A REUNIÃO PRIVADA COMO IMPORTANTE FERRAMENTA NA RESOLUÇÃO DO CONFLITO DENTRO DA MEDIAÇÃO

Resumo

O presente artigo tem como objetivo demonstrar o quão eficaz a reunião privada pode ser na busca do consenso no procedimento da mediação. Pretende-se abordar o trabalho em conjunto do mediador, advogados e partes na obtenção de um resultado favorável para todos os envolvidos.

Artigo

A REUNIÃO PRIVADA COMO IMPORTANTE FERRAMENTA NA RESOLUÇÃO DO CONFLITO DENTRO DA MEDIAÇÃO

 

Thaís Ferreira Bressan1

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo demonstrar o quão eficaz a reunião privada pode ser na busca do consenso no procedimento da mediação. Pretende-se abordar o trabalho em conjunto do mediador, advogados e partes na obtenção de um resultado favorável para todos os envolvidos.

Palavras-chave: Mediação; Reunião privada; Conflito.

INTRODUÇÃO

  A mediação é um método autocompositivo de resolução de conflitos com o auxílio de um terceiro imparcial e sem poder decisório. Pressupõe um trabalho em conjunto entre os participantes no desenvolvimento de potenciais soluções de benefício mútuo, sempre com visão prospectiva.

O mediador, independente e neutro, irá auxiliar as partes utilizando-se de ferramentas procedimentais, dentre elas a reunião privada, na co-construção de um possível acordo com o (r)estabelecimento do diálogo e, consequentemente, a negociação de interesses.

A mediação convida que os seus participantes sejam os verdadeiros protagonistas do procedimento, e, verdadeiramente, tomem decisões conjuntas e equilibradas, as quais possam ser sustentadas no tempo, sempre com o auxílio de um facilitador do diálogo devidamente capacitado.

  • A atuação do mediador junto às partes

Sabemos que, nas relações humanas, o surgimento do conflito é quase inevitável. Na maioria das vezes, pequenas rusgas se transformam em uma avalanche de maus sentimentos, acarretando, até mesmo, o término de relacionamentos pessoais e/ou profissionais.

Fomos doutrinados a ouvir para rebater, sem sequer ter a certeza de que aquilo que realmente foi dito pela outra parte condiz com o que acreditamos que seja verdade.

Fischer, Ury e Patton (2018, pág. 57) dizem: “[…] A necessidade de ouvir é óbvia, mas é difícil ser um bom ouvinte, sobretudo sob o estresse de uma negociação. […] Dizem que a concessão menos onerosa que existe é fazer o outro lado saber que foi ouvido.”

O mediador, fazendo um mapeamento do conflito, analisa a natureza do conflito e todo o seu histórico e, com isto, auxilia as pessoas envolvidas no litígio a resgatarem a comunicação promovendo uma autorreflexão e um planejamento de ações que certamente contribuirão no desenlace da questão.

Sandy de Paula Alves e Jaqueline Porcino de Paula in Revista do Fórum Nacional de Mediação e Conciliação (2017, pág. 361) dizem com propriedade:

Na mediação, a participação ativa das partes na busca de soluções para a questão em “litígio” deve ser estimulada pelo mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, e auxiliará os interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.

Sem o auxílio de um profissional especialista em negociação de ganhos mútuos, o que em mediação chamamos de soluções ganha-ganha, corre-se um sério risco de que haja uma escalada do conflito, ou seja, uma situação conflituosa que não foi devidamente cuidada poderá crescer de forma progressiva, provavelmente acarretando perdas pessoais e/ou profissionais para as partes envolvidas.

  • A atuação do mediando na mediação

Sabemos que os mediandos são os protagonistas no procedimento da mediação. Fazendo uma analogia, o mediador seria o maestro e, os mediandos, a orquestra. É um trabalho em conjunto que exige uma plena sintonia entre ambos.

O mediando, por meio de uma comunicação positiva e não violenta, pelo menos é o que dele se espera, faz o seu relato da história sob seu ponto de vista.

É no relato das histórias que cada pessoa pode ter contato com a visão do outro sobre o mesmo fato, suas motivações que geraram aquele conflito, suas percepções e possíveis aberturas para uma futura autocomposição.

