NOVOS INVESTIMENTOS EM CONCESSÕES E PPPS: CONTORNOS E LIMITES

Artigo

NOVOS INVESTIMENTOS EM CONCESSÕES E PPPS: CONTORNOS E LIMITES[1]

 Gabriela M. Engler Pinto[2]

 Introdução 

O presente artigo pretende (i) delimitar os contornos do conceito de novos investimentos, (ii) discutir os limites à mutabilidade dos contratos de parceria (assim entendidos os contratos de concessão comum, concessão patrocinada, concessão administrativa, concessão de serviços regida por legislação setorial, permissão de serviço público, arrendamento de bem público, concessão de direito real e os outros negócios público-privados que, em função de seu caráter estratégico e de sua complexidade, especificidade, volume de investimentos, longo prazo, riscos ou incertezas envolvidos, adotem estrutura jurídica semelhante)[3] especificamente para inclusão de novos investimentos no curso da execução contratual, a partir da reflexão sobre casos concretos e à luz da regra declarada pelo artigo 22 da Lei 13.448/17,[4] que afasta dos contratos de parceria as disposições da Lei 8.666/93 relativas aos limites quantitativos para as alterações de contratos administrativos e (iii) propor sistemática que, a partir do enquadramento de casos em determinadas categorias, ofereça diretrizes objetivas para estipulação de limites à mutabilidade contratual para inclusão de novos investimentos em situações concretas envolvendo contratos de parceria.

O debate acerca dos limites à alteração dos contratos de parceria não é novo e, possivelmente, o artigo 22 da Lei 13.448/17 tenha surgido justamente para consolidar entendimento há muito defendido pelos especialistas no tema.[5]

Enquanto parcela da doutrina mais moderna defendia a inaplicabilidade, às parcerias, dos limites à alteração contratual tal qual expressos nos §§ 1o e 2o do art. 65, da Lei 8.666/93,[6] na prática, na maioria das vezes em que o tema era submetido aos gestores públicos e controladores responsáveis pela implementação das modificações contratuais, prevalecia, em boa medida, uma postura conservadora,[7] e por vezes até equivocada,[8] de aplicabilidade dos referidos limites às parcerias, temperada com a visão do Tribunal de Contas da União (TCU) que admitiu aos contratos administrativos excepcionar os limites dos §§ 1o e 2o do art. 65 da Lei 8.666/93 apenas quando atendidos um conjunto de requisitos.[9]

Eis que, durante a tramitação da Medida Provisória 752/2016, surgiu o mencionado artigo 22, no que chamei, em outra oportunidade, de revolução silenciosa.[10] Ao mesmo tempo em que a disposição legal selou antiga disputa, deixou em aberto pergunta ainda mais importante: inaplicáveis os limites quantitativos à mutabilidade contratual previstos na Lei 8.666/93, quais seriam os contornos, especialmente qualitativos, a delimitar alterações nos contratos de parceria?

A resposta, em tese, não é difícil. Para que seja juridicamente legítima, a alteração contratual deve (i) ser necessária para se atingir a finalidade – o interesse público – que motivou a contratação; (ii) estar vinculada ao objeto contratual; e (iii) preservar a equação econômico-financeira do contrato e os direitos do contratado. Quando o contrato de parceria tiver por objeto serviço púbico deverá, ainda, haver reflexão sobre a necessidade de prévia licitação.[11] Mas como aplicar esses preceitos na prática?

Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que ‘alteração contratual’ abrange muitas circunstâncias, de causas e consequências variadas; distintas, inclusive, a depender do setor de infraestrutura sob análise.[12] Tratar todas elas sob o manto de uma ‘teoria geral da mutabilidade contratual’ está fadado a generalismo que pouco contribui para os desafios da vida real. A partir dessa constatação, segue o esforço de segregar, neste artigo, apenas a reflexão sobre as hipóteses de alteração contratual para inclusão de novos investimentos.

Assim, este artigo está dividido em cinco partes. Além desta introdução, a segunda parte busca definir novos investimentos e, no processo, discutir as dificuldades da comunidade jurídica de distingui-los dos investimentos contingentes, bem como as implicações dos diferentes enquadramentos. Na sequência, a terceira parte apresenta uma proposta de três categorias para classificação de novos investimentos, a partir das quais a quarta parte discute os limites qualitativos à mutabilidade dos contratos de parceria para inclusão de novos investimentos. Por fim, a quinta parte conclui.

