ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO: OS IMPACTOS PSICOSSOCIAIS À SAÚDE DO TRABALHADOR E AS SUAS DIFICULDADES NO ÂMBITO PROBATÓRIO

Resumo

O assédio moral desencadeia diversos danos à saúde do trabalhador, que constantemente tem a sua dignidade, sua honra, sua moral e a sua integridade física abalada, gerando problemas psíquicos como doenças psicossociais, físicos em decorrência do psicológico como doenças psicossomáticas e emocionais como depressão, ansiedade, fobia social e transtornos obsessivos compulsivos. Desta forma, diante desta problemática, o presente trabalho tem como objetivo analisar as implicações à saúde do trabalhador em decorrência do assédio moral, e versar sobre as dificuldades probatórias para a responsabilização destas condutas. Para tanto, utilizou-se uma revisão bibliográfica, considerando a sua importância na construção de uma pesquisa científica, uma vez que proporciona avanços no campo do conhecimento, analisando as fronteiras do tema. O assédio moral no ambiente de trabalho se demonstra como uma conduta danosa, que além de afetar a dignidade da pessoa humana e implicar em consequências na saúde do trabalhador, também afronta os valores sociais do trabalho. As agressões morais geralmente são sutis, de difícil percepção e identificação pela vítima, assim, os agressores se utilizam de meios lícitos para se alcançarem fins ilícitos. No mais, a vítima se sente acuada, quando não é coagida a não denunciar, com ameaças e receios de não ser levada a sério, de o agressor continuar impune e de sofrer represálias ou agressões mais intensas. Por fim, reafirma a importância de políticas públicas de conscientização sobre o assédio moral no ambiente de trabalho e a indicação de meios de denúncia.

Abstract

Moral harassment triggers various damages to the health of workers, who constantly have their dignity, honor, morals and physical integrity shaken, generating psychological problems such as psychosocial illnesses, physical as a result of psychological problems such as psychosomatic and emotional illnesses such as depression, anxiety, social phobia and obsessive compulsive disorders. Thus, in view of this problem, this study aims to analyze the implications for workers' health as a result of moral harassment, and discuss the evidential difficulties for the accountability of these conducts. For that, a bibliographical review was used, considering its importance in the construction of a scientific research, as it provides advances in the field of knowledge, analyzing the borders of the theme. Moral harassment in the workplace is shown to be harmful conduct, which in addition to affecting the dignity of the human person and implying consequences for the worker's health, also affronts the social values of work. Moral aggressions are usually subtle, difficult to perceive and identify by the victim, thus, the aggressors use legal means to achieve illegal purposes. Furthermore, the victim feels cornered, when he is not coerced not to report, with threats and fears of not being taken seriously, of the aggressor remaining unpunished and of suffering more intense punishment or aggression. Finally, it reaffirms the importance of public policies to raise awareness about moral harassment in the work environment and indication of means of denunciation.

Keywords: Moral Harassment. Workplace. Psychosocial Illnesses. Evidence Difficulties.

Artigo

ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO: OS IMPACTOS PSICOSSOCIAIS À SAÚDE DO TRABALHADOR E AS SUAS DIFICULDADES NO ÂMBITO PROBATÓRIO

 

Mayara Ferreira de Andrade[1]

RESUMO

O assédio moral desencadeia diversos danos à saúde do trabalhador, que constantemente tem a sua dignidade, sua honra, sua moral e a sua integridade física abalada, gerando problemas psíquicos como doenças psicossociais, físicos em decorrência do psicológico como doenças psicossomáticas e emocionais como depressão, ansiedade, fobia social e transtornos obsessivos compulsivos. Desta forma, diante desta problemática, o presente trabalho tem como objetivo analisar as implicações à saúde do trabalhador em decorrência do assédio moral, e versar sobre as dificuldades probatórias para a responsabilização destas condutas. Para tanto, utilizou-se uma revisão bibliográfica, considerando a sua importância na construção de uma pesquisa científica, uma vez que proporciona avanços no campo do conhecimento, analisando as fronteiras do tema. O assédio moral no ambiente de trabalho se demonstra como uma conduta danosa, que além de afetar a dignidade da pessoa humana e implicar em consequências na saúde do trabalhador, também afronta os valores sociais do trabalho. As agressões morais geralmente são sutis, de difícil percepção e identificação pela vítima, assim, os agressores se utilizam de meios lícitos para se alcançarem fins ilícitos. No mais, a vítima se sente acuada, quando não é coagida a não denunciar, com ameaças e receios de não ser levada a sério, de o agressor continuar impune e de sofrer represálias ou agressões mais intensas. Por fim, reafirma a importância de políticas públicas de conscientização sobre o assédio moral no ambiente de trabalho e a indicação de meios de denúncia.

 

Palavras-chave: Assédio Moral. Ambiente de Trabalho. Doenças Psicossociais. Dificuldades Probatórias.

 

MORAL HARASSMENT IN THE WORK ENVIRONMENT: THE PSYCHOSOCIAL IMPACTS ON WORKER’S HEALTH AND ITS DIFFICULTIES IN THE PROBATORY SCOPE

 

ABSTRACT

Moral harassment triggers various damages to the health of workers, who constantly have their dignity, honor, morals and physical integrity shaken, generating psychological problems such as psychosocial illnesses, physical as a result of psychological problems such as psychosomatic and emotional illnesses such as depression, anxiety, social phobia and obsessive compulsive disorders. Thus, in view of this problem, this study aims to analyze the implications for workers’ health as a result of moral harassment, and discuss the evidential difficulties for the accountability of these conducts. For that, a bibliographical review was used, considering its importance in the construction of a scientific research, as it provides advances in the field of knowledge, analyzing the borders of the theme. Moral harassment in the workplace is shown to be harmful conduct, which in addition to affecting the dignity of the human person and implying consequences for the worker’s health, also affronts the social values of work. Moral aggressions are usually subtle, difficult to perceive and identify by the victim, thus, the aggressors use legal means to achieve illegal purposes. Furthermore, the victim feels cornered, when he is not coerced not to report, with threats and fears of not being taken seriously, of the aggressor remaining unpunished and of suffering more intense punishment or aggression. Finally, it reaffirms the importance of public policies to raise awareness about moral harassment in the work environment and indication of means of denunciation.

