A MEDIAÇÃO COMO UM MÉTODO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS NAS RELAÇÕES CONDOMINIAIS

Resumo

O Código de Processo Civil (Lei 13.105/15) definiu a mediação em seu art. 165 § 3˚ como um método de autocomposição de solução de conflitos para casos que envolvem relações já estabelecidas e continuadas, como ocorrem nas relações condominiais. Iniciativas foram implementadas, inclusive por entidades ligadas a esse ramo imobiliário, a fim de solidificar um trabalho de divulgação da mediação e outros métodos autocompositivos junto à classe de profissionais envolvidos com a gestão dos condomínios, bem como da própria comunidade condominial (moradores, administração, fornecedores, etc). Ao longo do texto, são abordadas situações do cotidiano de condomínios edilícios que são levadas às discussões adequadas para tratamento, pela via da mediação, em vez de possíveis judicializações de ações, bem como os aspectos positivos da mediação para que seja adotada como uma prática dialógica de solução de conflitos nesse setor.

Artigo

A MEDIAÇÃO COMO UM MÉTODO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS NAS RELAÇÕES CONDOMINIAIS

Fernanda Francisca Veras Carvalho

 

 

RESUMO

O Código de Processo Civil (Lei 13.105/15) definiu a mediação em seu art. 165 § 3˚ como um método de autocomposição de solução de conflitos para casos que envolvem relações já estabelecidas e continuadas, como ocorrem nas relações condominiais. Iniciativas foram implementadas, inclusive por entidades ligadas a esse ramo imobiliário, a fim de solidificar um trabalho de divulgação da mediação e outros métodos autocompositivos junto à classe de profissionais envolvidos com a gestão dos condomínios, bem como da própria comunidade condominial (moradores, administração, fornecedores, etc). Ao longo do texto, são abordadas situações do cotidiano de condomínios edilícios que são levadas às discussões adequadas para tratamento, pela via da mediação, em vez de possíveis judicializações de ações, bem como os aspectos positivos da mediação para que seja adotada como uma prática dialógica de solução de conflitos nesse setor.

Palavras-Chave: Autocomposição. Relações Condominiais. Mediação. Cultura do Diálogo.

1 INTRODUÇÃO

Em um condomínio edilício, existem situações que podem ensejar na necessidade de gerenciar o conflito de forma célere e eficaz, a fim de evitar o seu escalonamento. Não raras vezes, a judicialização tem sido o caminho mais percorrido pelas pessoas envolvidas nos conflitos que decorrem de embates acerca de barulhos, inadimplência, animais, obras, dentre outros motivos que levam a uma quebra de estabilidade nas relações interpessoais.

O instrumento da mediação é muito apropriado para o contexto condominial. O novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/15) trouxe essa ambiência favorável à prática dos métodos autocompositivos de solução de conflitos, a exemplo da Mediação, aqui focada. Em seu artigo 165 §3˚ (BRASIL, 2015a) preconiza que o mediador deve atuar, preferencialmente, nos casos em que houver vínculo mais duradouro entre as partes, como se apresenta nas relações presentes em um condomínio edilício, caracterizadas pela interdependência em função dos interesses em comum de quem vive num mesmo espaço geográfico, com áreas comuns de convivência. A preocupação em se obter um bom ambiente para se conviver envolve respeito aos espaços, regras, regulamento e regimento internos, convenção, dentre outros alicerces.

Nesse contexto, o objeto de análise do presente artigo é apresentar a mediação como um método adequado para solucionar os conflitos surgidos nas relações interpessoais em condomínios edilícios, por se tratar de um instrumento que imprime imparcialidade, privacidade, celeridade e menor custo e cuja eficácia já pode ser constatada na solução de conflitos vivenciados em outros setores da sociedade e pode significar um salto qualitativo na prática administrativa e jurídica do setor condominial.

A metodologia utilizada para elaboração do presente trabalho foi a pesquisa bibliográfica em livros sobre mediação e métodos autocompositivos e sobre Direito Civil e Processo Civil, em Códigos e Resoluções do Ordenamento Jurídico, na Carta Magna brasileira, em sites de instituições do setor imobiliário e de condomínios, além de artigos científicos extraídos na internet.

O presente artigo possui quatro seções, além dessa introdução. Na primeira delas, aborda-se a mediação e a utilização desse instituto nas relações condominiais e na segunda seção, sua aplicação como um método para a solução de conflitos e prevenção do seu acirramento no ambiente do condomínio edilício. Na sequência, as considerações finais e as referências bibliográficas.

O tema é relevante, tendo em vista os aspectos positivos inerentes à prática da mediação, que serão abordados em relação ao setor de condomínios, sobretudo pela existência da pandemia do coronavírus (Covid 19), que causou o confinamento das pessoas em seus lares e condomínios, que passaram a agregar homeoffices e homeschool, de forma que exigiu de todos maior disposição para cuidar desse espaço de convivência, com maior diálogo, respeito e celeridade na condução do tratamento dos conflitos condominiais.

2 O INSTITUTO DA MEDIAÇÃO NO AMBIENTE CONDOMINIAL

A Carta Magna brasileira clama, em seu preâmbulo, por “uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias” (BRASIL, 2018).

Trata-se de uma mensagem que refletiu junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que lançou a Resolução 125/2010 (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2010) tratando sobre a política judiciária nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesse. Propõe-se, com isso, olhar para o acesso à justiça com uma lente ampliada, visando buscá-la não somente pelo método heterocompositivo do judiciário, mas também permitindo às pessoas criarem, elas próprias, soluções para seus conflitos, acessando uma “ordem jurídica justa” (WATANABE, 2019, p. 3) e adequada ao seu perfil e à natureza do caso, abrindo-se para o campo da extrajudicialização e dos métodos autocompositivos.

A mediação foi regulada em 2015, pela Lei 13.140/15 (BRASIL, 2015b), cuja conceituação encontra lugar no artigo 1º, parágrafo único, “como meio de solução de controvérsias entre particulares, além da autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública”, sendo, portanto, uma atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, escolhido ou aceito pelas pessoas envolvidas na controvérsia, para auxiliá-las e estimulá-las a identificar ou desenvolver soluções consensuais e mutuamente satisfatórias para todos.

Ademais, a Lei de Mediação conceituou que o mediador é o profissional que, de forma neutra e imparcial, “conduzirá o procedimento de comunicação entre as partes, buscando o entendimento e o consenso e facilitando a resolução do conflito” (art. 4º, §1º, Lei 13.140/15).

Já o Código de Processo Civil (BRASIL, 2015a) solidificou normativamente a mediação. Faz-se uso da mediação, mais apropriadamente, quando existe vínculo anterior entre as partes que, pelo conflito, pode acabar se rompendo. Diz assim o art. 165 § 3º, do novo Código de Processo Civil (CPC/15):

  • 3º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.

De acordo com Muszkat (2008, p. 29):

[…] o conflito geralmente se inicia por um pequeno desentendimento que, dependendo da habilidade e flexibilidade na comunicação entre as partes que se desentenderam, pode vir ou não a se transformar numa controvérsia, que por sua vez desaguará no conflito, agora como franca disputa.

A mediação pode ser extrajudicial ou judicial. Na sua forma extrajudicial, ela ocorre em espaços privados, a exemplo das Câmaras de mediação, ou dentro dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs), que mesmo em sede de tribunal, ainda são sessões de mediação pré-processuais, conforme preceitua o art. 165 do Código de Processo Civil (CPC/15). O acordo resultante se torna um título executivo extrajudicial que pode se tornar judicial, quando levado à homologação pelo juiz. Já em sua vertente judicial, a mediação integra o processo civil, como uma janela para a busca da autocomposição, de acordo com o artigo 334 do CPC/15 (Lei 13.105/15).

Segundo Câmara (2004, p.24)

Trata-se, pois, de uma manifestação daquilo que Mauro Cappelletti chamou de jurisdição extrajudicial, a busca de soluções consensuais, em que se consiga destruir a animosidade existente entre as partes de modo a fazer com que suas relações sejam mantidas.

O mediador, mediante suas técnicas, vai realizar o seu trabalho com vistas a estimular os envolvidos a participar da mediação, como reais protagonistas em busca da resolução dos problemas que lhes afetam, por exemplo, dentro do condomínio onde vivem. Após recepcionar todos os interessados na mediação, o mediador realiza a abertura da sessão onde expõe todas as características desse instituto, informando-lhes sobre os princípios da imparcialidade, informalidade, confidencialidade, boa fé, busca do consenso, decisão informada e autonomia da vontade das pessoas, que são fundamentais para a condução da mediação e para a efetiva participação dos envolvidos.

Jonathan e Almeida (2019, p. 239) nos apresentam os seguintes estágios do processo de mediação:

(i) pré-mediação ou estágio preliminar; (ii) abertura da mediação; (iii) acesso ao conflito; (iv) investigação aprofundada do conflito; (v) redefinição do conflito e criação de alternativas; (vi) formulação e negociação de propostas; (vii) tomada de decisão consensual e término da mediação; (viii) acompanhamento.

Os mediandos estarão imbuídos em ouvir atentamente um ao outro, sem interrupções e julgamentos e, com base no animus consensual, buscarão gerar alternativas (brainstorm) e escolherão, em negociação, as opções que representem plausibilidade e satisfação mútua.

Por fim, o mediador elabora a ata contendo os termos do acordo, que pode ser transitório, parcial ou final ou mesmo não ter acordo. Não é obrigatória a presença de advogados, mas caso as pessoas estejam acompanhadas de seus patronos, considera-se de grande relevância e colaboração para que os parâmetros legais sejam observados. Durante a sessão de mediação, os mediandos podem consultá-los juridicamente sobre as opções que estão surgindo como solução para o conflito, em consonância com o princípio da mediação denominado “princípio da decisão informada” (CABRAL; CURY, 2018, p. 17).

Os advogados são interlocutores confiáveis, consultores jurídicos e podem colaborar para que a mediação condominial, por exemplo, cumpra seu curso, concedendo o protagonismo para o seu cliente, ao mesmo tempo em que o mantém informado sobre implicações, riscos, direitos e obrigações acerca do acordo que está sendo coconstruído, dentro de um viés cooperativo, incluindo a satisfação mútua e decisões sustentáveis. O acordo garante segurança jurídica e caso seja de interesse dos mediandos, apesar de não necessário, pode ser homologado em juízo. Como já mencionado, trata-se de um título executivo extrajudicial, e pode ser levado direto à fase de execução processual, caso não cumprido.

Por certo, para a mediação atingir uma maior capilaridade na resolução de conflitos condominiais, há de se começar pela difusão dessa cultura de diálogo, com a ajuda dos advogados que atuam nesse ramo, a fim de buscar melhor qualidade na comunicação interpessoal, além de possibilitar a capacitação de profissionais envolvidos na prestação do serviço condominial, seja pela administração, seja pela gestora do condomínio, pelos sindicatos e outros órgãos representativos desse setor imobiliário.

O objetivo é divulgar junto aos que trabalham, prestam serviços ou morem em condomínios edilícios, uma cultura consensual que possa, gradativamente, ir ganhando espaço, regidos pelo princípio da boa-fé, com viabilidade de acordos factíveis e sustentáveis para todos, que contemplem soluções representativas dos envolvidos no conflito, sob a condução imparcial de um mediador independente, deixando a decisão judicial para situações em que a autocomposição reste prejudicada.

3 A MEDIAÇÃO NAS RELAÇÕES CONDOMINIAIS COMO UMA PRÁTICA COTIDIANA E PREVENTIVA

A mediação condominial, na modalidade extrajudicial, apresenta aspectos positivos para o condomínio e para os moradores, pois além de ser uma maneira mais rápida de solucionar os conflitos, não expõe o nome do condomínio publicamente, evita causar prejuízo às potenciais transações imobiliárias de compra, venda e aluguel de apartamentos ou lojas (se comercial), além de evitar o acúmulo de passivos prejudicando a saúde financeira do condomínio.

Por meio dos veículos internos de comunicação, a administração do condomínio pode disseminar a mediação extrajudicial como o método preferencial para solucionar os eventuais conflitos que surgirem e, para tanto, realizar uma reunião de condomínio para obtenção de adesão dos condôminos e inclusão, nos documentos condominiais, para cumprir os requisitos dispostos no art. 1.333 do Código Civil (Lei 10.406/02), a exemplo do quórum na assembleia para alteração da Convenção do condomínio edilício (BRASIL, 2002).