O mediador convida os mediandos a atuarem tendo uma escuta empática, ou seja, escutando não necessariamente com a intenção de concordar, mas, sim, de fazer com que o outro sinta que foi ouvido. Ter uma escuta diferenciada ajudará a estabelecer novas bases de relacionamento e conceber alternativas para a situação que gerou o impasse.

Tânia Almeida (2014, pág. 66) diz:

A escuta ativa apoia-se no tripé legitimação, balanceamento e perguntas e tem por objetivos: i) oferecer uma qualidade de interlocução cujo acolhimento possibilite que as pessoas se sintam legitimadas em seus aportes e participação; ii) conferir equilíbrio entre dar voz e vez aos integrantes da conversa e viabilizar uma escuta que inclua o ponto de vista do outro; iii) oferecer perguntas que gerem informação, propiciem progresso e movimento ao processo de mediação.

Os mediandos devem estar abertos para uma comunicação fluida, honesta e de boa-fé.

Precisam estar aptos a absorver e refletir sobre o que foi trazido à sessão de mediação.

Um pequeno desentendimento, que, muitas vezes, decorre de uma falha na comunicação entre as partes, acarreta ressentimentos cada vez maiores entre ambas, podendo desaguar em um esfriamento da relação e, até mesmo, em um rompimento definitivo.

A mediação estimula a tomada de decisões conjuntas, sempre tendo em pauta o respeito recíproco e a busca do senso comum.

  • Reuniões privadas: uma potencial ferramenta na resolução do conflito

No momento em que as partes optam pelo procedimento da mediação, princípio da autonomia da vontade das partes, um dos princípios que a regem, o mediador faz o devido acolhimento das mesmas e, já nessa primeira reunião, tem a oportunidade de criar o que chamamos de Rapport.

Trata-se do estabelecimento de uma relação de confiança entre mediador e mediandos, o que facilita a compreensão e uma possível resolução do conflito.

O mediador, com a concordância das partes, estabelece uma agenda de trabalho, deixando pré-estabelecido um número de reuniões que serão necessárias, o que possibilitará ter tempo suficiente para a elaboração da decisão informada.

Por ser um procedimento oral e informal, se forem necessárias novas reuniões para um aprofundamento das questões, o mediador as incluirá no plano de trabalho com a concordância dos mediandos.

Há casos em que a pauta subjetiva é “muito rica”, ou seja, deve-se ter o cuidado de se tratar primeiramente questões subjetivas, que, na maioria das vezes, são as grandes causadoras da dificuldade de se prosseguir na negociação assistida.

Poderá o mediador, no transcorrer da mediação, utilizar-se das reuniões privadas (caucus) com o objetivo de tratar de questões mais sensíveis que poderiam, em uma reunião conjunta, aflorar sentimentos que, certamente, prejudicariam a geração de opções criativas.

Meire Rocha do Nascimento in Revista do Fórum Nacional de Mediação e Conciliação (2017, pág. 331) diz:

O mediador tem a sua disposição a técnica das sessões privadas, denominada caucus, que visa oportunizar o desabafo, o abrandamento das emoções afloradas pela vivência do conflito e para o esclarecimento de alguma questão. Essa técnica, caso o mediador entenda ser útil, deve ser utilizada de forma equilibrada, fundamentada nos princípios da confiança e da imparcialidade.

Maurício Vasconcelos Galvão e Filho, Fernanda Koeler Galvão e Cristiane Dias Carneiro (PELAJO et al., 2019, pág. 150) dizem:

A realização da reunião privada deve ser previamente comunicada para cada mediando e, de regra, deve ser garantido aos mediandos uma paridade ou isonomia de tratamento, de modo que se um terá uma reunião privada, deve ser assegurado ao outro mediando, do mesmo modo, o direito ao caucus.

Há situações em que o mediando não quer compartilhar fatos na presença do outro, ou porque não se sente seguro, ou não está à vontade para tal. É importante ressaltar que o mediador tem o dever de confidencialidade (dever de sigilo) de tudo o que for tratado por cada mediando na sessão privada. Somente com a autorização expressa do mediando, poderá o mediador trazer para a sessão conjunta o que foi discutido em particular.