 

Keywords: Moral Harassment. Workplace. Psychosocial Illnesses. Evidence Difficulties.

 

  1. INTRODUÇÃO

 O assédio moral esteve sempre presente nas relações de trabalho, desde a Idade Antiga, as afrontas à moral do ser humano esteve presente na escravidão, na servidão, nos modelos de produção industrial e no trabalho assalariado, somente após o surgimento de conscientização de dignidade da pessoa humana e posteriormente do valor social do trabalho que as agressões morais no ambiente de trabalho passaram a repercutir uma imagem negativa. Isto porque a condição do trabalhador reflete muito a forma comportamental estudada socialmente frente ao assédio moral, pois aquele possui uma característica intrínseca quanto a sua vulnerabilidade e hipossuficiência na relação laboral.

Diante disso, as pessoas consentem e se acostumam com as condutas abusivas, sejam elas verbais, escritas, gesticuladas, comportamentais, danificando a sua personalidade, integridade física e ou psíquica, bem como a degradação do ambiente de trabalho. Em razão disso, essa prática ainda é muito presente nas relações de trabalho, se apresentando de diversas formas, na qual o trabalhador convive com o assédio moral, temendo outras agressões e represálias, principalmente porque há muitas dificuldades probatórias para a comprovação.

Ainda, como consequência, o assédio moral desencadeia diversos danos à saúde do trabalhador, que constantemente tem a sua dignidade, sua honra, sua moral e a sua integridade física abalada, gerando problemas psíquicos como doenças psicossociais, físicos em decorrência do psicológico como doenças psicossomáticas e emocionais como depressão, ansiedade, fobia social e transtornos obsessivos compulsivos.

Desta forma, diante desta problemática, o presente trabalho tem como objetivo analisar as implicações à saúde do trabalhador em decorrência do assédio moral, e versar sobre as dificuldades probatórias para a responsabilização destas condutas. E, embora o problema supracitado não seja algo relativamente novo, ainda paira uma dúvida sobre a caracterização de assédio moral no ambiente de trabalho, a responsabilidade destas condutas e a sua punibilidade, as medidas protetivas oferecidas para a vítima, e outros questionamentos que precisam ser esclarecidos, sob pena de surgimento de novos casos sem a devida atenção. Ainda, comumente, reclamações trabalhistas são distribuídas sob a lide do assédio moral, desencadeando diversos problemas na saúde da vítima, reservando-a à uma vida traumática, que poderia ter sido evitada se de antemão determinadas providências jurídicas tivessem sido tomadas.

Sendo assim, a temática se mostra relevante para a sociedade, como uma conscientização social, para o meio acadêmico, para a construção do conhecimento jurídico, e por fim, para o profissional e pessoal da autora, na qual empenha um interesse motivacional por suas experiências e a intenção de aprimorar seus conhecimentos sobre o assunto, como operante do direito.

 

  1. REFERENCIAL TEÓRICO

 O assédio moral sempre esteve presente nas relações de trabalho, bem antes do próprio conceito de trabalho e de emprego atuais, sendo constituído e construído no cenário mundial ao longo dos anos, desde as primeiras divisões históricas da humanidade e das suas relações sociais. Isto porque, como visto anteriormente, o trabalho era visto como um castigo, desde a Roma antiga e todo o trabalho desempenhado por escravos, que se perpetuou por anos. (PAIXÃO; OLIVEIRA, 2017)

Durante toda a trajetória da sociedade, o trabalho marca o trabalhador com a sua desvalorização e com a exploração da sua mão-de-obra, com jornadas exaustivas e excessivas, baixos salários, ambiente de trabalho alienante, sendo tratado como um mero objeto para a obtenção de lucro é apenas mais uma peça no modelo produtivo em que está inserido. Por isto, o assédio moral, apesar de ser tratado recorrentemente, sempre se apresentou inerente às relações de trabalho, como uma das mais graves violências praticadas contra o ser humano, afrontando não somente o princípio fundamental da dignidade da pessoa, mas também do valor social do trabalho, e desencadeia tantas outras consequências ao trabalhador que é assediado e aos demais trabalhadores que presenciam as agressões no ambiente de trabalho, o tornando desagradável.

O assédio moral no ambiente de trabalho despertou a atenção do pesquisador em psicologia do trabalho, Heinz Leymann (1984), que realizou diversas pesquisas na área da psicologia e da psiquiatria, identificando o fenômeno da violência moral em locais de trabalho, desenvolvendo este estudo inicialmente na Suécia, se estendendo a outros estudiosos na Alemanha e na França (VACCHIANO, 2007). Tais pesquisas evidenciaram condutas comportamentais violentas em diferentes formas, a denominando como “psicoterror”, em razão do comportamento coercitivo exercido pela comunicação hostil para com um indivíduo ou grupo de indivíduos, colocando-o em uma posição de fraqueza psicológica (MATTOS; et al, 2009).

Em virtude das descobertas, das pesquisas e dos estudos sobre o tema, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), passou a se preocupar com o assunto, concluindo que trabalhadores de diferentes países estavam sob situações de violência moral em seus locais de trabalho. Assim, desde 1996, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) reconhece a existência do assédio moral nas relações de trabalho como um problema internacional que necessita de prevenção e combate.

A palavra “assédio” é um termo consagrado, porém não é considerado legítimo por todos os doutrinadores de Direito que versam sobre o assunto, entretanto, seu sentido se pauta na “perseguição”, “molestamento” ou “intimidação”, e transferem o sentido de maus tratos e humilhações praticados em um contexto de relação trabalhista. O assédio moral varia de acordo com o enfoque desejado, seja ele médico, psicológico ou jurídico, no caso, juridicamente o assédio moral pode ser considerado como um abuso emocional, de forma maliciosa por meio de boatos, intimidações, humilhações, descrédito e isolamento (NASCIMENTO; SILVA, 2008).

