A MEDIAÇÃO COMO MEIO PARA TUTELA DOS ANIMAIS E DO MEIO AMBIENTE, PELA IMPORTÂNCIA DESTES PARA OS INTERESSES METAINDIVIDUAIS

Resumo

O presente artigo objetiva demonstrar que a utilização dos meios propícios para a solução de conflitos tende a ser mais eficaz e eficiente para a solução de litígios envolvendo a tutela dos direitos atinentes à proteção do meio ambiente e direitos dos animais. A pesquisa engendrada se baseou na metodologia teórica qualitativa, por meio de análise bibliografias, trabalhos acadêmicos e caso concreto com relação ao tema abordado, o que propiciou compreender que para a solução mais célere e efetiva se abriga na mediação dos conflitos, que proporciona a construção do diálogo, da perspectividade das relações e o enfrentamento do conflito como algo positivo e necessário de modo a proporcionar o rompimento com a visão bi polarizada de ganhos e perdas. Vislumbrando-se que as questões atinentes a danos ambientais necessitam de soluções rápidas para evitar o verdadeiro caos ecológico sendo necessária a preservação da fauna e flora como um todo para condições de vida na Terra como verdadeira casa comum.

Artigo

A MEDIAÇÃO COMO MEIO PARA TUTELA DOS ANIMAIS E DO MEIO AMBIENTE, PELA IMPORTÂNCIA DESTES PARA OS INTERESSES METAINDIVIDUAIS

Kleusa Ribeiro Barbosa1
Clariana da Silva Lima2

RESUMO
O presente artigo objetiva demonstrar que a utilização dos meios propícios para a solução de conflitos tende a ser mais eficaz e eficiente para a solução de litígios envolvendo a tutela dos direitos atinentes à proteção do meio ambiente e direitos dos animais. A pesquisa engendrada se baseou na metodologia teórica qualitativa, por meio de análise bibliografias, trabalhos acadêmicos e caso concreto com relação ao tema abordado, o que propiciou compreender que para a solução mais célere e efetiva se abriga na mediação dos conflitos, que proporciona a construção do diálogo, da prospectividade das relações e o enfrentamento do conflito como algo positivo e necessário de modo a proporcionar o rompimento com a visão bipolarizada de ganhos e perdas. Vislumbrando-se que as questões atinentes a danos ambientais necessitam de soluções rápidas para evitar o verdadeiro caos ecológico sendo necessária a preservação da fauna e flora como um todo para condições de vida na Terra como verdadeira casa comum.

Palavras-chave: Meios propícios de solução de conflitos; mediação; meio-ambiente, direito dos animais, direitos coletivos, ação civil pública

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por escopo tratar da importância da utilização dos meios propícios para a solução de conflitos, em especial a mediação, para casos em que o litígio versa sobre direitos dos animais e a tutela do meio ambiente.
Por este escorreito, são analisados os direitos difusos e coletivos, tendo por base que a agressão ao meio ambiente e do ecossistema como um todo afeta de forma pontual a vida de todos os indivíduos, causando danos de ordem muitas vezes irreparável.
Partindo-se deste pressuposto, a mediação se apresenta como meio propício de solução de conflitos que necessitam de solução rápida e segura, tangenciando questões que envolvem uma relação continuada que enseja soluções de caráter prospectivo.
Nesse sentido há de se verificar a importância e urgência da mudança de mentalidades para além da solução judicial dos conflitos que demandam maior custo e grande lastro temporal prejudicando e desgastando relações. A instalação da bipolaridade tende a obstruir a boa fruição do diálogo e soluções estáveis e duradouras de preservação do meio ambiente saudável e sustentável.