É o que diz o Art. 31 da lei de Mediação: “Será confidencial a informação prestada por uma parte em sessão privada, não podendo o mediador revelá-la às demais, exceto se expressamente autorizado.”

O mediador, com toda a sua expertise, nas reuniões privadas ou individuais, saberá promover uma autorreflexão nos mediandos, através de perguntas, fazendo com que os mesmos tragam soluções de benefício mútuo que poderão ser trabalhadas na reunião conjunta.

Tânia Almeida (2014, pág. 222) diz:

Essas reuniões são especialmente úteis na desconstrução de impasses de qualquer natureza e no acolhimento de diferenças, e constituem espaço ideal para as perguntas mais diretas e para aquelas exporiam os participantes se fossem feitas em reuniões conjuntas — especialmente as perguntas autoimplicativas, que convidam o entrevistado a identificar sua participação no que há de positivo e no que há de negativo na interação com o outro mediando e no desacordo.

Evandro Souza e Lima e Samantha Pelajo (ALMEIDA; PELAJO; JONATHAN, 2019, pág. 290) dizem:

O mediador pode optar por conduzir a mediação exclusivamente por meio de reuniões conjuntas ou fazer uso de reuniões privadas, especialmente indicadas quando são percebidos obstáculos de difícil transposição, que denotam a existência de agenda oculta ou de algum outro motivo de retração.

É importante ressaltar que o mediando pode e deve, quando sentir necessidade, solicitar uma reunião privada, não ficando somente a critério do mediador tal iniciativa.

  • Reunião privada: quando utilizá-la

A reunião privada pode ser utilizada em várias fases do procedimento da mediação.

  • Pré-mediação: reunião privada entre o mediador e as partes

Antes mesmo da primeira reunião em conjunto, o mediador, com o intuito de ter uma melhor compreensão dos fatos e estabelecer uma relação de confiança com as partes, faz uma reunião privada com cada um dos mediados.

Juliana Loss in Cabral e Cury (2018, pág. 119) diz:

As razões que baseiam o uso das sessões privadas variam, mas é comum, por exemplo, que as reuniões privadas realizadas em um momento prévio a uma primeira sessão conjunta sejam voltadas a ventilar emoções das partes e criar a confiança entre partes e mediador.

E complementa: “Um estudo aponta que o uso de sessões privadas com o intuito de construir rapport, e desenvolver confiança entre partes e mediador logo em momentos iniciais, precisamente com o uso de caucus em pré-mediação, pode ser positivo.”

As partes são as protagonistas da mediação. São elas que, juntamente com o mediador, vão co-construir um possível e desejado acordo segundo as inúmeras possibilidades de solução de conflitos que são geradas no transcorrer do procedimento.

O mediador ouvirá, primeiramente, uma parte e, depois, por igual tempo (Princípio da isonomia), ouvirá a outra parte, mantendo o equilíbrio que é fundamental para a lisura do processo.

Já nessa primeira sessão privada, um desenho da mediação já é confeccionado e as mais variadas questões trazidas pelo mediado entram na pauta de trabalho.

Temas objetivos e subjetivos que, se fossem tratados em uma primeira sessão conjunta, somente contribuiriam para a escalada do conflito, são trabalhados em conjunto nessa sessão privada.

Tânia Almeida (2014, pág. 118) diz:

Em entrevistas privadas, os mediadores devem convidar os mediandos a refletirem sobre a solução ideal/melhor alternativa (Melhor Alternativa Negociada — MAN) e a solução indesejável/pior alternativa (Pior Alternativa Negociada — PAN) para a situação que se apresenta e estimulá-los a pensar em possibilidades que fiquem compreendidas entre essas duas margens.

E acrescenta:

A boa solução é aquela que mais se aproxima da solução ideal, e por consequência, mais se distancia da solução indesejável, segundo as perspectivas de ambos os mediandos, MAN e PAN são parâmetros que ajudam a definir o que de melhor e de pior se pode obter na Mediação.

Quanto maior for o comprometimento dos mediandos no procedimento da mediação, maior será a probabilidade de se obter bons resultados. A qualidade da participação dos mesmos implica a qualidade de um possível acordo.

  • Reunião privada entre mediador e partes com a presença dos advogados

Os mediandos, acompanhados pelos seus respectivos clientes, trazem à mediação as questões mais relevantes e necessárias para serem negociadas.