Para Hirigoyen (2008), o assédio moral pode ser entendido como toda ou qualquer ação abusiva (comportamentos, palavras, gestos, atos escritos ou falados) que venham a gerar danos à personalidade de outrem, bem com sua dignidade, integridade física e ou psíquica.  E conforme Lima Filho (2009) o assédio moral pode ser explicado como um fenômeno comportamental do ser humano, que tem suas razões na inveja, no egoísmo, no ressentimento, na rivalidade e no domínio da violência como forma de resolver diferenças e conflitos interpessoais.

Nesse seguimento,  Soboll (2006)  descreve o  assédio moral no ambiente de trabalho, como uma exposição dos trabalhadores à situações humilhantes e constrangedoras, geralmente condutas repetitivas e de forma prolongada, durante o horário de trabalho, no exercício das suas funções, bem como não está em efetivo serviço, enviando-lhe mensagens, e-mails de cobrança, ligações em horários inoportunos, a exigências indevidas como :  chegar com antecedência ou não fazer o devido intervalo, impedindo-o assim, de ter momentos de descanso.

Assim, o assédio moral está presente muitas das vezes de forma imperceptível no ambiente de trabalho e por comportamentos abusivos, humilhantes (gestos ou palavras, atitudes) que prejudicam a integridade física e psíquica da vítima, ocorre de maneira repetitiva, tornando o ambiente de trabalho insuportável e hostil. Devido aos desgastes psicológicos que provoca, diminui a produtividade e provoca absenteísmo do funcionário, que pode evoluir para a incapacidade laborativa, o desempenho, e até a morte, constituindo um risco invisível e concreto nas relações de trabalho (NASCIMENTO; SILVA, 2008, p.20)

Estas práticas ofendem diretamente a dignidade e a moral do trabalhador, que vive constantemente para ser cobrado, humilhado, desgastado e sem qualquer descanso e distanciamento da vida pessoal com o ambiente de trabalho, atingindo assim também a sua integridade física e social. E por isso, o assédio moral, por suas condutas abusivas de natureza psicológica, é considerado como um atentado contra a dignidade psíquica do ser humano, ainda mais por ser uma conduta reiterada, repetitiva e prolongada (SOBOLL, 2006), expondo o trabalhador a situações degradantes e humilhantes constantemente.

Neste contexto, o ambiente de trabalho tem uma característica degradante, infeliz e turbulenta, com constantes condutas negativas, sem organização e motivação aos trabalhadores, o que acarreta em um ambiente silencioso e tolerante às condutas abusivas, impedindo qualquer solidariedade entre os colegas de trabalho, uma vez que há medo e receio de ocorrer o mesmo consigo, temendo por seu emprego ou qualquer promoção a vista ou mesmo sofrer represálias.

Ademais, é importante frisar que geralmente as características do agressor se concentram em pessoas egoístas, covardes, narcisistas, que eleva o ego e a superioridade, sem olhar para o próximo como um ser igual, mas sempre inferior, enquanto as características do assediado demonstram pessoas inteligentes e competentes, mas que acatam insultos e críticas humilhantes, e geralmente são mulheres, negros, homossexuais, deficientes físicos ou portadores de doenças, trabalhadores com idade avançada (a partir de 45 anos), aprendizes, estagiários e estudantes (ALMEIDA, 2011).

Um dos alvos preferidos do assediador são os laços afetivos que permitem a resistência, a troca de informações e comunicações entre colegas. Trata-se, pois, de uma violência “interna corporis” que se concretiza em intimidações, difamações, ironias e constrangimento do ‘transgressor’ ou com atos concretos de desprezos multifacetários, como forma de impor controle e manter a ordem. (ALMEIDA, 2011, p. 11)

Assim, “os níveis mais baixos da hierarquia organizacional são as maiores vítimas do assédio moral, pois detém menor poder organizacional” (MATTOS; et al, 2009, p.56), e por isso, geralmente as vítimas não são aquelas que têm uma autoestima baixa ou que são frágeis emocionalmente, mas aquelas que trabalham muito e são dedicados à empresa, que fazem horas extras, trabalham até tarde e mesmo doentes tentam não faltar ao trabalho ou ao menos deixar que tais situações lhe atrapalhe, temendo pelas represálias.

Conforme Paixão e Oliveira (2007) aduzem que o assédio moral pode ser caracterizado por identificações maliciosas ao que diz respeito aos “aspectos, físicos, costumes, crença, caráter, condutas, família, dentre outros” (PAIXÃO; OLIVEIRA, 2017, p.02), como por exemplo referenciar alguém como “aquela gordona”, “aquele que é macumbeiro”, e em diante. Além disto, também citam o regulamento de quantas vezes o trabalhador vai até o banheiro, obrigação de isolamento, proibição de qualquer contato entre colegas de trabalho, comentários que num tom de brincadeira são maldosos e desrespeitosos, não ser sincero sobre informações importantes sobre o trabalho ou transmitir informações erradas, para prejudicar, ou na designação de tarefas que exigem demasiadamente, sendo impossíveis de serem realizadas ou desprezada por outros, mudança arbitrária e sem aviso prévio de horários, não aceitar atestado médico, divulgar informações sobre a vida privada, dentre outros.

Além dessas condutas, Hirigoyen (2002) cita outras que caracterizam o dano moral no ambiente de trabalho, entre eles: aplicar suspensões ou advertências sem razões; descontar faltas que são direitos do trabalhador (consulta ou exame médico, falecimento, casamento, doação de sangue, entre outros); lhe impor carga de trabalho extraordinária; comentários humilhantes e maliciosos; desdém à deficiências físicas ou à doenças, principalmente quando interferem na capacidade do trabalhador; despromoção sem justificativa; desvio ou dupla função; impedimentos de usar o telefone ou internet; imposição de prazos curtos para projetos grandes, que demandam tempo e dedicação, sendo impossíveis entregar na data e horário requerido; proibição de se alimentar, de descansar, até de tomar um café; segregação por diversidade; tarefas inúteis, impossíveis ou absurdas; trocas de horário ou de turno sem qualquer aviso ao trabalhador, entre outros.

