ABRIGO CONTRA O VENTO: OS TRÊS PRINCÍPIOS QUE SUSTENTAM A FACULDADE NACIONAL DE DIREITO E FAZEM OS SEUS 130 ANOS DE EXISTÊNCIA SEREM ESSENCIAIS NA BUSCA PELA TRANSFORMAÇÃO SOCIAL DO PAÍS

Resumo

O presente texto tem como objetivo comprovar a importância histórica da Faculdade Nacional de Direito e expor que a trajetória de seus 130 anos foi essencial na busca pela transformação social do país. Inovadora e, ao mesmo tempo, tradicional. Acolhedora, plural e reconhecida pela sua excelência na formação jurídica. Sob o risco de se perder em inúmeras virtudes, o artigo demonstra como três princípios são capazes de sintetizar esta importante missão.

Artigo

ABRIGO CONTRA O VENTO:

OS TRÊS PRINCÍPIOS QUE SUSTENTAM A FACULDADE NACIONAL DE DIREITO E FAZEM OS SEUS 130 ANOS DE EXISTÊNCIA SEREM ESSENCIAIS NA BUSCA PELA TRANSFORMAÇÃO SOCIAL DO PAÍS

 

Paulo Samico

RESUMO: O presente texto tem como objetivo comprovar a importância histórica da Faculdade Nacional de Direito e expor que a trajetória de seus 130 anos foi essencial na busca pela transformação social do país. Inovadora e, ao mesmo tempo, tradicional. Acolhedora, plural e reconhecida pela sua excelência na formação jurídica. Sob o risco de se perder em inúmeras virtudes, o artigo demonstra como três princípios são capazes de sintetizar esta importante missão.

PALAVRAS-CHAVE: Comportamento ético, responsabilidade social, espírito crítico, inovação, diversidade.

INFORMAÇÕES DE TRAJETÓRIA PROFISSIONAL: Graduado em Direito pela Faculdade Nacional de Direito da UFRJ, pós-graduado em Processo Civil e estudante de pós-graduação em Direito Regulatório pela UERJ. Foi coordenador jurídico na BAT Brasil (Souza Cruz) por 7 anos. Professor da Future Law. Autor de diversos artigos publicados em periódicos jurídicos. Membro-fundador do núcleo de Departamentos Jurídicos da AB2L. Pesquisador acadêmico da FGV Conhecimento e gerente jurídico na função de Legal Counsel Business Support da Mondelēz International.

TEXTO DO ARTIGO

Testemunha da história política e social do país desde sua fundação, em 1891, a Faculdade Nacional de Direito da UFRJ demonstra dia após dia seu poder enquanto agente de transformação social na vida daqueles que a ela recorrem. Com a missão de transformar, seu nascimento gerou grande mudança e um verdadeiro rompimento com a tradição da época, que concentrava o ensino jurídico no eixo São Paulo-Olinda.

Sua criação trouxe pluralismo jurídico e inovação, além de romper o status quo ante do ensino jurídico clássico e comum no país, chamando para a capital federal os interessados a construir um novo núcleo de pensamento. De alguma forma, os entusiastas de sua fundação sabiam que o surgimento de uma nova instituição jurídica seria algo grandioso, mas perceberam desde muito cedo que a glória e o prestígio somente viriam se houvesse o engajamento daqueles que realmente estivessem com vontade de fazer a diferença.

Embora Mendes de Almeida e outras figuras históricas de notória importância mereçam eterno destaque por terem projetado os alicerces do que hoje é a gloriosa Faculdade Nacional de Direito[1], este texto não se prenderá no histórico de sua fundação. O objetivo destas palavras é sintetizar a importância que esta renomada instituição ocupa na vida de centenas de milhares de pessoas. Grupo de cidadãos, não somente formado por alunos e ex-alunos. Um grupo mais amplo – o qual inclui um vasto corpo docente, inúmeros profissionais ligados à sua administração e, em especial, os assistidos que a ela recorrem com a esperança do acesso à justiça.