Antes, porém, é preciso esclarecer que é premissa deste trabalho que o artigo 22 da Lei 13.448/17 aplica-se indistintamente a todos os contratos de parceria – inclusive àqueles em vigor à época da promulgação da Lei -, e não apenas aos setores rodoviário, ferroviário e aeroportuário, que são objeto específico da Lei 13.448/17. As razões desse entendimento serão melhor explicadas em outra oportunidade, mas apenas o fato de o artigo 22 situar-se topograficamente nas ‘disposições finais’, junto a outros artigos que regulam matérias estranhas aos temas específicos do diploma legal (prorrogação antecipada e relicitação) já é indício claro de que a pretensão legislativa foi no sentido de conferir ampla aplicabilidade ao art. 22.

1. O que são novos investimentos?

Num esforço de sistematização, é possível identificar três categorias de investimentos no contrato de parceria: (i) os investimentos necessários, sejam decorrentes de obrigação de investimento específica,[13] sejam aqueles necessários ao atendimento dos indicadores de desempenho estipulados no contrato;[14] (ii) os investimentos contingentes, explicados no tópico 2.1; e (iii) os novos investimentos, objeto do presente estudo e objetivamente definidos no tópico 2.3.

A distinção é relevante na medida em que se o investimento sob análise for um investimento necessário ou um investimento contingente, não fará sentido qualquer juízo sobre os limites à mutabilidade contratual, posto que a avaliação de interesse público quanto à inclusão desses investimentos no contrato – e, portanto, de pertinência ao objeto contratual e aderência à sua finalidade – já foi feita à época da estruturação do projeto.

Ou seja, somente haverá discussão acerca dos limites à mutabilidade contratual quando se estiver diante, rigorosamente, de um novo investimento.

1.1. Investimentos contingentes

Os investimentos contingentes são aqueles que, embora previstos no contrato de parceria como encargo da concessionária, têm sua exigibilidade condicionada à ocorrência de determinado evento, que pode ou não ser a termo definido. Em tese é possível, inclusive, que não ocorrido o evento, o investimento contingente sequer seja exigível.

Na prática, os investimentos contingentes mais comuns são as obrigações de investimento sujeitas à gatilho contratual, a exemplo de novas obras de aumento de capacidade de infraestruturas quando elas atingem determinados níveis de serviço. Isso é recorrente no setor rodoviário em relação à duplicação de rodovias quando a trafegabilidade atinge níveis definidos nos contratos,[15] e nas concessões aeroportuárias no tocante à construção de nova pista de pouso e decolagem, quando o aeroporto atinge determinada demanda de passageiros.[16]

Também podem tomar a forma de investimentos contingentes as expansões de infraestrutura independente de gatilho, como a previsão de prolongamento de linhas férreas ou metroviárias, inclusive em extensões não previamente determinadas em contrato.[17]

De forma semelhante, investimentos para cumprimento de obrigações de universalização de serviços – como é comum nos setores de telecomunicações, distribuição de energia e de saneamento básico – quando previstas originalmente no contrato, são investimentos contingentes. Esses são exemplos em que é comum o ritmo de execução dos investimentos contingentes se descolar das previsões originais (tanto do concedente quanto da concessionária) como ocorre, por exemplo, em concessões de saneamento que tem a obrigação de atender determinada população cuja taxa de crescimento extrapola as projeções iniciais.

A premissa de modelagem dos investimentos contingentes é a avaliação de política pública, no momento de estruturação do contrato de parceria, quanto à importância e pertinência de se prever, desde a origem, o investimento contingente, seja ele certo ou incerto. Por conta dessa reflexão, a execução dessas obrigações de investimento não deve sujeitar-se a qualquer crivo de limitação qualitativa ou quantitativa à mutabilidade contratual, posto que esse juízo já foi feito à época da estruturação do projeto.

Isso não significa dizer que o contrato de concessão não precisaria ser aditado (i) para consignar a execução dos investimentos contingentes e (ii) promover, caso necessário, o reequilíbrio econômico-financeiro da concessão.[18] A questão do reequilíbrio é particularmente relevante se o investimento contingente não foi precificado quando da licitação do projeto.

