Resumo
Desta forma, o objetivo do presente trabalho é o de analisar o respeito à dignidade deste trabalhador, construindo o raciocínio final a partir das definições atinentes ao Direito do Trabalho e, respectivamente, à natureza do serviço e à relação entre a empresa e o motorista.
A proposta é importante, uma vez que muito se debate acerca da legalidade do transporte oferecido, porém uma figura muito importante deste serviço se vê esquecida em meio à discussão, e urge ser trabalhado o tema sob esta perspectiva. Insta salientar que a proposta deste trabalho não é adentrar no mérito a respeito da legalidade ou não do transporte privado urbano, e sim, analisar o contexto da situação sob a ótica do trabalhador.
Abstract
Hence, the objective of this study is to analyse the respect to the dignity of this professional, elaborating the final reasoning from the definitions pertaining to Labour Law and, respectively, to the nature of the service and to the relationship between the company and the driver.
The proposal is important, since much is debated about the legality of the transportation offered, yet an imperative figure of this service is forgotten in the middle of the discussion, and the subject must be worked out from this perspective. Urges to point out that the proposal of this assignment is not to go into the merit regarding to the legalization or not of this urban private transport, but rather, analyse the context of the situation from the standpoint of the professional.
Key words: labour relation, Uber, worker, dignity, professional’s dignity.
Artigo
A DIGNIDADE DO TRABALHADOR E AS NOVAS FORMAS DE EXPLORAÇÃO DO TRABALHO HUMANO: A RELAÇÃO UBER X MOTORISTA
Raiza Moreira Delate
RESUMO
Diante dos mais recentes debates acerca da modernização das relações de trabalho, bem como acerca da inovação que a plataforma do Uber trouxe aos brasileiros, faz-se necessária a discussão no que tange a uma das partes desta relação: o motorista.
Desta forma, o objetivo do presente trabalho é o de analisar o respeito à dignidade deste trabalhador, construindo o raciocínio final a partir das definições atinentes ao Direito do Trabalho e, respectivamente, à natureza do serviço e à relação entre a empresa e o motorista.
A proposta é importante, uma vez que muito se debate acerca da legalidade do transporte oferecido, porém uma figura muito importante deste serviço se vê esquecida em meio à discussão, e urge ser trabalhado o tema sob esta perspectiva. Insta salientar que a proposta deste trabalho não é adentrar no mérito a respeito da legalidade ou não do transporte privado urbano, e sim, analisar o contexto da situação sob a ótica do trabalhador.
Palavras-chave: relação de emprego, uber, trabalhador, dignidade, dignidade do trabalhador.
ABSTRACT
Upon recent debates on the modernisation of labour relation, as well as about the innovations that Uber platform brought for Brazilians, it becomes necessary the discussion with regards to one of the parties of this relation: the driver.
Hence, the objective of this study is to analyse the respect to the dignity of this professional, elaborating the final reasoning from the definitions pertaining to Labour Law and, respectively, to the nature of the service and to the relationship between the company and the driver.
The proposal is important, since much is debated about the legality of the transportation offered, yet an imperative figure of this service is forgotten in the middle of the discussion, and the subject must be worked out from this perspective. Urges to point out that the proposal of this assignment is not to go into the merit regarding to the legalization or not of this urban private transport, but rather, analyse the context of the situation from the standpoint of the professional.
Key words: labour relation, Uber, worker, dignity, professional’s dignity.
SUMÁRIO
- 1. INTRODUÇÃO ………………………………………………………………………………………….. 9
- 2. A EVOLUÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO AO LONGO DOS SÉCULOS …… 11
- 3. DOS PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO………………………………………… 15
3.1. PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO …………………………………………………………………… 15
3.2. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO OPERÁRIO (OU PRO MISERO)………………… 16
3.3. PRINCÍPIO DA CONDIÇÃO MAIS BENÉFICA ………………………………………….. 16
3.4. PRINCÍPIO DA NORMA MAIS FAVORÁVEL…………………………………………….. 17
3.5. PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE DOS DIREITOS TRABALHISTAS ….. 19
3.6. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE ……………………………………………… 20
3.7. PRINCÍPIO DA IMPERATIVIDADE DAS NORMAS TRABALHISTAS …………… 20
3.8. PRINCÍPIO DA IRREDUTIBILIDADE SALARIAL ……………………………………….. 20
3.9. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA RELAÇÃO DE EMPREGO…………………. 21
3.10. PRINCÍPIO DA INALTERABILIDADE CONTRATUAL LESIVA…………………… 22
- 4. O PAPEL DA UBER NA ERA DA FLEXIBILIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO ……………………………………………………………………………………………….. 24
- 5. A FLEXIBILIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO A PARTIR DA GLOBALIZAÇÃO ……………………………………………………………………………………….. 27
- 6. A ESTRUTURA DA UBER ……………………………………………………………………….. 30
- 7. UM BREVE PANORAMA DO RECONHECIMENTO DAS RELAÇÕES DE EMPREGO UBER X MOTORISTA NO EXTERIOR …………………………………………. 35
- 8. A RELAÇÃO ENTRE UBER E MOTORISTA ………………………………………………. 39
8.1. DOS REQUISITOS E ELEMENTOS ESSENCIAIS AO CONTRATO DE EMPREGO …………………………………………………………………………………………………. 39
8.2. DO POR QUE EXISTE RELAÇÃO DE EMPREGO ENTRE UBER E
MOTORISTA ………………………………………………………………………………………………. 42
8.2.1. Pessoa física e pessoalidade …………………………………………………………….. 42
8.2.2. Onerosidade …………………………………………………………………………………….. 44
8.2.3. Não eventualidade…………………………………………………………………………….. 45
8.2.4. Subordinação …………………………………………………………………………………… 47
- 9. A OFENSA À DIGNIDADE DO TRABALHADOR ………………………………………… 52
- 10. CONCLUSÃO ……………………………………………………………………………………….. 57
REFERÊNCIAS…………………………………………………………………………………………… 61
- 1. INTRODUÇÃO
O Brasil, decerto, vive uma época de mudanças, a implementação das tecnologias nas relações cotidianas é cada vez mais frequente, e o Direito, como reflexo das relações sociais e suas mazelas, acaba atingido por tais tecnologias em seus ramos – como é o caso do Direito do Trabalho.
Desta forma, urge uma análise das mudanças enfrentadas pela sociedade em razão do avanço tecnológico, para certificarmo-nos de que os princípios e direitos fundamentais continuem a ser observados nestas relações.
Ricardo Tenório Cavalcante, em sua tese de doutorado reproduzida sob o livro “Jurisdição, Direitos Sociais e Proteção do Trabalhador: a efetividade do direito material e processual do trabalho desde a teoria dos princípios”, em 2008 já atentava para o fato de que:
É nessa onda de intermináveis vicissitudes, na crista da qual está o discurso de redução da carga protetiva do trabalhador, que se impõe uma reflexão sobre a atuação do Poder Judiciário diante da teoria dos direitos fundamentais e diante mesmo da democracia constitucional brasileira.1
Hoje, em 2017, nos deparamos com a declaração do atual presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia afirmando que, para ele, a Justiça do Trabalho não deveria nem existir2, o que reforça a disposição da casa em reformar o Direito do Trabalho para esvaziá-lo no que se refere às conquistas históricas dos trabalhadores.
Fica evidente a urgência de os intérpretes do Direito empenharem-se na construção de raciocínios que acompanhem as evoluções sociais, com a finalidade da preservação do Estado de Direito como garantidor dos Direitos Sociais.
Assim, este trabalho visa o estudo de recente relação jurídica, qual seja a estabelecida entre a empresa UBER e os motoristas a ela vinculados, relação esta com definição ainda problemática, e que atualmente levanta debates por diversos estados do país, tendo dado origem a algumas ações na Justiça do Trabalho na reinvindicação por direitos. No estado de São Paulo, a exemplo, algumas ações foram ajuizadas perante a Justiça do Trabalho, de forma que os motoristas vêm pleiteando a rescisão do contrato com a empresa UBER com o pagamento de horas extras, décimo terceiro salário e férias.
Mais além, o objetivo deste trabalho de conclusão é o de analisar o respeito à dignidade deste trabalhador, construindo o raciocínio final a partir das definições atinentes ao Direito do Trabalho e, respectivamente, à natureza do serviço e à relação entre a empresa e o motorista.
Saliente-se que a proposta não é a de adentrar no mérito a respeito da legalidade ou não do transporte privado urbano, e sim, analisar o contexto da situação sob a ótica do trabalhador.
Primeiramente, cabe a elaboração de um contexto histórico para demonstrar a evolução dos direitos fundamentais e das garantias trabalhistas conquistadas ao longo dos séculos. Assim, espera-se ver atendida a observância da importância de tais direitos, e mesmo dos princípios consagrados pela matéria em questão, para que não se perca de vista a sua aplicabilidade na atualidade, bem como se faça um estudo diário pelos juristas, para que tais pensamentos acompanhem a evolução da sociedade.
Após o breve contexto histórico, serão expostas as definições no que tange à empresa UBER e será analisada a relação entre ela e o motorista da plataforma, observando os princípios do Direito do Trabalho. Ao fim, contextualizaremos o aspectos abordados ao longo do presente trabalho.
- 2. A EVOLUÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO AO LONGO DOS SÉCULOS
O trabalho é tão antigo quanto o homem, e ao longo da história assumiu basicamente as formas de: escravidão, servidão, corporações de ofício e emprego.
Na antiguidade, o trabalho, com significado distinto do que possui hoje, consistia numa forma de sobrevivência, vez que para satisfazer a fome o homem caçava, pescava, lutava contra animais e mesmo contra outros homens. Com o início da formação de tribos, a luta estendeu-se à busca pelo poder e domínio de outros grupos e territórios.
Como resultado dos conflitos em busca de poder e de expansão territorial, muitos homens eram feitos prisioneiros, o que com o passar do tempo deu origem à condição de escravo, tendo, a partir da escravidão, surgido o trabalho subordinado em favor de terceiro (4.000 a.C.).
Até o século XIX, a escravidão esteve em evidência, consistindo em uma absoluta relação de domínio, na qual o escravo enquadrava-se como objeto do direito de propriedade e não como um sujeito de direito; todavia, em que pese sua caracterização como objeto, sua condição de escravo era transferida aos seus filhos. Em suma, o único “direito” do escravo era o de trabalhar.
De forma paralela à escravidão, no Direito Romano, homens livres e de baixo poder aquisitivo passaram a locar seus serviços aos senhores feudais, nascendo o arrendamento da coisa – locatio conductio rei. As condições iniciais desse tipo de contrato eram basicamente iguais às dos escravos e regidas pela locação de coisas.
A servidão, surgida no feudalismo, dos séculos I a IX, trouxe uma gradual pessoalização do trabalhador. O servo já não era escravo, porém não era totalmente livre, uma vez que trabalhava para a obtenção de proteção militar e política. A distinção crucial é a de que o servo, diferentemente do escravo, não era caracterizado como coisa, o que lhe conferia alguns poucos direitos civis, como a possibilidade de contrair núpcias, a exemplo.
A partir do século XII, surge a figura das corporações de ofício. Divididas em três classes – mestres, companheiros e aprendizes – essas organizações eram constituídas de grupos de trabalhadores especializados em determinada atividade. As corporações de ofício tinham como objetivo essencial o controle do mercado, impedindo a concorrência e assegurando privilégios aos mestres, responsáveis pela direção das atividades. O tempo de trabalho nestas organizações durava em média de 12 a 14 horas diárias, porém podia ultrapassar as 18 horas, havendo, ainda, o emprego de mão de obra infantil e da mulher.
Os mestres das corporações de ofícios ofereciam treinamento aos aprendizes, que estavam sujeitos a castigos corporais pelos seus responsáveis. Quando o aprendiz adquiria a condição de companheiro, o que poderia durar em média cinco anos, recebia de seu mestre pagamento pelo trabalho. Para que o aprendiz ou companheiro pudesse chegar à posição de mestre, deveria prestar um exame, que além de difícil era pago.
A constante dependência entre os aprendizes e companheiros e seus mestres, gerou conflitos entre as categorias, o que deu início à compagnonnage, no século XVI. As compagnonnage eram formadas por companheiros que buscavam defender seus interesses em face dos mestres.
Em 1789 a Revolução Francesa pôs fim às corporações de ofício e, consequentemente, às compagnonnage, uma vez que tais organizações eram incompatíveis com os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade trazidos pela revolução, mas, sobretudo, eram incompatíveis com o ideal de liberdade individual do homem. Os ideólogos da revolução não admitiam que houvesse poderes intermediários entre o Estado e o indivíduo, como era o caso das corporações, que possuíam seus estatutos próprios os quais conferiam amplos e ilimitados poderes aos mestres. Sobre este acontecimento que trouxe significativas mudanças para o trabalho, vale transcrever:
Graças à Revolução Francesa o trabalho tornou-se livre. Em razão dos princípios jurídicos propugnados pelos teóricos do Liberalismo, especialmente o princípio da autonomia da vontade e uma de suas decorrências – a liberdade de contratar – o trabalho realizado por uma pessoa em proveito de outra passou a ser decorrência não mais de relações de subordinação pessoal, mas de vinculação contratual.3
Contudo, foi com a Revolução Industrial que o Direito do Trabalho, o contrato de trabalho e o salário tiveram seu marco inicial. Com a descoberta da máquina a vapor como fonte de energia, houve a necessidade de pessoas para operarem as máquinas, o que impôs a substituição do trabalho escravo, servil e corporativo pel trabalho assalariado.
A implementação das máquinas a vapor e têxtil não só deram início à produção em larga escala, como também iniciaram o processo de substituição do homem, o que acarretou a redução e extinção de inúmeros postos de trabalho, resultando em índices alarmantes de desemprego. Em contrapartida, a partir da substituição dos postos de trabalho pelas máquinas, houve a necessidade de homens para a sua operação, o que deu origem à mão de obra assalariada e de certa forma qualificada, já que se fazia necessário que os trabalhadores soubessem como operá-las – assim, surgiu a classe dos trabalhadores.