1. DOS INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS

Prima facie, vale olhar para a história no tocante à evolução dos direitos fundamentais. Eles foram sistematizados em gerações e/ou dimensões, que representam movimentos de ação e pensamento do direito e da justiça no mundo contemporâneo. Mauro Cappelletti, em 2008, falou em três dimensões da Justiça, as quais ele chamou de constitucional, transnacional e social. Atualmente, há quem fale em até cinco dimensões.
A primeira delas, que Cappelletti chamou de dimensão constitucional, trata dos direitos individuais, com certos valores fundamentais, como o da liberdade. Neste momento a finalidade maior era restringir abusos do Estado contra o cidadão, vinculando o próprio legislador.
A segunda dimensão dos direitos fundamentais refere-se àqueles que versam sobre a igualdade, com alcance social, econômico e cultural. O marco desta fase é a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, que inspirou a realização de Pactos Internacionais sobre direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais. Era o tempo do pós-guerra mundial que requeria uma tentativa de superar rígidos critérios das soberanias nacionais, razão para o autor mencionado acima chamá-la de transnacional.3

De terceira dimensão são os direitos coletivos e difusos, oriundos da fraternidade e da solidariedade, tais como o direito à paz, ao desenvolvimento, ao meio ambiente sadio, à qualidade de vida e mais ainda, ao acesso ao Direito e à Justiça. Segundo Humberto Dalla Pinho os direitos coletivos, em sentido lato vêm ocupando posição de destaque no ordenamento de diversos países. É cada vez maior a preocupação com as demandas coletivas, o que exige do jurista preparo adequado para lidar com essas questões, utilizando, desde a doutrina constitucional clássica até os mais modernos postulados do direito processual.4

Dalla Pinho ainda se refere a direitos de quarta e quinta dimensões. Os de quarta, entendidos como de toda a humanidade, como os referentes à bioética, biotecnologia e engenharia genética, e os de quinta geração, aqueles advindos de tecnologias de informação, Internet, ciberespaço e realidade virtual em geral.5
Sistematizados os direitos fundamentais, se pretende olhar para a tutela coletiva. É com a Lei de Ação Civil Pública que se inaugura uma nova fase do processo civil onde “se começa a abandonar a visão individualista do processo e passa-se a vê-lo como apto a tutelar também interesses coletivamente considerados”.6

O Código de Defesa do Consumidor define duas modalidades de direitos coletivos: os difusos e os coletivos em sentido estrito. Os interesses ou direitos difusos têm sujeitos indeterminados (‘a’ coletividade), objetos indivisíveis e um conflito advindo de uma relação efêmera, como situações repentinas e imprevisíveis, enquanto os interesses e direitos coletivos se diferenciam por ter sujeitos determinados ou, em tese, determináveis (‘uma’ coletividade), e o conflito advém de uma relação jurídica base.

Sumariamente, direitos difusos são aqueles que todo brasileiro ou indivíduo humano possui meramente por ser, tais como: meio ambiente equilibrado, segurança pública, ordem econômica, etc. São direitos objetivos da população em geral. Já os coletivos, são direitos que possuem aquelas pessoas ligadas por uma relação mais específica  que a de ser brasileiro, por exemplo, moradores de um local que tenha sofrido desastre ambiental. Neste caso, todos têm direito de exigir reparação do causador do desastre.
Nesta senda, a Constituição Federal traz em si o objetivo de efetivar o exercício ao meio ambiente sadio, haja vista que estabeleceu uma gama de incumbências para o Poder público, arroladas nos incisos I ao VII do § 1º do art. 225. Nas palavras de Maria Toledo:

O art. 225, caput, da Magna Carta assegura o interesse difuso ao meio ambiente, estabelecendo o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito de todos e dispõe a natureza jurídica dos bens ambientais como de uso comum do povo, e impõe tanto ao Poder Público quanto à coletividade o dever de defender e preservar os bens ambientais para as presentes e futuras gerações.7

Merece friso o parágrafo 1º, inciso VII, do art. 225 da CF/88, onde tem-se que:
[…], incumbe ao Poder Público:
[…]
VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que
coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou
submetam os animais à crueldade.

Do mesmo modo que o meio ambiente possui proteção constitucional, os animais,
desde 1988, também contam com tutela garantida na carta magna. Pode-se dizer, portanto,
que o direito ao meio ambiente sadio é um direito fundamental (de 3ª dimensão) difuso e
que a tutela aos animais se inclui neste bojo.