Reportamo-nos também ao aspecto mencionado por Capanema (ZAIM, 2019, p. 1), sobre a possibilidade de existência de câmaras de mediação dentro dos próprios condomínios, a fim de lidar, preventivamente, com as questões que possam surgir, sem deixar escalonar os conflitos. Refletindo mais sobre o tema, ao ser indagado sobre quais ferramentas o síndico, por exemplo, poderia utilizar para atenuar os conflitos nos condomínios, Capanema respondeu:

A única posição e recomendação é a utilização do bom senso, da compreensão e uma dose muito forte de consciência de que é preciso desjudicializar a sociedade brasileira. Se os condomínios, principalmente aqueles que têm um número significativo de condôminos constituírem “Câmaras de Mediação” para os conflitos internos, a qualidade de vida nesses condomínios melhoraria muito. É preciso que todos compreendamos que viver em condomínio exige renúncia e compreensão principalmente do fato de que acima dos interesses pessoais devem estar os interesses coletivos (CAPANEMA apud ZAIM, 2019, p. 1).

Esforços no sentido da utilização da mediação já constituem uma realidade em Sindicatos do setor, a exemplo do Secovi Rio (Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis e dos Condomínios Residenciais e Comerciais em todo o Estado do Rio de Janeiro) que representa legalmente condomínios, imobiliárias e incorporadoras, ao ter instalado uma Câmara de Mediação, contando com um elenco de mediadores independentes, já cadastrados, demonstrando que, num primeiro momento, todas as questões que envolvem os seus clientes podem ser solucionadas por meio da mediação.

A cartilha elaborada pela ABADI (Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis), em julho de 2020, intitulada “Protocolo “ABADI de Melhores Práticas em Mediação Condominial”, trata de um guia de consulta para síndicos, administradoras e todos os envolvidos na esfera condominial. Conforme Wania Baeta (2020), uma das idealizadoras da mencionada cartilha, “o mediador será escolhido pelas partes, seus advogados e/ou pelo síndico, sendo recomendável que tenha expertise na área que for atuar”. Ela acrescenta que a remuneração do mediador pode se dar pela tabela de remuneração da Câmara Privada, por exemplo, ou pelo honorário informado pelo próprio mediador adoc (independente). Podem ser agregados outros profissionais como perito, engenheiro, arquiteto, mestre de obras, eletricista, pedreiro, dentre outros, a fim de prestar informações necessárias ou apresentar laudos, viabilizando a facilitação na busca da melhor solução para todos.

Vale ressaltar que a instalação de uma Câmara de Mediação dentro de um condomínio ou de um sindicato deve primar pela independência e imparcialidade dos mediadores, princípios básicos da mediação, tendo em vista que o aspecto da confiança no serviço de mediação a ser prestado não deve ser questionado por quaisquer dos envolvidos e seus advogados, se os tiverem acompanhando.

Para tanto, o mediador bem capacitado vai saber conduzir o trabalho com neutralidade, celeridade e eficiência. Vai procurar ficar atento a conflitos decorrentes do poder e autoridade desiguais, de posições divergentes, da falta de informações por uma das partes, da comunicação e comportamentos inadequados, ao tempo em que vai ressaltar os interesses em comum ou passíveis de entendimento.

No caso específico do condomínio edilício, de acordo com Lantos (2018), existem cinco dimensões da gestão condominial que merecem atenção e podem gerar motivos para a mediação, a saber: “organizacional, operacional, planejamento financeiro, comunicação e relacionamento”. Ele acrescenta que as principais situações de conflitos ligadas a essas dimensões decorrem da dificuldade de convivência entre os condôminos; da existência de comportamentos antissociais; do barulho de animais e de crianças; de discriminação por parte dos condôminos em relação aos funcionários, de intrigas entre os funcionários; intrigas entre diferentes gerações ou diferentes culturas; da postura antiética dos gestores; da disputa de poder em relação à gestão; da falta de transparência da gestão; da inadimplência; da falta de prioridade nos investimentos; da existência de infiltrações e de obras nos apartamentos; da falta de cumprimento da convenção por desinteresse ou desconhecimento do condômino ou dos gestores; pelo descumprimento de outros aspectos legais, como a lei do silêncio, ou mesmo problemas contratuais com prestadores de serviços e fornecedores externos.

