A PROTEÇÃO PELA APARÊNCIA COMO PRINCÍPIO

Resumo

O texto trata da chamada “teoria da aparência”, abordando-a como um princípio jurídico autônomo, que encontra justificação na proteção da confiança e cujas condições de aplicação demandam circunstâncias específicas, em ponderação com outros interesses também merecedores de tutela.

Artigo

A proteção pela aparência como princípio*

Carlos Nelson Konder**

Resumo: O texto trata da chamada “teoria da aparência”, abordando-a como um princípio jurídico autônomo, que encontra justificação na proteção da confiança e cujas condições de aplicação demandam circunstâncias específicas, em ponderação com outros interesses também merecedores de tutela.

Palavras-chaves: Aparência; Confiança; Princípio.

Sumário: 1. Proteção da confiança; – 2. A chamada teoria da aparência; – 3. Casos de aparência de direito; – 4. A aparência de representação; – 5. Fundamentos da teoria da aparência; – 6. Requisitos para a proteção pela aparência; – 7. Críticas à teoria da aparência; – 8. A proteção da confiança em virtude da aparência concebida como um princípio; – 9. Conclusão; – 10. Referências.

1.      Proteção da confiança

O período em que vivemos, denominado por alguns alta-modernidade (ou, por outros, pós-modernidade), caracteriza-se pela multiplicação e extensão das atividades humanas. A velocidade das comunicações, a eficiência dos transportes e a concentração dos negócios nos grandes núcleos urbanos são apenas alguns efeitos de processos como a industrialização, a revolução tecnológica e a globalização, todos interligados entre si e conducentes ao crescimento da complexidade das relações jurídicas.

Na atividade cotidiana, assistimos a um processo que leva da mera especialização a uma funcionalização sistêmica.[1] Isto é, se nas comunidades tradicionais a vida social podia funcionar apenas com base em alguns profissionais especializados que, com seu know-how específico, desempenhavam um papel singular na coletividade – o ferreiro, o padeiro, o carpinteiro, o artista – a complexificação conduz hoje à formação de gigantescos sistemas abstratos, funcionalmente diferenciados.

Em especial, a alta-modernidade está profundamente baseada na existência do que Anthony Giddens chama de “sistemas peritos” (expert systems), que são “sistemas de excelência técnica ou competência profissional que organizam grandes áreas dos ambientes material e social em que vivemos hoje”.[2] Trata-se de sistemas de considerável magnitude formados por experts de diferentes especialidades reunidos em uma intrincada organização que, em virtude de sua absurda complexidade técnica, revelam-se indecifráveis para o observador leigo externo e, da mesma maneira, anônimos, em face da impossibilidade de identificar um responsável central.[3]

Uma decorrência da proliferação de tais sistemas é o papel central que passa a desempenhar a confiança. Não a confiança pessoal, fundada nas qualidades morais daquele em quem se confia, mas uma confiança fundada na correição de princípios dos quais se é ignorante, no que Giddens denomina “compromissos sem rosto” (faceless commitments).[4] Confiança não na integridade das pessoas que compõem o sistema, mas uma fé no conhecimento em relação ao qual a pessoa leiga é completamente ignorante.[5]

Estamos cercados por tais sistemas – e deles dependemos – em nosso dia-a-dia: quando se entra em um automóvel e dirige em uma cidade, quando se faz check-in em um aeroporto e se embarca em um avião, quando se saca dinheiro no caixa eletrônico, quando se investe na bolsa, quando se envia um e-mail, quando se faz um telefonema. Mesmo em casa, o indivíduo está imerso em sistemas nos quais deposita confiança: mesmo ignorando os códigos que permitiram aos arquitetos e engenheiros levantar o prédio, é possível subir as escadas sem medo de a estrutura desabar.

Em virtude disso, a conduta individual busca a simplificação que a confiança fornece, uma vez que os custos de cada demanda por informação seriam incalculáveis. Um cético, orientado pela necessidade de plena compreensão racional de cada um dos sistemas de que faz uso, dificilmente conseguiria viver nesta sociedade.[6] Nesse cenário cotidiano, confiar deixa de ser um ato de liberalidade ou de imprudência e torna-se uma necessidade, como enfatiza Niklas Luhmann:

una completa ausencia de confianza le impediría [el hombre] incluso levantarse en la mañana. Seria víctima de un sentido vago de miedo y de temores paralizantes. Incluso no sería capaz de formular una desconfianza definitiva y hacer de ello un fundamento para medidas preventivas, ya que esto presupondría confianza en otras direcciones. Cualquier cosa e todo sería posible. Tal confrontación abrupta con la complejidad del mundo al grado máximo es más de lo que soporta el ser humano.[7]

Mas esta aceitação tácita, por estarem descartadas as alternativas, não decorre apenas de uma dependência passiva do leigo.[8] Do outro lado, o empresário faz uso desse novo ritmo de mudança, que desvencilhou os modos de vida da modernidade dos tipos de ordem social tradicional. Ele não aguarda a demanda do cliente; cria o desejo através da publicidade. A marca ganha um sobrevalor considerável, pois ela é determinante como elemento inspirador de confiança.[9] Nas palavras de Gerson Branco:

O valor confiança é um dos pilares centrais de todo o direito. Somente existe a possibilidade de convivência social se o valor confiança está presente. Os mecanismos de proteção deste valor são muitos e, regra geral, existem leis e procedimentos para sua proteção. E, justamente em razão da crescente valorização da confiança e da consciência do fenômeno, o valor confiança passou a ser considerado como um valor econômico, em razão de grandes investimentos realizados no mercado de consumo após os anos setenta, por meio de ‘estratégias de confiabilidade’.[10]

Enfim, fica claro que “a confiança está portanto envolvida de uma maneira fundamental com as instituições da modernidade”.[11] É ela que viabiliza o funcionamento do sistema, na medida em que reduz a complexidade social ao desprezar as variáveis abstratas, distantes e complicadas.

Ao Direito não passou despercebida tamanha transformação social, muito menos o novo papel desempenhado pela confiança. Além de encontrar justificação na incidência direta dos preceitos constitucionais que concretizam uma reformulação axiológica do sistema tradicional, a ampla consagração do princípio da boa-fé objetiva é um exemplo marcante dessa proteção da confiança demandada pela própria organização social.[12]

Todavia, a proteção jurídica da confiança não se resume à aplicação do princípio da boa-fé objetiva.[13] Existem determinadas situações que não se enquadram nos parâmetros de aplicação daquele princípio, mas nas quais ainda assim a proteção se justifica. . Explica Anderson Schreiber:

“o reconhecimento da necessidade de tutela da confiança desloca a atenção do direito, que deixa de se centrar exclusivamente sobre a fonte das condutas para observar também os efeitos fáticos da sua adoção. Passa-se da obsessão pelo sujeito e pela sua vontade individual, como fonte primordial das obrigações, para uma visão que, solidária, se faz atenta à repercussão externa dos atos individuais sobre os diversos centros de interesses, atribuindo-lhes eficácia obrigacional independentemente da vontade ou da intenção do sujeito que os praticou. É nesse contexto que se inserem a teoria da declaração, a teoria da aparência, e até, de certa forma, a ampliação dos casos de responsabilidade objetiva, além de outras manifestações jurisprudenciais que apenas recentemente vêm sendo objeto de um esforço capaz de remetê-las à tutela da confiança”.[14]

São exatamente os casos em que a confiança se funda em uma aparência de legitimidade jurídica, que, como foi observado, é justificável e mesmo necessária na sociedade contemporânea. A tutela jurídica da confiança construída em virtude de uma aparência foi abordada em doutrina pela designada teoria da aparência.[15]