O papel de agente transformador da FND na vida das pessoas é sustentado por três grandes princípios ou valores estruturantes: a responsabilidade social, o comportamento ético e o espírito crítico. Quando era diretor, o professor Flávio Martins fazia questão de lembrar a cada aluno, no dia da imposição de grau sobre esses. Reforçava como era importante que tais valores fossem refletidos em atitudes práticas. Com efeito, para aqueles que prestavam atenção naquelas sábias palavras, notavam que os princípios não se davam apenas por regras de conduta. O ensinamento era reflexo da própria instituição acompanhado da fórmula de como praticar a mudança na sociedade.

Comecemos pela responsabilidade social. A trajetória da Faculdade Nacional de Direito é recheada pela formação de grandes advogados, juristas, diplomatas, escritores, políticos e magistrados. A fama pela qualidade de seus professores ultrapassa os muros do prédio onde funcionou o Senado Federal, na Rua Moncorvo Filho, localizada no centro do Rio de Janeiro. As vidas destes profissionais foram essencialmente transformadas ao cruzar os perímetros da instituição.

Quando um professor fala sobre o seu currículo é possível observar uma entonação especial na voz quando diz que leciona na Faculdade Nacional de Direito da UFRJ. O tom especial soa quase como um carimbo de qualidade, uma vez que “lecionar na Nacional” é ter uma credencial de renome, – talvez até mais importante do que muitos títulos comumente almejados na carreira jurídica acadêmica. O mesmo se percebe com os alunos quando fazem questão de dizer que são oriundos da FND, sigla reconhecida por todos os operadores do Direito, – dado a sua relevância no cenário jurídico nacional.

O Núcleo de Prática Jurídica oferece[2] atendimento jurídico nas áreas cível, penal e trabalhista à toda a comunidade por meio dos alunos que estão iniciando na praxe forense, sob a supervisão dos professores da instituição. A análise crítica dos estudantes é estimulada em cada atendimento, instigando os aprendizes a desenvolver a inteligência jurídica para resolver os casos solicitados pela população. A união entre teoria e prática leva efetivamente a tão buscada justiça social àqueles que não podem pagar por um advogado particular e sonham com a resolução de seus problemas.

A transformação de um sonho em futuro próximo, também se dá pelas práticas inclusivas promovidas por toda a comunidade acadêmica na política de cotas. O acesso à UFRJ mudou radicalmente em 2011, quando passou a adotar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como único meio de acesso à instituição. Entendendo a pluralidade da população e a necessidade de se chegar a um alunado mais diverso, a FND abraçou a ideia da soma. A maioria dos professores vivenciaram a implementação da política de cotas e hoje observam uma maior diversidade étnica, de ideais, religiosa e na opinião daqueles que frequentam a FND.

Ainda sobre diversidade e inclusão, professores comentam sobre o nítido diferencial competitivo de seus alunos. Se chegaram até ali vencendo diferentes batalhas, arrumando formas de lograr êxito diante de um mundo que, insistentemente quer derrubá-los, por que subestimar sua força? Como minimizar ou desdenhar sua importância? É o que a professora Kone Cesário enfatiza[3] nas palestras que participa: um aluno proveniente de uma realidade social difícil pode ter enorme potencial que, se tiver sua capacidade comportamental bem explorada, as competências técnico-jurídicas serão somente mero detalhe para torná-lo um grande profissional do Direito.

Embora ainda não se tenha o cenário perfeito, há que se comemorar o progresso. Isso porque quando se compara o momento presente com a normalidade passada, nota-se que as turmas formadas há cinco ou dez anos quase sempre eram compostas por jovens provenientes de escolas tradicionais e famílias que puderam na época, dar amparo financeiro e acolhimento afetivo aos futuros egressos. Hoje, a realidade é mista e inclusiva mas, nem todos possuem a mesma sorte de seus veteranos, fazendo com que a FND seja palco de cruzamento das mais variadas histórias de vida.

Quem aqui escreve é exemplo deste novo e múltiplo cenário da FND. Com histórico escolar no ensino público e beneficiado pelas políticas públicas promovidas pelo Estado, foi a primeira pessoa de seu núcleo familiar a cursar uma instituição superior de ensino. Na mesma linha, em 2018 a AdUFRJ[4] promoveu uma linda campanha nomeada “UFRJSEMPRE”, a qual contou a história de brasileiros que também foram pioneiros no ensino superior em suas famílias. Com relatos sobre toda a trajetória e as inúmeras mudanças positivas que o ingresso na universidade proporcionou, todos transformaram sonhos em futuros possíveis, oxigenaram a produção acadêmica, e ainda protagonizaram verdadeiras histórias de superação.