Os autores Ferrari e Martins (2011) compreendem que o assédio moral pode ser identificado pelas humilhações, desprezo ou incentivo ao fracasso e ao desanimo, por gestos de forma reiterada na relação hierárquica de trabalho, ou não, com a finalidade de humilhar, degradar e atingir a autoestima de outrem, assumindo ainda os resultados de um possível pedido de demissão, desencadeamento de doenças psicossomáticas e até quadro de depressão acompanhado por suicídio.

O assédio moral é classificado de acordo com a modalidade em que é exercida sob o indivíduo, ou seja, de acordo com a relação hierárquica entre o assediado e o assediador, podendo ser vertical, horizontal e misto. Neste sentido, o assédio moral vertical se apresenta quando há diferenças hierárquicas entre o assediado e o assediador, quando parte de superior hierárquico e seu subordinado, ou vice-versa, o que é mais comum e geralmente ocorre quando o superior é jovem e inexperiente, possuindo subordinados mais experientes e de idade avançada (OLIVEIRA, 2016). No mais, essa modalidade é dividida em: vertical descendente, do superior hierárquico contra seus subordinados; e em vertical ascendente, entre um profissional administrador ou supervisor do superior hierárquico, o que muitas das vezes se apresenta como uma cadeia de agressões morais (GUEDES, 2003).

E ainda, o assédio moral horizontal se apresenta quando não há uma relação de subordinação entre agressor e o agredido, no qual ambos estão sob o mesmo nível hierárquico, geralmente entre colegas, podendo ser de forma individual ou grupal (OLIVEIRA, 2016). Essa modalidade de assédio também é chamada de transversal, e é de simples definição, uma vez que ocorre entre os próprios colegas e mais frequente em situações de disputa de cargos, funções ou promoções, por isso, um dos aspectos mais comuns dessa modalidade é a inveja e as inimizades pessoais, bem como as dificuldades de indivíduos conviverem com as diferenças um dos outros, como no caso de um grupo de mulheres e um grupo de homens, fora situações em que há inseridos no grupo pessoas negras, homossexuais, religiosas, entre outros que sofrem preconceito e discriminação a todo tempo pela sociedade (GUEDES, 2003).

Entretanto, há aqueles que defendem a existência da modalidade mista de assédio moral, quando a agressão parte de um grupo, e neste grupo estão presentes indivíduos com relação não hierárquica e com relação hierárquica com o agredido, sendo uma espécie de sobreposição das modalidades anteriores (OLIVEIRA, 2016).

A modalidade vertical de assédio moral, são aquelas relacionadas ao poder hierárquico na relação de trabalho, levando o empregado a situações vexatórias, desumanas, como por exemplo,

(…) os desmandos, a manipulação, o medo, a competitividade, os programas de qualidade total associado ao de produtividade. E, ainda, incorporadas facetas como: qualificação, polifuncionalidade, visão sistêmica do processo produtivo, rotação de tarefas, autonomia e flexibilização. Sendo, que, a flexibilização envolve precarização, eliminação dos postos de trabalho e de direitos duramente conquistados, imposição de baixos salários, jornadas prolongadas, mortes, aumento da pobreza urbana e da miséria, doenças ocupacionais e incertezas de vários tipos e do fenômeno horizontal que é a pressão para o trabalhador produzir com qualidade e baixo custo (NASCIMENTO; SILVA, 2008, p.23)

 Quanto a modalidade de assédio moral horizontal, esta é caracterizada pela propagação do medo, em razão das práticas autoritárias no ambiente de trabalho, no qual desencadeia comportamentos agressivos e de indiferença ao sofrimento do outro, não havendo uma relação interpessoal saudável e solidária, e sim ausência de prazer nas atividades desempenhadas e um sentimento de esgotamento e inutilidade, instaurado principalmente pelo pacto de silêncio coletivo e de diminuição da produtividade (NASCIMENTO; SILVA, 2008)

Ainda, dentre tais modalidades de assédio moral, há múltiplas formas de condutas, sendo algumas mais comuns, são elas:

Quadro 1: Principais condutas de assédio moral no ambiente de trabalho

Recusar comunicações diretas Recusa em estabelecer uma comunicação direta com o agredido, negando sua existência, o que impede a interrupção das agressões e impossibilita o entendimento e o consenso, paralisando a vítima, negando o conflito e o desprezo.
Desqualificar Desqualifica a vítima de forma velada e discreta, com condutas irônicas, de reprovação e não verbal, com gestos, suspiros, risos, etc.
Desacreditar Desacredita a vítima, gerando dúvida sobre a sua competência ou sobre suas condutas, criando situações de desentendimento, rotulação e ridicularização. Essa conduta cria apelidos, calúnias, mentiras, entre outras manobras de descredibilidade.
Isolar Isola a vítima, deixando de ouvi-la, ignorando-a, não lhe respondendo, gerando o sentimento de estranheza, solidão e incapacidade de construir qualquer relacionamento com os colegas, o que também gera incapacidade de reagir.
Vexar Vexamentos à vítima por tarefas além das suas atribuições ou além da capacidade humana de realização, tentando expor a vítima a atividades sem importância ou de representatividade na organização, exigindo grande esforços do trabalhador em cumprir atividades em curto lapso temporal, ressaltando a urgência e a necessidade de desdobramento para alcançar o resultado, e em seguida desprezar o seu trabalho. Outra forma vexatória é humilhar o trabalhador de forma proposital, mas que indique como brincadeira ou algo “sem querer”.
Induzir a erro Induzimento à vítima a cometer um erro, de forma armada para diminuí-la ou desprezá-la, e preparando uma situação de condução da vítima para que esta tenha reações agressivas ou surtos, para então poder acusá-la diante do superior hierárquico ou dos demais colegas em seguida.
Assediar sexualmente Assédios sexuais, normalmente ao sexo feminino (porém não de forma exclusiva), que consiste na obtenção de favores sexuais das vítimas, como afirmação do poder exercido sobre o assediado. A intenção é transformar a pessoa perseguida como alguém sempre disponível, inclusive sexualmente, no qual o agressor detém um poder pessoal, pelo seu corpo além da relação de trabalho, o que poderá usar contra a vítima para confundi-la ou atormenta-la, inclusive para reverter a situação e acusa-la de assédio sexual.