2.      A chamada teoria da aparência

A teoria da aparência, fazendo uso da denominação mais utilizada em doutrina, é um instrumento por meio do qual, em nome da proteção do sujeito de boa-fé, se desconsidera o vício interno de uma situação aparentemente válida para fazer valer a situação como se perfeita e regular fosse. Para proteger aquele que, de boa-fé, negocia com um falso titular do direito, a lei impõe a produção dos mesmos efeitos jurídicos que o negócio surtiria se ocorresse com o assentimento do verdadeiro legitimado, invadindo, portanto, seu patrimônio.[16]

Há necessariamente algum sacrifício do verdadeiro titular do direito, que sofrerá os efeitos da conduta do titular aparente. Mas, em nome da proteção da justificada confiança daquele que se fiou na aparência, o ordenamento admite nestas hipóteses a imposição desse ônus ao titular. Em tais casos, o verdadeiro legitimado terá que suportar os efeitos da situação jurídica aparente e se contentar em acionar apenas aquele que deu causa à aparência de legitimação pelas perdas e danos gerados. Os relevantes interesses em jogo gerados pelo “parecer” levam a reconhecer efeitos jurídicos naquela situação a princípio puramente fática.[17] O erro é eliminado por força da lei e a vontade de quem errou é preservada não através da anulação de um negócio, como no erro-vício, mas ao reconhecer eficácia às declarações que formam o conteúdo do ato.[18]

Busca-se assim proteger a boa-fé nas relações jurídicas, a segurança, a lealdade e, principalmente, a confiança. Por conta disso, há autores que preferem denominar a teoria da aparência de princípio ou doutrina da confiança, equiparando a teoria ao seu fundamento.[19] Com a proteção de quem, de boa-fé, confiou na aparência também se evita uma incômoda, trabalhosa, ou mesmo impossível verificação preventiva da realidade, garantindo a agilidade e praticidade necessárias ao comércio jurídico cotidiano.

Atribui-se sua criação e utilização a uma necessidade jurídico-econômico-social,[20] a qual resulta da já referida multiplicação e extensão das atividades humanas favorecida pela velocidade das comunicações, permitindo uma economia de tempo e de atividades.

Nos negócios civis e empresariais, especialmente os bancários, o aspecto fiduciário ganha relevo especial, para providenciar o necessário “clima de credibilidade e a desnecessidade de verificação exaustiva de todos os dados comunicados por uma das partes à outra”.[21]

A conveniência de proteger a confiança fundada na aparência está diretamente ligada ao diagnóstico dos “sistemas peritos” e dos “compromissos sem rosto”, como demonstra Ricardo Luis Lorenzetti.[22] Neste âmbito, a utilização do standard contratual tradicional levaria a considerar negligente o consumidor ou usuário, pois ele atua em cima de um conhecimento indutivo bastante frágil. Contudo, ele se encontra adstrito a esta conduta em virtude da abrangência e inextrincabilidade do sistema. Portanto, o novo contexto demanda a reformulação dos modelos de comportamento racional do “contratante médio”, ao menos em tais situações.[23] Nelas, a chamada teoria da aparência figura como um instrumento jurídico adequado a esta nova conformação social.

3.      Casos de aparência de direito

Não há, em nosso ordenamento, uma cláusula geral de proteção da confiança em virtude da aparência. Para alguns autores, é possível inferir a aceitação em nosso direito da teoria da aparência como um princípio implícito.[24] Contudo, o entendimento é bastante controvertido.[25]

O que há em nosso sistema é uma série de dispositivos específicos de aparência de direito, isto é, situações concretas nas quais se protege o sujeito de boa-fé em virtude de uma falsa aparência de regularidade jurídica, em detrimento do verdadeiro titular do direito.

Não se trata de casos de mera consideração da aparência no direito, como na posse, no direito cambiário e na fé pública, mas dispositivos nos quais a aparência prevalece como mecanismo de saneamento de uma situação erroneamente percebida.[26] Uma breve apresentação de tais normas serve à finalidade de ilustrar os parâmetros em que a teoria se justifica.

O primeiro destes casos é o do herdeiro aparente (CC, art. 1.817). O dispositivo determina a validade da alienação onerosa e dos atos de administração praticados pelo herdeiro aparente antes de sua exclusão. Isto é, se aquele que se encontrava excluído da sucessão (CC, art. 1.814), mas figurava na ordem de vocação hereditária – ou seja, aparentava ser herdeiro –, vier a dispor de bens da herança antes de efetivada sua exclusão, o terceiro que, de boa-fé, confiou na aparência de herdeiro efetivamente adquire os bens, devendo o verdadeiro herdeiro prejudicado interpelar o alienante por perdas e danos.

Outro caso é o do credor putativo (CC, arts. 309 e 311). O devedor que, de boa-fé, pague a quem aparenta ser credor estará exonerado da obrigação, pois será reputado válido (rectius, eficaz) o pagamento.

Também prevalece a alienação feita por proprietário aparente a adquirente de boa-fé quando esta tiver lugar em leilão ou estabelecimento comercial (CC, art. 1.268). Neste caso, a lei exige expressamente que a transferência ocorra “em circunstâncias tais que, ao adquirente de boa-fé, como a qualquer pessoa, o alienante se afigurar dono”.

Outro caso é a capacidade aparente (CC, art. 180). Para tal, a lei veda ao menor que dolosamente omitiu sua incapacidade invocá-la para se eximir da obrigação. Neste caso, permanece válido o negócio efetuado, independente da incapacidade que o vicia, em nome da proteção da outra parte que confiou na aparência de maioridade e do princípio de que ninguém pode se beneficiar da própria torpeza.

Podemos mencionar ainda o casamento putativo (CC, art. 1.561). No que toca aos filhos, ou mesmo ao cônjuge de boa-fé, o casamento nulo ou anulável produz todos os efeitos que um casamento válido produziria, até o momento da sentença que o declare inválido.

Enfim, há o caso clássico do mandato aparente (CC, art. 689), no qual todos os atos do mandatário ajustados com contratantes de boa-fé são válidos e vinculam o mandante enquanto o mandatário ignorar a extinção do mandato. A aparência de representação, contudo, merece destaque especial.

 4.      A aparência de representação

O caso mais exemplificativo da aparência de direito é a representação aparente. Ela aplica-se tanto no âmbito civil do mandato como na denominada representação orgânica do direito empresarial.[27]

A representação é paradigmática por sua evolução. Um primeiro passo foi a admissão da própria ideia de representação, vedada no direito romano, por meio da qual se passa a admitir que os atos de outrem surtam efeitos diretos no patrimônio do titular.[28]

De início, isto só poderia ocorrer por meio de um contrato de mandato. Contudo, justamente com o desenvolvimento da vida negocial e da necessidade de agilidade nas transações, passa-se a cogitar da representação instituída por outros contratos ou, às vezes, mesmo independente de outorga voluntária do poder de representação. Ganhou força a denominada teoria da separação, que torna o negócio jurídico da representação abstrato, independente do contrato que regula seus efeitos entre representante e representado.[29] Como indica Anderson Schreiber, “a teoria da separação traz, assim, uma clara opção pela proteção do terceiro (de boa-fé) em desfavor do representado”.[30]

Para Ricardo Luís Lorenzetti, podemos falar ainda de efeitos de representação originados simplesmente em virtude de comportamentos típicos objetivados que autorizem tal interpretação daquele que confia, como em situações cuja prolongação e reiteração no tempo cria uma determinada expectativa.[31]

Não apenas nas cogitações doutrinárias é possível encontrar reflexões sobre a aparência de representação, mas também a jurisprudência nacional vem se manifestando sobre o tema, a começar pelo leading case julgado pelo Supremo Tribunal Federal em 1974.[32] Tratava-se de um aparente diretor da financiadora Finan S.A. que colheu uma série de investimentos com o anúncio de títulos que possuíam o alto rendimento de 34%. Ele, contudo, encontrava-se legalmente impedido de atuar na empresa gerenciando capital alheio por ter passado a ocupar o cargo de corretor de fundos públicos. Os títulos naufragaram e o dinheiro investido foi desviado para o uso pessoal do aparente diretor da empresa, que depois se suicidou, levando os clientes ao judiciário para que a Finan S.A. os indenizasse. A aplicação da teoria da aparência prevaleceu mesmo no STF, em virtude de o falso diretor possuir todos os atributos idôneos a produzir uma aparência convincente: possuía gabinete privativo nos escritórios da empresa, era tratado por “diretor” e participava de suas decisões internas.

Uma série de outros casos foi historicamente objeto de decisões judiciais favoráveis à proteção da confiança fundada na aparência, como o funcionário de banco que se utiliza maliciosamente da aparência de autorização para recolher capital alheio para investimento,[33] o comerciante que confia na aparência formal de regularidade de títulos e escrituração,[34] a utilização no que se refere a grupos de empresas[35] e, em matéria processual, o oficial de justiça que efetua a citação em pessoa diferente do réu.[36]

5.      Fundamentos da teoria da aparência

Diversos foram os fundamentos levantados em doutrina para justificar a proteção jurídica da confiança na aparência, como a posse de direitos e a validade do negócio ostensivo nas simulações. Mas entre eles, os que foram utilizados e desenvolvidos com maior intensidade são os fundamentos que se passa a examinar.

Na teoria alemã, a proteção da aparência está ligada ao princípio geral da publicidade, à confiança gerada pelo título.[37] Ocorre que o sistema germânico é profundamente abstracionista no que toca aos negócios jurídicos, ou seja, é mais recorrente a vedação de invocação dos vícios internos de um negócio que seja formalmente adequado. Desse modo, a proteção em virtude da aparência pode ganhar grande abrangência exclusivamente fundada na publicidade do título, por conta do formalismo característico daquele ordenamento, o que não ocorre em outros sistemas, como destaca Orlando Gomes:

Trata-se de uma construção teórica que não pode ser transplantada para outros sistemas que não emprestam tanta importância ao título formal. É claro, porém, que num ordenamento formalístico, a proteção do terceiro se torna muito mais enérgica e intensa porque fica ele dispensado de justificar sua conduta, sempre que tiver agido com fundamento num título formal.[38]

Já no modelo anglo-saxão a equidade é o fundamento tradicionalmente utilizado, pois as cortes possuem a prerrogativa de realizar o julgamento por equity.[39] Além disso, o papel da appearance doctrine é completado por outros instrumentos, como a disregard of legal entity doctrine.[40]

Na teoria francesa, por sua vez, fundamenta-se a aparência no erro, ou mais precisamente, no princípio error comunis facit ius.[41] Segundo a doutrina mais tradicional, tal erro deveria ser invencível, mas tal posição vem sendo atenuada pela simples exigência de que o erro seja escusável. Esta nova orientação tem por ponto de partida a decisão do caso Banque Canadienne Nationale c. Directeur Général des Impôts, em 13 de dezembro de 1962: o presidente do Banco havia subscrito uma caução em nome da instituição financeira sem poderes para fazê-lo, mas o Tribunal reconheceu que o Banco estava vinculado uma vez que, naquelas circunstâncias, a outra parte (Administração Pública) não estava obrigada a exercer uma pesquisa exaustiva acerca de poderes especiais dos administradores do banco – passa-se assim da exigência de um erro invencível para a suficiência de uma crença legítima.[42]

A crítica central ao error comunis está na necessidade de que o erro seja compartilhado, se não pela totalidade, ao menos pela generalidade das pessoas, desprezando as peculiaridades de cada caso. O caminho trilhado por boa parte da doutrina é, diante da insuficiência do erro como fundamento da aparência, combiná-lo com a boa-fé.[43]

O princípio da boa-fé, por sua vez, é um dos fundamentos invocados de maneira mais recorrente para justificar a tutela fundada na aparência, em especial por autores mais tradicionais, que não distinguiam a boa-fé subjetiva (estado psicológico de ignorância do vício) da sua concepção objetiva (princípio que impõe regras de conduta nos negócios jurídicos).[44] A confusão permitia invocar um princípio da boa-fé subjetiva, que teria, em certos casos a eficácia saneadora de atos viciados. Hoje, contudo, a doutrina reconhece a distinção, mas indica na proteção pela aparência “uma ponte entre as boas fés objectiva e subjectiva, devendo assentar em ambas”.[45] Ocorre, no entanto, que os contornos atualmente bastante definidos da boa-fé objetiva não parecem suficientes para abarcar a tarefa de justificar a proteção da aparência, ao menos não em todos os casos.

Também foi por vezes utilizada a responsabilidade civil como fundamento da preservação do negócio fundado na aparência, como um mecanismo de reparação integral do dano que a nulidade do negócio causaria. Planiol e Ripert afirmavam tratar-se de uma hipótese de responsabilidade subjetiva, mas Crémieu cogitava mesmo de enquadrar os casos na responsabilidade fundada no risco.[46] A crítica a este fundamento está no fato de muitas vezes ocorrer a aparência de direito sem culpa do titular do direito, sem atividade de risco, ou mesmo sem nexo de causalidade entre a conduta do verdadeiro titular e a aparência criada.[47]

É certamente de Ricardo Luis Lorenzetti a ideia mais inovadora acerca da proteção da confiança em virtude da aparência: uma nova técnica de conclusão de negócios.[48] Para o autor, cada técnica conceitual corresponde a um determinado suporte fático. No caso dos tradicionais vínculos pessoais individualizados, presentes em contextos paritários onde a confiança existe em sentido genérico, o consentimento é o instrumento por excelência. Já nas condições gerais de contratos de massa, onde há necessidade de um controle legal da incorporação do sujeito (em geral o consumidor) e do conteúdo do contrato para compensar condições desiguais, a adesão é a forma negocial típica. Mas no atual contexto social, caracterizado pelos sistemas peritos de Giddens, observa-se uma nova fattispecie: a oferta como aparência e a aceitação baseada na confiança. Nestes casos, tanto o consentimento como a adesão se revelam insuficientes porque há efeitos jurídicos que não estão ligados a declarações de vontade, mas a comportamentos objetivos típicos aos quais o ordenamento imputa conseqüências. O ofertante não se obriga por sua vontade, mas pela aparência jurídica criada. O aceitante se vincula menos pela sua declaração de vontade do que pela confiança que depositou. Para o doutrinador argentino, no que tange às fontes do negócio jurídico, a autonomia da vontade não é a regra geral com determinadas exceções.[49] O que há é uma pluralidade de fatores de atribuição de efeitos negociais, como uma característica da complexidade social de nossa época. Substitui-se assim o conceito voluntarístico de negócio jurídico pelo que se insere nas ideias de autorresponsabilidade e confiança.

6.      Requisitos para a proteção pela aparência

Embora haja grande controvérsia em torno de quando se justifica proteger aquele que confiou na aparência em detrimento do real titular do direito, é possível sintetizar em três os requisitos que são normalmente aduzidos para a aplicação da chamada teoria da aparência.

O primeiro requisito é a própria aparência: a existência de uma situação de fato cercada por circunstâncias em virtude das quais se apresente como seguramente de direito.[50] Ou seja, circunstâncias aptas a suscitarem a confiança objetiva na legitimidade jurídica da situação aparente.[51] Para Lorenzetti, esta aparência surge quando há comportamentos socialmente típicos (reiterados no tempo e generalizados de maneira a gerar expectativas) situados no âmbito dos sistemas peritos.[52]

O segundo requisito refere-se ao sujeito passivo, isto é, aquele que confiou na aparência. Para a maior parte da doutrina, ele deve, de boa-fé, incidir em um erro escusável, possuir uma razoável justificativa para acreditar.[53] O erro escusável aqui, contudo, ganha características especiais: por um lado, sua conformação é mais rigorosa, na medida em que se exige maior diligência por conta dos sacrifícios envolvidos;[54] por outro lado, seu efeito é distinto do erro-vício, que tem o condão de anular um negócio jurídico válido, podendo se falar aqui de um erro sanante, capaz de conferir validade e eficácia a um negócio apenas aparente.[55] Tendo isso em vista, Gustavo Birenbaum prefere sintetizar este segundo requisito como a confiança legítima, “que vem a ser a união, a condensação, do erro escusável com a boa-fé em sua acepção ética”.[56]

O exame da doutrina que trata da teoria da aparência indica ainda um terceiro requisito que, embora não listado, costuma ser implicitamente pressuposto. Seria a existência de algum tipo de omissão por parte do titular efetivo do direito que justificasse a imputabilidade do ônus decorrente da conversão da situação aparente em legitimidade jurídica. Vicente Ráo, por exemplo, menciona o titular que, por qualquer circunstância, não utilizou os meios legais que dispunha para evitar a criação da aparência.[57] Já Arnaldo Rizzardo afirma que “quem dá lugar a uma situação jurídica enganosa, ainda que sem o deliberado propósito de induzir a erro, não pode pretender que seu direito prevaleça sobre o direito de quem depositou confiança na aparência”.[58]

Entretanto, a exigência deste requisito é controversa. Para Álvaro Malheiros, por exemplo, a aplicação da teoria da aparência independe de qualquer manifestação do titular, sendo irrelevantes a distinção entre o titular que tolera a situação de falsa aparência, se omite, ou se esforça para evitar a aparência, mas sem sucesso.[59] A distinção entre estas situações, contudo, é ponto central das críticas à teoria da aparência.

7.      Críticas à teoria da aparência

A utilização da teoria da aparência, especialmente em virtude dos excessos de muitos de seus doutrinadores, não passou sem críticas. Da doutrina tradicional, alardeava-se o atentado contra a liberdade de consentimento, ao forçar o titular verdadeiro a sofrer o prejuízo de uma operação para a qual não acedeu, e o desrespeito à regra de que ninguém pode transferir direito que não tenha (nemo ad alium transferre potest quam ipse habet).[60] Tais críticas perdem força diante da nova ordem civil que, sob inspiração das normas constitucionais, consagra princípios como a boa-fé, a função social e o equilíbrio do contrato, capazes exatamente de atenuar os dogmas tradicionais como a autonomia da vontade, a intangibilidade do conteúdo do contrato e a relatividade dos seus efeitos.[61]

A falta de um fundamento claro, entretanto, permanece como um grande obstáculo à utilização da teoria como fonte de obrigações. Como destaca Ricardo Lira: “Essa advertência nos leva à consciência da necessidade de enfrentar o fenômeno da aparência com máxima cautela, para o fim de evitar que, em nome da boa-fé de terceiros, não se termine por subverter princípios jurídicos assentes e consagrados”.[62]

O exame crítico mais cuidadoso veio de Fábio Konder Comparato, em artigo em que afirma a insustentabilidade da teoria da aparência.[63] Centrado no caso da aparência de representação, o autor destaca inexistir lacuna que possibilite a aplicação do princípio, pois a lei rege expressamente todas as três hipóteses referentes à conduta do verdadeiro titular do direito – o suposto mandante: (i) se ele age com tolerância com relação ao mandatário, o que há é um mandato tácito ou presumido; (ii) se ele se omite culposamente, sendo possível lhe imputar uma negligência em fazer cessar as atividades do mandante, será responsabilizado em perdas e danos; e (iii) se o suposto mandante não faltou com seu dever de diligência, não pode responder: os atos são ineficazes e por eles responderá o mandatário.[64]

8.      A proteção da confiança em virtude da aparência concebida como um princípio

A teoria da aparência, nascida no século passado na Alemanha, incorreu, na voz de diversos de seus defensores clássicos, em uma série de excessos e, em razão disso, foi, justificadamente, alvo de profundas censuras e críticas incisivas, que lhe negavam utilidade e viabilidade.[65] Contudo, as opções negativistas, no auge de suas procedentes argumentações, não esgotam todas as possibilidades da teoria; ao contrário, o que se afigura sob os protestos é uma demanda por maior rigor na sua configuração. Rejeitar a doutrina em si em razão de tais dificuldades, desprezando a sua utilidade para o nosso tempo, seria como, na imagem tradicional, jogar fora a criança junto com a água do banho. Necessário, portanto, não o desprezo pela proteção em virtude da aparência, mas uma dedicação mais aprofundada ao tema, de maneira a clarear seus requisitos e permitir que desabrochem todas suas promissoras possibilidades.

Daí a relevância de um exame da já mencionada abordagem que concebe a proteção pela aparência como um princípio. Para tanto, contudo, é necessária uma breve análise da transformação de significado que este conceito sofreu.

Tradicionalmente, os princípios eram considerados quase que exclusivamente em sua função informadora e ordenadora e sua aplicação era sempre subsidiária, condicionada à existência de uma lacuna das regras específicas. Esta concepção encontra-se diretamente vinculada ao paradigma clássico que atribui ao aplicador um papel mecânico, restrito à exegese de normas regulamentares. Foi somente com a passagem do positivismo para o denominando pós-positivismo que se difundiu o reconhecimento da força normativa dos princípios: as normas seriam um gênero dentro do qual são espécies não apenas as regras, mas também os princípios.[66]

Neste sentido, a maioria da doutrina vem acolhendo a posição de Robert Alexy, que concebe os princípios como mandados de “otimização”, que determinam que algo seja realizado na maior medida possível.[67] Sob essa perspectiva, os princípios distinguem-se dos valores apenas no fato de que os primeiros se situam no plano deontológico (dever ser), enquanto os segundos encontram-se no plano axiológico (bem). De outro lado, os princípios são também espécies do gênero norma, assim como as regras (razões definitivas), das quais se diferenciam porque não se aplicam em qualquer situação (razões prima facie). Desse modo, a solução de um conflito entre princípios é resolvida na dimensão do peso (e não da validade, como nas regras), por meio de uma ponderação, uma hierarquização no caso concreto.