Os representantes da FND no evento chancelaram o fim da elitização no acesso ao ensino superior de renome da instituição. O filho de um motorista de ônibus agora poderia se formar em Direito ao lado do filho do executivo de uma multinacional. É evidente o progresso social da FND nestes mais de cem anos mas, as dificuldades orçamentárias, de gestão e até mesmo obstáculos políticos somam o atraso na conquista pelo cenário educacional ideal.

Sob o risco de entrar para história como isenta ou neutra diante das profundas crises políticas que o país vem enfrentando, a Faculdade Nacional de Direito manteve o seu comportamento ético ao se posicionar pelos direitos humanos e prestigiar a posse de atitudes compatíveis com os valores republicanos, de quem defende a legalidade e não mede esforços para promover a manutenção do Estado Democrático de Direito.

Ao longo de seus 130 anos, a FND já viu nascer e morrer governos de diferentes vertentes, democráticos ou não. Permaneceu de pé e, embora silenciada em algumas situações, sempre seguiu seu propósito em servir como bússola para inúmeros brasileiros perdidos em meio ao caos institucional que o país infelizmente atravessou por diversas vezes.

Desde muito cedo, a FND desperta em seus alunos o dever de fazer o que é certo. Não só orienta os futuros operadores do Direito a observar a legislação em vigor, mas exercita que se pense sobre o que é considerado moralmente aceito de acordo com os bons valores da convivência em sociedade. A partir do estímulo ao debate, o processo educacional convida ao pensamento crítico, reflexões e promove a troca de ideias durante as aulas, nos fóruns de discussão e nos diálogos realizados nos grupos de pesquisa.

Com as novas tecnologias e o crescimento das interações virtuais, cresceram os debates que buscam desconstruir alguns dogmatismos. Presente nas redes sociais desde cedo, a FND sempre convidou seus alunos para discutirem sobre o certo e o errado durante todo o processo de formação jurídico-profissional.

Na ética não existe meio termo, ou se é ético ou não é. Em seu Projeto Pedagógico vigente[5], a FND ensina o Direito por meio do eixo norteador “Direitos Humanos e Inclusão Social”. Trata-se de um guia para a formação do futuro operador do Direito, onde se pretende adquirir uma formação ética, humanista, crítica e interdisciplinar. Entre os eixos de formação fundamental-interdisciplinar, técnico-profissional e prático, existe a preocupação no ensino da Ética Profissional e do Estatuto do Advogado não só a partir da leitura das normas em vigor, mas também através da observação e análise de atitudes do seu corpo acadêmico.

A liberdade de cátedra conferida pela Constituição Federal e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação faz com que os professores tenham liberdade para ensinar, compartilhar suas experiências, e exteriorizar todo o seu conhecimento tendo como ponto de partida o comportamento ético e grau de responsabilidade altíssimo na construção do futuro profissional que ali está se formando.

Ao sustentar um comportamento ético ao longo das décadas de serviços prestados para a sociedade, é necessário compreender como uma academia consegue chegar aos 130 anos mais forte do que nunca. Para isso, se faz indispensável discorrer sobre o espírito crítico que a instituição estimula sobre seus alunos e professores.

Para se ter espírito crítico é preciso ousadia, coragem, atitude e entrega. Isso porque a crítica não existe por si só. Toda crítica vem acompanhada de uma análise anterior, da soma de fatos e ideias. É sinônimo de acréscimo e construção. Ao promover o ensino jurídico, a FND não apenas repete a letra seca da lei. É instigando o futuro operador do Direito a questionar se realmente a norma ora estudada, guarda compatibilidade com a sociedade e se há interesse público em sua manutenção para que, em contrário, se utilize os mecanismos legais para impugnação da norma em dissonância.

O espírito crítico estimulado pela FND também está em seus professores, quando esses se atentam para as novas tecnologias e para a sociedade em acelerada transformação. Os mestres desempenham um papel extremamente importante ao provocar nos alunos o pensamento para soluções inéditas na resolução de conflitos oriundos de tamanha disrupção. Já que cabe às ciências jurídicas conferir a segurança necessária para a sociedade abraçar a inovação e continuar avançando, é notório que a estagnação não cabe ao Direito.