1.2. A confusão entre investimentos contingentes não precificados na origem e novos investimentos

Da perspectiva da modelagem de projetos, pode tanto haver o comando, no edital, para que as concessionárias precifiquem já na licitação a execução dos investimentos contingentes (mesmo sem saber quando eles serão executados)[19] quanto haver a mera previsão de que os investimentos contingentes serão exigidos quando verificadas determinadas condições e que, na oportunidade, o contrato será reequilibrado para contemplar a execução dessas obrigações.

Exemplo dessa última hipótese, que ganhou notoriedade no universo da infraestrutura, é a construção da nova subida da serra de Petrópolis/RJ, no âmbito da concessão rodoviária federal da BR 040/MG/RJ.[20] O programa de exploração rodoviária (PER) originário da rodovia previa a obrigação da concessionária de implantar a obra até 2006, estimando uma verba de 80 milhões (a preços de 1995), porém, deixando claro que ‘o valor real da obra, a menos ou a mais da estimativa prevista, será negociado com o(a) DNER’.[21] Ou seja, um típico caso de investimento contingente não precificado à época da licitação do projeto.

Contudo, quando a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) pretendeu cumprir a determinação do PER e exigir a obra de duplicação, o aditivo que reequilibrou o contrato de concessão para compensar a concessionária pelos investimentos foi considerado irregular pelo TCU.[22]

Nesse caso, faltou reflexão sobre a real natureza dos investimentos de duplicação: se seriam efetivamente novos investimentos ou investimentos contingentes não precificados à época da licitação. Isso é relevante pois tratar investimento contingente como se fosse um novo investimento ignora a escolha de política pública de implementar a infraestrutura no bojo do contrato, feita quando da licitação original. Adicionalmente, e de forma mais relevante para este artigo, a falta de reflexão adequada sobre a natureza do investimento trouxe para a discussão questões impertinentes ao caso, como a própria incidência dos limites à mutabilidade contratual previstos nos §§ 1º e 2º do art. 65 da Lei 8.666/93, como se vê da manifestação da Controladoria Geral da União:

O entendimento da CGU é de que o instrumento da licitação para a obra da NSS poderia ter sido utilizado, uma vez que os valores aportados pelo poder concedente ultrapassamos limites legais, previstos nos §§ 1º e 2º do art. 65 da Lei 8.666/93, e para isso seria imprescindível uma avaliação econômica entre as duas possibilidades (inserir no contrato de concessão ou licitar diretamente), (…).[23]

A rigor, essa discussão sequer deveria se colocar neste caso, mesmo porque à época da manifestação da CGU a Medida Provisória 752/16 já estava em vigor, afastando expressamente a regra do art. 65 dos contratos de parceria.[24]

A discussão é emblemática para pensarmos sobre por que faz sentido que certos (e talvez grande parte) dos investimentos contingentes não devam, de fato, ser precificados pelas proponentes no momento da licitação.

Assim como ocorre na maioria dos casos em que há investimentos contingentes não precificados na origem, para a construção da nova subida da serra em Petrópolis seria bastante difícil, e certamente muito impreciso, precificar obra de tamanha complexidade de engenharia e ambiental, cuja execução estava estimada para ocorrer anos após a celebração do contrato de concessão, quando as próprias tecnologias construtivas seriam certamente outras. Nesse contexto, que leva em consideração as dificuldades reais de execução do projeto, nada mais adequado, tanto do ponto de vista econômico quanto jurídico, deixar a precificação desses investimentos contingentes para o momento da sua efetiva implantação.

Nesse sentido, merecem destaque os contratos de concessão rodoviária estruturados pelo Estado de São Paulo em 2016 que, ao preverem a implantação do mecanismo de free flow[25] como um investimento contingente, deixaram claro que sua precificação se daria se e quando essa tecnologia se tornasse exigível para a concessionária.[26] Outro exemplo é a expansão da concessão metroviária do Estado do Rio de Janeiro, que previu que o prolongamento das linhas se daria quando houvesse interesse do Estado e disponibilidade de recursos para tanto.[27]

 Observa-se que essa opção de não precificar investimentos contingentes na origem é a que, a princípio, faz mais sentido da perspectiva econômica, na medida em que o concedente e, principalmente, os usuários apenas pagam pelo investimento se e quando ele se mostrar necessário, enquanto no caso dos investimentos contingentes precificados na origem, a concessionária precisa considerar na licitação a remuneração para amortização do futuro investimento, ainda que não se saiba quando ele vai ocorrer. Ou seja, da perspectiva econômica, o empreendimento é necessariamente mais caro por ter que considerar na partida investimentos que não se tem certeza quando ocorrerão. Além disso, usuários e concedente que não se beneficiam do investimento acabam pagando por ele quando, ao menos em tese, seria mais justo que isso não ocorresse. Por fim, evita o exercício, pelo concedente e concessionária, de difícil futurologia na orçamentação desses investimentos.