Fonte: Adaptada de Mattos; et al (2009)

Assim, de acordo com a opinião de Ferrari e Martins (2011), o assédio moral pode se apresentar tanto em relações hierárquicas, ou seja, do chefe para seu subordinada, ou para uma relação que não há hierarquia, como entre colegas de trabalho. Contudo, os autores Paixão e Oliveira (2017) esclarecem que não é qualquer cobrança ou meta que pode caracterizar o assédio moral, mas sim aquelas exageradas com supervisões excessivas, colocando o trabalhador em situações de extremo estresse, e exemplifica uma situação de um funcionário que passa a ser cobrado para atingir uma meta, e durante este processo houve diversas piadas, deboches, gozações por não conseguir atingir a meta, sentindo-se mal, o que muitas das vezes o faz extrapolar suas condições humanas de trabalho, e abrir mão de outros momentos como estudo, saúde, família, lazer e outros.

 

  1. METODOLOGIA DA PESQUISA

 Para tanto, utilizou-se uma revisão bibliográfica, considerando a sua importância na construção de uma pesquisa científica, uma vez que proporciona avanços no campo do conhecimento, analisando as fronteiras do tema. A partir da delimitação do tema, houve uma pesquisa bibliográfica investigatória, aplicando assim uma metodologia dedutiva e qualitativa a partir da coleta de dados e resultados, permitindo obter ideias sobre o tema, as lacunas e a contribuição da investigação para o desenvolvimento do conhecimento.

 

  1. RESULTADOS E DISCUSSÃO

 4.1 Dificuldades no âmbito probatório

 Comumente há de se deparar com condutas agressivamente ofensivas e assediadoras moralmente à colaboradores em seu ambiente de trabalho, porém, considerando a situação econômica atual do país, a escassez de empregos, o temor por uma demissão ou uma represália, a dificuldade de conseguir comprovar suas alegações, consequentemente inibem os trabalhadores tanto de prestar solidariedade ao colega que está sendo assediado, quanto de tomarem as próprias providências denunciando o assediador (PAIXÃO; OLIVEIRA, 2017).

Portanto, a questão da prova é bastante relevante quando se trata de assédio moral no ambiente de trabalho, uma vez que por vários motivos a vítima não denuncia, e aqueles envolvidos no assédio moral também não se sentem confortáveis em denunciar, o que contribui para que o agressor prossiga com os ataques, e perpetua a impunidade. Carvalho Filho (2015) explica que geralmente as condutas do agente agressor hierárquico superior é revestida de legalidade, assim é mascarada pela aparência da legalidade, e pode ser facilmente justificada, contribuindo para a dificuldade probatória.

Por isso, além da dificuldade de identificação do assédio moral, devido a forma sutil de degradação psicológica, o assédio moral também apresenta grandes dificuldades probatórias. Os obstáculos das provas se encontram na dificuldade de denunciar, de comprovar as condutas e os comportamentos, principalmente aqueles direcionados individualmente ao colaborador, sem testemunhas, além da prova testemunhal, pois dificilmente outros colaboradores estarão dispostos a testemunhar, tanto por não conseguir identificar o assédio moral, ou por estar persuadida pelo assediador, por ser cúmplice das condutas, e também por receio de represálias (ALMEIDA, 2017).

São enormes as dificuldades vivenciadas pelas vítimas de assédio no concernente à convocação de pessoas – geralmente colegas de trabalho – dispostas a prestar, como testemunhas, depoimentos a seu favor tanto no âmbito Administrativo como na Justiça. É até compreensível o ato de resistência dessas pessoas em prestar depoimentos de modo espontâneo e sem risco, pois, se prontificaram a testemunhar, estão fadadas ao mesmo infortúnio vivenciado, isto é, tornar-se-ão alvo de ameaças e perseguições por parte do superior hierárquico, elementos esses típicos da ocorrência do fenômeno (MINASSA, 2012, p.175)

Ressalta-se que os meios de prova nos casos de assédio moral, é principalmente testemunhal, embora também se admita depoimento pessoal, prova documental e prova pericial, nos casos que geram danos emocionais ou físicos. Minassa (2012) explica que o primeiro procedimento é identificar o nexo de causalidade entre o fato ilícito (conduta de assédio moral) e o resultado danoso provocado por este, e assim, deve-se registrar todos os acontecimentos através de dias e horas precisas, mencionando o ambiente, a situação envolvida e a presença de outras pessoas, recolhendo as provas que indiquem as consequências de tais atos, como as induções ao erro, as humilhações e as chacotas pelos colegas, os sofrimentos pelo abalo moral e da dignidade, bem como atestados médicos, laudos médicos, para comprovar as implicações emocionais e físicas.

Entretanto, é difícil que o assediado consiga lembrar de todos os acontecimentos precisamente, ou ter a premeditação de acolher provas para denunciar o agressor, o que Minassa (2012) indica como cópias autenticadas de cartas, e-mails, mensagens, bilhetes, entre outros, enviados pelo assediador e pelos colegas co-assediadores, fotografias, vídeos, gravações de voz, e etc. Ainda, o trabalhador teme inclusive este recolhimento de provas, por sofrer represálias ou intensificações das condutas de assédio, caso seja descoberto.

No mais, ressalta-se que o artigo 373 do Código de Processo Civil indica que cabe ao autor o ônus da prova, quanto ao fato constitutivo de seu direito, e também indica que nos casos em que haja impossibilidade ou excessiva dificuldade de cumprir o encargo de ônus da prova, este poderá ser distribuído diversamente. E também, indica em seu artigo 7º que é assegurada às partes equilíbrio processual, quanto aos meios de defesa e aos ônus das provas (BRASIL, 2015). Contudo, dificilmente esta regra é aplicada quando se trata de ônus de prova, com intuito de comprovar o assédio moral.

Ainda, há outra consequência quando não se consegue comprovar as condutas ilícitas do assédio moral, a condenação do próprio agente assediado, através de medida disciplinar punitiva pela denúncia, ou pelas tutelas jurisdicionais da esfera penal e civil, pelo crime de calúnia (artigo 138 do Código Penal) e por danos morais ou patrimoniais causados ao agente acusado de assédio moral, respectivamente (MINASSA, 2012).