Lantos (2018) ainda ressalta que, preventivamente, ações podem ser realizadas pelo próprio condomínio nessas dimensões de gestão, para evitar ou para melhor gerir os possíveis problemas, a fim de proporcionar melhores resultados gerais para a sua administração e para todos que participam do condomínio. Para essa mudança de postura visando a cultura do diálogo, ele destaca algumas atividades de prevenção de controvérsias, tais como o compartilhamento de informações de interesse do condomínio e dos condôminos de forma transparente; participação em palestras de sensibilização em relação a conviver em condomínio e aos conflitos de vizinhança; treinamento da equipe do condomínio (síndico, conselheiros, gestores e funcionários em geral) em competências relativas ao diálogo  e comunicação não violenta (CNV) e técnicas de construção de consenso; organização dos sistemas de gestão (conselhos, comissões internas), planejamento prévio, apoio na construção de pautas e atas, definição de temas, datas e horários, além de buscar o envolvimento de todos que convivem no condomínio.

A mediação pode ser utilizada, sempre que couber, sendo um instrumento acessível, tempestivo e efetivo. “Nada afeta tão negativamente a qualidade de vida de uma pessoa quanto um conflito entre vizinhos”, conforme alerta Capanema (apud SECOVI, 2014, p. 1). Para o condomínio, a inadimplência, por exemplo, afeta a saúde financeira e acaba tornando-se um problema que deve ser resolvido com celeridade, o que pode ser proporcionado pela mediação. A negociação fica nas mãos das pessoas que melhor sabem sobre o caso, que conseguem criar soluções conjuntas, aumentando a probabilidade dos envolvidos ficarem satisfeitos com o resultado.

Segundo Tania Almeida (2008), “a autoria das soluções devolve aos mediandos o controle do processo decisório sobre suas próprias vidas e possibilita que a solução eleita atenda a seus reais interesses, necessidades e valores”. E acrescenta que o cumprimento do que é acordado na Mediação é uma consequência natural, vez que as pessoas se comprometeram quando estavam buscando as soluções durante o procedimento da mediação.

Preventivamente, ao lidar com os assuntos condominiais, o papel do advogado que trabalha nesse ramo, configura-se também como um gestor de conflitos, que vai trabalhar baseado nas necessidades desse nicho de clientes, dentro das dimensões de gestão condominial, a exemplo das citadas nessa seção. Além do seu conhecimento jurídico, assaz importante, ele fará uso de habilidades negociais e comunicacionais, que lhe permitirão ir além do positivismo da lei e encontrar saídas, junto com seus clientes, que representem a inclusão de outros fatores como os relacionais, financeiros, emocionais, no sentido de que as pessoas envolvidas num conflito dentro de um condomínio preservem a sua capacidade de dialogar, de solucionarem controvérsias contemplando a todos e de manter um ambiente saudável de convivência.

Segundo Tania Almeida (2008, p.1):

[…] os advogados podem ter extensa atuação na Mediação. Além de oferecerem os parâmetros legais para os temas em negociação podem, ainda, assessorar seus clientes: 1) na escolha do mediador, privilegiando o conhecimento na matéria ou na condução do processo de Mediação; 2) na identificação de seus interesses e necessidades, clarificando a demanda; 3) no preparo para participar da Mediação, informando sobre os princípios éticos, a dinâmica do processo e seus procedimentos; 4) na identificação dos interesses e necessidades da outra parte, auxiliando a criar soluções de benefício mútuo.

Assim, o advogado que trabalha em assuntos condominiais exerce um papel muito diferenciado quando ele se apresenta como o profissional que vai assessorar seu cliente, considerando essa visão mais ampliada do conflito, levando em conta o protagonismo das pessoas, autonomia das suas vontades, boa-fé, transparência, confidencialidade, inclusão dos interesses de todos os envolvidos na questão, escuta atenta, cultura do diálogo e consenso.

Para Capanema (2019), em palavras proferidas para o 1º Congresso Mato-grossense de Direito Condominial, divulgado em outubro de 2019, pela TV Síndico Legal, “o Direito Condominial está conquistando o seu lugar no vastíssimo mundo do Direito e é o Direito do futuro, vez que novas formas de condomínio estão surgindo”. E a mediação é igualmente uma oportunidade de atuação profissional do advogado que atua nesse ramo imobilário.

            Essa postura do advogado estará em consonância tanto com o papel garantidor do acesso do seu cliente à justiça, no entendimento de “acesso a uma ordem jurídica justa” (WATANABE, 2019, p. 3), como também com o seu dever ético, constante no art. 2° inciso VI, do Código de Ética e Disciplina da OAB (Res 02/2015), do profissional que vai “estimular, a qualquer tempo, a conciliação e mediação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios”.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Baseados no novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/15) que nos proporciona a mudança paradigmática pela busca da Justiça de forma menos adversarial e a Lei de Mediação (BRASIL, 2015b), torna-se essencial que todos que trabalhem na prestação de serviços condominiais deem atenção destacada a esse movimento legal de aplicação dos métodos autocompositivos de solução de conflitos, a exemplo da mediação, objeto desse trabalho, estimulando a cultura do diálogo, frente à judicialização de ações, buscando-se a preservação das relações que são duradouras e continuadas no tempo, como as que ocorrem dentro de um condomínio edilício.

Diante das questões condominiais, o mediador, por meio das técnicas, buscará facilitar o diálogo entre as pessoas, para que participem coconstruindo uma solução de satisfação mútua, um resultado factível e sustentável para todos. O acordo proveniente da mediação privada é considerado um título executivo extrajudicial e se desejarem, pode ser homologado pelo juiz, tornando-se um título executivo judicial.

São várias situações cotidianas em um condomínio que podem gerar conflitos, como infiltrações, barulhos excessivos de animais e crianças, descumprimento às regras, inadimplência, dentre outras. Ações preventivas podem ajudar a diminuir essa incidência de conflitos ou evitar o escalonamento dos mesmos, num trabalho conjunto de todos que estão envolvidos diretamente ou indiretamente nessas questões condominiais.

Considera-se relevante que a gestão e a administração condominial estimulem a utilização da mediação, alterando, quando necessário, seus normativos (regimento interno, convenção) e que os moradores tenham um maior conhecimento e entendimento a respeito dos benefícios da Mediação e outros métodos autocompositivos, tão salutares à resolução de lides condominiais, proporcionando maior celeridade e efetividade e cuidado com as relações interpessoais.

Atualmente existem câmaras privadas de conciliação, mediação e arbitragem que lidam com questões condominiais, mas igualmente podem ser realizadas por mediadores autônomos, independentes (adoc). Prima-se que a mediação seja largamente incentivada por advogados do setor condominial, por ser considerada uma ferramenta do Direito privado na resolução de conflitos decorrentes de direitos patrimoniais e disponíveis. Conhecer mais detalhadamente a mediação, seus princípios e modus operandis, em busca da facilitação de diálogos, envolve tanto os operadores do Direito, quanto o administrador, gestor, síndico e sindicatos, condôminos, fornecedores e demais profissionais ligados a essa área.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CABRAL, Trícia Navarro Xavier; CURY, Cesar Felipe (Orgs). Lei de Mediação comentada artigo por artigo. São Paulo: Foco, 2018.

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Fernanda Francisca Veras Carvalho:

 

Psicóloga formada pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, em 1989. Advogada formada pela Universidade Cândido Mendes, em 2016. Pós-graduada em Direito Civil, Processo Civil e Direito Imobiliário pela UCAM (2018). Pós-graduada em Mediação Judicial pelo IUPERJ/Nupemec (2019). Associada ao Instituto Brasileiro de Práticas Colaborativas. Mediadora judicial do TJRJ e extrajudicial adoc. Membro da Comissão de mediação da OAB Barra (2019/21).

 

 

Palavras Chaves

Autocomposição. Relações Condominiais. Mediação. Cultura do Diálogo.