Proveniente deste espírito crítico inovador que a FND firmou parceria[6] com a Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs (AB2L) para a realização do curso sobre “Direito e Novas Tecnologias”, aberto a toda a comunidade acadêmica. Foram realizadas mais de dezessete aulas, discutindo temas sobre a transformação do Direito ao longo do tempo e como os profissionais devem se adaptar face ao que se espera do “advogado do amanhã”. O curso também abarcou debates sobre blockchain, criptomoedas, novos modelos de negócios, jurimetria, inteligência artificial, resolução de disputas online, Marco Civil da Internet, veículos autônomos, Proteção de Dados Pessoais e muitos outros temas.

O ineditismo deste curso merece menção especial, pois nunca houve, para os alunos de uma faculdade pública, nada próximo do que lhes foi proporcionado naquele momento. Ali, ficou evidente o interesse do corpo docente na preparação de seus estudantes para enfrentar o “novo” sem medo. Com o evento, foi firmado um pacto para que os mestres não virassem o rosto para a realidade de um mundo cada vez mais acelerado e sedento por soluções inovadoras para velhos e novos problemas.

A parceria se solidificou no “FND | AB2L Academy”[7], uma iniciativa inovadora que leva aos jovens estudantes, de maneira teórica e prática, o que há de mais novo no universo do Direito e das novas tecnologias, com novos cursos e encontros para discutir como o mundo jurídico pode fazer a diferença na sociedade. Afinal, somente sendo disruptivo é que o Direito consegue dar o suporte necessário para a própria disrupção.

Disrupção: cisão completa com o “status quo ante”. Na definição clássica do dicionário[8], trata-se do ato ou efeito de romper, de interromper o curso natural, causar ruptura de um processo. Conceito que a FND adotou ao estimular o pensamento e o espírito crítico em seus alunos, somado a postura que a instituição preserva face às novas tecnologias disruptivas que tanto se fala e se sedimenta no campo da inovação[9].

Fala-se em inovação no Direito quando se fomenta os dilemas éticos do uso de inteligência artificial ou, por exemplo, quando se discute a aplicação do Sandbox Regulatório, ambiente excepcional que consiste na experimentação de novos modelos de negócio de produtos ou serviços diferentes dos usuais, que precisam ser observados para o regulador identificar se a ferramenta precisa ou não ser regulada. É o que a FND faz. E com louvor.

Cabe lembrar que inovação também é constatar que as operações financeiras mudaram e novas formas de pagamento precisam ser estudadas com maior profundidade, além de cheques ou títulos de crédito. Inovar na educação do Direito é definitivamente, admitir que o aluno precisa de aprofundamento teórico de acordo com o estudado no eixo de formação fundamental-interdisciplinar. Compreender e absorver a base sólida do estudo da ética, da filosofia e das ciências econômicas e políticas é fundamental para a formação do pensamento jurídico.

Todavia, ainda que o aluno necessite de aprofundamento teórico, é no estudo das disciplinas dos eixos técnico-profissional e prático, que ele será ensinado a sintetizar seu raciocínio. Inovar também é ensinar que o estudante de Direito busque ter seu pleito compreendido de forma rápida, objetiva e assertiva e que, para isso, técnicas de Visual Law poderão ajudá-lo na prática atual onde há judicialização excessiva e um poder judiciário assoberbado com o excesso de demandas como nunca antes se viu.

Em suma, inovação é mudar, aos poucos, a realidade da cultura de judicialização para que se tenha uma mudança prática gradativa, segura e efetiva. Como? Ensinando o aluno sobre a importância da prevenção, da multidisciplinariedade, do entendimento de que outras profissões e ciências podem e devem encontrar espaço para dialogar com o universo jurídico e também, de que os operadores de Direito não são, nem podem ser superiores a quem quer que seja, – apenas se sobressaem quando a motivação é a de refletir segurança para pessoas (pessoas!) em polo de fragilidade.

Neste combo de reconstruções que é a inovação, também cabe mencionar o desejo pela transformação do mercado jurídico para uma inédita realidade, um novo patamar onde a tecnologia se torna aliada à novas ferramentas para alcance de melhores resultados, sem omitir ou ausentar as pessoas do centro dos processos, procedimentos e tomada de decisões.