Portanto, muitas vítimas acabam desistindo de denunciar as condutas que assediam a sua moral. Neste ponto, Silva e Silva (2015, p.53) conceitua que “o autoritarismo presente no ambiente de trabalho é um fator inibidor de denúncias, sendo muito difícil a configuração do assédio moral, uma vez que a coleta de provas se torna escassa”, e por isso, a impunidade se perpetua, pois, se não há como comprovar os fatos, não há punição.

 

4.2 As implicações do assédio moral ao trabalhador

 O assédio moral geralmente inicia como uma brincadeira, um episódio isolado, algo inofensivo, mas que aos poucos se propaga enganosamente, uma vez que a vítima não tem a intenção de demonstrar que se sentiu ofendida com as brincadeiras e os comentários, ou pela violência verbal, o que contribui para o crescimento dos ataques do assediador (FIGUEIRA; BELÉM; ARCANJO, 2017).

Como consequência, o trabalhador retorna para casa humilhado, triste, com a autoestima baixa, principalmente pela vergonha que passa no ambiente de trabalho, pela falta de reconhecimento do seu trabalho e das suas qualidades pessoais, que se mostra ferida pelos ataques e perseguições do assediador. Isto porque, quando o processo de assédio se estabelece a vítima é estigmatizada, reduzida a alguém de caráter duvidoso, difícil convivência, com problemas de loucura, atribuindo a personalidade do conflito e tornando-se aquilo que o assediador tanto crítica (FIGUEIRA; BELÉM; ARCANJO, 2017).

O trabalhador se sente coagido com a constante e insistente propostas de metas, às vezes impossíveis de serem concretizadas ou inatingíveis, que não proporcionam ao trabalhador quaisquer elementos mínimos para o seu trabalho. Assim, aqueles que assediam o trabalhador apenas o veem como um mero objeto, como um número, como mais um colaborador, sem lhe prestar o devido respeito, e reconhecimento de que é um ser humano, e tem direito à saúde, lazer, um ambiente de trabalho sadio, além de dignidade.

Essa dose de perversão moral – algumas pessoas sentem-se mais poderosas, seguras e até mesmo mais auto confiantes à medida que menosprezam e dominam outras – pode levar com facilidade, a nosso ver, ao assédio moral, quando aliada à questão da hipercompetitividade […] Ou seja, a perversidade (por vezes ligadas a traços como frieza, calculismo e inteligência) e encorajada por práticas organizacionais danosas (corrosão de valores éticos essenciais) acaba por desconsiderar o outro, em um verdadeiro extermínio psíquico, calculado e covarde, em relação à pessoa agredida. (HELONAI, 2004, p.05)

Por isto, evidentemente o assédio moral produz um abalo na dignidade da pessoa assediada, gerando outras consequências como doenças psicossociais, depressão, síndrome do pânico, ansiedade generalizada, em razão do estresse, da cobrança, da baixa autoestima, e outros, e também doenças psicossomáticas, que em razão do abalo emocional e sentimental, não atinge somente o psicológico mas também o corpo, gerando diversas doenças como gastrite, úlceras, problemas intestinais, pressão alta, enxaquecas, entre outras.

 

4.1.1 Abalo da Dignidade da Pessoa Humana

 O direito do trabalho digno tem como função preservar a integridade física e psíquica do trabalhador, oferecendo condições adequadas de saúde e segurança em seu ambiente de trabalho, e meios adequados para a sua subsistência e da sua família, com uma remuneração compatível e de uma jornada não degradante e excessiva, promovendo ainda, o desenvolvimento e aprimoramento econômico, social e pessoal. Isto se deu às reivindicações, revoluções e movimentos sociais que abalavam a sociedade e serviram de pauta para o cenário de transformações da política, da econômica e com o Direito do Trabalho, que pretendia proporcionar aos trabalhadores uma dignidade e melhores condições de trabalho. (DELGADO, 2015)

O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, é o norteador da interpretação de todo o ordenamento jurídico, estando diretamente vinculada à ideia de que o homem não é mero objeto sujeito ao Estado ou à terceiros, sendo considerado um princípio de caráter absoluto, pois vai além do inciso III do artigo 1º da Constituição Federal, estando presente em todas as normas, garantindo a dignidade ao ser humano.

Para Ávila (2015), o assédio moral é uma chaga social que carrega consequências desastrosas e provoca graves consequências à vítima, violando o princípio da dignidade da pessoa humana, e também o direito de conviver num ambiente sadio de trabalho, sendo ambos preceitos assegurados constitucionalmente. Um ambiente sadio e equilibrado de trabalho é um direito fundamental, e está diretamente relacionado à dignidade da pessoa, pois tem uma relação direta com o direito à vida, uma vez que as condições do ambiente de trabalho influenciam na saúde do trabalhador.

No mais, ressalta-se que a dignidade da pessoa humana é uma condição inerente a todos os seres humanos, pela simples circunstância da sua natureza, o que lhe concede proteção dos princípios morais e jurídicos. Por este motivo, a dignidade da pessoa humana é um requisito a ser respeitado em qualquer coletividade, inclusive no ambiente de trabalho, para que haja uma harmoniosa convivência em sociedade (FIGUEIRA; BELÉM; ARCANJO, 2017).

Portanto, as agressões psicológicas que se manifestam através do assédio moral no ambiente de trabalho, por humilhações, constrangimentos, perseguições, manipulações, que prejudiquem o trabalhador e o traga consequências para a sua vida profissional e pessoal, abalam significativamente a dignidade da pessoa humana do trabalhador (FIGUEIRA; BELÉM; ARCANJO, 2017).

4.1.2 Doenças Psicossociais

 

Para Vacchiano (2007), o assédio moral acarreta diversos problemas de saúde ao trabalhador como:

  1. a) depressão; b) angústia; c) estresse; d) crises de competência; e) crises de choro; f) mal-estar físico e mental; g) cansaço exagerado, h) falta de interesse pelo trabalho; I) irritação constante; j) insônia, alterações no sono, pesadelos; k) diminuição da capacidade de concentração e memorização; l) isolamento, tristeza, redução da capacidade de se relacionar com outras pessoas e fazer amizades; m) sensação negativa em relação ao futuro; n) mudança de personalidade, reproduzindo as condutas de violência moral; o) aumento de peso ou emagrecimento exagerado, aumento da pressão arterial, problemas digestivos, tremores e palpitações; p) redução da libido; q) sentimento de culpa e pensamentos suicidas; r) uso de álcool e drogas; s) tentativa de suicídio. (VACCHIANO, 2007, p.54)

Importa mencionar uma demanda trabalhista (nº 0010242-28.2013.5.14.0008) proposta no Tribunal Regional do Trabalho – TRT da 14ª Região, entre uma funcionária e uma empresa pública que detinham uma relação de emprego, na qual a reclamante postula a declaração judicial da prática de assédio moral e indenização por danos por conta da perda da sua função que a fez retornar para a posição de técnica social. (JUSBRASIL, TRT-14, 2014)

A reclamante informou que o seu superior hierárquico a tratava com indiferença, ficando sem falar com a funcionária por semanas, tratando-a com desprezo, sem orientá-la corretamente pelos seus serviços e lhe dar a devida atenção, burlando reuniões sem avisá-la e ainda impondo restrições e limites do uso de banheiro, nas quais foram identificadas e vistoriadas, e identificado pelo Ministério Público a presença de assédio moral. (JUSBRASIL, TRT-14, 2014)

Sobre o assédio moral, é imperioso destacar que a cada dia vem crescendo no Brasil estas doenças silenciosas como as psicológicas oriundas do terror psicológico que se trava no ambiente laboral, sob o nome de assédio moral tanto de natureza vertical como horizontal. Tem-se que as estatísticas estão a cada dia apontando o aumento de ambientes laborais nefastos à integridade moral dos obreiros. (JUSBRASIL, TRT-14, 2014)

Percebe-se claramente que a magistrada observou as consequências do assédio moral na saúde do trabalhador, sendo uma delas as doenças psicológicas.

Ainda entendo que na situação em liça a reclamante passou a desenvolver problemas de baixa estima e de aceitação no local de trabalho, sendo determinado pelo gestor assediador que diversas tarefas fossem refeitas várias vezes por detalhes mínimos, sem qualquer fundamento, fomentando no clima laboral uma situação de insatisfação e insegurança entre os colaboradores.

(…)

É preciso destacar que foi realizada a perícia médica na autora para verificação de sua situação clínica no ambiente laboral, notando-se, como dito pelo perito, que, mesmo estando a autora apta ao labor, a reclamante vinha apresentando depressão e transtornos psicológicos pós-traumático, com nexo causal direto com as atividades desenvolvidas e com o clima organizacional que, pela prova documental, fiquei convencida da situação de terror e medo que se instaurou na agência. (JUSBRASIL, TRT-14, 2014)

Por fim, a magistrada compreendeu que do assédio moral decorreu a doença psíquica da reclamante comprovada por seus documentos clínicos, pela prova pericial e por todas as outras provas que mostram evidentemente que a autora detinha o direito de ser indenizada (JUSBRASIL, TRT-14, 2014).

Contudo, no Brasil, a violência moral decorrente do ambiente do trabalho ainda não é vista pelos profissionais de saúde como um risco visível para o fator psicossocial, tampouco como responsável pelo desgaste das condições de trabalho, gerando como consequência um clima ruim e negativo nas relações interpessoais, desestabilizando emocionalmente as vítimas da violência moral, comprometendo a sua saúde, bem como agravando doenças, levando-os à disfunção ou incapacidade laborativa de longa duração ou até mesmo, a morte (RUFINO, 2007)

Ocorre que a violência moral no ambiente de trabalho ainda não foi incorporada pelos profissionais da área de saúde e trabalho como risco invisível (fator psicossocial) responsável pela degradação deliberada das condições de trabalho, gerando um clima negativo nas relações, desestabilizando emocionalmente os/as trabalhadores/as, comprometendo a saúde, desencadeando ou agravando doenças que podem levar disfunção e/ou incapacidade laborativa, de longa duração ou até mesmo a morte. As ofensas, humilhações e a sobrecarga de trabalho em razão da condição de raça e cor reforçam a informação que vem sendo apontada pelos principais institutos de pesquisas, há mais de vinte anos, que o contingente da população negra comparada com a branca é o segmento mais discriminado, sendo que o mesmo acontece quanto ao Assédio Moral no trabalho. (VACCHIANO, 2007, p.12)

Nesta lógica, é necessário que o Sistema Único de Saúde (SUS) reconheça a importância deste tema e as suas consequências e os danos à saúde do trabalhador, propiciando a eles medidas legais específicas, atendimento médico, bem como acompanhamento interdisciplinar, no qual os profissionais estejam preparados para ouvir e compreender a vítima, sem reduzir a assistência apenas à medicação e a “psiquiatrização do problema social” (HIRIGOYEN, 2011).

 

4.1.3 Doenças Psicossomáticas

 

Uma das principais implicações do assédio moral no trabalho é a perda de interesse, bem como o prazer de trabalhar, gerando com isso a desestabilidade emocional, agravamento de moléstias já existentes na saúde do trabalhador e surgimento de novas doenças. Portanto, devido à queda de produtividade e de qualidade de vida, o trabalhador é acometido por doenças profissionais, acidentes de trabalho e outras doenças psicossomáticas.

Entre as doenças psicossomáticas, Vacchiano (2007, p.55) cita: dores generalizadas, palpitações, tremores, diminuição da libido, aumento da pressão arterial, dor de cabeça, distúrbios digestivos, tonturas, falta de apetite, falta de ar, entre outros sintomas relacionados a todo sofrimento das agressões verbais sofrido no ambiente de trabalho. Em relação à demanda citada anteriormente (nº 0010242-28.2013.5.14.0008), a magistrada também reconheceu a incidência de doenças psicossomáticas relacionadas diretamente pelo assédio moral.

O assédio, muitas vezes, não se mostra nos gritos ou em xingamentos. Existe a modalidade velada de assédio que se verifica pelo desprezo ou pela total falta de interação. Existe aquela perseguição velada em que o assediador, praticamente, não se comunica ou não permite que os demais façam a interação com o assediado, minando suas forças e energias, causando um decréscimo cada vez maior da auto- estima da autora e, principalmente, propiciando uma doença psicossomática como a depressão e os transtornos pós-traumáticos, atestados pela perícia médica. (JUSBRASIL, TRT-14, 2014)

 Desta forma, “com o tempo, o próprio assédio pode gerar patologias nas vítimas, à medida que faz com que elas acreditem ser exatamente o que os agressores pensam, ou desejam que sejam: desatentas, inseguras, incompetentes e frágeis” (NASCIMENTO; SILVA, 2008, p.23)

 

4.1.4 Dano Moral Coletivo

 Por fim, insta salientar que, o assédio moral, além de gerar um dano moral a cada indivíduo, também produz um dano para com todos os funcionários atingidos por tais condutas. Entretanto, é importante ressaltar que a noção e o conceito de dano moral são amplos, pois se trata da personalidade humana, alcançando atos ilícitos que causam “dessossego, desconforto, medo, constrangimento, angústia, apreensão, perda de paz interior, sentimento de perseguição ou discriminação, desestabilização pessoal, profissional, social e financeira” (FERRARI; MARTINS, 2011, p. 22), experimentado pelas vítimas de assédio moral, conforme vimos anteriormente.

Assim, por atingir a moral de uma massa de trabalhadores, o dano moral gerado é de caráter coletivo, uma vez que a reparação do dano tem natureza coletiva e não meramente individual, atingindo uma parcela determinável da sociedade, que no caso constitui os funcionários do mesmo departamento, ou outros funcionários que presenciaram o assédio moral.

Importa esclarecer que o dano moral coletivo não é um mero desdobramento do dano moral individual, pois além de violar a honra, a dignidade, intimidade, imagem e reputação da pessoa do trabalhador, também viola direitos transindividuais, direitos difusos e coletivos, principalmente ao que tange ao direito de ter um ambiente e condições de trabalho sadios. (FERRARI; MARTINS, 2011)

Desta forma, as condutas de assédio moral no ambiente de trabalho não afetam apenas o assediado, um único trabalhador, mas de forma transcendente à individualidade, atinge todo um grupo de trabalhadores dentro da mesma situação fática, que ainda que não vítimas diretas, também tem seus direitos coletivos afrontados, visto que a manutenção de um ambiente de trabalho adequado, equilibrado e sadio é um direito fundamental e constitucional, inerente à coletividade.

 

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Diante do exposto, compreende-se que o trabalho tem um valor significativo socialmente, principalmente por conceder ao homem a possibilidade de subsistência e consequentemente de dignidade, e por esta razão está elencado na Constituição Federal de 1988 como um princípio fundamental do Estado Democrático de Direito, juntamente com a dignidade da pessoa humana. No mais, o trabalhador possui uma característica inerente à sua vulnerabilidade perante o empregador e o ambiente de trabalho, portanto, é assegurado constitucionalmente de direitos e garantias fundamentais de proteção.

Entretanto, muitas agressões ainda são praticadas no ambiente de trabalho, suprimindo direitos trabalhistas e reduzindo o trabalhador a péssimas condições de trabalho. Entre tais práticas, há o assédio moral, através de agressões verbais, humilhações e vexatórios constantes, não designar tarefas ou designar tarefas humanamente impossíveis e sobrecarregadas, criar histórias e mentiras, excluir o trabalhador do convívio social entre os colegas de trabalho, entre outras atitudes que infligem a moral do trabalhador.

O assédio moral no ambiente de trabalho se demonstra como uma conduta danosa, que além de afetar a dignidade da pessoa humana e implicar em consequências na saúde do trabalhador, também afronta os valores sociais do trabalho. As agressões morais geralmente são sutis, de difícil percepção e identificação pela vítima, assim, os agressores se utilizam de meios lícitos para se alcançarem fins ilícitos. No mais, a vítima se sente acuada, quando não é coagida a não denunciar, com ameaças e receios de não ser levada a sério, de o agressor continuar impune e de sofrer represálias ou agressões mais intensas.

Embora o Congresso Nacional se empenhe a elaborar Projetos de Lei e Propostas de Emenda à Constituição, para que haja melhores parâmetros conceituais e característicos do assédio moral e consequentemente de punições aos praticantes, ainda não é suficiente, uma vez que a jurisprudência ainda improcede alguns meios de provas e não a diversifica, tampouco a inverte, não reconhecendo assim a presunção do assédio moral.

Mas o assédio moral não é levado frequentemente ao Poder Judiciário, principalmente devido ao ambiente austero, abusivo e autoritário, ainda, há desconhecimento do conceito e da caracterização do assédio moral, e dificuldades aparentes para recolher elementos probatórios suficientes para que haja a denunciação e consequentemente sua responsabilização pelos atos praticados, tanto no âmbito administrativo, civil e penal, a reparar os danos morais e patrimoniais sofridos pela vítima.

Por fim, reafirma a importância de políticas públicas de conscientização sobre o assédio moral no ambiente de trabalho, e indicação de meios de denunciação, como otimização de recursos humanos e pessoais, palestras, campanhas, conversas, rede de apoio, e todos os meios possíveis de estabelecer um ambiente saudável, equilibrado e seguro para que a vítima possa denunciar qualquer agressão moral sem as atuais dificuldades probatórias, bem como também não ficar à mercê das agressões e ter a sua saúde física, emocional e psíquica abalada, em todos os casos a fim de prevenir e combater a prática de assédio moral no ambiente de trabalho.

 

REFERÊNCIAS

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Notas:

[1] Graduada em Direito pela Universidade Estácio de Sá, Pós-Graduada em Direito e Processo do Trabalho e Pós-Graduanda em Direito do Consumidor. Advogada, inscrita na OAB-RJ nº 229.678 E-mail: [email protected].

Palavras Chaves

Assédio Moral. Ambiente de Trabalho. Doenças Psicossociais. Dificuldades Probatórias.