2. DO MEIO AMBIENTE E DOS ANIMAIS

Com a maior conscientização de direitos, é de se esperar o surgimento de novas demandas, de novos anseios, como tem sido o de vivenciar um Estado Democrático de Direito Ambiental. Conceito abstrato que segundo Morato Leite apud Vânia Damasceno“ serve de parâmetro para se realizar a justiça ambiental”.8
Ocorre que hodiernamente a crise ambiental é de ordem mundial. A crescente degradação do meio ambiente e escassez de recursos ambientais traz consigo uma “desigualdade na distribuição dos benefícios do patrimônio natural e dos gravames impostos pela legislação ambiental. Eles não afetam de modo igual todos os seres vivos”.9

Em grupos sociais vulneráveis, o impacto ambiental traz reflexo além dos ecológicos, como empobrecimento econômico, esquecimento político, saúde precária, entre outros. É possível identificar tal realidade em épocas e circunstâncias diferentes, tais como nos operários da revolução industrial, nos morros desmatados e com deslizamentos recorrentes, nas periferias, no esgoto a céu aberto, nas florestas dos índios, nos homens pobres e nos animais não humanos na atual revolução tecnocientífica. Nesta senda, vale conjeturar que os reflexos do impacto ambiental, tão fáceis de visualizar nas situações mencionadas acima, representam violações a direitos fundamentais.
Aqui, um parêntese sobre a concisa e contemporânea definição de direitos fundamentais encontrada nas palavras de Antônio P. Gaio Júnior, que após discorrer em sua mais recente obra sobre a conceituação de direitos fundamentais, condensa seu melhor significado afirmando que

“”direitos fundamentais’” seriam todos aqueles direitos subjetivos que dizem respeito universalmente a “todos” os seres humanos enquanto dotados do status de pessoa, ou de cidadão ou de pessoa capaz de agir”.10 (grifos nossos)

O antropocentrismo indiscutível desta definição incita a menção ao estudo do Promotor de Justiça Gustavo S. Nogueira, que citando a teoria da justiça de John Rawls diz que conforme este autor, em suma, não existe raça nem grupo reconhecido de seres humanos aos quais falte o atributo da capacidade para a personalidade moral, e continua explicando que “considerando que os animais não possuem a referida capacidade, seria regra entre eles essa ausência…”. Ainda na teoria rawsiana, “os indivíduos possuem deveres naturais” e dentre eles o “dever de não provocar sofrimento desnecessário”.11

Assim, em consonância com esta teoria, como os animais não possuem capacidade para participar do processo de escolha dos princípios de justiça, seriam apenas objetos de uma proteção decorrente de um dever natural. Surgem os agentes morais (seres humanos capazes) e os pacientes morais (animais e humanos incapazes). Na mesma senda, Gustavo Nogueira apresenta ponto crucial: o de que é de razoável certeza que a proteção das crianças e dos incapazes não é apenas o indicativo de um dever natural, haja vista que não participam de escolhas relevantes para a sociedade. Independe da condição de incapazes civis, as suas condições de humanos e, principalmente, de sujeitos de uma vida, tem-se para com eles deveres diretos positivados.
Do mesmo modo, ao revés da ideia de que somente os seres humanos, ‘capazes de agir’, possuem direitos fundamentais, este estudo parte do pressuposto que os animais são sujeitos de uma vida, e que apesar de incapazes de decisões principiológicas e da ultrapassada falta de consenso sobre a possibilidade de serem sujeitos de direito, já foram reconhecidos cientificamente como sencientes e quando sofrem pela ação ou omissão intencional do ser humano, sentem mais do que dor física, sentem dor moral1213.

Portanto, nas palavras de Gustavo Nogueira:

[…] é absolutamente necessário superar a ideia de que o homem é o centro do universo, do cosmos, e que tudo e todos devem servi-lo, o conhecido “antropocentrismo” é considerado ingênuo, arrogante, morto e enterrado para Jesus Mosterin, porque não se pode mais pretender que toda a criação esteja a serviço do homem.14

Por tais argumentos, nota-se que:

A justiça ambiental é voltada para redução das desigualdades ocasionadas na
distribuição dos impactos ambientais do progresso humano. No entanto, como
os animais também fazem parte dos grupos de seres vivos vulneráveis a esses
impactos, nada mais lógico que o Estado Democrático de Direito Ambiental
venha a tutelar seus direitos diante da modernidade.15

A espécie humana não é o único sujeito do meio ambiente, mas é a única que
causa degradação ambiental, comportando-se como o hóspede mal educado da Terra.