O curso oferecido anteriormente pela AB2L marcou o início de uma jornada rumo a novas e mais atuais interpretações. Porém, o elo de ligação entre a FND, o pensamento crítico, o progresso na mistura social e a inovação foi compulsoriamente solidificado pela chegada abrupta de uma pandemia em nível global.

A alternativa para substituir as aulas presenciais se deram pela manutenção de encontros e trocas virtuais. Mas, nas diferentes histórias de vidas matriculadas na FND, muitas não tinham condições para acessar as aulas remotamente. Às vezes era a qualidade da internet, às vezes a falta de um ambiente tranquilo ou a falta de equipamento adequado que impossibilitava a conexão. Pensando nisso, a UFRJ disponibilizou para todos os seus alunos e demais graduações e pós-graduações, um programa de educação remota. A iniciativa ofertou[10] aproximadamente 13 mil kits de internet (chip ou chip e modem – ambos os casos com franquia de internet móvel) para estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica.

Foi necessário se adaptar à nova realidade que se desenhou na vida de todos. O ensino não poderia ser paralisado e, mesmo de portas fechadas, a FND permaneceu aberta virtualmente para que suas atividades continuassem, e sua produção acadêmica permanecesse sendo o pilar de sustentação de uma educação pública de referência no país e no mundo. Esse fato retrata como a direção da instituição também precisa, constantemente, se reinventar e encontrar na inovação, soluções criativas para continuar proporcionando aos alunos uma educação de qualidade e sem interrupções em tempos de crise.

Outro importante ator e exemplo clássico dos princípios e valores norteadores da FND é o Centro Acadêmico Cândido de Oliveira (CACO). Sem delongas, o CACO é um dos principais diretórios do movimento estudantil do país. Sua história é centenária. Foi fundado em maio de 1916[11] e se manteve firme até o momento presente em diversas configurações, onde a militância estudantil sempre se posicionou claramente nos mais variados tópicos políticos, com exemplos da entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial e a mobilização em defesa do monopólio estatal da exploração do petróleo no início da década de 1950.

Ou seja, nem mesmo regimes que atentavam contra a democracia foram capazes de cessar suas atividades de forma definitiva. Em 1964, o CACO se posicionou em defesa da legalidade constitucional e em favor do presidente João Goulart. Tal atitude ocasionou a intervenção policial da FND e gerou o enquadramento de seus diretores, – mais tarde detidos e alvos de processo disciplinar. O diretório continuou na luta pela restauração da liberdade democrática até 1969, data em que o Ministério da Educação (MEC) fechou o centro acadêmico e seu presidente Vladimir Palmeira foi obrigado a deixar o país. Os regimes ditatoriais tiveram um fim. O CACO, não.

Mais forte, militante em prol do restabelecimento das liberdades democráticas e com nova configuração, o diretório ressurgiu em 1978 clamando pela anistia aos opositores do regime militar e antidemocrático em vigor, somado ao pedido pelo retorno das eleições diretas para presidente da República.

Inúmeros alunos passaram pelo CACO em toda a sua história. Muitos de posicionamentos políticos dissonantes. Todavia, todos eram e são radicais, militantes e ferozes quando a liberdade democrática está em jogo. Independentemente do posicionamento político-partidário de cada aluno e integrante, o sentimento de orgulho e amor pela FND uniram todos eles que, imbuídos pelo espírito crítico que os direcionava para o que era o certo a se fazer, escolhiam se colocar ao lado da Constituição e das liberdades democráticas.

Por fim, este artigo buscou centralizar informações de como a FND exerceu seu papel de agente transformador da sociedade ao longo de toda a sua história e até hoje, continuadamente. É claro que a instituição possui inúmeros outros princípios e valores, mas seria leviano da parte de qualquer autor tentar sintetizar todos eles em uma única obra.

Não foi, nem há outra forma de prestigiar a Faculdade Nacional de Direito, que não seja por meio do destaque e dissertação dos três maiores princípios norteadores já mencionados: responsabilidade social, comportamento ético e espírito crítico.