Contudo, quando a questão é analisada da perspectiva jurídica, verifica-se preferência pela modelagem que contemple na largada a precificação dos investimentos contingentes, ao invés de deixar a discussão sobre a remuneração desses investimentos para o procedimento de reequilíbrio, quando verificada a condição ensejadora do investimento contingente. Por quê?

Na prática, isso ocorre por duas razões centrais. A primeira é para evitar discussões sobre os limites à mutabilidade contratual para inclusão ulterior dos investimentos, que surgem no momento de reequilibrar o contrato. Conceitualmente, como já explicado, essa discussão é impertinente no caso dos investimentos contingentes, mas a análise da realidade demonstra que ela invariavelmente ocorre. A segunda razão é a dificuldade do Governo de precificação a posteriori dos investimentos, tanto pela complexidade metodológica (se há ou não plano de negócios, quais inputs de preço utilizar no fluxo de caixa marginal, etc.) quanto pelo constante receio de responsabilização pessoal dos agentes públicos perante os órgãos de controle.[28]

Não obstante essa realidade na qual investimentos contingentes são em regra precificados na origem, é importante frisar que não há qualquer óbice jurídico à precificação de investimentos contingentes durante a execução contratual, quando se verificarem necessários. Supor que isso implicaria algum tipo de violação às regras que regem as contratações públicas, como a exigência de prévia licitação, é ignorar a realidade complexa de estruturação e contratação de projetos de longo prazo. Aliás, não precificar investimentos contingentes na licitação preserva amplamente a isonomia entre participantes: todos sabem que terão que executar determinados investimentos no horizonte contratual e que essas obrigações serão precificadas de acordo com as condições econômicas e de mercado à época de sua implantação.

O principal problema que remanesce, para a concessionária, é a dificuldade de precificação em geral de investimentos pelo Poder Público que, ao referenciar custos com base em tabelas oficiais de preços, não avalia fielmente todos os riscos assumidos contratualmente pela concessionária. Na prática, esse risco corresponde a alguns pontos a mais na taxa de retorno calculada pela concessionária, já na expectativa que o governo não calculará adequadamente o valor do investimento.

1.3. Conceito de novos investimentos

Diante de todo o exposto, novos investimentos são aqueles não previstos – nem como necessários nem como contingentes – no contrato de parceria à época da licitação e que surgem de alguma necessidade pública superveniente, concreta e determinada.

Vale lembrar que a inserção de novos investimentos não deve ser encarada como circunstância de exceção e sim com naturalidade, em decorrência da inescapável incompletude dos contratos de longo prazo,[29] como em regra são os de parceria. Tanto é assim que a própria Lei Federal de Concessões (Lei 8.987/95) determinou como conteúdo dos contratos “os direitos e obrigações do poder concedente e da concessionária em relação a alterações e expansões a serem realizadas no futuro, para garantir a continuidade da prestação do serviço.[30] Aliás, como será explorado em outro momento, a modelagem contratual é excelente oportunidade para regrar e estabelecer os contornos para inclusão de novos investimentos em contratos de parceria.

Adiante, propõe-se uma sistemática para tratar das hipóteses de inclusão de novos investimentos nos contratos de parceria. A ideia é que a partir da compreensão do enquadramento jurídico seja possível definir mais objetivamente os limites à mutabilidade contratual em cada caso.

2. Proposta de três categorias para classificação de novos investimentos

A experiência prática no dia a dia do universo das parcerias evidenciou que são três as hipóteses mais comuns – e que abrangem senão todos a quase totalidade dos casos – de inclusão de novos investimentos em contratos de parcerias: (i) para atualização dos serviços, que requerem modernização; (ii) para execução de investimentos prementes, emergenciais ou necessários para prestação dos serviços; e (iii) para expansão da infraestrutura. Adiante, serão melhor detalhadas cada categoria.

2.1. