas, científicas e culturais. As obras contribuem para esse propósito, ao provocarem reflexões sobre formas de expressão, identidade e diversidade de gênero.

Antes de chegar à sua plena exibição na EAV, a Queermuseu foi inicialmente exposta no Santander Cultural em Porto Alegre. Porém, à medida que se inseria no debate artístico, a

3 FIDELIS, Gaudêncio. O museu do desvio. Queermuseu: cartografias da diferença na arte brasileira. Rio de Janeiro: AMEAV, 2018. 11 p.

4 Ainda que a expressão seja definida e explicitada mais detidamente ao longo do trabalho, vale ressaltar que o termo queer decorre da teoria queer, que estuda as minorias sexuais e de gênero e teve origem nos Estados Unidos por volta da década de 80. (MISKOLCI, Richard. A teoria queer e a sociologia: o desafio de uma analítica da normalização. Sociologias, Porto Alegre, Ano 11, nº 21, jan./jun. 2009, 150 p).

5 FIDELIS, Gaudêncio. Censura e democracia: a Queermuseu mostra uma história de resistência à criminalização da produção artística. Queermuseu: cartografias da diferença na arte brasileira. Rio de Janeiro: AMEAV, 2018. 17 p.

6 Acerca das tentativas de censura sofridas pela exposição cf. FIDELIS, Gaudêncio. Queermuseu e o enfrentamento do fascismo e do fundamentalismo no Brasil em defesa da livre produção de conhecimento. Iluminuras, Porto Alegre, v. 19, n. 46, jan./jul. 2018, 417 – 423 p.

7 Queermuseu no Parque Lage. Disponível em: < http://eavparquelage.rj.gov.br/queermuseu/>. Acesso em: 15 de abril de 2019.

8 “Queermuseu: cartografias da diferença na Arte Brasileira é uma exposição que foi concebida como uma plataforma não heterocêntrica e não heteronormativa que explora conceitualmente, por meio de uma estratégia não tematizante ou ilustrativa, a expressão da identidade de gênero e a diferença na arte brasileira”. (FIDELIS, Gaudêncio. Não heterocentrismo e não heteronormatividade na exposição Queermuseu e seus percursos originais de visitação. Queermuseu: cartografias da diferença na arte brasileira. Rio de Janeiro: AMEAV, 2018. 48 p).

9 ICOM. Manifesto do ICOM Brasil a favor da liberdade de expressão e em respeito à toda forma de diversidade humana.                                          Disponível                           em:                          <                           http://www.icom.org.br/wp- content/uploads/2017/09/Manifesto_do_ICOM_BRASIL_a_favor_da_liberdade_de_expressao_Case_Santander. pdf>. Acesso em: 02 de abril de 2019.

exposição foi fechada10, em razão do crescimento de interpretações propagadas por grupos conversadores relacionando a mostra à pedofilia e zoofilia11. Após poucos dias de exposição, o Santander reteve as obras e cancelou a exibição. De acordo com o curador Gaudêncio Fidelis, tal atitude “executou um grave processo de censura”12.

 Ocorre que, durante esse período, o Ministério Público do Rio Grande do Sul realizou visita à exposição, na qual se constatou a ausência de qualquer apologia à pedofilia ou zoofilia, ou mesmo de violação a interesses de crianças ou adolescentes. Da mesma maneira, a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal no Rio Grande do Sul emitiu a Recomendação PRDC/RS nº 21/201713.

Independentemente do posicionamento dos órgãos públicos competentes, a exposição não voltou ao Santander Cultural, o que fez o Museu de Arte do Rio (“MAR”) disponibilizar- se para receber a Queermuseu. Como o Município do Rio de Janeiro participa do Conselho Curador do MAR, a exposição foi mais uma vez alvo de acusações e impedida de ser exibida, desta vez no Rio de Janeiro. O Município deixou claro o seu posicionamento, difamando e cesurando a mostra, o que implicou danos ao patrimônio artístico14.

Nesse contexto, alguns deputados federais e estaduais apresentaram moções de repúdio à exposição direcionadas ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (“MPRJ”). Dentre as acusações e pedidos para que a mostra não viesse a público, os deputados afirmavam que a mesma iria “agredir a formação moral, bons costumes e valores familiares da população fluminense”15. O questionamento acerca da normatização dos corpos16 provocado por uma das obras foi entendido por um dos deputados como “apelo evidentemente erótico e com inscrições

10 Acerca do fechamento da exposição e do significado desta censura em se tratando de liberdade de expressão e do papel transgressor da arte contemporânea: RECH, Alessandra; SCHUTZ, Danielle. Episódio Queermuseu: reflexos do despreparo social em torno da Arte. Palíndromo, v. 9, n. 19, set./dez. 2017, 13 – 30 p.

11 FIDELIS, Gaudêncio, op. cit., 20 p.

12 Ibid., 23 p.

13 MORAES, Fabiano de. Recomendação PRDC/RS nº 21/2017. Disponível em: <http://www.mpf.mp.br/rs/sala- de-imprensa/docs/recomendacoes/2017/recomendacao-queermuseu-porto-alegre/view>. Acesso em: 15 de abril de 2019.

14 FIDELIS, Gaudêncio, op. cit., 24 – 25 p.

15 RIO DE JANEIRO. Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Inquérito Civil nº 2017.01062736. Interessada: Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 127 p.

16 SABATINO, Juliana. Nota da cartografia da sociedade de hoje: o caso polêmico da criança viada. Desvio, ed. 4., maio 2018, 108 – 110 p.

inadequadas, como, por exemplo, ‘criança viada e travesti na lambada’”17, como se o fora da norma fosse o estranho e o proibido.

Ao mesmo tempo, o Projeto de Lei nº 3452/2017, que buscava proibir a utilização de imóveis estaduais para realização de exposições e demais performances artísticas que fizessem “apologia à pedofilia, zoofilia, à erotização infantil, ao uso de drogas e ao vilipêndio de símbolos e crenças religiosas”18, começou a tramitar na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. Mais uma clara tentativa, por meio do Legislativo, de censurar a Queermuseu.

O que se observa é a intenção de grupos obscurantistas de impor sua visão de mundo e tutelar os limites da arte, marginalizando a diferença. Nessa estratégia de infantilização da cidadania, instituições públicas que devem promover a cultura são instrumentalizadas para o seu boicote e restrição.

Após esta segunda tentativa de retirar a exposição das instituições artísticas, a EAV, coerente com a sua história19, se prontificou a recepcionar a Queermuseu. Um ato condizente com o passado da Escola e seus objetivos institucionais: estimular e provocar diálogo e reflexões sobre o papel da arte em uma sociedade democrática, plural e livre20.

Em razão da importância da Queermuseu, a EAV celebrou acordo tripartite com a Secretaria de Estado de Cultura e a curadoria da exposição. Após a celebração do acordo – sem qualquer custo para os cofres públicos –, foi realizada uma campanha de financiamento coletivo (“crowdfunding”) para custear a exposição. A sociedade civil motivou e construiu as políticas

17 RIO DE JANEIRO. Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Inquérito Civil nº 2017.01062736. Interessada: Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 55 p.

18 RIO DE JANEIRO. Projeto de Lei nº 3452/2017, de 03 de outubro de 2017. Disponível em: < http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/scpro1519.nsf/1061f759d97a6b24832566ec0018d832/f919358926e42da2832581ae 00502117?OpenDocument&ExpandSection=-1>. Acesso em: 15 de março de 2019.

19 A EAV, desde sua fundação em 1975, tem como propósito servir de espaço para novas concepções estéticas, desafiando desde sempre o academicismo e a manifestação das mais diversas formas de censura. Referida Escola desenvolve suas funções no Parque Lage, imóvel estadual, e abriga artistas e artesões desde sua concepção inicial, desenvolvendo programas de ensino em arte e abrigando eventos de relevo nos cenários artísticos local, nacional e internacional. Já recebeu expressões artísticas como a 1ª Exposição Mundial de Fotografia, a exposição “Como vai você, Geração 80?” e shows de artistas como Caetano Veloso, Cazuza e Chico César, dentre muitos outros. Além disso, serviu de palco para peças e cenário para filmes como “Terra em transe”, “Macunaíma” e “Hamlet”. 20 O projeto. Disponível em: http://www.eavparquelage.rj.gov.br/memoria/o-projeto/>. Acesso em: 24 de abril de 2019.

de cultura que a cercam. O crowdfunding arrecadou R$ 1.081.176,00 (um milhão, oitenta e um mil, cento e setenta e seis reais), sendo o maior já registrado no país21.

À medida em que a exposição se concretizava na EAV, foi instaurado o Inquérito Civil nº 2017.01062736 (“Inquérito Civil”) pelo MPRJ em 19 de fevereiro de 201822, com base nas manifestações apresentadas pelos deputados. Através de diversos ofícios direcionados à EAV, o MPRJ investigou a Queermuseu buscando informações relativas ao seu acontecimento e aos eventos que ocorreram em torno de si23.

Dentre uma das principais questões discutidas no Inquérito Civil estava a classificação etária da exposição. Quando instada a manifestar-se sobre a questão, a EAV afirmou, por meio de seus advogados, que a classificação indicativa prevista pela Portaria nº 368/2014 do Ministério da Justiça24, vigente à época, não se aplica a exposições de arte25.

Dentro da sequência de fatos apontados26, o MPRJ expediu a Recomendação nº 05/2018 em 09 de agosto de 2018 (“Recomendação nº 05/2018”), com o intuito de que a exposição acontecesse sem maiores percalços na EAV27, assinada conjuntamente tanto por uma das promotoras que acompanhou o Inquérito Civil quanto pelo diretor da EAV e seus advogados.

21 SZWARCWALD, Fábio. Queermuseu, Queerescola. Queermuseu: cartografias da diferença na arte brasileira. Rio de Janeiro: AMEAV, 2018. 48 p.

22 RIO DE JANEIRO. Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Inquérito Civil nº 2017.01062736. Interessada: Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 1 p.

23 Paralelamente, foi instaurado um Inquérito Civil diverso para apurar supostas irregularidades junto ao Corpo de Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro no evento “Caetano contra censura”. Tal evento se reinventou como um ato de resistência às tentativas de frear a exibição da Queermuseu ao público, por meio da apresentação de diversos artistas nacionais em um momento político frágil à democracia brasileira: um dia após a morte de Marielle Franco. (RIO DE JANEIRO. Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Inquérito Civil nº 2018.000224075. Interessada: Escola de Artes Visuais do Parque Lage).

24 BRASIL. Portaria nº 368/2014 do Ministério da Justiça, de 11 de fevereiro de 2014. Disponível em: < https://justica.gov.br/seus-direitos/classificacao/legislacao/portaria-mj-368-14.pdf>. Acesso em: 19 de abril de 2019.

25 RIO DE JANEIRO. Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Inquérito Civil nº 2017.01062736. Interessada: Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 1 p.

26 Realidade muito diversa é aquela observada em outros lugares do mundo, em que manifestações artísticas e culturais pela visibilidade do movimento queer ocorreram normalmente sem quaisquer proibições. Em 2017, por exemplo, a exposição Queer British Art 1861-1967, que exibiu pinturas, gravuras, fotos e filmes a respeito de temática equivalente, esteve exposta no museu Tate Britain, em Londres, e não enfrentou quaisquer problemas. (BARLOW, Clare. Presenting the first exhibition dedicated to queer British art. Disponível em:

<https://www.tate.org.uk/whats-on/tate-britain/exhibition/queer-british-art-1861-1967>. Acesso em: 18 de abril de 2019).

27 RIO DE JANEIRO. Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Inquérito Civil nº 2017.01062736. Interessada: Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 476 – 479 p.

De acordo com a Recomendação, o MPRJ: (i) previu a classificação indicativa de 14 (quatorze) anos para acessar a exposição, ainda que entendamos ser desnecessária a obrigação de estipular a classificação indicativa para exposições; e (ii) exigiu a afixação de avisos alertando que a mostra apresentava obras com conteúdo de nudez e sexo, mesmo a Arte expondo o nu sob diferentes perspectivas há séculos. A par das críticas que possam ser feitas, a Recomendação do MPRJ foi importante para garantir o acontecimento da exposição à luz da liberdade de expressão artística.

  • A tentativa do conservadorismo e a contenção do Judiciário

Como dito, após todas as tratativas em âmbito administrativo no MPRJ, que tiveram início com manifestações apresentadas por deputados questionando a mostra, foi expedida a Recomendação nº 05/2018, na qual foi acordada a classificação indicativa de 14 (quatorze) anos para acessar a exposição, garantindo a realização da Queermuseu na EAV.

Não obstante, mais uma vez com o objetivo de censurar a exposição, o Deputado Estadual da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (“ALERJ”) Marcio Henrique Cruz Pacheco, eleito pelo Partido Social Cristão (“PSC”), apresentou pedido de providências28 direcionado à 1ª Vara da Infância, Adolescente e Idoso do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (“TJRJ”) na véspera da data de início da mostra.

O deputado29 do PSC apresentou o referido pedido com o objetivo claro de suspender a “exposição da mostra de arte exposta nos equipamentos públicos do Estado do Rio de Janeiro”, “em especial na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, por ferir normas administrativas e legais de proteção da criança e do adolescente”30.

28 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. 1ª Vara da Infância, Adolescente e Idoso. Ação nº 0195023-46.2018.8.19.0001. Requerente: Marcio Henrique Cruz Pacheco. Requerida: Queermuseu – Cartografias da Diferença na Arte Brasileira e Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 2-14 p.

29 Em sua biografia no site da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro – ALERJ, o deputado afirma que “A vida pública reafirma minha vocação em defesa dos valores cristãos aonde Deus me levar. Sempre a Favor da Vida!”. Além disso, o deputado afirma que tem seu trabalho marcado pela defesa dos “valores da família”. DEPUTADOS/Ficha Completa. Deputado Marcio Pacheco. Assembleia Legislativa do Estado do Rio de       Janeiro.                   Rio                                de                     Janeiro.    Disponível                       em:                          < http://www.alerj.rj.gov.br/Deputados/PerfilDeputado/328?Legislatura=19&AspxAutoDetectCookieSupport=1>. Acesso em: 26 de abril de 2019.

30 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. 1ª Vara da Infância, Adolescente e Idoso. Ação nº 0195023-46.2018.8.19.0001. Requerente: Marcio Henrique Cruz Pacheco. Requerida: Queermuseu – Cartografias da Diferença na Arte Brasileira e Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 3 p.

Em suas razões, para embasar o pedido que visava a suspensão da Queermuseu, o deputado alegou, de forma imprudente, que a exposição “sob o título de arte, vinha em tese, através dos quadros e imagens, fazendo apologia à pedofilia, zoofilia, vilipêndio de símbolos e crenças religiosas e estímulo à erotização infantil” e que, dessa forma, “ultrapassaram os limites legais da liberdade de expressão artística”31. Subsidiariamente, caso o Juízo não entendesse pela suspensão da exposição, o deputado requereu que fosse determinada a classificação proibitiva para menores de 18 (dezoito) anos e que a mostra não fosse realizada em prédio público, mas sim em espaço privado.

Poucas horas após o recebimento do pedido de providências, o Juízo da 1ª Vara da Infância, Adolescente e Idoso proferiu decisão liminar32 que, entre outras providências, determinou a proibição da entrada e permanência de crianças e adolescentes com idade inferior a 14 (quatorze) anos, ainda que acompanhados dos pais ou responsáveis legais, e entre 14 (quatorze) e 15 (quinze) anos desacompanhados na Queermuseu.

Assim, a decisão proferida pelo Juízo teve por resultado prático proibir adolescentes de até 14 (quatorze) anos, mesmo acompanhados de seus responsáveis, de ingressarem em um museu para ver obras de artes plásticas, tais como pinturas e gravuras; mais uma das tentativas de censura. Transformou-se classificação indicativa em proibitiva, em decisão contrária, inclusive, à Recomendação nº 05/2018, expedida pelo MPRJ para o caso.

A EAV, assim que informada da decisão proibitiva e limitadora, interpôs Agravo de Instrumento33 em sede de plantão judiciário visando à reforma da decisão pelo TJRJ para o reestabelecimento da classificação indicativa da exposição, nos exatos termos da Recomendação nº 05/2018 e do Parecer do Ministério da Justiça.

Nas suas razões recursais, a EAV reforçou o entendimento de que a exposição deveria ocorrer sem quaisquer proibições ou censuras, apenas sob a classificação indicativa – de caráter

31 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. 1ª Vara da Infância, Adolescente e Idoso. Ação nº 0195023-46.2018.8.19.0001. Requerente: Marcio Henrique Cruz Pacheco. Requerida: Queermuseu – Cartografias da Diferença na Arte Brasileira e Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 3 p.

32 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. 1ª Vara da Infância, Adolescente e Idoso. Ação nº 0195023-46.2018.8.19.0001. Requerente: Marcio Henrique Cruz Pacheco. Requerida: Queermuseu – Cartografias da Diferença na Arte Brasileira e Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 2-14 p.

33 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. 3ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento nº 0045759-55.2018.8.19.0000. Agravante: Queermuseu – Cartografias da Diferença na Arte Brasileira e Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Agravado: Marcio Henrique Cruz Pacheco. 2-17 p.

informativo – quanto a conteúdos e temas supostamente inadequados para menores de 14 (quatorze) anos.

Nesse mesmo sentido, foi esclarecedora a Nota Técnica nº 11/2017/PFDC/MPF34, do Ministério Público Federal, por meio da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, ao indicar que: (i) exposições artísticas em museus dispensam prévia classificação etária por parte do Poder Público (art. 4º da Portaria 368/2014); (ii) a classificação indicativa tem o mero intuito de indicar e não de proibir (art. 7º da Portaria 368/2014); (iii) por ser indicativa, a classificação etária não possui força vinculante, não cabendo o impedimento ao acesso de crianças ou adolescentes a eventos tidos como impróprios à sua faixa etária (Constituição, art. 21, XVI, c/c. o art. 220, § 3º, inciso I e art. 74 do ECA); e (iv) compete exclusivamente aos pais ou responsáveis decidir sobre o acesso de menores de 18 (dezoito) anos a espetáculos em geral35.

A EAV ainda ponderou que o mais grave no cenário que se desenvolveu é que a decisão proferida pelo Juízo estava em conflito com julgado do Supremo Tribunal Federal, em controle concentrado de constitucionalidade, nos autos da ADI nº 2.404/DF, na qual o Plenário assentou a ratio decidendi de que a classificação indicativa é o ponto de equilíbrio entre liberdade de expressão e a proteção aos interesses dos menores.

34 Assim dispõe a Nota Técnica nº 11/2017/PFDC/MPF: “(…) d) Conteúdos divulgados em sites de Internet e obras literárias ou visuais não veiculadas em televisão não se encontram regulados pelo atual sistema de classificação indicativa. Desta forma, uma apresentação teatral ou uma exposição de esculturas ou pinturas em um museu dispensa qualquer tipo de prévia classificação etária por parte do Poder Público (art. 4º da Portaria 368/2014)”. (…)

  1. A classificação etária, seja a efetuada pelo Poder Público, seja aquela feita pelo próprio responsável pelo espetáculo ou diversão, é meramente INDICATIVA, isto é, possui “natureza pedagógica e informativa capaz de garantir à pessoa e à família conhecimento prévio para escolher diversões e espetáculos públicos adequados à formação de seus filhos, tutelados ou curatelados” (art. 7º da Portaria 368/2014).
  2. Por ser “indicativa”, a classificação etária efetuada pelo Poder Público não possui força vinculante; assim, não cabe ao Estado (nem aos promotores do espetáculo ou diversão) impedir o acesso de crianças ou adolescentes a eventos tidos como “inadequados” à sua faixa etária, especialmente quando estejam elas acompanhadas por seus pais ou responsáveis (Constituição, art. 21, XVI, c.c. o art. 220, § 3º, inciso I e art. 74 do ECA);
  3. Compete exclusivamente aos pais ou responsáveis decidir sobre o acesso de menores de 18 anos a programas televisivos e diversões e espetáculos em geral (Constituição, art. 220, § 3o, inciso I, e STF, ADI 2.404/DF).” (MINISTÉRIO PUBLICO FEDERAL. Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. Nota Técnica nº 11/2017/PFDC/MPF: Liberdade de expressão artística em face da proteção de crianças e adolescentes. Brasília. 2017. 36-37 Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/temas-de-atuacao/direitos-sexuais-e-reprodutivos/nota- tecnica-liberdade-artistica-e-protecao-de-criancas-e-adolescentes>. Acesso em: 26 de abril de 2019).

35 Conforme se depreende do artigo 220, § 3, I da CRFB c/c o artigo 74 do ECA, o Poder Público, por meio de Lei Federal, irá regular as diversões e espetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada. O mesmo entendimento está contido no julgamento da ADI 2.404/DF: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.404/2016. Requerente: Partido Trabalhista Brasileiro – PTB. Relator: Dias Toffoli. Brasília,             31                                  de          agosto           de            2016.     24                           p. Disponível            em < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=13259339>. Acesso em: 26 de abril de 2019.

No referido julgamento, o Plenário do Supremo Tribunal Federal destacou que “buscou a Constituição conferir aos pais, como reflexo do exercício do poder familiar, o papel de supervisão efetiva sobre o conteúdo acessível aos filhos”, não sendo “compatível com o desígnio constitucional conferir caráter vinculante ou obrigatório a tal classificação [indicativa]”36.

Com a distribuição do recurso ao Desembargador Fernando Foch37, foi proferida decisão antecipatória, a fim de restabelecer a classificação indicativa de 14 (quatorze) anos, tal como recomendada pelo MPRJ, reformando a decisão proibitiva da 1ª Vara da Infância, Adolescente e Idoso.

Em sua bem fundamentada decisão, que se aprofundou no debate sobre a proteção do direito da criança e do adolescente em contraponto à liberdade de expressão artística, o Desembargador Fernando Foch entendeu que não compete à autoridade judicial, por força de lei, a proibição ou permissão de ingresso de crianças e/ou adolescentes em diversões públicas

– e mostra de arte é diversão pública – e sim, ao legislador federal. Tal entendimento decorre da interpretação dos artigos 220, § 3º, I da Constituição da República, e do artigo 74 do ECA, em conjunto com o artigo 21, XVI da Constituição da República38, motivo pelo qual a decisão de primeira instância deveria ser cassada.

36 “Havendo a Constituição Federal se utilizado da expressão ‘para efeito indicativo’ e autorizado o legislador federal a regular as diversões e espetáculos públicos, esclarecendo, no entanto, que, ao Poder Público, caberia “informar” sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada, verifica-se que não é compatível com o desígnio constitucional conferir caráter vinculante e obrigatório a tal classificação, de modo a criar hipótese de proibição”. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.404/2016. Requerente: Partido Trabalhista Brasileiro

– PTB. Relator: Dias Toffoli. Brasília, 31 de agosto de 2016. 24 p. Disponível em < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=13259339>. Acesso em: 26 de abril de 2019).

37 Anteriormente, em razão do recurso ter sido interposto em sede de plantão judiciário, o desembargador de plantão Mauro Pereira Martins havia indeferido a medida liminar pleiteada por entender que a questão em comento não seria atividade própria para o plantão judiciário e deveria ser resolvida por aquele desembargador a quem coubesse a distribuição do recurso. Assim, o desembargador Mauro Pereira Martins indeferiu a medida liminar e determinou a urgente distribuição do recurso, para que a matéria fosse reapreciada pelo Desembargador Relator, o qual coubesse, por livre distribuição.

38 Constituição da República. Art. 21. Compete à União: (…) XVI – exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de programas de rádio e televisão.

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. (…) § 3º Compete à lei federal: (…) I – regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada. (BRASIL. Constituição da República, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 23 de abril de 2019).

Dentre diversos trechos bem pontuados pela decisão, o Desembargador enfatizou o direito à expressão artística enquanto Direito Fundamental: “como a ampla manifestação intelectual, artística, científica e de comunicação é direito fundamental, torná-la pública independe de prévia licença e de antecipada censura, seja total ou parcial”39 40.

A ênfase aos Direitos Fundamentais por meio do processo judicial em questão também ocorreu em julgamento monocrático de mérito do Desembargador, que conclui pela perda superveniente do objeto do recurso, em razão do término da exposição, ao afirmar que “a ampla manifestação intelectual, artística, científica e de comunicação é direito fundamental, torná-la pública independe de prévia licença e de antecipada censura, seja total ou parcial41”.

O que se percebe, mais uma vez, são as tentativas diversas atacar de todos os lados a Queermuseu e fazer com que a mostra seja censurada. O Legislativo, o Ministério Público e o Poder Judiciário interviram, de diferentes formas, neste processo de constantes tentativas de censuras e garantias, o que ocasionou, ao fim, a garantia da liberdade de expressão artística. O Judiciário pôde, em  razão  da sua atuação,  garantir a realização   da  exposição  Queermuseu,

Estatuto da Criança e do Adolescente. Art. 74. O poder público, através do órgão competente, regulará as diversões e espetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada. (BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente, de 13 de julho de 1990. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 26 de abril de 2019).

39 “Observa-se aqui que o próprio constituinte autorizou expressamente um tipo de restrição às liberdades comunicativas tendo como objetivo a tutela dos direitos da criança e do adolescente.

A premissa de que partiu o constituinte foi a de que o acesso a certos conteúdos incompatíveis com o estágio de desenvolvimento psíquico da criança e do adolescente pode ser prejudicial à sua formação.

Note-se que, ao contrário do que ocorria em constituições anteriores, não há aqui autorização para censura. O Poder Público Federal não pode proibir qualquer diversão ou espetáculo público, nem tampouco vedar a veiculação de programas de rádio ou televisão. No afã de compatibilizar as liberdades comunicativas com os interesses da criança e do adolescente, o constituinte autorizou tão somente uma restrição pontual àquelas.

Trata-se da figura conhecida na dogmática constitucional como direito fundamental sujeito à reserva legal qualificada. Em tais hipóteses, a norma constitucional não apenas reclama que a restrição se perfaça por meio de lei, mas também estabelece os fins a serem necessariamente perseguidos e os meios a serem adotados pelo legislador.” (SARMENTO, Daniel. Regulação de espetáculos públicos e da programação da rádio e televisão e direitos da criança e do adolescente. in CANOTILHO, J. J. Gomes; MENDES, Gilmar Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgand; STRECK, Lenio Luiz (coord.). Comentários à Constituição do Brasil. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

2.039 p).

40 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. 3ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento nº 0045759-55.2018.8.19.0000. Agravante: Queermuseu – Cartografias da Diferença na Arte Brasileira e Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Agravado: Marcio Henrique Cruz Pacheco. Julgamento em: 21/08/2018. 4 p.

41 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. 3ª Câmara Cível. Agravo de Instrumento nº 0045759-55.2018.8.19.0000. Agravante: Queermuseu – Cartografias da Diferença na Arte Brasileira e Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Agravado: Marcio Henrique Cruz Pacheco. Julgamento em: 22/11/2018.

reafirmando a efetivação do Direito Fundamental da liberdade de expressão artística e, de igual forma, os direitos de grupos minoritários que ali estavam sendo retratados.

3.     A ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NA EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

 Passada a análise dos fatos que permearam a Queermuseu, faz-se necessário entender como a atuação ativista do Poder Judiciário serve de meio alternativo à promoção de direitos inerentes à pessoa humana e, com base nisso, compreender em que medida o processo judicial citado atuou na concretização desses direitos no caso analisado.

Frise-se que não estamos tratando aqui do ativismo judicial42, teoria constitucional que retrata um posicionamento, a preferência de um modo próprio e proativo de interpretar a Constituição e as leis quando há uma lacuna na legislação. O ativismo pode se inserir quando há necessidade de garantia de avanços sociais que encontram dificuldades de execução pela via política majoritária43, por exemplo, a extensão dos direitos advindos da união estável heteroafetiva à união estável homoafetiva.

No caso da Queermuseu o que se observou foi uma atuação proativa do Poder Judiciário, resguardando grupos historicamente vulneráveis e garantindo a aplicação de lei, que não é lacunosa e já proíbe diretamente a censura. A atividade ampla do Judiciário para garantir Direitos Fundamentais é vista de maneira positiva pela maior parte dos juristas e da sociedade. Não é comum encontrar-se, atualmente, críticos em relação à decisão de Brown v. Board of Education44 e é crescente o número de apoiadores de decisões como Obergefell v. Hodges45.

 No caso objeto do presente estudo, a atuação do Poder Judiciário garantiu o atendimento de demandas sociais não necessariamente satisfeitas pelas instâncias políticas, além de

42 BARROSO, Luís Roberto. Countermajoritarian, Representative, and Enlightened: The roles of constitutional tribunals in contemporary democracies. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, 2017, 2182 p. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/rdp/v9n4/2179-8966-rdp-9-4-2171.pdf>. Acesso em: 25 de abril de 2019.

43 Ibid, 2.183 p.

44 Brown v. Board of Education of Topeka (349 U.S. 294 (1955)) foi um caso julgado na Suprema Corte dos Estados Unidos onde se decidiu pela inconstitucionalidade das divisões raciais entre estudantes brancos e negros em escolas públicas do país.

45 Obergefell v. Hodges (576 U.S. (2015)) foi um caso julgado na Suprema Corte dos Estados Unidos onde o tribunal declarou que os casamentos entre pessoas do mesmo sexo não podem ser proibidos e devem ser reconhecidos como válidos em todos os estados e áreas sujeitas à jurisdição da Constituição dos Estados Unidos.

promover avanços sociais inerentes ao processo civilizatório, especialmente com a afirmação de Direitos Fundamentais, mais especificamente o direito de liberdade de expressão artística.

Com a redemocratização, em decorrência de um longo período em que o país foi assolado por um regime militar autoritário, que tinha a censura como característica intrínseca46, foi promulgada a Constituição da República de 1988. A Constituição vedou qualquer tipo de censura47, positivando, ainda, sob o gênero da liberdade de expressão, os direitos relacionados à livre manifestação do pensamento (artigo 5º, IV48) e à livre expressão no exercício de atividades intelectuais, artísticas científicas e de comunicação (artigo 5º, IX49).

A liberdade de expressão artística surge como um braço do princípio da dignidade da pessoa humana50, sendo considerada para além de um Direito Fundamental, traduzindo uma liberdade cultural, de forma a ampliar a essência da liberdade de expressão, valor caro às sociedades democráticas modernas51, como a brasileira. Assim, a efetivação da garantia desse

46 O regime militar autoritário, principalmente, por meio do Ato Institucional nº 5, impediu a livre circulação de ideias e opiniões no Brasil e a censura foi o mecanismo utilizado para evitar as críticas ao regime e a difusão de ideias que não se coadunassem com o pretendido pelos militares. Ato Institucional nº 5. Art. 5º: A suspensão dos direitos políticos, com base neste Ato, importa, simultaneamente, em: (…) III – proibição de atividades ou manifestação sobre assunto de natureza política. (BRASIL. Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-05-68.htm>. Acesso em: 26 de abril de 2019). No mesmo sentido se mostra o Decreto nº 24.651/34, outorgado por Getúlio Vargas em 10 de julho de 1934.

47 Constituição da República. Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

  • 2ºÉ vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. (BRASIL. Constituição da República, de 05                                de            outubro   de            1988.                Disponível                    em:                         < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 19 de abril de 2019).

48 Constituição da República. Art. 5º. IV- é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado anonimato. (BRASIL. Constituição da República, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 19 de abril de 2019).

49 Constituição da República. Art. 5º. IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; (BRASIL. Constituição da República, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 19 de abril de 2019).

50 Constituição da República. Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (…) III – a dignidade da pessoa humana.

51 Conforme trecho do voto do Ministro Luís Roberto Barroso: “A segunda razão pela qual a liberdade de expressão deve ser tratada como uma liberdade preferencial em uma sociedade como a brasileira, e talvez nas sociedades democráticas em geral, é que a liberdade de expressão é não apenas um pressuposto democrático, como é um pressuposto para o exercício dos outros direitos fundamentais. Para exercerem-se bem os direitos políticos, o direito de participação política, a liberdade de associação, a liberdade de reunião, o próprio desenvolvimento da personalidade, é preciso que haja liberdade de expressão, é preciso que haja uma livre circulação de fatos, opiniões e ideias para que cada um possa participar esclarecidamente do debate público. Ninguém deve ter o direito de selecionar quais são as informações que podem chegar ao debate público. Portanto, a segunda razão é que, sem liberdade de expressão, não existe plenitude dos outros direitos, não existe autonomia privada, não existe autonomia pública.” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Constitucionalidade nº 4.815/2012. Requerente: Associação Nacional dos Editores de Livros – ANEL. Relatora: Min. Carmen Lúcia. Brasília, 10 de junho                                      de                                             2015.                          Disponível               em:                                        <

direito, especialmente do ponto de vista de uma sociedade que sofre com uma grandiosa desigualdade social, necessita de ações positivas do Estado52, que deve atuar afirmativamente para assegurar e possibilitar a todos os cidadãos o seu exercício e o fomento do debate público53

54.

A Queermuseu, desde seus entraves iniciais até a sua plena realização no Rio de Janeiro, demonstra de forma evolutiva a atuação afirmativa do Estado para a consumação da democratização do espaço público, garantindo voz àqueles que não a tem. No caso, as referidas garantias se deram por meio do Poder Judiciário, na medida que, após pedido de providências de um deputado estadual que pleiteou a suspensão da mostra, o TJRJ proferiu decisão garantindo a realização da exposição, em atenção à liberdade de expressão, sobretudo a artística.

Por isso, a liberdade de expressão é um valor tão significativo em regimes democráticos. A garantia dessa liberdade “possibilita que a vontade coletiva seja formada através do confronto de ideias, em que todos os grupos e cidadãos tenham a possibilidade de participar, seja para exprimir seus pontos de vista, seja para ouvir os expostos por seus pares55, o que representa uma grandeza necessária à dignidade da pessoa humana. Aqui, a intervenção altruísta que é possibilitada pelo papel dos tribunais não significou uma imposição de valores, mas assegurou “que cada pessoa possa viver os seus, possa professar as suas convicções, tendo por limite o respeito às convicções dos demais56”.

 Nesse sentido, outro valor fundamental que justifica o prestígio à liberdade de expressão é a autonomia individual. Em relação aos espectadores57, destinatários finais do conteúdo produzido, o intuito é que lhes seja admitida a capacidade de deliberar sobre o que irão ouvir,

http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10162709>. Acesso em: 25 de abril de 2019.

52 EMERSON, Thomas I. The System of Freedom of Expression. New York: Random House, 1970. 4 p.

53 SARMENTO, Daniel. Liberdade de expressão, pluralismo e o papel promocional do Estado. In SARMENTO, Daniel. Livres e iguais: estudos de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. 263 p.

54 “O regime do laissez-faire não é suficiente para permitir a todos a efetiva fruição desta tão importante liberdade, e produz como consequências práticas o reforço do poder dos ricos na esfera comunicativa, o empobrecimento dos debates públicos e a manutenção de uma estrutura social desigualitária e opressiva” (Ibid, 264 p).

55 Ibid, 281 p.

56 BARROSO, Luís Roberto, op. cit., 2.208 p.

57 A autonomia aqui tratada também se aplica aos emissores do discurso, não só aos receptores. A expressão das próprias ideias é de suma importância para o indivíduo e constitui-se como aspecto central da proteção à dignidade humana, sendo necessário a garantia de exercício desse direito.

ler, ver ou aprender58. Pelo que não é lícito, ao Estado ou a qualquer outra frente social, impedir que cidadãos consumam ideias, pontos de vistas e obras artísticas ou literárias, apenas por considerá-las equivocadas ou danosas. Deve-se assumir uma perspectiva não-paternalista que entende que o ser humano é capaz de avaliar e discernir aquilo que lhe é oferecido, formando suas próprias convicções59.

Como ressaltou Ronald Dworkin, o “Estado insulta seus cidadãos e nega a eles a sua responsabilidade moral, quando decreta que não se pode confiar neles para ouvir opiniões que possam persuadi-los a adotar convicções perigosas ou ofensivas.”60. É nesse aspecto que a atuação positiva e afirmativa do Estado corrobora com a promoção da autonomia individual, na medida em que busca promover a diversificação na esfera da liberdade de expressão artística, ainda que por meio do Poder Judiciário – como se desenhou no caso analisado.

Os valores aqui expostos, corretamente assimilados, apontam para o reconhecimento da necessidade de intervenção estatal que objetiva a pluralização de vozes no debate público e possibilita de forma plena a expressão das parcelas marginalizadas da nossa sociedade61, objetivo central da Queermuseu.

4.   QUEERMUSEU: OS DIREITOS FUNDAMENTAIS POR MEIO DA ARTE

 Por mostrar e poder ter sido vista, ainda que sob condicionamentos desnecessários relativos à classificação indicativa62 e diante dos inúmeros episódios de censura, a Queermuseu efetivou Direitos Fundamentais, muito em decorrência da atuação do Judiciário acima explicitada. Tal efetivação se dá basicamente por três razões, já que a exposição: (i) significou a inclusão social63 do grupo queer por meio da sensibilização artística; (ii) deu espaço para a

58 SARMENTO, Daniel, op. cit., 287 – 288 p.

59 Ibid, 288 p.

60 DWORKIN, Ronald. Why Speech Must Be Free. In: Freedom’s Law: The Moral Reading of the American Constitution. Cambridge: Harvard University Press, 1996, 200 p.

61 SARMENTO, Daniel, op. cit., 289 p.

62 Conforme já apontado anteriormente, entendemos que que a Portaria nº 368/2014 do Ministério da Justiça não se aplica aos casos de exposições artísticas, como a Queermuseu. De igual forma entende a EAV: RIO DE JANEIRO. Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Inquérito Civil nº 2017.01062736. Interessada: Escola de Artes Visuais do Parque Lage. 293 – 299 p.

63 Tem-se ciência que a exposição recebeu algumas críticas relacionadas à abordagem da arte queer, seja porque alguns a consideraram tratar pouco da temática, seja porque a mostra, ainda que importante na tratativa das questões de gênero, pode ainda assim ter sido excludente em sua concepção ao abordar a questão sob o ponto de vista de privilegiados tanto socialmente quanto culturalmente. A este respeito, foi feita uma performance artística ao fim da exposição por Gabe Passareli, irmã de Matheusa Passareli, artista de gênero não binário assassinada

produção de memória de grupos minoritários nas instituições de Arte; e (iii) aconteceu sob defesa da liberdade de expressão artística, apesar de todas as tentativas de censurá-la.

Em um primeiro plano, há de entender-se que a promoção de Direitos Fundamentais através de uma exposição é possível, tendo em vista que a efetivação de direitos também se dá diante da própria experiência estética64. A Queermuseu, por existir e resistir durante o tempo em que esteve exposta – trazendo o sentir artístico queer para dentro das instituições voltadas à Arte – retrata uma espécie de direito pela sensibilização artística de seu acervo.

A relação observada demonstra a possibilidade de poder utilizar a Arte como própria autocriação do Direito65. Esta autorreprodução decorre do fato de que ambos são subsistemas sociais que, quando postos em contato, geram a autopoiese66 do próprio Direito. Em outras palavras, os dois subsistemas sociais – Arte e Direito – se acoplam67, implicando a criação do Direito através da sensibilização artística. A arte modifica e ressignifica o Direito, ao passo que o Direito ganha corpo quando percebido através da Arte68:

violentamente no Rio de Janeiro. (LOPES, Carolina. Gabe Passareli em Queermuseu: O que fazer quando um corpo vira cinzas? Disponível em: < https://revistadesvio.com/2018/09/23/gabe-passareli-em-queermuseu-o-que- fazer-quando-uma-corpa-vira-cinzas/>. Acesso em: 17 de março de 2019). De qualquer maneira, não está sob o enfoque deste artigo investigar as críticas relativas ao teor crítico artístico da Queermuseu, mas tão somente identificar a existência da referida inclusão social na relação com os Direitos Fundamentais, incipiente até então. 64 Cf. “A experiência estética pode ocorrer favorecida por muitas e diferentes classes de objetos: uma pintura, uma sinfonia, um elemento da natureza, uma peça de mobiliário, um detalhe arquitetônico ou, mesmo, um punhado de parafusos enferrujados postos a esmo num recipiente de vidro. Todo objeto possui um poder potencial de evocação. Tudo aquilo que pode ser percebido sensorialmente, quando encontra o olhar inquiridor do outro, ganha dimensão estética”. (BONFIM, Gustavo Amarante. Primeiras Palavras. Notas de aula sobre Design e Estética. Rio de Janeiro, jan. 2001, 2 p., grifou-se).

65 Arte e Direito possuem processo de conhecimento correlato. Acerca das similaridades e conexão entre o processo de construção social e apropriação do conhecimento do Direito e da Arte: (i) SCHWARTZ, Germano;

MACEDO, Elaine. Pode o Direito ser Arte? Respostas a partir do Direito &  Literatura. [S.l]: CONPEDI: 1015

  1. Disponível em:

<http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/anais/salvador/germano_schwartz.pdf>. Acesso em: 18 de março de 2019; e (ii) MAMEDE, Gladston; FRANCA FILHO, Marcílio; RODRIGUES JUNIOR, Otávio (orgs.). Direito da Arte. São Paulo: Atlas, 2015.

66 Termo de origem observada na biologia para aferir a capacidade dos seres vivos se autoreproduzirem. Foi adaptado para o contexto das ciências sociais na década de 80, consistindo em um método de observação social por Niklas Luhmann. Conforme o autor afirma em El derecho de la sociedade: “a sociedade é o sistema abrangente de todas as comunicações, que se reproduz autopoieticamente, na medida em que produzem, na rede de conexão recursiva de comunicações (…)”. (LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. 2. ed. Heder: Universidad Iberoamericana, 2005, 83 p.).

67 Ibid.

68 Acerca do entendimento da Arte como força de expressão do que se constitui no mundo: “A arte permite a todo observador acessar seu horizonte indiscernível de sentidos, um horizonte de possibilidades de sentidos, de pontencialidades. À arte é possível transformar em tema da comunicação todas as coisas do mundo e, essa que é sua forma própria de operar, radicaliza ao fazer passar por um mundo aquilo que ela constrói, o mundo fictício. Mas, ainda que sob a forma ficcional, a realidade do mundo construída pela arte é realidade e mundo, constitui o mundo, vez que só é possível no mundo. A arte, assim, permite que o mundo se observe ao constituir-se no mundo. E faz atingindo, antes de tudo, a sensibilidade, a imaginação criando assim condições de possibilidade

A arte, enquanto forma, pode fazer luzir outros condensados de sentidos, expectativas substitutas, vez que fazer aparecer o mundo no mundo por intermédio da imaginação é a função da arte. Ao acoplar-se ao direito, talvez possibilite a este não só aprender

– atualizar-se com o mundo, mas, quiça, transformar-se para mundo69.

Observa-se assim que a Arte sensibiliza e muda o olhar e a perspectiva de quem a vê70, o que leva à constituição e autorreprodução de Direitos Fundamentais pela própria exibição de obras de arte que dialogam com minorias.

Nesse contexto, a Queermuseu funcionou como instrumento de mudança, na medida em que foi força de expressão de grupos recorrentemente retirados das instituições voltadas à promoção da Arte, o que se identifica como sendo de extrema importância dentro do contexto político atual, demarcado por retrocessos71 na efetivação de direitos de grupos minoritários72 e pela censura e desvalorização da Arte73. Ceder e dar espaço para que a Arte seja um instrumento de resistência dentro da conjectura apontada é ressignificar o próprio Direito enquanto garantia.

Dessa forma, à medida em que as obras da Queermuseu dão voz àqueles normalmente privados do seu direito à expressão, Direitos Fundamentais são efetivados. As instituições, antes não ocupadas por minorias74, passam a ser palco daqueles ainda entendidos por alguns como

para novas formas de descrição da sociedade, referências mobilizadas na auto-constituição da sociedade”. (PIRES, Nádia. A produção de direito no cinema. Um estudo sociológico. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas, Faculdade Nacional de Direito. Rio de Janeiro: UFRJ, 2011, 140 f., 20 p., grifou-se).

69 Ibid., 45 p.

70 NUNES BARBOSA, Fernanda; SARLET, Gabrielle. Direitos Humanos e Literatura: da “Nação Crioula” de José Eduardo Agualusa à escravidão contemporânea da Fazenda Brasil Verde. Revista de Direito, Arte e Literatura, Porto Alegre, v. 4., n. 2., jul./dez. 2018, 95 – 96 p.

71 Mostram-se incontáveis os fatos que comprovam a retroação presenciada atualmente no Brasil em matéria de Direitos Fundamentais e Direitos Humanos. A este respeito cf. https://www.hrw.org/pt/americas/brasil.

72 Entendemos como certa a concepção substantiva de minorias, e não a numérica ou a referenciada na nota de rodapé número 4 da opinião da Suprema Corte dos Estados Unidos em United States vs. CaroleneProducts (cf. ACKERMAN, Bruce. Más aliá de Carolene Products. Revista Jurídica de la Universidade de Palermo, n.1, ago. 2009, 126 – 156 p). Dessa forma, minorias são entendidas como grupos socialmente vulneráveis, em razão de reiterados processos de inferiorização pela desconsideração de seus interesses.

73 “(…) as artes em geral têm sido ameaçadas de várias formas no país, tanto em relação aos cortes orçamentários e a diminuição dos incentivos financeiros para a produção artística, como em relação ao teor dessas produções, como foi o caso dos ataques por grupos moralistas e neoconversadores à exposição Queermuseu (…)”. (LOPONTE, Luciana; COUTINHO, Andréa. Estamos em perigo? Arte, educação e resistências no Brasil. Juiz de Fora: Mostra Cultural Arte em Trânsito, 2017, 111 p. Disponível em: < http://congressomateria.fba.ul.pt/rede/2018_rede_01_08_Loponte.pdf>. Acesso em: 20 de março de 2019).

74 “Os membros de comunidades marginalizadas muitas vezes por suas práticas sexuais dissonantes das normas sociais, progressivamente identificados como queer a partir da década de 1980, não lograram encontrar nas exibições dos museus muitas referências aos seus estilos de vida e às suas experiências e conquistas. Sua história é silenciada ou simplesmente ignorada”. (PINTO, Renato. Museus e diversidade sexual: reflexões sobre mostras LGBT e Queer. Arqueologia Pública, Campinas, n. 5, 2012, 44 p).

estranhos e fora da norma75. A exibição da arte queer serve até mesmo para alterar a realidade demarcada pela noção estrita de sexo e gênero e incluir estes grupos vulneráveis:

As exibições nos museus são valiosas ferramentas de inclusão social. A materialidade serve como legitimadora de identidades e institucionaliza construções sociais precárias, transformando-as em fatos sociais. Por outro lado, pode servir como valioso recurso em práticas que transformam ou desestabilizam essas mesmas identidades sociais. O engajamento social dos museus com o público LGBT-Q é importante e os arqueólogos e curadores vêm, aos poucos, promovendo narrativas, e estendendo debates sobre os problemas sociais e a diversidade sexual, tanto antiga quando moderna. Enquanto as teorias arqueológicas queer podem auxiliar na desconstrução de discursos normativos, transpor a história queer para o público acaba por contestar tais normas e por revelar um pouco mais dos mecanismos sociais envolvidos em suas construções76.

Diversas obras da Queermuseu questionaram a normatização dos corpos e problematizaram a concepção de gênero sob o ponto de vista do padrão heteronormativo77; a finalidade é transgredir o espaço do indivíduo para além do gênero e sexo que possui e entendê- lo como humano detentor de direitos. A título de exemplo, algumas obras transpareceram, enquanto ato artístico, a realidade de grupos de necessária inclusão no meio social. Dentre elas, as obras Adriano Bafônica e Luiz França She-há78 e Travesti da lambada e deusa das águas79, ambas de Bia Leite, “fazem parte do plano de exaltar a liberdade de gênero comum a cada um de nós”80. A pintura Oxumaré81 de Nelson Boeira rompe com “a narrativa heteronormativa homofóbica, podendo se desdobrar às questões de preconceito dentro de religiões”, sendo de “grande relevância para discutir sobre a aceitação de uma minoria incompreendida e recriminada82.

Afinal, sob perspectiva da teoria queer, desenvolvida em grande parte por Judith Butler

75 BARREIRO, Alex. Um corpo estranho: ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Pró-posições, v. 24, n. 1, jan./abr. 2013, 269 p.

76 Ibid., 53 p.

77 Sobre a normatização dos corpos e a necessidade de romper com o binarismo hetero/homossexual, visto que a sexualidade opera como dispositivo histórico de poder: MISKOLCI, Richard, op. cit., 150 – 182 p.

78 LEITE, Bia. Adriano Bafônica e Luiz França She-há. Queermuseu: cartografias da diferença na arte brasileira.

Rio de Janeiro: AMEAV, 2018. 63 p.

79 LEITE, Bia. Travesti da lambada e deusa das águas. Queermuseu: cartografias da diferença na arte brasileira. Rio de Janeiro: AMEAV, 2018. 63 p.

80 SABATINO, Juliana. Nota da cartografia da sociedade de hoje: o caso polêmico da criança viada. Desvio, ed. 4., maio 2018, 110 p.

81 BOEIRA, Nelson. Oxumaré. Queermuseu: cartografias da diferença na arte brasileira. Rio de Janeiro: AMEAV, 2018. 73 p.

82 CORTES, Mayra. Crítica de Arte de ‘Oxumaré’. Desvio, ed. 4., maio 2018, 132 p.

e Michel Foucault83, o gênero é fruto de construção social tal como o sexo84 e decorre da mera significação e linguagem humanas. Assim, não há sentido em excluir das instituições de Arte aquilo que tanto repensa a multiplicidade85 quanto tenta representar as camadas vulneráveis da sociedade86 e excluídas dos lugares de reprodução do conhecimento.

À medida que a inclusão do grupo queer ocorre em decorrência da sensibilização ocasionada pela mostra exibida à sociedade civil, a memória de tal grupo se firma como verídica e importante na formação da história social brasileira. A EAV acaba simbolizando um lugar de memória87, no qual a Arte sobre e de grupos minoritários conseguiu ser exibida, mesmo diante das inúmeras tentativas de censura88.

Nessa perspectiva, o direito à memória surge como mais um dos Direitos Fundamentais89 associados à Queermuseu, uma vez que grupos minoritários puderam retratar a sua realidade, deixando registrado à posterioridade os questionamentos acerca das construções de gênero e sexo na sociedade.

Por fim, a Queermuseu agregou valores relativos à consolidação de manifestações artísticas em um ambiente de liberdade de expressão, compreensão e diferença. Ainda mais quando observamos as censuras que foram realizadas à exposição. Reabri-la ao público

83 Cf. FOUCAULT, Michel. História da sexualidade: a vontade de saber. 13 ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1988.

84 “It would make no sense, then, to define gender as the cultural interpretation of sex, if sex itself is a gendered category (…) As a result, gender is not to culture as sex is to nature; gender is also a discursive/cultural means by which “sexed nature” or a “natural sex” is produced and established as “prediscursive”, prior to culture, a politically neutral surface on which culture acts”. (BUTLER, Judith. Gender Trouble: feminism and the subversion of identity. London: Routledge, 1990, 7 p., grifou-se). Em igual sentido: BUTLER, Judith. Críticamente subversiva. JIMÉNEZ, Rafael (ed.). Sexualidades transgressoras: uma antología de estúdios queer. Barcelona: Icaria, 2002.

85 “Teoria queer abre possibilidades para pensar e repensar a multiplicidade, a ambiguidade e a fluidez das identidades, sejam elas sexuais ou de gênero, mas, além disso, também possibilita novas viscitudes para pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a própria educação”. (BARREIRO, Alex, op. cit., 269 p).

86 A teoria queer se insere nessa tentativa de representar a cultura da grupos marginalizados: MIRANDA, Olinson Coutinho; GARCIA, Paulo César. A teoria queer como representação da cultura de uma minoria. Salvador: III Encontro baiano de estudos em cultura, 2012.

87 “(…) lugares de memória – que, segundo o autor, servem para garantir a fixação de lembranças e de sua transmissão, e estão impregnados de simbolismos, pois caracterizam acontecimentos ou experiências vividas pelos grupos, ainda que muitos de seus membros não tenham participado diretamente de tais eventos”. (OLIVEIRA, Alecsandra. Arte como lugar de memória. Travessias, ed. 5, 2009, 12 p).

88 Importante ressaltar que, ao longo da história, a censura tem subjugado minorias na busca de reproduzir valores pré-estabelecidos. A este respeito: SIRTOLI, Guilherme; BRANDÃO, Cláudia. A censura e a abordagem do ‘queer’ nas artes visuais. Revista Seminário de História da Arte, v. 1, n. 7, 2018, 18 p.

89 Acerca da memória como Direito Fundamental civil e político cf. LEAL, Rogério Gesta; RAMOS, Tais. A memória como Direito Fundamental civil e político: abordagem preliminar. Revista Brasileira de Direito, IMED, v. 8, n. 1, jan./jun. 2012, 141 – 182 p.

significou resistir e perseverar na causa da arte e da liberdade, na medida em que as expressões artísticas tuteladas pela Constituição são justamente “aquelas que incomodam os agentes públicos e privados, que são capazes de gerar reflexões e modificar opiniões”90.

A liberdade de expressão artística é direito fundamental constitucionalmente consagrado91, perfazendo efeitos tanto para o artista quanto para toda a sociedade em aspectos democráticos e culturais:

Com efeito, a liberdade artística, enquanto um dos direitos que compõem a liberdade de expressão, exerce uma função democrática. A arte é um espaço de crítica e debate de ideias e serve mesmo como instrumento de controle dos poderes públicos. A liberdade das artes cumpre, ainda, uma função específica no campo do progresso da cultura. A arte muitas vezes é um mecanismo para ver à frente, questionar valores e concepções do seu tempo, incentivando transformações na sociedade92.

Ainda que desagrade ou cause incômodo, o artista deve ter assegurado seu direito a manifestar-se livremente e a população deve ter reconhecido o direito a acessar, conforme seu próprio juízo e querer, aquilo que de arte é produzido. Como já apontou o Supremo Tribunal Federal, “(…) impedir o livre trânsito de ideias é, portanto, ir de encontro ao conteúdo básico da liberdade de expressão93”.

Em síntese, justamente porque a arte objetiva provocar reflexões e propor novas visões e questionamentos, reconhece-se a preferência constitucional94 da liberdade de expressão

90 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 187/2014. Requerente: Procurador-Geral da República. Relator: Celso de Mello. Brasília, 29 de maio de 2014. Disponível em: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=5956195>. Acesso em: 10 de março de 2019.

91 Constituição da República. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo- se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…) IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; (…)

IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; (BRASIL. Constituição da República, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 23 de abril de 2019).

92 SILVA, Júlia Alexim. A liberdade de expressão artística. São Paulo: CONPEDI: 2009, 3202 p. Disponível em:

< http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/anais/sao_paulo/2281.pdf >. Acesso em: 29 de março de 2019.

93 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 187/2014. Requerente: Procurador-Geral da República. Relator: Celso de Mello. Brasília, 29 de maio de 2014. Disponível em: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=5956195>. Acesso em: 23 de abril de 2019.

94 Neste sentido: (i) SARMENTO, Daniel. A Liberdade de expressão e o problema do “hate speech”. Disponível em: < http://www.dsarmento.adv.br/content/3-publicacoes/19-a-liberdade-de-expressao-e-o-problema-do-hate- speech/a-liberdade-de-expressao-e-o-problema-do-hate-speech-daniel-sarmento.pdf>. Acesso em: 30 de abril de 2019; e (ii) BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4815. Requerente: Associação Nacional dos Editores de Livros. Interessados: Presidente da República e Presidente do Congresso

artística. Para abrir caminho na luta em prol da meta constitucional de uma sociedade mais livre e justa95, o que se impõe sempre, prima facie, é a proteção e promoção da liberdade de expressão e, consequentemente, da Arte em sociedade, inclusive por intermédio e com o apoio de órgãos do Poder Público96.

5.   CONCLUSÕES

Por meio das considerações e análises trazidas no presente trabalho, pudemos entender como se deu todo o curso para que a Queermuseu acontecesse. Desde a censura da exposição no Rio Grande do Sul e a instauração do Inquérito Civil no MPRJ, até o ajuizamento de um processo judicial visando a suspensão da mostra.

Nesse contexto, a atuação do Poder Judiciário garantiu a realização da exposição, o que efetivou Direitos Fundamentais, notadamente a liberdade de expressão artística. O papel do Judiciário foi desempenhado no sentido de promover a garantia das leis e sua constitucionalidade, impedindo que a exposição fosse censurada. Em casos como o da Queermuseu, o Judiciário deve adotar uma postura ativa visando a consumação da democratização do espaço público e aplicando a interpretação que deve ser dada às leis em matéria de Direitos Fundamentais.

Esta atuação foi importante para que direitos de grupos minoritários pudessem tomar concretude através da Arte, que em conjunto com o Direito opera, pela sensibilização artística, a inclusão social de minorias, o direito à memória e a garantia da liberdade de expressão artística, valor disposto na Constituição da República e tão importante para sociedades democráticas em contextos de censuras.

Nacional. Relatora: Carmen Lúcia. Brasília, 01 de fevereiro de 2016. Disponível em: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10162709>. Acesso em: 23 de abril de 2019.

95 TÔRRES, Fernanda Carolina. O direito fundamental à liberdade de expressão e sua extensão. Revista de Informação Legislativa, ano 50, n. 200, out./dez. 2013, 79 p.

96 “A principal dessas diretrizes é o princípio da igualdade. Cabe ao Estado atuar no sentido da correção das desigualdades criadas pelo mercado, de modo que devem ser protegidas aquelas manifestações artísticas que não encontram espaço no mercado privado”. (SILVA, Júlia Alexim, op. cit., 3205 p.).

6.   REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Palavras Chaves

Queermuseu, Direitos Fundamentais; Poder Judiciário; Direito e Arte; Liberdade de expressão.