Leonardo Boff, citado por Vânia Damasceno, “explica que, para cuidar do planeta, o homem precisa desenvolver uma ética de cuidado para com ele e com o planeta. É preciso que todos passem por uma alfabetização ecológica e façam uma revisão de seus hábitos
de consumo”.16

De tal modo, se espera que uma sociedade alfabetizada ecologicamente, ciente dos seus direitos e deveres, dos instrumentos adequados à aplicabilidade prática destes direitos e deveres, conscientizada de que o antropocentrismo trouxe e ainda traz danos ambientais e às outras espécies, pode ser o melhor aparato em defesa dos direitos difusos e coletivos e ao reconhecimento de que os animais como sujeitos de uma vida são detentores de direitos  fundamentais.
Na mesma toada, é importante perceber que levantar questões jurídico-legislativo Processuais
que desafiam o status quo e buscam atender interesses difusos e coletivos em detrimento de direitos individuais não é algo novo e é perfeitamente factível. Basta lembrar como há alguns anos, fumar em ambientes de convivência social era algo comum sob o manto do direito subjetivo de liberdade do fumante e hoje causa reações adversas espontâneas. Outro exemplo foi o do uso obrigatório do cinto de segurança em veículos automotivos. O que foi considerado um direito individual de escolha, perdeu espaço em prol do bem-estar social. São exemplos de interesses coletivos que hoje são direitos sociais exigíveis judicialmente. Se pensar nos animais e no meio ambiente como sujeitos de direitos causa estranheza, espera-se que no futuro inapropriadas sejam as atitudes de violência eles. Afinal, a espécie humana também é parte do meio ambiente e também é uma espécie de animal. Infelizmente, seria ingênuo não admitir que ainda há muito a ser
trabalhado na efetivação da tutela jurídica dos animais e do meio ambiente, apesar da
relevância e urgência de protegê-los.

3. MEDIAÇÃO: UMA FERRAMENTA VALIOSA PARA A PACIFICAÇÃO SOCIAL E TRATATIVAS QUE VISEM GARANTIR UM MEIO AMBIENTE SAUDÁVEL E TUTELA DOS ANIMAIS

O Processo dos nossos tempos requer reflexões críticas dos operadores do Direito.
O litígio como caminho certo para o cidadão que busca assessoria jurídica, resultou em consequências desastrosas para a sociedade, o que se percebe em demandas que beiram a
futilidade, e para a Justiça, que passa por uma crise que impede a qualidade dos serviços que presta ao jurisdicionado, como se demonstrará a seguir através de dados do Conselho Nacional de Justiça.
No âmbito da proteção dos animais e do meio ambiente, falou-se da premência de uma alfabetização ecológica e de hábitos de consumo. É preciso ir além disso, é preciso aprender a conversar, a construir acordos, ao invés de litigar. O instrumento cabível para melhor compreender esta necessidade é o Relatório Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça.
A edição 2020 (ano-base 2019) do dito Relatório traz logo em sua apresentação tom comemorativo em relação à produtividade média dos magistrados. Afirma ter sido a maior dos últimos onze anos, com “aumento no número de processos baixados e, consequentemente, elevação da produtividade média dos magistrados em 13%, atingindo o maior valor da série histórica observada, com média de 2.107 processos baixados por magistrado”.17

Em uma hipótese sem pretensões de exatidão, considerando 200 dias trabalhados por ano (retirou-se 52 finais de semana, férias e feriados a fim de chegar a um número redondo) cada magistrado teria baixado 10,5 processos por dia. Se este é um número que já pode ser considerado alto, tendo em vista a complexidade do trabalho de sentenciar e que esta não é a única ocupação dos juízes, espanta observar números impraticáveis na tabela a seguir.