A instituição é exemplo prático de transformação social por meio de uma educação que tanto se rascunha nas políticas públicas dos mais variados governos do país. Suas paredes cercam uma fortaleza de cultura, um ambiente clássico de crescimento e uma passagem para a realização de sonhos. Sua história guarda um passado de ouro, reflexo de muita luta e árdua dedicação contínua de seu corpo administrativo e docente.

O resultado de tanto empenho não poderia ser diferente: a produção de alunos e profissionais de extrema qualidade, saudosos e gratos em dizer que fizeram parte da maior faculdade de Direito do país.

O também centenário e educador Paulo Freire já dizia[12]: “Se a educação sozinha, não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda.” Por fim, não importa a atribulação, o caos ou a instabilidade que se passa fora dos muros da instituição, para todos aqueles que buscarem socorro, a Faculdade Nacional de Direito sempre oferecerá um ambiente seguro e acolhedor – como um verdadeiro abrigo contra o vento faz.

Por 130 anos e tantos mais.

Notas:

[1] Proclamada a República, autorizado e reconhecido o ensino livre, Mendes de Almeida convocou os antigos partidários da ideia e, com novos adeptos, declarou fundada a Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro, base do que é hoje a Faculdade Nacional de Direito. Sobre a FND. Disponível em <https://direito.ufrj.br/sobre-a-fnd/>. Acesso em 18/09/2021.

[2] O Núcleo de Prática Jurídica é o órgão responsável pela supervisão das atividades do Estágio e o exercício da prática jurídica curricular no curso de Direito. Disponível em < https://direito.ufrj.br/nucleo-de-pratica-juridica/quem-somos-npj/>. Acesso em 18/09/2021.

[3] Palavras de Kone Cesário, professora e vice-diretora da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ na palestra “O papel das instituições públicas e privadas no futuro do ensino jurídico”, realizada no evento “Law Disruption Week”, promovido pela Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs – AB2L em 21/08/2021.

[4] Associação de Docentes da UFRJ. Disponível em <https://adufrj.org.br/index.php/pt-br/institucional/historia>. Acesso em 18/09/2021.

[5] Projeto Pedagógico da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ. Disponível em <https://direito.ufrj.br/wp-content/uploads/2020/06/PROJETO_PEDAG%C3%93GICO__FND_2014.pdf>. Acesso em 18/09/2021.

[6] FND e AB2L promovem curso sobre direito e novas tecnologias. Disponível em <https://www.jota.info/eventos/ab2l-e-ufrj-promovem-curso-sobre-direito-e-novas-tecnologias-26072018>. Acesso em 19/09/2021.

[7] FND | AB2L Academy. Disponível em <https://ab2l.org.br/ab2l-academy/>. Acesso em 19/09/2021.

[8] Significado de “disrupção”. Disponível em <https://www.dicio.com.br/disrupcao/>. Acesso em 19/09/2021.

[9] Segundo o professor José Vicente, em definição de Schumpeter, inovação pode ser definido como: (i) a introdução de bem ou de nova qualidade para bem já conhecido; (ii) a introdução de método novo ou melhorado de produção; (iii) a criação ou a abertura de mercado; (iv) a conquista de fonte de suprimentos; e (v) a melhora na organização de indústria, tal como a conquista de uma posição de monopólio (ou sua interrupção). MENDONÇA, José Vicente Santos de. “Art. 4º. Requisitos para Regulação Pública”. Comentários a Lei de Liberdade Econômica: Lei 13.874/2019. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019. Págs. 167.

[10] UFRJ lança programa de inclusão digital para ensino remoto emergencial. Disponível em <https://conexao.ufrj.br/2020/06/ufrj-lanca-programa-de-inclusao-digital-para-ensino-remoto-emergencial/>. Acesso em 19/09/2021.

[11] Centro Acadêmico Cândido de Oliveira (CACO). Disponível em <http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/centro-academico-candido-de-oliveira-caco>. Acesso em 19/09/2021.

[12] FREIRE, Paulo. Terceira Carta Pedagógica. 2000, p.67. Disponível em <https://periodicos.ufsm.br/reveducacao/article/view/3050>. Acesso em 19/09/2021.

Palavras Chaves

Comportamento ético, responsabilidade social, espírito crítico, inovação, diversidade.