O causídico faz um diagnóstico dos fatos e presta a devida assessoria jurídica, o que é defeso ao mediador fazer, uma vez que é seu dever ético permanecer neutro e imparcial.

O advogado tem um papel fundamental antes, durante e após a mediação. Traz soluções que mais bem se adequem às necessidades e aos objetivos do seu cliente. Prepara o mesmo para o procedimento, instruindo-o sobre quaisquer dúvidas que porventura venham a surgir e, futuramente, com uma postura de colaboração, cooperará na confecção de um possível acordo que atenda às demandas pretendidas.

Com o término da mediação, o patrono prestará a devida assistência ao cliente sempre que for necessário, esclarecendo questões que surgirem, bem como acompanhando as providências que foram acordadas.

  • Reunião privada entre mediador e advogados

O cliente tem o advogado como seu fiel escudeiro, sendo assim, é a pessoa em que ele mais confia.

Em algumas circunstâncias, os mediandos estão com os ânimos muito exaltados, impossibilitando, a priori, um desenvolvimento mais exitoso da mediação.

O mediador, com a sua sensibilidade e expertise, percebe essa situação e convida os advogados para uma sessão privada.

Ambos os patronos, juntamente com o mediador, negociam os interesses, as necessidades e os valores que são caros aos seus clientes. Atuam em uma equipe que prima pela colaboração de seus integrantes.

As contribuições dos assessores jurídicos engrandecem o procedimento da mediação. Pelo fato de não estarem emocionalmente envolvidos, fazem um relatório minucioso dos problemas que precisam ser equalizados e estimulam os seus clientes a pensarem em soluções que sejam boas para ambas as partes, válidas juridicamente e executáveis e, não menos importante, sustentáveis no tempo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

  

Pelo exposto, é possível notar como a utilização da reunião privada, pelo mediador, por sua iniciativa ou por solicitação dos mediandos, pode proporcionar um alinhamento das expectativas e possibilidades de cada um dos envolvidos no processo de mediação.

Na medida em que o mediador tem a oportunidade de ouvir separadamente cada uma das partes, as mesmas se sentem legitimadas a exercer o seu papel de negociador, passando a se concentrar na identificação dos seus interesses mútuos, a partir de suas perspectivas e sentimentos, buscando ampliar o leque de possibilidades de solução do conflito em questão.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  

ALMEIDA, Tânia. Caixa de ferramentas em mediação: aportes práticos e teóricos. São Paulo: Dash, 2014.

ALMEIDA, Tânia; PELAJO, Samantha; JONATHAN, Eva (Coord.). Mediação de Conflitos: para iniciantes, praticantes e docentes. 2. ed. revisada, atualizada e ampliada. Salvador: Juspodivm, 2019.

BRASIL. Lei 13.140/15 — Art. 31. Lei de Mediação, de 26 de junho de 2015. Brasília, 2015.

CABRAL, Trícia Navarro Xavier (Org.); CURY, Cesar Felipe. Lei de Mediação comentada artigo por artigo: dedicado à memória da Profª Ada Pellegrini Grinover. Indaiatuba, SP: Foco, 2018.

FISCHER, Roger; URY, Willian; PATTON, Bruce. Como chegar ao sim. Tradução: Rachel Agavino. Ed. revisada e atualizada. Rio de Janeiro: Sextante, 2018.

PELAJO, Samantha (Coord.) et al. Comentários À Lei de Mediação Em Homenagem Aos 10 anos da Comissão de Mediação de Conflitos da OAB-RJ. Rio de Janeiro: Processo, 2019.

REVISTA DO FÓRUM NACIONAL DE MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO, v. 1, n. Rio de

Janeiro: EMERJ, 2017.

Notas:

1 Advogada com formação em Práticas Colaborativas. Mediadora empresarial formada pelo CBMA. Mediadora Judicial do TJ/RJ. Mediadora da Comissão de Mediação e Métodos Consensuais Seccional OAB/RJ. Pós- Graduada em Direito Civil pela ESA. Pós-Graduada em Direito do Consumidor pela EMERJ.

Palavras Chaves

Mediação; Reunião privada; Conflito.