A soma dos casos novos com os casos pendentes dividida pelo número de magistrados ((CN + CP) / nº Mg) do Tribunal de São Paulo, por exemplo, revela que cada magistrado tem para trabalhar atualmente cerca de 9.343 processos, o que aplicado à  hipótese anterior resulta em 46,7 processos por dia de trabalho. Porém, esta conta não é  estanque e desde a publicação do Relatório mais atual muitos casos foram distribuídos, provavelmente em maior quantidade que a de processos baixados.18
Assim, demonstra-se com dados que “a busca contínua pelo processo judicial, a pouca adesão aos meios consensuais de solução de conflitos e a preferência pelas soluções adjudicadas, isto é, aquelas proferidas pelos juízes, não parece ser ocasional, mas sim um produto cultural” nas palavras precisas de Klever Filpo.19

Se a Teoria Geral do Processo ensina que “a solução dada pelo Estado-Juiz, por meio do processo judicial, representaria a forma mais sofisticada de administração dos conflitos numa sociedade civilizada”, na contramão da ideia de auto tutela e autocomposição, os dados apresentados demonstram que a sobrecarga do Poder Judiciário atingiu números, no mínimo, preocupantes, para não dizer insustentáveis.
Entretanto, o discurso se renova na valoração de soluções não jurisdicionais dos conflitos
como meios alternativos de pacificação social.20

Mediação, conciliação e arbitragem sem dúvida são o carro chefe destas alternativas de pacificação social e é plausível pensar como um ato de cidadania o disseminar destas ferramentas dentro e fora dos tribunais.
Um exemplo concreto de mediação tratando do bem-estar de um animal ocorreu no Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, de comarca da região Sul Fluminense. Preservado o sigilo em relação aos mediandos por se tratar de Processo originário da Vara de Família e da comarca por se referir a uma entrevista informal a uma Mediadora Judicial atuante naquele CEJUSC, teve-se notícia de caso recente em que um casal foi encaminhado para a mediação a fim de discutirem a guarda do cão após o divórcio.
A Mediadora relatou que na primeira sessão de mediação penso que o foco de discussão seria a partilha dos bens do ex-casal e que o cachorro seria tema secundário nas tratativas. Contudo, o casal possuía poucos bens móveis, que não dava razão a qualquer conflito na partilha. A guarda do cão era o centro das preocupações e motivo das discussões. No encontro, foi descrito que questões de cuidado e atenção com o animal, como por exemplo o ex marido preocupar-se de a ex mulher levar o cão para o sítio de seu pai nos finais de semana colocando-o em risco de ser picado por uma cobra ou a possível tristeza do cachorro caso ficasse sozinho durante o dia foram temáticas
abordadas que exigiram ajustes minuciosos na construção do acordo que só foi conquistado após três sessões de uma hora e meia, em média.21

Do mesmo modo, a advogada e mediadora Claudia Nakano, do Estado de São Paulo, em artigo sobre “conciliação e mediação para pets” afirma que “os conflitos mais comuns que chegam ao CEJUSC são brigas entre vizinhos, problemas em condomínios, possíveis erros veterinários, pedidos de guarda e regulamentação de visitas”22, o queratifica o entendimento de que a tutela dos animais em ambiente de diálogo onde eles não são meros objetos de demanda, mas sujeitos com interesses fundamentais de cuidados para suas vidas a ser considerados direta ou indiretamente, podem e já estão acontecendo.

Assim, conclui-se que são perfeitamente viáveis situações micro, no sentido de individuais, familiares, etc., onde os animais são considerados nos ajustes humanos como no exemplo ocorrido no sul fluminense ou em hipóteses como as que enumerou a mediadora de São Paulo. Some-se a isso, ser a mediação instrumento de suma importância para a pacificação social, uma vez que pautada na comunicação não-violenta, é capaz de retirar as pessoas de posições engessadas para visitarem e considerarem perspectivas e possibilidades diversas/contrárias às suas.
No que diz respeito à proteção do meio ambiente a mediação deve ser posta como solução apta a promover o diálogo, a pacificação social e melhoria qualitativa das condições de existência e manutenção do todo ecológico, o que contribui para uma relação saudável dos homens entre si e com a vida ecologicamente equilibrada.
Há que se acrescentar que as soluções e procura destas em relação ao meio ambiente são tão prementes, o que pode inclusive verificar nas negociações de acordos a serem firmados entre Mercosul e União Europeia, a má administração e proteção dos recursos naturais presentes no Brasil que integra o Mercosul, poderia significar a não entrada de investimentos no país causando fragilidade inclusive nas relações entre os Blocos Econômicos.23
Isso demonstra a necessidade de uma tratativa mais dialogal e célere dos dilemas envolvendo questões ambientais, inclusive no fomento de soluções consensuais, o inverso inclusive como se constata afeta diretamente o próprio desenvolvimento do país.
Nesse sentido, as soluções céleres são fundamentais para se evitar que o objeto de proteção seja afetado de modo irreversível a causar graves danos, com um imensurável número de afetados.
Os conflitos envolvendo questões relacionadas ao meio ambiente devem ser resolvidos o mais breve possível, sob pena de se ferir direitos fundamentais, bem como de tornar ineficazes as normas ambientais em razão da irreversibilidade de alguns atos envolvendo bens ecológicos. A precaução e prevenção, princípios intrínsecos desse ramo do direito, demonstram a fragilidade dos bens naturais, que devem ser preservados para as presentes e futuras gerações, não admitindo uma postura precária nas resoluções de conflitos que o envolvam.24

Conforme explicitado, a mediação é meio que se volta à solução de litígios e a pacificação social, ela tem por escopo criar ambiente propício ao diálogo, propiciando o conhecimento de realidades e posições, construindo o entendimento de uma visão prospectiva das relações inter partes.
Em relação ao direito dos animais e proteção ambiental, verifica-se ser meio eficaz de resolução célere e satisfatória de problemas que a depender da marcha processual podem se tornar irreversíveis, causadores de danos irreparáveis. Nesse escorreito, a opção pela mediação exige a formação de nova mentalidade a quebrar o paradigma da bipolaridade e conflito visto sob um ponto de vista negativo.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, considera-se a mediação como ferramenta eficaz para a construção de uma sociedade pacífica, que priorize os direitos difusos e coletivos sem olvidar que o meio ambiente equilibrado é um direito essencial à qualidade de vida e que o bem-estar dos animais está intimamente vinculado à saúde do planeta.
Encerra-se este artigo com a provocação de porque não considerar razoável, importante e necessário não ser uma utopia a construção de um panorama pacificador onde seja viável, por exemplo, sentarem-se à mesa de mediação um latifundiário e um ativista ambiental? Neste espaço poderiam construir juntos, sob inspiração constitucional, garantias para a sobrevivência da fauna e da flora de um determinado local, de modo que não impeça a produção suficiente de alimentos realmente saudáveis (sem venenos) para a comercialização, em um cenário onde o lucro não seja mensurado apenas em cifras, mas norteado por um interesse comum de qualidade de vida para humanos, animais, flora, rios, mares, etc., ou seja, com reflexos além do ambiente objeto daquela pauta.

São incontáveis as frentes de trabalho no desenvolvimento de qualidade de vida no Brasil e no mundo e o que precisa ser entendido como urgente é a percepção de que a preservação do meio ambiente deve nortear toda e qualquer discussão social, jurídica, processual, política, governamental, etc. em oposição à cultura da ganância, onde tudo se volta para ganhar mais e mais e estes ganhos são mensurados por moedas. Sem um ambiente humanamente habitável uma infinidade de problemas econômicos e financeiros simplesmente perderá o objeto. Neste contexto, o cuidado com o bem-estar dos animais é termômetro indicativo de avanços e retrocessos e a mediação é recurso que permite pacificar, criar, transformar, melhorar, repensar questões que pode deixar de ser conflitivas para ser ideias de interesse conjunto.

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Palavras Chaves

Meios propícios de solução de conflitos; mediação; meio-ambiente, direito dos animais, direitos coletivos, ação civil pública