Este período foi marcado pela grande exploração do trabalhador, que possuía jornadas de até 16 horas, e pelas condições desumanas as quais estes eram submetidos. Homens, mulheres e crianças trabalhavam nas fábricas e o trabalho infantil não tinha idade mínima para ser realizado. Tendo em vista todos estes aspectos, surgiu uma causa jurídica, pois os trabalhadores começaram a associar-se para reivindicar melhores condições de trabalho e de salários, além da diminuição das jornadas excessivas e o fim da exploração de mulheres e crianças.
A duras penas os trabalhadores começaram a ver graduais mudanças, o que levou ao intervencionismo do Estado – os contratos que antes eram regidos de acordo com a vontade das partes, visto que a ideologia do Liberalismo não admitia a intervenção do Estado na Economia e nas relações de trabalho, passaram a ser regidos por leis centradas na garantia de proteção aos trabalhadores.
Desta forma, ao redor do mundo pôde-se observar o desenvolvimento das garantias trabalhistas. Em 1800, na Escócia, Robert Owen assumiu a fábrica de tecidos em New Lamark, acabando com o emprego de castigos e prêmios e a admissão de menor de dez anos ao trabalho; implementando a jornada de dez horas e meia de trabalho, medidas de higiene e a caixa de previdência para a velhice e assistência médica. Robert Owen conseguiu, ainda, estabelecer a criação do Trade Union, correspondente ao sindicato.
Na Inglaterra, em 1802, a Lei de Peel fixou a jornada de, no máximo, 12 horas para o trabalho, além de proibir o trabalho noturno, entre 21h e 6h. Posteriormente, em 1824 foram reconhecidos, ainda, os sindicatos.
Em 1864, foi reconhecido o direito de greve na França; já em 1881, na Alemanha, os seguros sociais o foram.
Sensibilizado por toda a exploração sofrida pelo homem, em 1891, o Papa Leão XIII publica a Encíclica Rerum Novarum, segundo a qual “não pode haver capital sem trabalho, nem trabalho sem capital”. Assim, a Igreja Católica, procurando estabelecer regras de convivência entre capital e trabalho, contribuiu para as relações trabalhistas trazendo regras que fixassem um salário mínimo e uma jornada máxima, buscando, também, a intervenção estatal.
A primeira Constituição mundial a proteger direitos dos trabalhadores foi a Constituição do México, em 1917, seguida pela Constituição de Weimar, em 1919.
O ano de 1919 foi marcado também pela criação da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que institui regras de obediência mundial de proteção ao trabalho.
Em 1927 surge a Carta Del Lavoro, Constituição italiana inspirada no corporativismo, que acabou por influenciar o sistema sindical brasileiro e a organização da Justiça do Trabalho.
No Brasil, a primeira constituição a tratar do Direito do Trabalho foi a de 1934, a qual estabeleceu a garantia à liberdade sindical, a isonomia salarial, o salário mínimo, a jornada de trabalho de oito horas e as férias anuais remuneradas.
De caráter intervencionista, em 1937 foi outorgada uma nova Constituição por Getúlio Vargas – esta constituiu o sindicato único, deu origem à contribuição sindical, vedou o direito de greve, dentre outras medidas.
Ainda no Brasil, em 1943 surge a consolidação das Leis do Trabalho (CLT), como forma de sistematizar as diversas leis trabalhistas esparsas vigentes no país. A Constituição de 1946 rompe com o intervencionismo exacerbado, trazendo caráter mais democrático. Já no ano de 1967, a nova Constituição mantém os direitos trabalhistas estabelecidos na Constituição de 1946.
1988 – é promulgada a vigente Constituição, na qual os direitos trabalhistas são amplamente tratados, fazendo-se notórios, principalmente, nos arts. 7º ao 11. A nossa Constituição trata os direitos trabalhistas como direitos sociais, parte integrante dos direitos fundamentais.
- 3. DOS PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO
Quanto à definição de princípios, Renato Saraiva assim disserta:
Princípios são proposições genéricas que servem de fundamento e inspiração para o legislador na elaboração da norma positivada, atuando também como forma de integração da norma, suprindo as lacunas e omissões da lei, exercendo, ainda, importante função, operando como baliza orientadora na interpretação de determinado dispositivo pelo operador de Direito.
Os princípios exercem, pois, uma tríplice função: informativa, normativa e interpretativa.4
No que tange à analise acerca da ofensa à dignidade do trabalhador, in casu, do motorista Uber, se faz necessária a apresentação dos princípios atinentes ao Direito do Trabalho, para embasar os argumentos esposados ao longo deste trabalho de conclusão.
3.1. PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO
Em sua obra sobre Direito do Trabalho, Mauricio Godinho leciona que “Informa este princípio que o Direito do Trabalho estrutura em seu interior, com suas regras, institutos, princípios e presunções próprias, uma teia de proteção à parte hipossuficiente na relação empregatícia – o obreiro -, visando retificar (ou atenuar), no plano jurídico, o desequilíbrio inerente ao plano fático do contrato de trabalho.”5 Portanto, o Princípio da Proteção visa proteger o trabalhador, atenuando o desequilíbrio existente no universo das relações de emprego. Assim, orienta o desenvolvimento do Direito do Trabalho.
Este princípio tem como objetivo o equilíbrio entre os sujeitos do contrato de trabalho, visto que há uma desigualdade no pacto laboral existente entre empregador e empregado – desigualdade esta decorrente do conflito entre capital e trabalho.
O Princípio da Proteção se subdivide, ainda, em outros três princípios, quais sejam:
- a) In Dubio pro Operario;
- b) Da Aplicação da Norma mais Favorável;
- c) Da Condição mais Benéfica.
Todavia, conforme as lições do renomado autor, o princípio tutelar não somente se desdobraria em três outros, mas inspiraria todo o complexo de regras, princípios e institutos que compõem esse ramo jurídico especializado.
3.2. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO OPERARIO (OU PRO MISERO) Desdobramento do princípio da proteção, o Princípio do In Dubio pro Operario é uma adaptação do Princípio do In Dubio Pro Reo, da seara do Direito Penal.
Quando da existência de dúvida quanto à aplicação do direito, o julgador deverá interpretar a norma em favor do empregado, pois este é parte hipossuficiente na relação empregatícia.
Insta salientar que o princípio em questão não se aplica ao campo probatório, uma vez que cabe ao autor o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu direito, cabendo ao réu a prova do fato modificativo, extintivo ou impeditivo do direito do autor, conforme artigos 818 da CLT e 333 do CPC, colacionados a seguir:
Art. 818/CLT. A prova das alegações incumbe à parte que as fizer.6
Art. 373/CPC. O ônus da prova incumbe:
I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.7
3.3. PRINCÍPIO DA CONDIÇÃO MAIS BENÉFICA
Decorrente do Princípio da Proteção, o Princípio em questão dispõe que uma condição de trabalho mais benéfica não pode ser substituída por outra condição menos vantajosa. Ou seja, a cláusula contratual mais vantajosa deve ser sempre preservada.
O Princípio da Condição mais Benéfica está agasalhado no art. 5º, XXXVI, da CRFB, a seguir:
Art. 5º, XXXVI/CF/88: a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.8
Já na CLT, encontramos a reprodução do mandamento no art. 468:
Art. 468 – Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.9
No mesmo sentido, as súmulas 51, I, e 288 do TST10:
Súmula 51. Norma regulamentar. Vantagens e opção pelo novo regulamento. Art. 468 da CLT.
I – As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento.
II – Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro.
Súmula 288. Complementação dos proventos de aposentadoria. A complementação dos proventos da aposentadoria é regida pelas normas em vigor na data da admissão do empregado, observando-se as alterações posteriores desde que mais favoráveis ao beneficiário do direito.
Assim, não haverá, na hipótese, conflito entre normas, e sim entre cláusulas contratuais.
3.4. PRINCÍPIO DA NORMA MAIS FAVORÁVEL
Decorrente do princípio da proteção, o Princípio da Norma mais Favorável versa no sentido de que havendo duas ou mais normas sobre a mesma matéria, ao caso concreto será aplicada a mais benéfica para o trabalhador.
Sobre a aplicação da norma mais favorável ao trabalhador, o art. 620 da CLT dispõe:
Art. 620. As condições estabelecidas em convenção, quando mais favoráveis, prevalecerão sobre as estipuladas em Acordo.11
Tal Princípio atua na elaboração, hierarquização e interpretação das regras jurídicas, de forma que o Direito do Trabalho não adota o sistema clássico de hierarquia das normas, e sim um modelo de hierarquia dinâmico, consistente na aplicação prioritária das normas que sejam mais favoráveis ao trabalhador, salvo disposição legal que disponha o contrário.
Sobre o tema, os autores Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino mencionam que:
Como corolário desse princípio, a Constituição permite, salvo as exceções expressas de seu texto, que normas e condições de trabalho mais vantajosas para os trabalhadores, conferindo direitos acima dos constitucionalmente previstos, venham a ser criadas pelas normas inferiores do escalonamento jurídico. Em regra, as condições mais benéficas ao trabalhador serão sempre preservadas, ainda que norma jurídica posterior estabeleça condições menos favoráveis.
Se a lei ordinária garante férias anuais de trinta dias e a convenção coletiva assegura férias anuais de sessenta dias, esta última será a “norma fundamental” a ser aplicada à categoria profissional a que se refira a convenção. Se a Constituição dispõe que o descanso semanal remunerado será preferivelmente aos domingos e o regulamento da empresa dispuser que o repouso será aos sábados e domingos, esta última norma será a “fundamental” para os trabalhadores daquela empresa. Se o contrato individual de trabalho garantir a remuneração das horas extras com adicional de 100% sobre a hora normal e a Constituição assegurar o acréscimo de apenas 50%, o contrato individual será a norma aplicável.12
Os referidos autores apontam, ainda, para outra função do Princípio em questão, qual seja a de interpretação das normas jurídicas quando identificada obscuridade de determinado dispositivo. Quando houver dificuldade quanto ao significado de norma jurídica, deverá se optar pela interpretação que confira sentido mais favorável ao trabalhador.
Neste sentido, é a lição do doutrinador Renato Saraiva:
O citado princípio atua em três momentos distintos, a seguir enumerados:
- Aplica-se a norma mais favorável na elaboração da regra jurídica, na qual as novas disposições legais devem estabelecer regras mais favoráveis aos trabalhadores, determinação essa que se encontra implícita no caput do art.
7.” da Carta maior, que menciona “… além de outros que visem à melhoria de sua condição social”.
- Emprega-se a norma mais favorável na hierarquização das regras jurídicas dos dispositivos confrontados, no sentido de que havendo vários dispositivos legais numa escala hierárquica, aplica-se o que for mais favorável ao trabalhador, independente de sua posição na escala.
- Aplica-se a norma mais favorável na interpretação das regras jurídicas, quando antepostas ao intérprete duas ou mais vertentes interpretativas de determinado dispositivo legal.13
Tal Princípio, contudo admite exceções. A primeira, quanto às leis governamentais proibitivas, pois “o Estado, mediante lei, pode vedar que por meio de outras normas jurídicas seja dispensado um tratamento mais benéfico para o trabalhador.”14.
A segunda exceção trata das leis de ordem pública, que não podem ser contrariadas ao argumento de preservação da norma mais favorável ainda que não sejam expressamente proibitivas.
3.5. DA IRRENUNCIABILIDADE DOS DIREITOS TRABALHISTAS
O Princípio da Irrenunciabilidade de Direitos dispõe que, via de regra, os direitos trabalhistas não irrenunciáveis e indisponíveis, não podendo ser submetidos a transação.
A Consolidação das Leis do Trabalho, em seu art. 9º prescreve:
Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.15
E ainda reforça o Princípio em tela no art. 467:
Em caso de rescisão de contrato de trabalho, havendo controvérsia sobre o montante das verbas rescisórias, o empregador é obrigado a pagar ao trabalhador, à data do comparecimento à Justiça do Trabalho, a parte incontroversa dessas verbas, sob pena de pagá-las acrescidas de cinqüenta
por cento”.16
Neste sentido, temos como exemplo o trabalhador que renuncia ao 13º salário e às férias: mesmo que ele firme cláusulas dispondo de tais direitos, este ato não terá validade jurídica, podendo o trabalhador, posteriormente, reclamá-los perante a Justiça do Trabalho.
Reforçando a conceituação, temos nas lições do autor Mauricio Godinho que: A indisponibilidade inata aos direitos trabalhistas constitui-se talvez no veículo principal utilizado pelo Direito do Trabalho para tentar igualizar, no plano jurídico, a assincronia clássica existente entre os sujeitos da relação socioeconômica de emprego. O aparente contingenciamento da liberdade obreira que resultaria da observância desse princípio desponta, na verdade, como instrumento hábil a assegurar efetiva liberdade no contexto da relação empregatícia: é que aquele contingenciamento atenua ao sujeito individual obreiro a inevitável restrição de vontade que naturalmente tem perante o sujeito coletivo empresarial.17
Portanto, o objetivo do Princípio da Irrenunciabilidade dos Direitos do Trabalho é basicamente impedir a renúncia por parte dos empregados frente às empresas para que estas não se utilizem de meios fraudulentos para auferir vantagens.
3.6. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE
Pelo princípio da primazia da realidade, os fatos valem mais do que meros documentos ou ajustes formalmente pactuados, logo o operador do direito deve levar em consideração a verdade real sobre a formal ou documental; ou seja: o que verdadeiramente importa é a intenção das partes.
3.7. PRINCÍPIO DA IMPERATIVIDADE DAS NORMAS TRABALHISTAS Acerca do Princípio da imperatividade das normas trabalhistas, leciona Maurício Godinho Delgado:
(…) prevalece a restrição à autonomia da vontade no contrato trabalhista, em contraponto à diretriz civil de soberania das partes no ajuste das condições contratuais. Esta restrição é tida como instrumento assecuratório eficaz das garantias fundamentais ao trabalhador, em face do desequilíbrio de poderes inerentes ao contrato de emprego.18
3.8. PRINCÍPIO DA IRREDUTIBILIDADE SALARIAL
O art. 7º, inciso VI da CRFB assim dispõe:
“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (…)
VI – irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;”19
Em razão do teor do artigo retro, o Princípio da Irredutibilidade salarial possui caráter relativo, uma vez que salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo, é direito do trabalhador urbano e rural a irredutibilidade do salário.
Sobre o tema, a Orientação Jurisprudencial 358 da SDI-1 do TST versa que:
- 35 Salário mínimo e piso salarial proporcional à jornada reduzida. Possibilidade. Havendo contratação para cumprimento de jornada reduzida, inferior à previsão constitucional de oito horas diárias ou quarenta e quatro semanais, é lícito o pagamento do piso salarial ou do salário mínimo proporcional ao tempo trabalhado.20
Todavia, em que pese a brecha prevista na Constituição, a irredutibilidade salarial é a regra.
3.9. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA RELAÇÃO DE EMPREGO
por tal princípio extrai-se, basicamente, que, em regra, os contratos de trabalho devem ser pactuados por prazo de validade indeterminado.
Desta forma, os contratos presumem-se por prazo indeterminado, devendo o contrário ser aprovado.
O princípio da continuidade da relação de emprego tem por objetivo dar garantias ao empregado, de que este terá seu contrato de trabalho preservado, evitando-se que o empregador adote sucessivos contratos por prazo determinado, o que costuma restringir muitos dos direitos trabalhistas.
Acerca do Princípio em comento, cabe transcrever o ponto relevante levantado pelo ilustre autor Renato Saraiva, em sua obra Direito do Trabalho para
Concursos Públicos:
É bem verdade que a CF11988, ao consagrar definitivamente o FGTS como regime obrigatório, bem como ao instituir a chamada indenização compensatória para os casos de dispensa imotivada ou I arbitrária (CF11988, art. 7.O, I), enfraqueceu consideravelmente o princípio da continuidade da relação de emprego, convertendo a dispensa sem justa causa num mero ato potestativo do empregador.
Todavia, a CFl1988 previu o aviso-prévio para os casos de dispensa imotivada do trabalhador (onerando a dispensa injusta), a estabilidade do dirigente sindical (art. 8.O, VIII) e a garantia no emprego para a gestante e o cipeiro (art. 10, ADCT), os quais valorizam, sem dúvida, o princípio em comento.
Neste sentido, é a Súmula 212 do TST:
- 21 Despedimento. Ônus da prova. O ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado.21
Ilustrando a força do Princípio da continuidade da relação de emprego, temos
que a celebração de contratos de trabalho de prazo determinado apenas pode ocorrer em decorrência da lei.
3.10. PRINCÍPIO DA INALTERABILIDADE CONTRATUAL LESIVA
Por fim, o Princípio da Inalterabilidade Contratual Lesiva versa sobre a impossibilidade de alteração do contrato para prejudicar o empregado, mesmo que tal alteração implique em prejuízo à atividade da empresa.
Com tal princípio busca-se preservar a máxima pacta sunt servanda, na qual “os pactos devem ser cumpridos”. Desta forma, os riscos do negócio são do empregador, não podendo haver a redução de suas responsabilidades em virtude de dificuldades havidas do seu empreendimento.
O art. 468 da CLT dispõe que só é lícita a alteração das condições pactuadas nos contratos quando há mútuo consentimento das partes e desde que não traga prejuízo ao trabalhador:
Art. 468. Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim, desde que
não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.22
Todavia, acerca do tema, vale destacar o seguinte trecho reproduzido da obra
de Renato Saraiva:
Por outro lado, não se pode esquecer que o empregador possui o poder de gestão, de mando e comando na direção da empresa, assumindo também os riscos da atividade econômica (CLT, art. 2.”), haja vista que o empregado presta serviços por conta alheia (princípio da alteridade).
Em função disso, a doutrina permite que o empregador promova, no exercício da gestão da empresa, pequenas variações no contrato de trabalho, de maneira unilateral (jus variandi), desde que não causem prejuízos ao empregado, sob pena de imediata resistência do obreiro,
inclusive com a busca da tutela jurisdicional (jus resistenciae).23
- 4. O PAPEL DA UBER NA ERA DA FLEXIBILIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO
O juiz Márcio Toledo Gonçalves, da 33ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, primeiro do país a reconhecer o vínculo empregatício entre Uber e motorista, criou um termo para denominar esta nova forma de relação – uberização.24
Para o magistrado, tal fenômeno é resultado de uma nova forma de organização do trabalho, resultante dos avanços da tecnologia. Por tal motivo, é importante analisar-se as relações advindas dessa evolução tecnológica, para compreender os desdobramentos, dentro das relações de trabalho, do uso das tecnologias disruptivas. Para tanto, o juiz sentenciante elabora um contexto histórico, que merece ser transcrito a seguir:
A princípio, é importante uma rápida contextualização histórica deste novo fenômeno. Na denominada sociedade urbana industrial podemos identificar a existência de três formas de organização do trabalho: a primeira foi criada pelo empresário norte-americano Henry Ford em 1914, o chamado fordismo, que representou a organização do trabalho em um sistema baseado numa linha de montagem em grandes plantas industriais. Havia ali certa homogeneização das reivindicações dos trabalhadores porque eles passavam a se encontrar sob o mesmo chão de fábrica, submetidos às mesmas condições de trabalho.
A partir da década de 1960, com o esgotamento do modelo fordista, disseminou-se um novo sistema de organização dos meios de produção denominado toyotismo. O sistema Toyota de produção, que também tinha como referência a montagem de um automóvel, quebrou o paradigma da produção em massa, de modo a fragmentar o processo produtivo, reunindo assim diferentes contratos de trabalho no mesmo empreendimento, além de diferentes empresas especializadas nessa parcialização da produção. Havia uma prevalência da heterogeneidade na regulamentação das condições de trabalho dada a distinção feita entre os trabalhadores diretamente contratados por uma montadora e os contratados pelas demais empresas
que prestavam serviços conexos ou periféricos, tais como vigilância,
limpeza e constituição de peças utilizadas na montagem do veículo. Como desdobramento dessa segunda fase, em meados dos anos de 1970, por causa da Crise do Petróleo de 1973 e de outras tantas razões próprias das dinâmicas cíclicas do capitalismo, iniciou-se uma grave crise econômica, propiciando a propagação da terceirização irrestrita tanto na indústria, como no setor de serviços.
Agora, estamos diante de um novo modelo de organização do trabalho.25
Pontua o magistrado que o fenômeno da “uberização” surgiu na segunda década do século XXI, e que apesar de por ora ocupar o seguimento dos transportes, a mesma forma de relação tende a se estender para diversos outros setores da atividade econômica. Justifica, ainda, o emprego do termo em função de a empresa tratar-se do “arquétipo desse atual modelo, firmado na tentativa de autonomização dos contratos de trabalho e na utilização de inovações disruptivas
nas formas de produção”26.
Ressalta que o trabalho humano nasceu e, ao longo da história, se desenvolveu sob a égide do desenvolvimento da tecnologia, sendo esta, inclusive, uma das marcas do capitalismo.
Todavia, mister se faz perceber que com o processo de evolução tecnológica do capitalismo existe um modo de extração do valor da força de trabalho, ao passo que o Direito do Trabalho é fundamental na busca por normas construtoras de direitos, bem como na preservação do respeito às garantias do trabalhador. Nas palavras do magistrado, a importância deste ramo se dá na “mediação no âmbito do capitalismo e que tem como objetivo constituir uma regulação do mercado de trabalho de forma a preservar um ‘patamar civilizatório mínimo’ por meio da aplicação de princípios, direitos fundamentais e estruturas normativas que visam
manter a dignidade do trabalhador.”27.
Na esteira do brilhante raciocínio construído pelo magistrado Márcio Toledo Gonçalves, este trabalho objetiva buscar o entendimento desta nova forma de exploração de capital, que acaba por protagonizar a criação de novas relações de trabalho não existentes a décadas atrás. Em suas palavras, “qualquer processo econômico que possua, em sua essência material, extração e apropriação do labor que produz mercadorias e serviços atrairá a aplicação deste conjunto normativo, sob risco de, em não o fazendo, precipitar-se em retrocesso civilizatório.”.
Assim, em que pese os entendimentos diversos dos esposados neste trabalho de conclusão, como também dos defendidos por alguns juízos da Justiça do Trabalho, é necessário que o Direito do Trabalho se atualize das novas demandas advindas do implemento de novas tecnologias, sob pena de ofensa à dignidade do trabalhador do século atual.
- 5. A FLEXIBILIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO A PARTIR DA GLOBALIZAÇÃO
O Direito do Trabalho surgiu em decorrência da necessidade de interferência do Estado nas relações entre empregador e empregado, de forma a estabelecer um mínimo de equidade, tendo em vista as desigualdades jurídicas e econômicas existentes entre eles.
Assim, as primeiras normas criadas refletiam o cunho fortemente intervencionista do Estado em tais relações, o que foi essencial para o desenvolvimento de condições mínimas de trabalho. Como ilustração deste período, no Brasil, podemos citar a Constituição de 1934, que incorporou em seu texto os direitos consagrados na legislação trabalhista, tais como jornada de oito horas de trabalho, férias e descanso semanal remunerados, proteção ao trabalho do menor e da mulher, dentre outros. O então presidente, Getúlio Dornelles Vargas, a partir da década de 30 começou a regulamentar algumas das demandas da classe trabalhadora decorrentes de décadas de exploração.
Todavia, durante as décadas de 80 e 90, com o fenômeno da globalização, houve uma reavaliação de tal política, que levou à reflexão acerca do caráter extremamente intervencionista que vinha se impondo perante as relações trabalhistas. Começou-se a debater acerca das consequências que direitos rígidos podem trazer para o mercado de trabalho. Como destacado pelos autores Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino:
(…) a inaudita expansão das relações comerciais entre os países, o livre e rápido trânsito internacional de capitais, bens e serviços, característicos do que se convencionou denominar globalização, passou a possibilitar uma competição direta e acirrada entre as empresas de quase todos os países. Para serem bem-sucedidas nessa competição, é evidente que elementos como produtividade e despesas de produção são essenciais. Relativamente às despesas de produção, avulta em importância o custo da mão de obra. É muito difícil uma empresa conseguir um preço final competitivo para seus produtos, caso necessite pagar bons salários e ainda uma infinidade de pesadas contribuições para benefícios trabalhistas e previdenciários, enquanto outras empresas, localizadas, por exemplo, na China, pagam salários irrisórios e têm muitos menores custos indiretos relativos a seus empregos.28 ainda complementam:
O resultado dessa realidade é a inexorável constatação de que não adianta criar-se um sistema trabalhista utópico, em que sejam previstos maravilhosos benefícios aos empregados, fora da realidade mundial, se, com isso, resultar impossibilitada a competitividade das empresas do país em que houver sido adotado tal sistema descompassado da realidade.29
Conforme asseverado por Arnaldo Süssekind na conferência de abertura do Fórum Internacional sobre Flexibilização no Direito do Trabalho (07/04/2003)30, o fenômeno da globalização desencadeou uma concorrência mundial que passou a exigir maior produtividade por parte das empresas, bem como a melhor qualidade dos seus produtos, além da redução dos custos para favorecer a essa concorrência. Após a Primeira Guerra Mundial, a produção das grandes empresas se dava desde a matéria prima até o comércio e o transporte; todavia, com a globalização, a dinâmica mudou, passando de uma estrutura vertical, para horizontal – as empresas passaram a adotar estratégias visando maior produtividade e menor custo de seus
produtos. Assim, os empresários passaram a concentrar seus esforços no desenvolvimento da atividade fim, deixando a cargo de outras empresas (subcontratação) os demais segmentos da produção, dando espaço para a terceirização.
Não há dúvidas de que a globalização e o desenvolvimento de novas tecnologias trouxe uma revolução às nossas sociedades no âmbito das relações de trabalho, seja extinguindo e criando novos postos, seja aprimorando-os. Porém, é incontestável que a partir de todos estes fenômenos, houve certa redução de direitos e condições contratuais de trabalho, acarretando revogação de leis, ou autorizando a flexibilização da aplicação da lei.
Em meio à tentativa das empresas de se adequarem à nova realidade capitalista e à ordem de consumo, a flexibilização das normas do Direito do Trabalho
visa assegurar a elas sua sobrevivência. Já no que diz respeito aos trabalhadores, a flexibilização surge como saída para o desemprego elevado, respeitando, todavia, direitos mínimos.
Insta salientar que, nas lições de Sérgio Pinto Martins, a flexibilização difere da chamada desregulamentação, uma vez que esta se caracteriza como uma forma mais radical de flexibilização, na qual o Estado retira do trabalhador toda proteção a ele conferida, o que inclui os direitos mínimos. Assim, permite-se aos empresários regularem todas as condições, obrigações e direitos decorrentes da relação entre empregador e empregado.31
No que tange o direito do trabalho, um acirrado debate vem sendo travado
entre os defensores do Estado social e dos adeptos do liberalismo, pois os primeiros defendem a intervenção estatal nas relações de trabalho para garantir a preservação dos princípios formadores da justiça social e da dignidade humana, podendo ampliar tais direitos através de negociações coletivas.
Em contrapartida, os neoliberais pregam a não interferência do Estado nas relações de emprego, o que significa que o Estado deveria, sempre que possível desregulamentar o Direito do Trabalho, deixando a cargo dos empresários as condições e regras de emprego sejam ditadas basicamente pelas leis do mercado.
É em meio a este cenário de novas tecnologias e de inovação dos postos de trabalho e relações de emprego, que surge a figura do motorista da Uber.
- 6. A ESTRUTURA DA UBER
A Uber é uma empresa multinacional norte-americana, que se caracteriza como prestadora de serviços eletrônicos na área de transporte urbano privado, baseada em tecnologia disruptiva em rede, através do E-hailing, por meio do qual se pode requisitar um táxi através de um dispositivo eletrônico, como um smartphone, por exemplo.
O serviço de transporte possui algumas categorias, que podem ser escolhidas conforme deseja o usuário, a seguir:
UberX: é o principal serviço da Uber – possui tarifa econômica e grande disponibilidade de carros.
Uber Black: é o serviço Premium da Uber, que conta apenas com carros de luxo nas cores prata ou preta, possuindo valor de tarifa alto.
UberPET: é um serviço projetado para locomoção de animais de estimação, que possui valor de tarifa alterada.
UberBag: se destina a atender clientes que tenham bagagens ou objetos em grande quantidade a serem transportados.
UberBike: serviço destinado ao transporte de bicicletas.
UberEats: mais novo serviço da Uber, que se destina à entrega de comida. Nos termos e condições do serviço Uber, constantes de seu sítio oficial, os
serviços são assim definidos:
Os Serviços integram uma plataforma de tecnologia que permite aos(às) Usuários(as) de aplicativos móveis ou sítios de Internet da Uber, fornecidos como parte dos Serviços (cada qual um “Aplicativo”), providenciar e programar Serviços de transporte e/ou logística e/ou compra de certos bens com terceiros provedores independentes desses Serviços, inclusive terceiros fornecedores independentes de transporte, terceiros fornecedores independentes de logística e terceiros fornecedores independentes de bens, mediante contrato com a Uber ou determinadas Afiliadas da Uber (“Prestadores Terceiros”). A menos que diversamente acordado pela Uber em contrato escrito em separado firmado com você, os Serviços são disponibilizados para seu uso pessoal e não comercial. VOCÊ RECONHECE QUE A UBER NÃO É FORNECEDORA DE BENS, NÃO PRESTA SERVIÇOS DE TRANSPORTE OU LOGÍSTICA, NEM FUNCIONA COMO TRANSPORTADORA, E QUE TODOS ESSES SERVIÇOS DE TRANSPORTE OU LOGÍSTICA SÃO PRESTADOS POR PRESTADORES TERCEIROS INDEPENDENTES QUE NÃO SÃO EMPREGADOS(AS) E NEM REPRESENTANTES DA UBER, NEM DE QUALQUER DE SUAS AFILIADAS.32
A empresa sustenta, portanto que inexiste relação de trabalho entre os motoristas, denominados “parceiros” e aquela. A Uber alega que é ela quem presta serviços aos motoristas, oferecendo a eles o uso da plataforma e do aplicativo, de modo a fomentar a atividade desses mesmos motoristas, na prestação do serviço de transporte diretamente aos passageiros. O contrato entre motorista e a Uber tende a mostrar que a empresa fornece serviços de tecnologia e não de transporte.
Nesse sentido, o juízo da 37ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, no autos da Ação Trabalhista de Nº 0011863-62.2016.5.03.0137, entendeu que não há relação empregatícia entre a Uber e os motoristas da respectiva plataforma, sob o seguinte fundamento:
Segundo se infere dos arts. 2º e 3º da CLT, os pressupostos para a caracterização da relação de emprego são a pessoalidade, a subordinação jurídica, a onerosidade e a não eventualidade na prestação dos serviços. Apenas o somatório de todos esses pressupostos tem por consequência a caracterização do vínculo de emprego.
No caso, o conjunto probatório produzido revela a ausência de subordinação do reclamante para com as reclamadas, o que inviabiliza o pretendido reconhecimento do vínculo empregatício.
De fato, a subordinação jurídica consiste “na situação jurídica derivada do contrato de trabalho, pela qual o empregado compromete-se a acolher o poder de direção empresarial no modo de realização de sua prestação de serviços” (DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabaho. 14. ed. São Paulo: LTr, 2015, p. 311). Ou seja, a subordinação jurídica se refere ao dever que o empregado tem de acatar as ordens dadas pelo empregador no que diz respeito ao modo da prestação dos serviços. Não se confunde com a subordinação jurídica a mera existência de obrigações contratuais entre as partes – o que é comum em todo tipo de contrato -, sendo, na verdade, fundamental que o próprio modo da prestação de serviços seja dirigido pela outra parte para que esteja configurada a subordinação a que se refere o art. 3º, caput, da CLT.33
Conforme exposto pelo magistrado, a empresa não dava ordens, tão somente exibia vídeos institucionais instruindo acerca do melhor modo de tratar o cliente para que os motoristas recebessem melhores avaliações dos próprios clientes. Mais além, poder desligar o aplicativo a hora que quisesse e escolher o horário para trabalhar, para o juiz, são outros elementos que demonstram não haver relação de emprego. Por fim, afirma que qualquer contrato prevê deveres de ambas as partes e a existência de uma regra a ser cumprida não configura a relação automaticamente como a de emprego.
O principal argumento contrário à existência do vínculo entre o motorista e a Uber é o de que aquele tem total liberdade quanto a sua jornada de trabalho, que é absolutamente flexível. O motorista da plataforma pode trabalhar quando e o quanto desejar. Essa característica é um traço marcante da autonomia da prestação do trabalho.
A empresa afirma que não presta serviços de transporte, não funciona como transportadora, nem opera como agente para o transporte de passageiro, conforme se infere dos seus próprios Termos e Condições.
A todo o tempo alega que, na verdade, é ela quem presta serviços aos motoristas a ela vinculados, sendo estes, usuários da plataforma disponibilizada. Porém, o ponto auge de tal questão é o atinente à subordinação – para a Uber, os motoristas são profissionais autônomos sem nenhuma exclusividade. Nas ações trabalhistas a defesa da Uber argumenta que presta serviço aos motoristas, consistente em, por meio de uma plataforma digital, incrementar a capacidade de eles angariarem passageiros. Mais além, reforça que os motoristas dirigem quando querem, tendo com única exigência para a manutenção da parceria “a constante promoção de experiências positivas para os usuários“. De igual forma, os motoristas possuem completa autonomia para o estabelecimento dos dias e horários nos quais pretende se conectar ao aplicativo para atender aos usuários que buscam o serviço de transporte individual privado.
Por fim, a Uber alega que, ao ser selecionado como motorista parceiro, este
concorda livremente com as condições que lhe são oferecidas para a utilização da
Horizonte, 30 de janeiro de 2017. Disponível em <
http://www.migalhas.com.br/arquivos/2017/2/art20170202-11.pdf> Acesso em: 10 abr. 2017.
plataforma, bem como que é este quem remunera a empresa pela utilização do aplicativo.
Todavia, como explicitado neste trabalho até o momento, um dos objetivos é demonstrar exatamente o contrário: que a Uber oferece o transporte de passageiros, sendo o aplicativo um instrumento ao bom funcionamento do serviço por estes contratado. Para tanto, cabe colacionar um trecho da sentença proferida pelo Juízo da 13ª Vara do Trabalho de São Paulo, que reconheceu o vínculo empregatício entre o autor (motorista) e Uber:
(…) recorde-se que o modelo capitalista de sociedade se ampara em uma célula fundamental: a forma mercadoria. Daí a referência ao produto sentido amplo, que abrange a noção de serviço oferecido no mercado. Em linhas gerais, o capital é investido na produção de mercadorias, e a circulação destas gera a extração de um excedente; parte do excedente é reinvestida na produção (daí a reprodução do modelo), e outra parte é acumulada pelo capitalista na forma de lucro. É dessa forma básica que são derivadas as relações sociais capitalistas. No que mais importa no caso concreto, para compreender a natureza da relação jurídica de que se trata, a questão é indicar qual é a mercadoria de que a ré extrai o seu excedente econômico.
E a resposta deve ser enunciada de maneira clara: a mercadoria da ré é o serviço de transporte. Nenhuma dúvida me ocorre quanto a isso. Não é por outra razão que é da ré (e não do motorista) o poder fundamental de quantificar o valor na circulação da mercadoria. É a ré que fixa o preço do serviço de transporte que o passageiro irá pagar.
Note-se que a tese da ré (de que a mercadoria da empresa não é o transporte, mas sim o próprio aplicativo) implicaria a noção de que o seu excedente seria gerado a partir da operação de fornecimento da plataforma aos supostos clientes motoristas. Ou seja, deveria haver um valor fixo, uma mensalidade, por exemplo, paga pelos motoristas em razão do uso da plataforma. Mas isso não ocorre: o valor que cabe à empresa é extraído do serviço de transporte prestado ao consumidor passageiro. Logo, como o excedente do capitalista é extraído na circulação da sua mercadoria, conclui-se com segurança que a mercadoria com que a ré atua não é o aplicativo, e sim o serviço de transporte.34.
Nesse sentido, a fixação do valor das corridas é feita pela empresa e não pelo motorista, o que corrobora para a conclusão de que se a relação jurídica fosse apenas entre passageiro e motorista, haveria uma negociação entre estas duas pessoas acerca do valor a ser recebido. Pelo contrário, o motorista da Uber sequer sabe o valor do serviço por ele prestado, só tomando conhecimento de tal quando a corrida é encerrada.
Do exposto, com todas as vênias, não há como concluir de forma diversa. A empresa Uber atua na prestação de serviços de transporte por meio de uma plataforma que visa captar clientes e, para isto, usa a mão de obra de motoristas cadastrados.
De igual forma, conforme salientado pelo magistrado Eduardo Rockenbach Pires, a Uber atua em diversos países além do Brasil e decisões oriundas do Estado da Califórnia e do Reino Unido demonstram que o entendimento estrangeiro tem sido no sentido de que a empresa atua na exploração de serviços de transporte.
- 7. UM BREVE PANORAMA DO RECONHECIMENTO DAS RELAÇÕES DE EMPREGO UBER X MOTORISTA NO EXTERIOR
A Comissão do Trabalho da Califórnia (EUA), após uma petição ajuizada por Barbara Ann Berwick, anunciou em 17/06/16 uma decisão que afirma que a mesma é empregada da empresa Uber e não apenas prestadora de serviços autônoma.
Na decisão, a Comissão afirmou que por estar “envolvida em todos os aspectos da operação” a relação entre Barbara e a empresa configura vínculo empregatício. A comissária do trabalho Stephanie Barrett rejeitou o argumento de a Uber se classificar como empresa de tecnologia de economia partilhada e decidiu que a motorista tinha direito à indenização.
Da mesma forma como ocorre nas ações correntes no Brasil, a Uber alegou à Comissão que seus motoristas são prestadores de serviços, serviços estes que na verdade constituem uma plataforma de tecnologia neutra, a qual conecta o motorista ao usuário (passageiro), servindo como ponte entre estes dois. Que, além disto, os motoristas vinculados ao aplicativo podem utilizá-lo quando e por quanto tempo julgarem necessários. Mais além, a empresa afirmou também que o “parceiro uber” pode ficar desconectado da plataforma por até 180 dias, quando ocorre a inativação da conta, que pode ser reativada posteriormente por solicitação via e-mail ou física, conforme trecho a seguir:
Product Manager Brian Tolkin testified that Defendant Uber is a technological platform, a smart phone application that private vehicle drivers (“Transportation Providers”) and passengers use to facilitate private transactions. Defendant Uber provides administrative support to the two parties: the passengers and the Transportation Providers. The Transportation Provider uses the application whenever she wishes to notify passengers that she is available to transport them. The passenger signs on to the application and requests a ride. When the Transportation Provider accepts the request, the model of the car and Picture of the Transportation Provider appears on the passenger’s device, so that the passenger can identify her hide.
Defendants argued that they do not exert any control over the hours Plaintiff worked. There is no minimum number of required trips. However, if a Transportation Provider is inactive for 180 days, the smart phone application expires and will remain inactive until the Transportation Provider applies in person or by email to reactivate it. A Transportation Provider is required to obtain a permit to carry passengers for a fee from the California Public
Utilities Commission.35
No mesmo sentido das ações trabalhistas que reconheceram o vínculo empregatício, a Comissão do Trabalho da Califórnia concluiu que a empresa controla as ferramentas que os motoristas usam, monitorando-os por meio de classificação em estrelas, classificação esta que, se abaixo de 4,6 pode resultar em encerramento do acesso ao aplicativo. Mais além, afirma que o motorista não possui autonomia para definir o valor das corridas, algo que é estipulado pela própria Uber, que inclusive, se um Assim, merece ser colacionado trecho da decisão proferida pela Comissão:
Defendants control the tools the drivers use; for example, drivers must register their cars with Defendants, and none of their cars can be more than ten years old. Defendants refer to “industry standards” with respect to drivers’ cars, however, it is unclear to what industry, other than the “taxi” industry, Defendants are referring. Defendants monitor the Transportation Drivers’ approval ratings and terminate their access to the application if the rating falls below a specific level. (4.6 stars).
(…)
The passengers pay Defendants a set price for the trip, and Defendants, in turn, pay their drivers a non-negotiable service fee. If a passenger cancels a trip request after the driver has accepted it, and the driver has appeared at the pick-up location, the driver is not guaranteed a cancellation fee. Defendants alone have the discretion to negotiate this fee with the passenger. Defendants discourage drivers from accepting tips because it would be counterproductive do Defendants’ advertising and marketing strategy.36
Não só na Califórnia, EUA, foi proferida decisão neste sentido. O Employment Tribunals, Tribunal do Reino Unido, em uma ação proposta por motoristas da Uber contra a controladora sediada na Holanda e outras duas que operam no Reino Unido – Uber London Ltd e Uber Brittania Ltd, reconheceu que os motoristas devem ser considerados empregados e não autônomos.
Na mesma forma como feita aqui no Brasil, o referido Tribunal analisou preliminarmente o negócio da Uber, tendo em vista o argumento amplamente divulgado pela empresa, o de que apenas presta serviços de tecnologia.
No início de sua fundamentação, o Tribunal advertiu que qualquer organização (i) que gerencie uma empresa em cujo “coração” está a função de transportar pessoas em veículos motorizados, (ii) que opere em parte por meio de companhia que procura se desviar das responsabilidades “reguladas” aplicáveis aos transportadores privados – ou seja, os PHV – Private Hire Vehicle – operators – mas (iii) que exija dos motoristas e passageiros que concordem, por meio de contrato, que ela não provê o serviço de transporte e (iv) recorra, em seus documentos e cláusulas contratuais, a ficções, linguagem torcida (twisted language) e novas terminologias (brand new terminology) merece certo grau de ceticismo.37
Para justificar a existência da relação de trabalho entre os motoristas e a Uber, o Tribunal levantou as seguintes características da relação: (i) a Uber entrevista e recruta os motoristas; (ii) a Uber controla as informações essenciais, como o sobrenome do passageiro, informações de contato e destinação pretendida, ocultando tais informações do motorista; (iii) a Uber exige que motoristas aceitem e/ou não cancelem viagens, assegurando a eficácia desta exigência por meio da desconexão dos motoristas que violarem tais obrigações; (iv) a Uber determina uma rota padrão a ser seguida pelo motorista; (v) a Uber fixa a tarifa e o motorista não poder negociar tal valor com o passageiro; (vi) a Uber impõe inúmeras condições aos motoristas, a exemplo, a escolha de quais veículos são aceitáveis para a prestação do serviço, e ainda instruem os motoristas sobre como fazer o seu trabalho, controlando-os na execução deste; (vii) a Uber sujeita seus motoristas a determinados parâmetros que ensejam procedimentos gerenciais ou disciplinares, por meio do sistema chamado rating; (viii) a Uber determina descontos quando lhe convém, muitas das vezes sequer envolvendo o motorista cuja remuneração será afetada; (ix) a Uber aceita o risco da perda; (x) a Uber detém as queixas dos motoristas e dos passageiros; e (xi) a Uber se reserva ao poder de alterar unilateralmente os termos contratuais em relação aos motoristas.38
Segundo o Tribunal, seria absurdo imaginar a Uber como cliente do motorista, nas palavras: “And if there is a contract with Uber, it is self-evidently not a contract under which Uber is a client or customer of a business carried on by the driver. We have already explained why we regard that notion as absurd.”. Assim, todos os fatos aqui mencionados serviram para embasar a decisão de que o contrato não é estabelecido entre passageiro e motorista, mas entre este e a empresa, no qual por meio de compensação, o “parceiro uber” torna-se disponível para transportar passageiros.39
Dessa maneira, pode-se dizer que, levando em consideração a primazia da realidade, o Employment Tribunals entendeu que o verdadeiro acordo entre as partes estaria localizado no campo das relações de trabalho dependente.
Nas palavras de Ana Frazão, professora de Direito Civil e Comercial na UnB: No exemplo mencionado, analisando todas as circunstâncias de fato, entendeu o Tribunal britânico que a situação jurídica criada pelos instrumentos contratuais era mera ficção, totalmente descolada da realidade, motivo pelo qual é esta que deveria prevalecer.
Tal lição parece muito pertinente à realidade brasileira atual, em que, na ânsia de flexibilização das relações trabalhistas, tem-se buscado afastar ou mesmo negar o princípio da realidade, ainda que por meio de subterfúgios legislativos.40
No mesmo sentido do esposado acima, este trabalho de conclusão caminha para o reconhecimento do vínculo empregatício entre motorista e Uber, passando a seguir para a análise dos requisitos caracterizadores de tal relação, considerando, sobretudo, o Princípio da Primazia da Realidade.
- 8. A RELAÇÃO ENTRE UBER E MOTORISTA
8.1. DOS REQUISITOS E ELEMENTOS ESSENCIAIS AO CONTRATO DE EMPREGO
O artigo 442 da Consolidação das Leis do Trabalho dispõe que “contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego”. Em que pese ao longo da CLT haver menção às expressões “contrato de trabalho” e “relação de emprego”, pela leitura do dispositivo retro, contata-se que a CLT equiparou o contrato à relação de emprego.
Abrindo mão da distinção feita pela doutrina a respeito de tais termos, partindo-se da Teoria Contratualista, a relação de emprego possui natureza contratual – a vontade das partes de pactuar faz surgir a relação empregatícia. Do exposto, temos como requisitos caracterizadores da relação de emprego os seguintes: pessoa física, pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação.
Nas lições de Ricardo Resende na obra Direito do Trabalho Esquematizado, temos que “(…) a subordinação não é o único requisito para a caracterização da relação de emprego. Também o são a prestação de trabalho por pessoa física, a pessoalidade, a onerosidade e a não eventualidade. Isto posto, só será empregado o trabalhador que reunir todos esses requisitos na relação que mantém com o tomador de seus serviços.”41
A pessoalidade é identificada porque a pessoa do empregado é elemento determinante da contratação, não podendo este, via de regra, ser substituído na prestação laboral. Conforme lição do autor retro mencionado, a relação de emprego é marcada pela natureza intuitu personae do trabalhador face o empregador, de forma que aquele só poderá se fazer substituir por outro em caráter esporádico e com aquiescência deste.
Outro requisito essencial é a não eventualidade na prestação no qual, resumidamente, o trabalhador faça seu trabalho de forma repetida no que tange às atividades permanentes do tomador e esteja fixado juridicamente a este. Algumas teorias tentam explicar este requisito, não havendo um consenso na doutrina, contudo na esteira de Mauricio Godinho Delgado, “o trabalhador não eventual é aquele que trabalha de forma repetida, nas atividades permanentes do tomador, e a este fixado juridicamente.”42. O fazendo de forma analítica, o autor Ricardo Resende explica:
Trabalha de forma repetida: a não eventualidade pressupõe repetição do serviço, com a previsão de repetibilidade futura. Isso quer dizer que o empregado não precisa trabalhar continuamente (todos os dias), mas deve a atividade se repetir naturalmente junto ao tomador dos serviços para que possa ser considerada não eventual.
(…)
Nas atividades permanentes do tomador: ainda que o trabalho se dê por curto período determinado, será não eventual se ocorrer em atividade que possui caráter permanente na dinâmica da empresa.
Aqui interessa apenas que a atividade seja normalmente desenvolvida pelo tomador, podendo ser atividade-fim OU atividade- meio.
Fixado juridicamente: o trabalhador labora para um empregador que manipula sua energia de trabalho, ocorrendo, então, a fixação jurídica do trabalhador ao empregador. Estabelece-se entre o trabalhador e tomador um compromisso, consubstanciado no contrato de trabalho. Logo, este trabalhador é não eventual.
A não fixação jurídica do trabalhador ocorre sempre que este não entrega sua energia de trabalho ao tomador de serviços. O trabalhador avulso, por exemplo, não tem a sua energia de trabalho manipulada por tomador nenhum, razão pela qual não se fixa a ninguém.43
Quanto ao requisito da onerosidade, este significa que o contrato entre empregado e empregador é bilateral, devendo o primeiro fornecer sua força de trabalho, enquanto que o segundo deve remunerá-lo pelos serviços prestados.
Por fim, a subordinação, requisito mais importante para a caracterização da relação de emprego, advém da sujeição do empregado aos comandos do empregador, o qual assumiu os riscos do empreendimento.
Nas lições de Alice Monteiro de Barros, cujo trecho merece transcrição, temos que:
Esse poder de comando do empregador não precisa ser exercido de forma constante, tampouco torna-se necessária a vigilância técnica contínua dos trabalhos efetuados, mesmo porque, em relação aos trabalhadores intelectuais, ela é difícil de ocorrer. O importante é que haja a possibilidade de o empregador dar ordens, comandar, dirigir e fiscalizar a atividade do empregado. Em linhas gerais, o que interessa é a possibilidade que assiste ao empregador de intervir na atividade do empregado. Por isso, nem sempre a subordinação jurídica se manifesta pela submissão a horário ou pelo controle direto do cumprimento de ordens.44
Ricardo Resende ressalta que surgiu no Brasil a ideia de alargar o sentido da relação de emprego pela ampliação do conceito de subordinação, para isso cita as palavras do doutrinador Mauricio Godinho Delgado, que afirma: “estrutural é, pois, a subordinação que se manifesta pela inserção do trabalhador na dinâmica do tomador de serviços, independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento”45 .
Quanto aos elementos essenciais do contrato de trabalho, temos os mesmos necessários aos demais contratos, do direito comum, quais sejam: a) agente capaz, b) objeto lícito e possível e c) forma escrita e não defesa em lei.
Conforme o Código Civil de 2002, em seu art. 104 e incisos:
Art. 104. A validade do negócio jurídico requer: I – agente capaz;
II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III – forma prescrita ou não defesa em lei.46
Nesse sentido, concluímos que para estar completa a relação de emprego é necessária a reunião dos elementos fáticos e dos elementos essenciais. Mais além, a ausência de um dos elementos essenciais, conforme artigo supra, torna o contrato nulo. A doutrina47 exemplifica tal comando com a situação do traficante de tóxicos – o sujeito que trafica maconha, por exemplo, mesmo que exerça tal atividade com a presença de todos os elementos fáticos caracterizadores da relação de emprego, por desempenhar atividade cujo objeto é ilícito, não pode pleitear direitos oriundos de um contrato de trabalho.
Por fim, como um adendo, na esteira das lições de Renato Saraiva48, cabe ressaltar que a Emenda Constitucional 45/2004 inovou e atribuiu à Justiça do Trabalho a competência para processar e julgar qualquer relação de trabalho e não só de relação de emprego (nova redação do art. 114 da CFl1988). Assim, um pedreiro, pintor, marceneiro ou qualquer outro profissional autônomo que não receber pelos serviços prestados, mesmo não sendo empregado do tomador de serviços em função da ausência de subordinação, ajuizará eventual demanda perante a Justiça laboral. Logo, o Poder Judiciário Trabalhista passa a ter competência para análise de todos os conflitos decorrentes da relação de trabalho em sentido amplo.
8.2. DO POR QUE EXISTE RELAÇÃO DE EMPREGO ENTRE UBER E MOTORISTA
8.2.1. Pessoa física e pessoalidade
É evidente o caráter intuitu personae da relação jurídica entre motorista e a plataforma, tendo em vista, principalmente o fato de que não é permitido ao motorista ceder sua conta do aplicativo para que outra pessoa não cadastrada ou previamente autorizada realize as viagens em seu lugar. Mais além, é evidente que o motorista trata-se de pessoa física.
Nesse sentido, a sentença exarada pelo Juízo da 33ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, nos Autos de Nº 0011359-34.2016.5.03.0112 ressalta que o depoimento de uma testemunha “é absolutamente revelador quanto à presença desse pressuposto ao demonstrar que a reclamada exige prévio cadastro pessoal de cada um dos pretensos motoristas, ocasião em que devem ser enviados diversos documentos pessoais necessários para aprovação em seu quadro, tais como certificado de habilitação para exercer a função de condutor remunerado, atestados de bons antecedentes e certidões “nada consta”.”49. O depoente revelou ainda que à época de sua contratação foi, inclusive, submetido à entrevista pessoal.
O depoimento de Saadi Alves de Aquino nos autos do IC 001417.2016.01.000/6 consistiu na declaração de que “na condição de coordenador de operações, acompanhava a contratação dos motoristas na cidade do Rio de Janeiro, processo que consistia em apresentação de documentos, testes psicológicos e análise de antecedentes por empresa terceirizada.”50. Chegando o Magistrado sentenciante à conclusão de que a empresa Uber escolhia minunciosamente quem poderia integrar ou não os seus quadros, o que reforça a presença do requisito pessoalidade na relação.
Além disso, de acordo com o regulamento constante do sítio eletrônico da Uber: “Os termos e condições da Uber não permitem o compartilhamento das contas dos motoristas parceiros. O uso da sua conta por outro motorista se constitui como um sério problema de segurança. Se soubermos que um motorista não corresponde ao perfil do motorista parceiro exibido pelo aplicativo do passageiro, a conta será suspensa imediatamente e ficará pendente para investigação.” (D i s p o n í v e l e m : <https://help.uber.com/h/1d93388d-cf19-408f-9c41-43dbdd34d44/>. Acesso em: 12 de maio de 2017)
Quanto a isto, cabe transcrever a excelente percepção do Douto Magistrado quanto à proibição de se substituir um motorista por outro:
Esse tópico merece atenção especial para que não seja confundida a infungibilidade da prestação de serviços no que tange ao trabalhador com a possibilidade de compartilhamento de veículos cadastrados no sistema eletrônico da Uber.
O automóvel registrado por cada motorista em sua conta é apenas uma ferramenta de trabalho que, por sua própria natureza, não tem relação alguma de dependência com os elementos fático-jurídicos do vínculo de emprego. Assim, a permissão dada ao proprietário do veículo de vincular terceiros para dirigi-lo é absolutamente irrelevante, tratando-se apenas de uma expressão do poder diretivo daquele que organiza, controla e regulamenta a prestação dos serviços
Gonçalves. Belo Horizonte, 13 de fevereiro de 2017. Disponível em
<https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ListaProcessos.seam?numero_unic=0011359-34.2016.5.03.0112&cid=10499> Acesso em: 24 abr. 2017.
Destarte, resta mais do que claro que a Uber mantém vínculo personalíssimo com cada motorista que integra a plataforma, independentemente de este ser ou não proprietário do veículo cadastrado.
8.2.2. Onerosidade
Explicado tal requisito em tópico supra, resta também evidente a presença da onerosidade no contrato firmado entre a empresa e o motorista, uma vez que é a Uber quem o remunera. É certo que a referida plataforma se utiliza do argumento de que os motoristas são remunerados pelo contratante do serviço, sendo o papel daquela apenas o de repassar os valores devidos.
Todavia, a teor do que dispõe o Princípio da Primazia da Realidade, temos tal argumento cai por terra, pois as constantes afirmativas da Uber não correspondem à realidade dos fatos.
O Magistrado sentenciante dos Autos de Nº 0011359-34.2016.5.03.0112 é preciso ao analisar os depoimentos das testemunhas do processo, afirmando que a prova constante dos autos evidenciava que a ré (Uber) conduzia, de forma exclusiva, toda a política de pagamento do serviço prestado, o que abrange a definição do preço por quilometragem rodada e tempo de viagem, as formas de pagamento, as promoções e descontos para usuários.
É exatamente esta situação que é visualizada na realidade do motorista, que não pode dizer-se ser autônomo. Este não tem sequer a possibilidade de gerência do negócio, o que não ocorreria caso fosse ele o responsável por remunerar a plataforma.
Além do mais, conforme depoimentos dos referidos autos, aos “parceiros uber”, como são denominados, eram oferecidos prêmios caso alcançassem condições previamente estipuladas, conforme trecho transcrito abaixo do depoimento do Sr. Saadi Alves de Aquino, ex-coordenador de operações da Uber, nos autos do IC 001417.2016.01.000/6:
(…) que próximo ao Carnaval, por exemplo, o motorista ativado que completasse 50 viagens em 3 meses ganharia R$ 1.000,00 (mil reais); (…) que no dia do protesto do taxista, no início de 2016, a empresa investigada já sabia que faltariam motoristas na cidade então programou uma promoção especial para o motorista que consiste em cumprir alguns requisitos, por exemplo, ficar online 8 ou mais horas, completar 10 ou mais viagens e ter uma média de nota acima de 4,7 e, então, o motorista ganharia 50% a mais de todas as viagens completadas nesse período e com esse padrão (…).
O Magistrado Márcio Toledo Gonçalves destacou, ainda, que do sítio eletrônico da plataforma consta que independentemente de a viagem ser gratuita ao usuário, o motorista será remunerado: “Alguns usuários possuem descontos ou promoções, e este valor é descontado também das viagens em dinheiro, por isso o valor pode er reduzido ou até R$0. Não se preocupe, estes descontos são custos da Uber e você receberá normalmente o valor da viagem em seu extrato”52
Assim, somado aos elementos trazidos da brilhante sentença proferida pelo
Juízo da 33ª Vara da Justiça do Trabalho de Belo Horizonte, nos Autos de Nº
0011359-34.2016.5.03.0112, aliado, ainda, ao Princípio da Primazia da Realidade, a empresa Uber não faz apenas intermediação entre passageiro e motorista, mas determina o preço do serviço e recebe por ele, posteriormente efetuando pagamento ao seu obreiro.
8.2.3. Não eventualidade
Conforme abordado anteriormente, o doutrinador Maurício Godinho Delgado, em sua obra Curso de Direito do Trabalho, sistematiza os principais conceitos e teorias acerca da não-eventualidade, quais sejam: a teoria do evento, dos fins do empreendimento e da fixação jurídica ao tomador de serviços.
Na sentença retro mencionada, o Magistrado conclui que o contexto fático probatório delineado nos autos, aponta para a hipótese de aplicação ao caso da teoria dos fins do empreendimento combinada com a teoria da eventualidade, raciocínio este do qual compartilha este trabalho de conclusão.
Conforme extraído da sentença dos Autos de Nº 0011359-34.2016.5.03.0112, em depoimento ao Ministério Público do Trabalho da 1ª Região, a testemunha Saadi Alves de Aquino, ex-coordenador de operações da empresa Uber, nos autos do IC
001417.2016.01.000/6 (id eecf75b), declarou que:
(…) se o motorista ficar mais de um mês sem pegar qualquer viagem, o motorista seria inativo; que seria fácil voltar a ficar ativo, se fosse à empresa e manifestasse interesse; que eram enviados e-mails, como o casos dos sticks acima citados, para que o motorista “ficasse com medo” e voltasse a se ativar na plataforma; que como gestor tinha por meta incentivar os motoristas a estarem ativos (…).
(…) que recebeu um email que não se lembra a data dizendo que se não fizesse pelo menos uma viagem no prazo de uma semana, seria excluído da plataforma, mas não houve exclusão (…).
Consoante depoimento acima, a não-eventualidade não apenas se faz presente para caracterizar a natureza do trabalho desenvolvido pelos motoristas, como também é algo exigido pela Uber.
No que tange a Teoria dos Fins do Empreendimento, também resta a relação em questão caracterizada como não eventual, uma vez que assim o consagra o trabalhador chamado a desenvolver serviços-fim da empresa. Decorre deste ponto uma grande celeuma, a respeito do que a plataforma se afirma ser e do que ela representa na prática. A Uber, como já mencionado anteriormente neste trabalho, se designa como plataforma tecnológica e não como prestadora de serviço de transportes, o que não corresponde com a prática, levando em consideração o Princípio da Primazia da Realidade.
Fato é que apesar de o CNPJ – Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica e o contrato social da empresa embasarem a tese de que esta explora tão somente plataforma tecnológica, a Uber não faz apenas a ponte motorista-passageiro. Na relação em questão é firmado um contrato no qual o usuário requer da empresa determinada viagem, que é solicitada pelo aplicativo desta; seguido a isto, é escolhido o condutor de forma unilateral, destinado à realização do serviço, o que evidencia o fornecimento de serviço de transporte.
Com brilhantismo, a sentença tratada amplamente neste tópico assim dispõe: A doutrina define o contrato de transporte de pessoas da seguinte maneira: “(…) é o negócio por meio do qual uma parte – o transportador – se obriga, mediante retribuição, a transportar outrem, o transportado ou passageiro, e sua bagagem, de um lugar para outro.” (GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini. Dos contratos de hospedagem, de transporte de passageiros e de turismo. São Paulo: Saraiva, 2007 p.84-8).
E completa:
Tanto é que já há julgados responsabilizando a empresa por vícios na prestação de serviços decorrentes de erros do motorista na condução do veículo, podendo ser citado à guisa de exemplo o processo 0801635-32.2016.8.10.0013 tramitado no 8º Juizado Especial Cível e das Relações de Consumo de São Luís/MA. Não poderia ser diferente diante da nítida relação de consumo entre ela e os usuários do aplicativo.
Encerrando o debate acerca da existência do requisito não eventualidade na relação Uber x Motorista, conclui-se que não há dúvidas de que ainda que a empresa atue no desenvolvimento de tecnologias, não há como se afastar o fato de que ela desempenha serviço de transporte urbano utilizando-se da mão de obra de seus “parceiros”.
8.2.4. Subordinação
Por fim, o último e mais delicado requisito da relação de emprego, o que gera maior discussão acerca da relação Uber x Motorista, a subordinação.
Levando em conta os argumentos trazidos em tópico anterior, quando da definição dos requisitos inerentes à caracterização da relação de emprego, bem como o raciocínio desenvolvido pela sentença proferida pelo Juízo da 33ª Vara da Justiça do Trabalho da 1ª Região, tratada neste ponto do trabalho, pode-se dizer com firmeza que os motoristas vinculados à plataforma são submissos às ordens de seu empregador.
Não vemos aqui a presença de uma subordinação clássica, e é por isso fundamental o desenvolvimento do Direito do Trabalho no sentido de acompanhar as mudanças tecnológicas dos postos de trabalho, que trouxeram figuras nunca antes vistas, mas que necessitam de regulamentação, sob pena de ofensa à dignidade do trabalhador.
Logo, é evidente que a ordens sobre o modo de desenvolver a prestação dos serviços, o controle contínuo do motorista, a aplicação de sanções disciplinares nos casos de ocorrência de comportamentos que a Uber julgue inadequados e a obrigatoriedade de observância das regras por ela estipuladas caracterizam a subordinação.
Consoante depoimento da testemunha Charles Soares Figueiredo, a empresa realiza verdadeiro treinamento de pessoal:
(…) que nessa oportunidade passaram por orientações de como tratar o
cliente, como abrir a porta, como tratar o cliente, como ter água e bala dentro do carro, que são obrigatórios, que teriam que manter a água gelada e estarem sempre se terno e gravata, guarda-chuva no porta malas; que o uso de terno e gravata era só para Uber Black, que também foi passado que o ar condicionado sempre deveria estar ligado, o carro limpo e lavado e o motorista sempre bem apresentado (…).53
Nos autos do IC 001417.2016.01.000/6, colacionados na referida sentença, Iris Morena Sousa e Freund, ex-gerente de marketing da Uber do Brasil Tecnologia LTDA., declarou que:
(…) na época em que a depoente trabalhou os interessados tinham que comparecer na sede da Uber para receber treinamento de cerca de duas ou três horas, oportunidade na qual eram repassadas informações relativas à forma de utilização do aplicativo, à forma como os motoristas poderiam se comportar e como deveriam se vestir; que aqueles motoristas que recebiam avaliação baixa eram convocados para refazer o treinamento sob pena de
serem excluídos do aplicativo (…).54
De igual modo, o depoimento de Saadi Mendes de Aquino reforça a caracterização da subordinação:
(…) (a Uber) mantem o padrão de atendimento pela avaliação do cliente e por recomendações de estilo: os melhores motoristas geralmente (e ai se listavam o que a empresa entende por um bom padrão de atendimento ao cliente, como ter balas e água disponíveis, usar trajes sociais, volume do som e uma rádio neutra, deixar o ar condicionado ligado, perguntar se o passageiro tem um caminho de preferência ou prefere a navegação, abrir a
porta do carro e não falar muito com o passageiro) (…).55
Mais além, os depoimentos de Charles Soares Figueiredo e Saadi Alves de Aquino, respectivamente, são precisos em demonstrar o controle exercido pela Uber sobre os motoristas, controle este passível de resultar em penalidades, conforme a
seguir:
(…) que se o motorista recusar de 5 a 6 corridas, seria bloqueado por algumas horas; que quando se refere a recusa de viagem, quer dizer que o aplicativo acionou noticiando uma corrida para o motorista, mas o mesmo não aceitou (…).”
“(…) que também havia a hipótese de um bloqueio temporário (“gancho”) que ocorria quando o motorista não aceitava mais do que 80% das viagens e esses ganchos eram progressivos, ou seja, 10 minutos, 2horas e até 12 horas off-line, ou seja, bloqueado; que esse gancho era automático do sistema e não passava por qualquer avaliação humana (…).56
Ora, com tais relatos, o argumento de que os motoristas têm flexibilidade e independência para fazer seus horários e prestar seus serviços da forma como bem desejam cai por terra ao analisar a realidade dos mesmos, que em caso de não seguirem as regras previamente determinadas sofrem punições. Cabendo destacar que a atenção às “recomendações” é obrigatória para que o motorista consiga boas avaliações e, assim, possa permanecer vinculado à plataforma.
E é o avanço tecnológico da sociedade em rede o responsável por criar a inédita técnica de vigilância da força de trabalho, que não se dá mais necessariamente com a intervenção humana.
A realidade é que o controle das regras e dos padrões de atendimento durante a prestação de serviços ocorre por meio das avaliações sob a forma de notas e reclamações feitas pelos consumidores do serviço oferecido. A Uber impõe diversos regramentos, cujo não cumprimento pode resultar em bloqueio do motorista e atém mesmo na sua exclusão da plataforma, ficando este, portanto, sujeito ao “controle” que é feito pelos usuários do serviço, que na verdade mascara o controle que também é realizado pela empresa.
Nas palavras de Márcio Toledo Gonçalves, Magistrado sentenciante, busco alicerce para sustentar a caracterização de vínculo empregatício objetivada neste trabalho:
Afinal, já não é mais necessário o controle dentro da fábrica, tampouco a subordinação a agentes específicos ou a uma jornada rígida. Muito mais eficaz e repressor é o controle difuso, realizado por todos e por ninguém. Neste novo paradigma, os controladores, agora, estão espalhados pela multidão de usuários e, ao mesmo tempo, se escondem em algoritmos que definem se o motorista deve ou não ser punido, deve ou não ser “descartado”.57
Assim, é subordinado porque oferece prestação laboral que é indispensável aos fins da atividade desenvolvida pela Uber, não podendo organizar-se da forma que entenda mais apropriada, tampouco receber o que verdadeiramente corresponde aos frutos de seu trabalho. Isto ocorre porque sua força de trabalho pertence à organização produtiva da empresa, que exige porcentagem entre 20 e 25 sobre o faturamento bruto alcançado, restando ao “parceiro” as despesas com combustível, manutenção, depreciação do veículo, multas, avarias, lavagem, água e impostos, conforme bem asseverado na sentença retro mencionada.
Além do mais, consoante depoimento58 do ex-gerente geral da Uber do Brasil
Tecnologia LTDA., a maneira como o cálculo das tarifas é elaborado, demonstra a estipulação dos salários dos motoristas, conforme a seguir:
“(…) que o salário mínimo era calculado por hora, com base em 44 horas semanais; que a remuneração do motorista era calculada entre 1.2 e 1.4 salários mínimos, descontando todos os custos (…).” (depoimento prestado nos autos do IC 001417.2016.01.000/6 – id 07b4d62).
Cumprindo com o objetivo de demonstrar a presença da subordinação na relação aqui tratada, por fim, cabe transcrever o artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho, a seguir:
Art. 6º. Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.
Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos <https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ListaProcessos.seam?numero_unic=0011359-34.2016.5.03.0112&cid=10499> Acesso em: 24 abr. 2017.
meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.59
Assim, na esteira do entendimento do Magistrado acima mencionado, temos a equiparação dos meios telemáticos e informatizados de supervisão aos meios pessoais e diretos de comando, o que demonstra a importância da evolução do Direito do Trabalho na busca pelo alcance da proteção ao maior número de trabalhadores possível.
Traçando um breve paralelo quanto ao assunto, o Código de Trabalho Português, no artigo 223, assim define o teletrabalho: “Para efeitos deste Código, considera-se teletrabalho a prestação laboral realizada com subordinação jurídica, habitualmente fora da empresa do empregador, e através do recurso a tecnologias de informação e de comunicação”.60
Da letra da lei supra transcrita, observa-se que Portugal considera como modalidade de trabalho subordinado o teletrabalho, conceito este que, aliado à disposição do parágrafo único do artigo 6º da CLT, nos mostra que não foge à subordinação a fiscalização realizada pela Uber sobre seu motorista.
- 9. A OFENSA À DIGNIDADE DO TRABALHADOR
Os Direitos Humanos são essenciais para uma convivência harmônica em sociedade.
A Constituição da República Federativa do Brasil em seu Título I traz os Princípios Fundamentais do Estado Democrático de Direito, colocando tal disposição logo no início do texto constitucional. Com isto, nota-se que tais princípios devem reger o Estado, servindo como um postulado central, e fundamento da República.
O art. 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988 assim dispõe:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(…)
III – a dignidade da pessoa humana; (grifo nosso)61
A dignidade da pessoa humana, um dos princípios fundamentais da República, irradia luzes sobre todo o ordenamento, devendo orientar todos os ramos do Direito, inclusive o trabalhista. Mais além, deve orientar o Estado de forma geral, abrangendo todos os seus poderes: executivo, legislativo e judiciário, bem como as atividades privadas, de forma a assegurar uma proteção básica aos cidadãos.
Complementando o artigo 1º, inciso III, da CRFB, o art. 6º traz um rol de direitos sociais que, se cumpridos, concretizam a dignidade da pessoa: Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (grifo nosso)62
Assim sendo, o trabalho é essencial para a construção da dignidade humana. Nas palavras de Benjamin Franklin (1706-1790), estudioso norte- americano, “o trabalho dignifica o homem”.
O trabalho, bem como os demais direitos sociais elencados no art. 6º da Constituição da República Federativa do Brasil, é essencial para o funcionamento e organização da sociedade. Durante a história da evolução do Direito do Trabalho, brevemente narrada no início deste trabalho, percebemos a participação do trabalho escravo63 como elemento sustentador de grandes civilizações por séculos.
Atualmente, a prática da escravidão é repudiada, por violar os direitos humanos, o que não significa, todavia, a sua inexistência, que adquiriu novas formas ao longo das décadas. Fato é que o trabalho é praticado por aquele que trabalha – o trabalhador – e este nem sempre teve (historicamente) a “dignidade” merecida.64
Assim, passamos ao ponto final deste trabalho de conclusão, no qual nos propomos a analisar a dignidade do trabalhador da Uber – o trabalho por ele desempenhado o dignifica ou não passa de um meio de exploração travestido de nova tecnologia?
A Consolidação das Leis do Trabalho e a Constituição Federal de 1988 (principalmente em seu art. 7º e incisos) asseguram diversos direitos e benefícios ao trabalhador brasileiro. A começar pelas férias, as quais podem ser gozadas no período de trinta dias após o trabalhador completar 12 meses de trabalho, nos termos do art. 136 da CLT. Há ainda que se falar nos encargos trabalhistas, como a contribuição ao INSS e ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), este último de responsabilidade do empregador que deve guardar 8% do valor do salário do funcionário em uma conta junto à Caixa Econômica Federal.
Quanto à demissão, quando o funcionário é dispensado de suas funções sem justa causa e liberado de cumprir o aviso prévio, o empregador deve pagar o valor referente às verbas rescisórias em 10 dias corridos. No que tange ao horário de trabalho, a jornada não deve ultrapassar 8 horas diárias, e 44 horas semanais, tendo o trabalhador que receber pelas horas extras trabalhadas. Além disto, todos os trabalhadores urbanos que prestam serviços no horário entre 22h e 5h da manhã devem receber adicional acrescido ao valor de seu salário, e em domingos e feriados, os funcionários devem receber adicional de, no mínimo, 100%; já aos sábados, o adicional permanece sendo de, pelo menos, 50% sobre a hora normal.
Assim, com esta breve lista enumerativa de alguns dos direitos do trabalhador brasileiro, pode-se notar aqueles que são furtados dos motoristas da Uber.
Ultrapassando o mérito acerca do reconhecimento de vínculo empregatício, tópico já discutido e demonstrado neste trabalho de conclusão, pode-se migrar ao debate acerca da ofensa à dignidade deste trabalhador.
O trabalho humano se apresentou sob diferentes formas no decorrer da história, até chegar ao cenário hoje observado, com a presença de políticas sociais, contratos reguladores, e principalmente, ressaltando a consideração da dignidade da pessoa humana, tendo em vista o histórico degradante dos trabalhadores até estes terem seus direitos reconhecidos.
Todavia, em nossa sociedade ainda existem resquícios da mentalidade escravista, de forma que muitos dos trabalhadores, não só no Brasil, são submetidos a condições degradantes. E muitas das vezes, por diversos motivos, aceitam tal submissão, ficando presos a seus empregadores.
O cenário econômico atual reflete um novo modelo do capitalismo, que se centrou na desregulamentação, expressa nas privatizações, nas aberturas para o mercado externo, nas políticas de flexibilização laboral e de ajuste fiscal.65 Este novo panorama afetou as relações de emprego, pois as empresas buscam o lucro a qualquer custo, mesmo que para isso seja sacrificada a dignidade do trabalhador.
Segundo Maria Aparecida Alkimin:
A violência da vida moderna que mais assombra e que constitui em flagrante atentado à dignidade humana e à garantia de exercício pleno dos direitos fundamentais é a chamada violência estrutural ou institucionalizada, ou seja, aquela baseada em fatores socioeconômicos, institucionais, culturais bem como fruto da explosão demográfica, desintegração social, influência dos meios de comunicação de massa, da globalização sem fronteiras e sem respeito às diferenças, que amplia as desigualdades e enaltece a miséria, causando mal-estar coletivo e enfraquecimento das instituições públicas, revelando-se também, a violência estrutural em forma de atentado à criança com a exploração do trabalho infantil, às mulheres, negros, trabalhadores que são discriminados, condições de vida indigna- baixos salários, desemprego, etc., que levam a miséria e até a
criminalidade, como forma de repressão ou defesa dos oprimidos pela
66SADER, Emir. MATÉRIA DE CAPA / A crise chega ao Brasil. Desequilíbrios estruturais do capitalismo atual. Disponível em <http://diplomatique.org.br/desequilibrios-estruturais-do-capitalismo- atual/> Acesso em: 30 mai. 2017.
desigualdade e desequilíbrio estrutural, enfim, são as violências que integram o contexto da vida moderna.
Logo, a empresa Uber furta de seus empregados a dignidade que lhe deveria conferir o trabalho à medida que se abstém de cumprir com as garantias sociais e trabalhistas presentes tanto na Carta Magna, quanto na Consolidação das Leis do Trabalho.
É fato incontestável que a empresa explora de maneira selvagem a mão de obra de pessoas que devido à crise que assola o país e o mundo, começaram a procurar trabalhos informais e autônomos.
De outro lado, podemos acompanhar nos noticiários as revoltas dos taxistas e suas constantes manifestações no que diz respeito à regulamentação do serviço de transporte desempenhado pela empresa.67
Disso concluímos que tal configuração de exploração de mão de obra está intrinsecamente ligada à prática de dumping por parte da empresa, que se utiliza da política de concorrência de forma consciente. Dessa forma, a empresa vem de outro país (EUA) e chegando ao mercado de destino (Brasil) vende seus serviços a preços extraordinariamente abaixo de seu valor justo por um tempo, visando prejudicar e/ou eliminar os fabricantes de produtos similares concorrentes daquele local, de forma que ao final, passa a dominar o mercado, impondo preços altos. É possível ver indícios de infrações à ordem econômica e às normas legais de tutela da
concorrência (Art. 36, § 3º, inciso XV, da Lei 12.529/201114).68
Conclusão lógica é a de que para o oferecimento de um produto extremamente barato, a empresa se utiliza de mão de obra também extremamente barata, ao passo que remunera precariamente seus empregados, que não são reconhecidos como tais, privando-lhes de outras garantias trabalhistas, além do direito à justa remuneração salarial.
Como excelente apontamento feito pelo Magistrado sentenciante nos autos da Ação Trabalhista de Nº 1001492-33-2016-5-02-0013:
A atuação agressiva da ré no tocante ao ganho de mercado e ao barateamento de mão de obra esbarra em preceitos constitucionais, notadamente os direitos fundamentais dos trabalhadores e a valorização do trabalho como fundamento da ordem econômica. Tais normas basilares vedam o uso do ser humano como mercadoria de comércio ou como insumo da produção, o que na prática vem sendo feito pela ré. Existe aí uma clara
violação ao princípio da dignidade humana.69
Diante da conjuntura econômica atual e das novas formas de exploração do trabalho humano, a ausência do reconhecimento de vínculo de emprego entre tais figuras ocupa papel central no novo cenário de violação dos direitos humanos, vez que o indivíduo não mais se encontra preso ao empregador por correntes, mas está a ele submisso sob uma forma de extrema exploração de sua mão de obra.
Destarte, o trabalho desempenhado pelo motorista Uber à respectiva empresa, desempenhado na forma que está, qual seja ausente de regulamentação, fere a dignidade do trabalhador, que não vê aplicados todos os direitos a ele inerentes.
Isto se dá porque o serviço desempenhado pela empresa se traveste de tecnologia, para burlar as leis trabalhistas, permitindo lucro elevado com mão de obra barata de seus empregados, que podem assim ser chamados quando presentes todos os requisitos da relação de emprego, como já demonstrado neste trabalho.
Neste sentido, o Direito do Trabalho deve buscar soluções que visem à preservação dos direitos do trabalhador à luz do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, valorizando-o e buscando a justiça como forma de alcançar os preceitos
constitucionais.
69 Idem.
- 10. CONCLUSÃO
De todos os pontos levantados neste trabalho de conclusão de curso pode – se observar que se encontram em choque alguns princípios do Direito, quais sejam o da livre iniciativa e o da dignidade da pessoa humana. Isto porque de um lado temos o argumento da importância das transformações promovidas pelas tecnologias disruptivas na efetivação da livre iniciativa, de outro, temos a preocupação de garantir ao trabalhador seus direitos, evitando a exploração desenfreada da mão de obra.
O princípio da livre iniciativa assegura o livre exercício de qualquer atividade econômica a qualquer pessoa, independentemente de autorização dos órgãos públicos, salvo se previsto em lei tal exigência. Tal princípio impulsiona, no âmbito da atividade econômica, a norma geral de que aos particulares é lícito fazer tudo que não seja proibido em lei.70
Assim, tendo em vista o carecimento de lei que impeça o funcionamento das
atividades desenvolvidas pela empresa Uber, esta pode atuar de forma livre, cumprindo com o princípio da livre iniciativa.
Contudo, quando se passa ao cumprimento da valorização do trabalho humano, princípio este atrelado à livre iniciativa, vemos o vão em que se encontra localizado o motorista, que possui diversos direitos trabalhistas subtraídos, tendo sua mão de obra explorada de forma desproporcional.
Nas palavras dos autores Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino, cuja transcrição merece destaque:
O art. 170, em seu caput, estatui que a nossa ordem econômica é “fundada na valorização do trabalho humano e na livre -iniciativa”, e sua finalidade é “assegurar a todos existência digna, c onforme os ditames da justiça social”. Essas disposições, que são as mais gerais acerca da ordem econômica, revelam nitidamente o caráter compromissário de nossa Carta Política. Em vez de assumir como um dado inelutável a consagrada cisão entre o “capital e trabalho”, o histórico antagonismo entre “empresário e trabalhador”, o texto constitucional procura transmitir uma ideia de integração, de harmonia, de sorte que assegura a livre – iniciativa (portanto, a apropriação privada dos meios de produção, a liberdade de empresa), mas determina que o resultado dos empreendimentos privados deve ser a concretização da justiça social, o que exige, entre outras coisas, a valorização do trabalho humano.
De todos os fatores de produção, portanto, o trabalho humano deve se r aquele colocado em primeiro lugar. O empreendedorismo é um valor consagrado, desde que valorize o trabalho humano e contribua para assegurar a todos uma existência digna.71 Nesse sentido, a indagação: o trabalho desempenhado pelo motorista da Uber cumpre com o consagrado pela Constituição?
Ora, conjugando os Princípios do Direito do Trabalho aqui desenvolvidos, tais como o da Proteção, o da Irrenunciabilidade dos Direitos Trabalhistas e o da Primazia da Realidade, com o preceito constitucional que garante a dignidade da pessoa humana, não se pode chegar a conclusão diversa da de que o não reconhecimento da relação entre tais partes como relação empregatícia, fere os ditames da justiça social.
Conforme anteriormente abordado, o artigo 6º da Constitu ição da República Federativa do Brasil traz um rol dos direitos sociais que visam possibilitar melhores condições aos mais fracos, bem como tentar equalizar as situações socialmente desiguais.
Somado a isto, o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que irradia seu comando para todo o ordenamento jurídico, não permite que tal relação não seja reconhecida como de emprego.
Em um dos conceitos de Dignidade da Pessoa Humana, temos o de Ingo Sarlet, qual seja o de que:
(…) por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comun hão com os demais seres humanos (…).72
Ainda sobre a Dignidade da Pessoa Humana, o respeitável autor Gustavo
Tepedino a define da seguinte forma:
Com efeito, a escolha da dignidade da pessoa humana como fundamento da República, associada ao objetivo fundamental de erradicação da pobreza e da marginalização, e de redução das desigualdades sociais, juntamente com a previsão do §2º do art. 5º no sentido da não exclusão de quaisquer direitos e garantiras, mesmo que não expressos, desde que decorrentes dos princípios adotados pelo texto maior, configuram uma verdadeira cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana,
tomada como valor máximo pelo ordenamento (…).73
Logo, fere a dignidade do trabalhador que este trabalhe exaustivamente todos os dias, o que inclui feriados, finais de semana e madrugadas, que se abstenha de momentos de lazer e em família, que se submeta a condições nada favoráveis a ele, nas quais sequer possui o direito de férias e décimo terceiro salário, sem qualquer previsão de que ao final do mês terá reunido os esforços necessários ao sustento seu e de sua família, uma vez que não sabe o valor que ganhará todo o mês. Tudo isto somado aos custos do “empreendimento”, no qual o sujeito adquire carro, custeia a manutenção de pneus, revisão do veículo, e demais gastos constantes dos Termos e Condições por ele assinados de forma impositiva.
Consoante conclusão elaborada pelo Magistrado Marcio Toledo Gonçalves, proferida na já referida RTOrd 1001492-33.2016.5.02.0013:
É neste contexto que devemos perceber o papel histórico do Direito do Trabalho como um conjunto de normas construtoras de uma mediação no âmbito do capitalismo e que tem como objetivo constituir uma regulação do mercado de trabalho de forma a preservar um ‘patamar civilizatório mínimo’ por meio da aplicação de princípios, direitos fundamentais e estruturas normativas que visam manter a dignidade do trabalhador.
Portanto, devemos estar atentos à atualidade do Direito do Trabalho, esta estrutura normativa que nasceu da necessidade social de regulação dos processos capitalistas de extração de valor do trabalho alienado.
Qualquer processo econômico que possua, em sua essência material, extração e apropriação do labor que produz mercadorias e serviços atrairá a aplicação deste conjunto normativo, sob risco de, em não o fazendo,
precipitar-se em retrocesso civilizatório.74
Por todo o exposto, o ramo do Direito do Trabalho deve acompanhar a evolução tecnológica de suas relações, se incumbindo de estuda-las, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais e do trabalho, visando a “(…) combater as relações de trabalho disfarçadas (…) que escondam o verdadeiro status legal, notando que uma relação de trabalho disfarçado ocorre quando o empregador trata um indivíduo diferentemente de como trataria um empregado de maneira a esconder o verdadeiro status legal dele ou dela como um empregado, e estas situações podem surgir onde acordos contratuais possuem o efeito de privar trabalhadores de sua devida proteção (…).”75.
A positivação do princípio da dignidade da pessoa humana demonstra a preocupação do Estado com o povo, tornando-o preceito fundamental que alcança todos os ramos do Direito, o que inclui o trabalhista.
Sendo, portanto, o trabalho objeto de valorização pessoal do homem, podendo com ele se prover uma vida digna, este deve cumprir com os preceitos fundamentais, a fim de que seja digno. 665 – Recomendação OIT 198 – Relativa à Relação de Trabalho. Recomendação OIT n°198 Relativa à Relação de Trabalho. D is p o n í v e l e m <h t t p : / / w w w . l e g is t r a b . c o m . b r / r e c o m e n d a c a o – o i t – 198 – r e l a t i va – a – r e l a c a o – de – t r a b a l h o / > Ac e s s o e m 0 8 j u n . 2 0 1 7 .
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Notas de Rodapé:
1 CAVALCANTE, Ricardo Tenório. Jurisdição, Direitos Sociais Proteção do Trabalhador e: a efetividade do direito material e processual do trabalho desde a teoria dos princípios. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008, p. 24.
2 AMARAL, Iracema. Presidente da Câmara diz que Justiça do Trabalho “nem deveria existir”. A declaração de Rodrigo Maia aconteceu ao defender as reformas trabalhista e da Previdência, ambas em tramitação na Casa. Disponível em <http://www.em.com.br/app/noticia/politica/2017/03/09/interna_politica,852838/presidente-da-camara- diz-que-justica-do-trabalho-nem-deveria-existir.shtml> Acesso em: 10 mar. 2017.
3 PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Manual de direito do trabalho. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 3.
4 SARAIVA, Renato. Direito do trabalho para concursos públicos. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009, p. 31.
5 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 183.
6 BRASIL. DECRETO-LEI N.º 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943. Aprova a Consolidação das Leis do
Trabalho. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm> Acesso em:
08 jun. 2017.
7 BRASIL. LEI Nº 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Código de Processo Civil. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em: 08 jun. 2017.
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9 BRASIL. DECRETO-LEI N.º 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943. Aprova a Consolidação das Leis do
Trabalho. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm> Acesso em:
08 jun. 2017.
10 Súmulas, Orientações Jurisprudenciais e Precedentes Normativos. Disponível em <http://www.tst.jus.br/documents/10157/63003/Livro-Internet.pdf> Acesso em: 08 jun. 2017.
1 BRASIL. DECRETO-LEI N.º 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943. Aprova a Consolidação das Leis do
Trabalho. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm> Acesso em:
08 jun. 2017.
12 PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Manual de direito do trabalho. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 31.
13 SARAIVA, Renato. Direito do trabalho para concursos públicos. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009, p. 33
14 PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Manual de direito do trabalho. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 32
15 BRASIL. DECRETO-LEI N.º 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm> Acesso em: 08 jun. 2017.
17 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 187.
18 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, 2010, p.196. 19 BRASIL. Constituição (1988). CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Disponível em http://planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso em: 08 jun. 2017.
20 Súmulas, Orientações Jurisprudenciais e Precedentes Normativos. Disponível em<http://www.tst.jus.br/documents/10157/63003/Livro-Internet.pdf> Acesso em: 08 jun. 2017.
21 Súmulas, Orientações Jurisprudenciais e Precedentes Normativos. Disponível em <http://www.tst.jus.br/documents/10157/63003/Livro-Internet.pdf> Acesso em: 08 jun. 2017.
22 BRASIL. DECRETO-LEI N.º 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm> Acesso em: 08 jun. 2017.
23 SARAIVA, Renato. Direito do trabalho para concursos públicos. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009, p. 37.
24 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (3. Região). RTOrd 0011359-34.2016.5.03.0112. Autor: Rodrigo Leonardo Silva Ferreira. Réu: UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA.. Juiz: Márcio Toledo Gonçalves. Belo Horizonte, 13 de fevereiro de 2017. p. 9-10. Disponível em <https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ListaProcessos.seam?numero_unic=0011359-34.2016.5.03.0112&cid=10499> Acesso em: 24 abr. 2017.
25 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (3. Região). RTOrd 0011359-34.2016.5.03.0112. Autor: Rodrigo Leonardo Silva Ferreira. Réu: UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA.. Juiz: Márcio Toledo Gonçalves. Belo Horizonte, 13 de fevereiro de 2017. p. 10. Disponível em <https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ListaProcessos.seam?numero_unic=0011359-34.2016.5.03.0112&cid=10499> Acesso em: 24 abr. 2017.
26 Idem.
27 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (3. Região). RTOrd 0011359-34.2016.5.03.0112. Autor: Rodrigo Leonardo Silva Ferreira. Réu: UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA.. Juiz: Márcio Toledo
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28 PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Manual de direito do trabalho. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 7.
29 PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Manual de direito do trabalho. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 7.
30 Revista Consultor Jurídico. DIREITOS EM JOGO: Arnaldo Süssekind repudia flexibilização selvagem. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2003-abr- 07/arnaldo_sussekind_repudia_flexibilizacao_selvagem?pagina=6> Acesso em: 25 mar. 2017.
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34 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (2. Região). RTOrd 1001492-33.2016.5.02.0013. Autor: Fernando dos Santos Teodoro. Réu: Uber do Brasil Tecnologia Ltda., Uber International B.V., Uber International Holding B.V.. Juiz: Eduardo Rockenbach Pires. São Paulo, 11 de abril de 2017. p. 7. Disponível em <http://www.migalhas.com.br/arquivos/2017/2/art20170202-11.pdf> Acesso em: 15 mai. 2017.
35 UBER TECHNOLOGIES, INC., A. DELAWARE CORPORATION VS. BARBARA BERWICK. p. 4-5. Disponível em <http://digitalcommons.law.scu.edu/cgi/viewcontent.cgi article=1988&context=historical> Acesso em: 15 mai. 2017.
36 Idem.
37 A d e c is ã o d o R e i n o U n id o s o b r e o s m o t o r i s t a s d a U b e r . O q u e e l a n o s e n s in a ? D is p o n í v e l e m <https://jota.info/colunas/constituicao-empresa-e-mercado/decisao-reino-unido- sobre-os-motoristas-da-uber-o-que-temos-aprender-com-ela-01112016> Acesso em: 21 mai. 2017.
38 FRAZÃO, Ana. A d e c is ã o d o R e i n o U n id o s o b r e o s m o t o r is t a s d a U b e r . O q u e e la n o s ens in a ? D is p o n í v e l e m <https://jota.info/colunas/constituicao-empresa-e-mercado/decisao-reino- unido-sobre-os-motoristas-da-uber-o-que-temos-aprender-com-ela-01112016> Acesso em: 21 mai. 2017.
39 Idem.
40 Idem.
41 RESENDE, Ricardo. Direito do trabalho esquematizado. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011, p. 65-66.
42 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 273.
43 RESENDE, Ricardo. Direito do trabalho esquematizado. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011, p. 67-68.
44 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 6. ed. São Paulo : LTr, 2010, p. 268.
45 DELGADO, Mauricio Godinho. Direitos Fundamentais na Relação de Trabalho. Revista do Ministério Público do Trabalho, nº 31, mar. 2006, p. 46.
46 BRASIL. LEI No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002. Institui o Código Civil. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm> Acesso em: 08 jun. 2017.
47 SARAIVA, Renato. Direito do trabalho para concursos públicos. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009, p. 81-82.
48 SARAIVA, Renato. Direito do trabalho para concursos públicos. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009, p. 46.
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50 Idem.
51 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (3. Região). RTOrd 0011359-34.2016.5.03.0112. Autor: Rodrigo Leonardo Silva Ferreira. Réu: UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA.. Juiz: Márcio Toledo Gonçalves. Belo Horizonte, 13 de fevereiro de 2017. Disponível em <https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ListaProcessos.seam?numero_unic=0011359-34.2016.5.03.0112&cid=10499> Acesso em: 24 abr. 2017.
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53 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (3. Região). RTOrd 0011359-34.2016.5.03.0112. Autor: Rodrigo Leonardo Silva Ferreira. Réu: UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA.. Juiz: Márcio Toledo Gonçalves. Belo Horizonte, 13 de fevereiro de 2017. Disponível em<https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ListaProcessos.seam?numero_unic=0011359-34.2016.5.03.0112&cid=10499> Acesso em: 24 abr. 2017.
54 Idem.
55 Idem.
56 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (3. Região). RTOrd 0011359-34.2016.5.03.0112. Autor: Rodrigo Leonardo Silva Ferreira. Réu: UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA.. Juiz: Márcio Toledo Gonçalves. Belo Horizonte, 13 de fevereiro de 2017. Disponível em <https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ListaProcessos.seam?numero_unic=0011359-34.2016.5.03.0112&cid=10499> Acesso em: 24 abr. 2017.
57 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (3. Região). RTOrd 0011359-34.2016.5.03.0112. Autor: Rodrigo Leonardo Silva Ferreira. Réu: UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA.. Juiz: Márcio Toledo Gonçalves. Belo Horizonte, 13 de fevereiro de 2017. p. 23. Disponível em No que tange à percepção econômica do motorista do aplicativo Uber, este também não detém domínio sob a estipulação de preços, ou seja, não possui domínio sobre a atividade econômica, em tese, desenvolvida por ele.
58 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (3. Região). RTOrd 0011359-34.2016.5.03.0112. Autor: Rodrigo Leonardo Silva Ferreira. Réu: UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA.. Juiz: Márcio Toledo Gonçalves. Belo Horizonte, 13 de fevereiro de 2017. p. 28. Disponível em <https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ListaProcessos.seam?numero_unic=0011359-34.2016.5.03.0112&cid=10499> Acesso em: 24 abr. 2017.
59 BRASIL. DECRETO-LEI N.º 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm> Acesso em: 09 jun. 2017.
60 UCHÔA, Marcelo Ribeiro. O teletrabalho. Disponível em <http://www.ambito- juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5980> Acesso em: 18 jun.2017.
61 BRASIL. DECRETO-LEI N.º 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm> Acesso em: 08 jun. 2017.
62 Idem.
63 Em uma definição sui generis, que abarca as formas exploração ao longo da história, como a escravidão e a servidão.
64 GIDDENS, Anthony. Sociologia. Tradução Santa Regina Netz. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2005, p. 235.
66 ALKIMIN, Maria Aparecida. Violência na relação de trabalho e a proteção à personalidade do trabalhador. Curitiba: Juruá, 2008. p. 104.
67 Taxistas protestam contra a Uber em frente à rodoviária de Vitória. Disponível em <http://g1.globo.com/espirito- santo/noticia/2017/03/taxistas-protestam-contra-uber-em-frente-rodoviaria-de-vitoria.html> Acesso em: 21 mar. 2017.
Taxistas fazem manifestação contra Uber na rodoviária de São José. Disponível em <http://g1.globo.com/sp/vale- do-paraiba-regiao/noticia/2017/02/taxistas-fazem-manifestacao-contra-uber-na-rodoviaria-de-sao- jose.html> Acesso em: 21 mar. 2017. Deputados propõem fim do Uber e defendem monopólio de taxistas. Disponível em <http://veja.abril.com.br/economia/deputados-propoem-fim-do-uber-e-defendem-monopolio-de- taxistas/> Acesso em: 22 mar. 2017.
68 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (2. Região). RTOrd 1001492-33.2016.5.02.0013. Autor: Fernando dos Santos Teodoro. Réu: Uber do Brasil Tecnologia Ltda., Uber International B.V., Uber International Holding B.V.. Juiz: Eduardo Rockenbach Pires. São Paulo, 11 de abril de 2017. p. Disponível em <http://www.migalhas.com.br/arquivos/2017/2/art20170202-11.pdf> Acesso em: 15 mai. 2017.
70 MOURA, Cid Capobiango Soares de; SALES, Ana Carolina de. Serviço de transporte da Uber tem respaldo na liberdade de profissão. Disponível em <http://www.conjur.com.br/2017-jan-08/servico- transporte-uber-base-liberdade-profissao> Acesso em: 08 jun. 2017.
71 PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Manual de direito do trabalho. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 1022.
72 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e seus direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.
73 TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil, Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 48.
74 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (2. Região). RTOrd 1001492-33.2016.5.02.0013. Autor: Fernando dos Santos Teodoro. Réu: Uber do Brasil Tecnologia Ltda., Uber International B.V., Uber International Holding B.V.. Juiz: Eduardo Rockenbach Pires. São Paulo, 11 de abril de 2017. p. Disponível em <http://www.migalhas.com.br/arquivos/2017/2/art20170202-11.pdf> Acesso em: 15 mai. 2017.