Outra corrente, seguida por Klaus Günther e Jürgen Habermas a partir do pensamento de Ronald Dworkin[68], defende que o procedimento sugerido por Alexy para solucionar o problema da colisão de princípios os esvazia de seu caráter normativo, conduzindo a uma criticável concepção axiologizante do direito.[69] Tal mecanismo de preferência e mensuração condiz somente com o tratamento de valores. Se princípios são normas, então atuam no plano do agir obrigatório, não do teleológico.[70] Consequentemente, não podem ter somente uma preferência no caso concreto ou ser aplicados na medida do possível, pois uma norma não pode ter uma pretensão de validade gradual.[71]

Para então entender o mecanismo de aplicação dos princípios, é imprescindível observar a distinção entre o plano da justificação, onde os princípios encontram sua fundamentação, e o plano da aplicação, onde se discute a adequação do princípio a um caso concreto. Assim, dois princípios aparentemente contraditórios no plano da justificação são apenas concorrentes no plano da aplicação.[72] Diversamente das regras, que se aplicam de maneira “tudo ou nada”,[73] com exceções previamente enumeráveis, um princípio excepciona a aplicação do outro em virtude de circunstâncias características do caso concreto.[74] É um procedimento que não supõe uma gradação, mas uma cessão; que não toca ao plano da validade, mas ao da aplicação. Os princípios, são então definidos, em oposição às regras, como normas cujas condições de aplicação não são pré-determinadas.[75]

Portanto, de acordo com esta concepção de princípio, é possível encontrar em um mesmo ordenamento dois princípios aparentemente opostos na justificação – como a proteção pela aparência e o nemo ad alium transferre potest quam ipse habet (ninguém pode transferir direito que não tenha) – sem que isso sacrifique a coerência necessária ao sistema, uma vez que se aplicarão em circunstâncias específicas distintas. Prima facie, ambos encontram justificação no sistema porque encontram fundamento nos preceitos constitucionais – o primeiro mais ligado à solidariedade social, o segundo à liberdade negocial.[76] No entanto, somente o juízo de adequação ao caso concreto permite definir qual deles será aplicável. Nesse sentido, a distinção entre a argumentação referente à validade de um princípio e aquela pertinente à sua aplicação a um caso concreto é explicitada por Klaus Günther:

Seguindo a distinção, sugerida aqui, entre fundamentação e aplicação, estas razões devem se referir à consideração de todos os interesses, no caso da argumentação a respeito da validade de uma norma, e ao exame de todos os sinais característicos situacionais, no caso da argumentação a respeito da adequação de uma norma.[77]

Neste ponto, é impossível não aquiescer com os críticos em reconhecer que na maioria dos casos concretos o princípio da proteção pela aparência, embora se justifique em abstrato, não é aplicável. Somente “sinais característicos situacionais” bastante peculiares informam a adequação do princípio e autorizam sua aplicação.[78] Estes sinais são os requisitos já apresentados pelos estudiosos da tradicional teoria da aparência: uma situação cujas circunstâncias provoquem uma inequívoca aparência de direito e a confiança legítima daquele que incorre, de boa-fé, em erro escusável.

O dito terceiro requisito não parece exigível: se de fato ocorre uma aparência inequívoca que preencha todos aqueles elementos necessários a provocar a confiança legítima, o titular já falhou em impedir tal aparência. De fato, o crescimento das hipóteses de imputação objetiva faz mesmo duvidoso que possa a proteção pela aparência ser fundada na violação de um dever jurídico prévio.[79] Assim, nos casos em que imputação é objetiva, a omissão não seria pertinente para a proteção pela aparência, e naqueles que a imputação é subjetiva, a prova da omissão pode atuar como mais um elemento de persuasão sobre a adequação da aplicação do princípio, mas não deve ser imprescindível, podendo ser considerada in re ipsa. Leciona Arnoldo Wald:

O que pode parecer estranho na responsabilidade decorrente da frustração da confiança depositada numa pessoa é que, em determinados casos, ela não pretendeu obrigar-se, nem cometeu alguma falta, não tendo necessariamente agido com culpa ou dolo, mas, não obstante, tornou-se devedora ou responsável perante quem nela confiou. Há todavia, uma condição básica e que consiste no fato de ter o prejuízo decorrido da confiança que inspirou o responsável, criando-se uma expectativa em favor de outrem, que assim se torna credor no momento da frustração que passa a sofrer.[80]

A aplicabilidade restrita, contudo, não afasta a validade de sua caracterização como um princípio, nem a conveniência de caracterizá-lo como um princípio autônomo. Embora partilhe do mesmo fundamento do princípio da boa-fé objetiva – a confiança –, tomar a proteção pela aparência como um aspecto de sua aplicação só seria possível mediante a deturpação dos claros confins da boa-fé objetiva e seria uma contribuição para um nocivo movimento de sua banalização.[81]

9.      Conclusão

Embora seja precipitado qualquer tipo de raciocínio definitivo sobre o tema, é possível a partir da concepção de princípio acima exposta, sintetizar o raciocínio traçado no seguinte sentido: a proteção daquele que confia em uma aparência de direito por meio da conversão do negócio aparente em negócio jurídico efetivo e regular pode ser considerada um princípio de nosso ordenamento uma vez que encontra fundamento na tutela da confiança e justificação entre os princípios constitucionais, em especial o da solidariedade social. Sua aplicação, contudo, está restrita a situações especiais em que, assim como nos casos já expressamente previstos em lei, estejam presentes circunstâncias que conduzam de maneira inequívoca a uma aparência de direito e a confiança legítima daquele que, de boa-fé, incide em erro escusável.

10.  Referências

  • ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1993.
  • BIRENBAUM, Teoria da aparência. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2012.
  • BONAVIDES, Curso de direito constitucional, São Paulo, Malheiros, 2000, p. 232-238.
  • BRANCO, Gerson Luiz Carlos. A proteção das expectativas legítimas derivadas das situações de confiança: elementos formadores do princípio da confiança e seus efeitos. Revista de direito privado, n.12, out./dez. 2002, p. 177.
  • COMPARATO, Fábio Konder. Aparência de representação: a insustentabilidade de uma teoria. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. n. 111, 1998, p. 39-44.
  • CORDEIRO, António Menezes. Da boa fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 1997.
  • DWORKIN, Levando os direitos a sério, São Paulo, Martins Fontes, 2002.
  • FRADA, Manuel António de Castro Portugal Carneiro da. Teoria da confiança e responsabilidade civil. Coimbra: Almedina, 2004.
  • FORGIONI, Paula A. Contratos empresariais: teoria geral e aplicação, 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.
  • GALUPPO, Marcelo Campos. Os princípios jurídicos no Estado Democrático de Direito: ensaio sobre o modo de sua aplicação. Revista de Informação Legislativa, n. 143, jul.-set. 1999, p. 191-209.
  • GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade, trad. Raul Fiker. São Paulo: Unesp, 1991.
  • GOMES, Orlando. Transformações gerais do direito das obrigações, 2 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980.
  • GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação, trad. Cláudio Molz. São Paulo: Landy Editora, 2004.
  • HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms: contributions to a discourse theory of law and democracy. Cambridge: MIT Press, 1998.
  • LARENZ, Karl. Derecho justo: fundamentos de etica juridica. Madrid: Civitas, 1993.
  • LEÃO, António Carlos Amaral; e REGO, Gérson Ferreira do. A aplicabilidade da teoria da aparência nos negócios jurídicos. Revista dos Tribunais, n. 618, 1987, p. 30-33.
  • LIRA, Ricardo Pereira. Considerações sobre a representação nos negócios jurídicos. A teoria da aparência e o principio da publicidade na administração publica. Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, n. 1, 1993, p. 301-319.
  • LORENZETTI, Ricardo Luis. La oferta como apariencia y la aceptación basada en la confianza. Revista de Direito do Consumidor, n. 35, 2000, p. 13.
  • LUHMANN, Niklas. Confianza. Barcelona: Anthropos, 1996.
  • LUHMANN, Niklas. Social systems, Stanford: Stanford University Press, 1995.
  • MALHEIROS, Álvaro. Aparência de direito. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial, n. 6, 1978, p. 41-77.
  • MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 4 ed., São Paulo, RT, 2002.
  • MORAES, Maria Celina Bodin O princípio da solidariedade. Na medida da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2010, p. 237-265.
  • MOTA, Maurício Jorge. A teoria da aparência. Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano I, n. 1, Jan./Jun. 2000, p. 151-242.
  • NEGREIROS, Teresa. Teoria do contrato: novos paradigmas, Rio de Janeiro, Renovar, 2002.
  • RÁO, Vicente. Ato jurídico. São Paulo: Max Limonad, 1965.
  • SCHREIBER, A proibição de comportamento contraditório: tutela da confiança e venire contra factum proprium. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.
  • SCHREIBER, A representação no novo Código Civil, in TEPEDINO Gustavo (coord.), A parte geral do novo Código Civil, 2 ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 238).
  • TEPEDINO¸ Gustavo. Premissas metodológicas para a constitucionalização do direito civil. Temas de direito civil, 3 ed, Rio de Janeiro, Renovar, 2004, p. 1-22.
  • WALD, Arnoldo. A teoria da aparência e o direito bancário. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, n. 106, 1997, p. 7-19.
  • WALD, Arnoldo. O princípio da confiança. Revista forense, v. 386, jul.-ago./2006, p. 15-23.

* Uma versão inicial deste texto foi publicada em MORAES, Maria Celina Bodin de (coord.). Princípios do direito civil contemporâneo. Rio de janeiro: Renovar, 2006, p. 111-133. Atualizações foram feitas para esta publicação.

** Professor do Departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito da UERJ e do Departamento de Direito da PUC-Rio. Doutor e mestre em direito civil pela UERJ. Especialista em direito civil pela Universidade de Camerino (Itália).

11. Notas de Rodapé:

[1] São diversos os autores que se debruçam sobre a questão dos sistemas com análises e conclusões bastante distintas, como HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms: contributions to a discourse theory of law and democracy. Cambridge: MIT Press, 1998, e LUHMANN, Niklas. Social systems, Stanford: Stanford University Press, 1995.

[2] GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade, trad. Raul Fiker. São Paulo: Unesp, 1991, p. 35.

[3] MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 4 ed., São Paulo, RT, 2002, referindo-se à despersonalização e desmaterialização do comércio jurídico, destaca que a proteção da confiança está intimamente ligada ao anonimato.

[4] GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade, cit., p. 84.

[5] GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade, cit., p. 91.

[6] Segundo Karl Larenz, “El ordenamiento jurídico protege la confianza suscitada por el comportamiento de otro y no tiene más remedio que protegerla, porque poder confiar, como hemos visto, es condición fundamental para una pacífica vida colectiva y una conducta de cooperación entre los hombres y, por tanto, de la paz jurídica” (LARENZ, Karl. Derecho justo: fundamentos de etica juridica. Madrid: Civitas, 1993, p. 91).

[7] LUHMANN, Niklas. Confianza. Barcelona: Anthropos, 1996, p. 4. Em tradução livre: “uma completa ausência de confiança iria impedi-lo [o homem] até mesmo de se levantar de manhã. Ele seria vítima de um vago sentimento de medo e de termores paralisantes. Sequer seria capaz de formular uma desconfiança definitiva e de fazer disso fundamento para medidas preventivas, já que isso pressuporia confiança em outras direções. Qualquer coisa e tudo seria possível. Esse confronto abrupto com a complexidade do mundo ao mais alto grau é mais do que suporta o ser humano”.

[8] GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade, cit., p. 92-93.

[9] LORENZETTI, Ricardo Luis. La oferta como apariencia y la aceptación basada en la confianza. Revista de Direito do Consumidor, n. 35, 2000, p. 13.

[10] BRANCO, Gerson Luiz Carlos. A proteção das expectativas legítimas derivadas das situações de confiança: elementos formadores do princípio da confiança e seus efeitos. Revista de direito privado, n.12, out./dez. 2002, p. 177. Em sentido similar, “A confiança – e sua preservação – são fundamentais para o adequado fluxo de relações econômicas. A confiança, ligada à tutela da boa-fé e da proteção das legítimas expectativas, atua como fato de redução e custos nas transações econômicas, pois poupa os contratantes de maiores dispêndios na seleção de seus parceiros comerciais” (FORGIONI, Paula A. Contratos empresariais: teoria geral e aplicação, 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 73).

[11] GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade, cit., p. 34.

[12] CORDEIRO, António Menezes. Da boa fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 1997, p. 1243.

[13] Neste sentido, destaca Anderson SCHREIBER que “não são poucos os autores a reconhecer que a noção de confiança transcende o próprio âmbito da boa-fé, refletindo-se sobre todo o direito civil, e sobre o direito de uma forma geral” (A proibição de comportamento contraditório: tutela da confiança e venire contra factum proprium. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 86)

[14] SCHREIBER, Anderson. A proibição de comportamento contraditório, cit., p. 88-89.

[15] Gustavo BIRENBAUM destaca a utilização das expressões titularidade aparente, legitimação aparente, aparência de direito, ou situação jurídica aparente, com ênfase nesta última, mas critica a vagueza da expressão “teoria da aparência”, usualmente utilizada, sugerindo, em seu lugar, “tutela da confiança decorrente da aparência” (Teoria da aparência. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2012, p. 15).

[16] Em distinção à responsabilização, “esta não opera através da imposição de uma obrigação de indenizar, pois coloca antes o confiante na posição jurídica correspondente às expectativas que alimentou; a ordem jurídica confere a alguém uma posição que ‘em si’ não existia, devido à ocorr~encia de uma situação que, segundo o seu figurino fenomenológico ‘exterior’, conduzia à respectiva atribuição. A tutela da aparência ‘anula’ deste modo a diferença entre o que parece e aquilo que tem existência efetiva como realidade jurídica” (FRADA, Manuel António de Castro Portugal Carneiro da. Teoria da confiança e responsabilidade civil. Coimbra: Almedina, 2004, p. 44-45)

[17] GOMES, Orlando. Transformações gerais do direito das obrigações, 2 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980, p. 115.

[18] RÁO, Vicente. Ato jurídico. São Paulo: Max Limonad, 1965, p. 233.

[19] É o caso de António Menezes CORDEIRO, que assim se justifica: “Rejeita-se, para traduzir a realidade em causa, a locução ‘aparência’, corrente na literatura alemã do princípio do século e mantida, até hoje, no espaço latino: apenas interessa considerar a aparência que tenha repercussões humanas, enquanto, por outro lado, ela não é necessária para provocar a adesão a representações que constitui o cerne do tema em causa” (Da boa fé, cit., p. 1234).

[20] É o que destaca Álvaro MALHEIROS: “A aparência do Direito viria, assim, inegavelmente corresponder a uma necessidade jurídico-econômico-social, e seria, na verdade, a expressão de um ideal de Justiça e a consagração de um princípio de eqüidade, consubstanciados na tentativa de conciliação dos ideais de segurança e de certeza no conflito de interesses que o direito visa a ordenar” (Aparência de direito. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial, n. 6, 1978, p. 41-42).

[21] WALD, Arnoldo. A teoria da aparência e o direito bancário. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, n. 106, 1997, p. 9-10.

[22] LORENZETTI, Ricardo Luis. La oferta como apariencia, cit., p. 9-38.

[23] LORENZETTI, Ricardo Luis. La oferta como apariencia, cit., p. 13.

[24] GOMES, Orlando. Transformações, cit., p. 118: “O Direito pátrio aceitou a teoria da aparência, sem, entretanto, condensá-la numa disposição geral”. No mesmo sentido WALD, Arnoldo. A teoria da aparência, cit., p. 14; e RÁO, Vicente. Ato jurídico, cit., pp. 246-247, que destaca: “dos casos expressamente ou implicitamente admitidos por lei a doutrina extraiu o princípio jurídico da aparência de direito, não mediante o simples processo da analogia, mas através da investigação do fundamento das disposições legais, – e , assim sendo, a indicação legal desses casos não é taxativa, pois não exclui a admissão dos demais que realizarem os requisitos da aparência segundo sua qualificação jurídica (…)”. A consideração da proteção pela aparência como um princípio será retomada no item 8, infra.

[25] As posições contrárias serão examinadas no item 7, infra, podendo destacar desde já as relevantes divergências de LIRA, Ricardo Pereira. Considerações sobre a representação nos negócios jurídicos. A teoria da aparência e o principio da publicidade na administração publica. Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, n. 1, 1993, p. 301-319; e de COMPARATO, Fábio Konder. Aparência de representação: a insustentabilidade de uma teoria. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. n. 111, 1998, p. 39-44.

[26] MALHEIROS, Álvaro. Aparência de direito, cit., p. 43.

[27] Como é cediço, a pessoa jurídica, como construção abstrata, somente age por meio das pessoas naturais que atuam como seus órgãos, logo não há alteridade na atuação desses órgãos, pois eles corporificam, no seu agir, a conduta da própria pessoa jurídica, razão pela qual se critica a utilização o termo representação. Explica Pontes de Miranda: “Dentro ou para fora da pessoa jurídica, o órgão é sempre pessoa, ou grupo de pessoas, pelo qual atua a pessoa jurídica, tornando-a presente, razão para conceitualmente e normativamente se dever evitar toda alusão à ‘representação’. O órgão da pessoa jurídica presenta-a; não a representa” (MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado, tomo I, 2. ed.. Rio de Janeiro: Borsoi, 1954, p. 371).

[28] LORENZETTI, Ricardo Luis. La oferta como apariencia, cit., p. 17.

[29] É o que explica Anderson SCHREIBER: “O mandato é um contrato que regula a relação entre o representado e o representante, estabelecendo termo e condições para o exercício do poder de representação. A representação – atuação em nome de outrem – ocorre, já se viu, independentemente da outorga do poder de representação e do eventual contrato que regule o seu exercício. Aliás, há inúmeras formas contratuais de se regular o exercício do poder de representação – não apenas por meio do mandato. Mais: a outorga do poder de representação diferencia-se e até independe do contrato que regula o exercício deste poder” (A representação no novo Código Civil, in TEPEDINO Gustavo (coord.), A parte geral do novo Código Civil, 2 ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 238).

[30] SCHREIBER, Anderson. A representação, cit., p. 239.

[31] LORENZETTI, Ricardo Luis. La oferta como apariencia, cit., p. 17-18.

[32] STF, 1a T., RE. 77814, Rel. Min. Luis Gallotti, julg. em 02.04.1974, publ. no DJ de 10.05.74. O caso é examinado em doutrina por SCHREIBER, Anderson. A representação, cit., p. 248; WALD, Arnoldo. A teoria da aparência, cit., p. 14, e LEÃO, António Carlos Amaral; e REGO, Gérson Ferreira do. A aplicabilidade da teoria da aparência nos negócios jurídicos. Revista dos Tribunais, n. 618, 1987, p. 33.

[33] “Teoria da Aparência. Investimento. Agente captador de recursos. Terceiro de boa-fé. Comprovado que o emitente do recibo de aplicação no mercado financeiro era notoriamente agente autorizado a captar recursos para aplicar em certa instituição financeira, responde esta pelo desvio do numerário, uma vez que a teoria da aparência protege o terceiro de boa-fé. Recurso conhecido e provido” (STJ, 4a T., REsp. 276025, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, julg. em 12.12.2000, publ. no DJ de 12.03.2001 e na RSTJ 147/339).

[34] “Processual civil. Agravo regimental contra decisão que negou provimento a agravo de instrumento para fazer subir recurso especial. Ausência de prequestionamento. Reexame de prova – Súmula nº 07/STJ. Dissídio jurisprudencial não comprovado. 1. Verificados pelo magistrado os requisitos formais de validade das notas fiscais e a adequada escrituração das mercadorias nos livros próprios, nada mais justo que se primar pela boa-fé da autora, consagrada na teoria da aparência. […]” (STJ, 1a T., AGA. 356416, Rel. Min. José Delgado, julg. em 05.04.2001, publ. no DJ de 11.06.2001). No mesmo sentido, STJ, 2ª T., REsp. 112313, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, julg. em 16.11.1999, publ. no DJ de 17.12.1999.

[35] “Consórcio. Teoria da aparência. Publicidade. Responsabilidade Civil. Legitimidade passiva. A empresa que, segundo se alegou na inicial, permite a utilização da sua logomarca, de seu endereço, instalações e telefones, fazendo crer, através da publicidade e da pratica comercial, que era a responsável pelo empreendimento consorcial, e parte passiva legitima para responder pela ação indenizatória proposta pelo consorciado fundamentada nesses fatos. Recurso conhecido e provido” (STJ, 4a T., REsp. 113012, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, julg. em 18.03.1997, publ. no DJ de 12.05.1997 e na RT 744/204)

[36] STJ, Corte Especial, EREsp. 178145, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, julg. em 25.06.2001, publ. no DJ de 25.02.2002, e EREsp. 156970, Rel. Min. Vicente Leal, julg. em 02.08.2000, publ. no DJ de 22.10.2001 e na RDR 22/164.

[37] MALHEIROS, Álvaro. Aparência de direito, cit., p. 59.

[38] GOMES, Orlando. Transformações, cit., p. 117

[39] MALHEIROS, Álvaro. Aparência de direito, cit., p. 59.

[40] WALD, Arnoldo. A teoria da aparência, cit., p. 13.

[41] Na expressão dos irmãos Mazeaud: “uma aparência, contanto que seja muito séria, pode validar atos praticados sem direito” (Leçons de Droit Civil, t. II, Paris, Montchrestien, 1956, p. 1098, apud GOMES, Orlando. Transformações, cit., p. 118).

[42] MOTA, Maurício Jorge. A teoria da aparência. Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano I, n. 1, jan./jun. 2000, p. 161.

[43] RÁO, Vicente. Ato jurídico, cit., p. 242.

[44] É o caso de RÁO, Vicente. Ato jurídico, cit., pp. 223 e ss..

[45] CORDEIRO, António Menezes. Da boa fé, cit., p. 1238. No mesmo sentido, Gustavo BIRENBAUM destaca que, com base na confiança legítima, podemos encontrar uma hipótese de entroncamento da boa-fé subjetiva com a objetiva na “imposição de um padrão mínimo e razoável de diligência por parte de quem é induzido a erro pela aparência, juntamente com a exigência de correção e lealdade que é dirigida também ao verdadeiro titular da situação aparente” (Teoria da aparência, cit., p. 74). A ligação entre a aparência e a boa-fé será retomada no item 8, infra.

[46] RÁO, Vicente. Ato jurídico, cit., p. 239.

[47] Vicente RÁO já destacava, ainda tratando do sistema anterior, no qual não havia a cláusula geral de responsabilidade por risco (CC, art. 927, parágrafo único): “O fundamento extraído do princípio da responsabilidade (atitude ativa ou omissiva) não justificaria, tampouco, todos os casos de aparência de direito, muitos dos quais ocorrem independentemente de culpa, sem laço de causalidade entre a culpa e a aparência; a responsabilidade por dano objetivo ou risco, por sua vez, somente seria admissível por disposição excepcional e expressa de lei nos sistemas, como o nosso, que da culpa faz resultar, em regra, a responsabilidade, salvo casos expressos taxativamente enumerados” (Ato jurídico, cit., p. 239).

[48] LORENZETTI, Ricardo Luis. La oferta como apariencia, cit., pp. 23 e ss.

[49] LORENZETTI, Ricardo Luis. La oferta como apariencia, cit., p. 28.

[50] RÁO, Vicente. Ato jurídico, cit., p.243.

[51] Como explica Gustavo BIRENBAUM: “O primeiro dos requisitos para a configuração da proteção da confiança despertada por uma aparência de titularidade é a presença, objetivamente aferida, de circunstâncias inequívocas, que fazem que uma situação de fato manifeste como verdadeira uma situação jurídica que não é verdadeira” (Teoria da aparência, cit., p. 41).

[52] LORENZETTI, Ricardo Luis. La oferta como apariencia, cit., p. 25.

[53] RÁO, Vicente. Ato jurídico, cit., p. 243.

[54] “No âmbito dos atos praticados diante de uma aparência de direito, onde o sacrifício imposto à esfera jurídica do verdadeiro titular é enorme, naturalmente só se pode ter por eficaz aquela boa-fé subjetiva que estiver incrementada pela eticidade, isto é, qualificada por um agir cuidadoso e prudente por parte de quem invoca a tutela da confiança derivada da aparência” (BIRENBAUM, Gustavo. Teoria da aparência cit., p. 73).

[55] É clara a explicação de Gsutavo BIRENBAUM: “Nos casos de aparência de titularidade, todo o esquema tradicional acerca do erro como vício do consentimento é subvertido, porquanto, na fattispecie da titularidade aparente, aquele que erra é também aquele que confia na veracidade de uma dada situação jurídica e que, justamente por isso, não quer o desfazimento de um negócio que lhe era conveniente, embora nascido de uma falsa percepção da realidade” (Teoria da aparência, cit., p. 60-61).

[56] BIRENBAUM, Gustavo A titularidade aparente, cit., p. 71.

[57] É o que o autor explica no seguinte trecho: “E quando se afirma que tais efeitos são produzidos em prejuízo do titular verdadeiro, a afirmação deve ser entendida em termos: – o titular verdadeiro possui, normalmente, meios legais para obstar que outrem disponha de seu direito sem estar, para tanto, legitimado; mas, se por qualquer circunstância não usou ou não pôde usar desses meios, cumpre-lhe, é certo, respeitar a situação de quem corretamente negociou à vista e consideração da aparência de direito, mas sempre lhe resta a faculdade de reclamar do titular aparente e não legitimado, que semelhante situação lhe causou, a reparação das perdas e danos” (RÁO, Vicente. Ato jurídico, cit., p. 244).

[58] RIZZARDO, Arnaldo. Teoria da aparência. Ajuris, n. 24, 1982, p. 225. Ricardo Luis LORENZETTI, por sua vez, afirma que a ação ou omissão do titular será necessária, salvo “cuando existe una forma expresa requerida legalmente o cuando hay una inscripción registral de la situación” (La oferta como apariencia, cit., p. 25).

[59] MALHEIROS, Álvaro. Aparência de direito, cit., p. 73. Também contra a exigência do requisito BIRENBAUM, Gustavo. Teoria da aparência, cit., p. 82.

[60] RÁO, Vicente. Ato jurídico, cit., p. 234.

[61] Sobre o tema, v. NEGREIROS, Teresa. Teoria do contrato: novos paradigmas, Rio de Janeiro, Renovar, 2002, pp. 105 e ss.

[62] LIRA, Ricardo Pereira. Considerações, cit., p. 318.

[63] COMPARATO, Fabio Konder. Aparência de representação, cit., p. 39-44.

[64] O autor destaca ainda que a proteção da segurança das relações jurídicas vale para os dois lados e conclui enfaticamente: “A teoria da representação aparente constitui verdadeiro contrabando ideológico no direito nacional. Um grupo de professores de direito e magistrados, fascinados pela novidade intelectual que nos vem do estrangeiro, demitiu-se do seu dever elementar de interpretar e analisar o direito pátrio em sua sistematicidade. O resultado foi nefasto” (COMPARATO, Fabio Konder. Aparência de representação, cit., p. 44).

[65] CORDEIRO, António Menezes. Da boa fé, cit., pp. 1236-1237.

[66] Sobre a mudança da concepção de princípio, v. BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, São Paulo, Malheiros, 2000, pp. 232-238. Para um enfoque desta transformação histórica no âmbito do direito civil, v. TEPEDINO¸ Gustavo. Premissas metodológicas para a constitucionalização do direito civil. Temas de direito civil, 3 ed, Rio de Janeiro, Renovar, 2004, p. 1-22.

[67] ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1993, p. 86-87.

[68] Normalmente estas duas correntes são aproximadas pela doutrina (especialmente no sentido de incluir Dworkin na primeira, junto com Alexy, sem relevar suas distinções), como, por exemplo, pelo pioneiro BONAVIDES, Paulo. Curso, cit., p. 248.

[69] Para uma comparação crítica das duas correntes, v. GALUPPO, Marcelo Campos. Os princípios jurídicos no Estado Democrático de Direito: ensaio sobre o modo de sua aplicação. Revista de Informação Legislativa, n. 143, jul.-set. 1999, p. 191-210, especialmente p. 196.

[70] Neste sentido os princípios se distinguem das diretrizes políticas (passíveis de ponderação), como afirma DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério, São Paulo, Martins Fontes, 2002, p. 36 e ss.

[71] HABERMAS, Jürgen. Between facts and norms, cit., p. 255 e ss..

[72] GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação, trad. Cláudio Molz. São Paulo: Landy Editora, 2004, especialmente pp. 367 e ss.

[73] DWORKIN, Ronaldo. Levando, cit., p. 39 e ss..

[74] GALLUPO, Marcelo Campos. Os princípios, cit., p. 195.

[75] HABERMAS, J. Between, cit., pp. 217 e ss.

[76] De fato, enquanto o nemo ad alium transferre potest quam ipse habet liga-se claramente à liberdade individual e à autonomia privada, a proteção pela aparência, uma vez fundada na confiança, encontra guarida constitucional sob o princípio da solidariedade (CF, art. 3º, I), que é “a expressão mais profunda da sociabilidade que caracteriza a pessoa humana” (MORAES, Maria Celina Bodin de. O princípio da solidariedade. Na medida da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2010, p. 250-251).

[77] GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação, cit., p. 368 – grifos nossos.

[78] A consideração da proteção pela aparência como um princípio nestes termos não se distingue tanto nos efeitos da posição que, embora não a reconheça como princípio autônomo, considera admissível a analogia com os casos de proteção pela aparência previstos em lei, pois a identidade de ratio que justifica a analogia será exatamente o preenchimento dos requisitos que revelam a adequação da aplicação do princípio. Sobre a possibilidade de aplicação analógica das regras de eficácia da aparência v. BIRENBAUM, Gustavo. Titularidade aparente, cit., p. 137 e ss.

[79] FRADA, Manuel António de Castro Portugal Carneiro da. Teoria da confiança e responsabilidade civil, cit., p. 94.

[80] WALD, Arnoldo. O princípio da confiança. Revista forense, v. 386, jul.-ago./2006, p. 22.

[81] “A insistência doutrinária no estudo do venire contra factum proprium e de outras figuras de conteúdo similar […] como categorias autônomas tem o efeito, ainda que muitas vezes inconsciente, de evitar a superutilização da boa-fé objetiva. Com esta expressão, superutilização da boa fé objetiva, propõe-se designar um processo de invocação arbitrária da boa-fé como justificativa ética de uma série de decisões judiciais e arbitrais, que nada dizem tecnicamente com seu conteúdo e funções” (SCHREIBER, Anderson. A proibição de comportamento contraditório, cit., p. 116).

Palavras Chaves

Aparência; Confiança; Princípio.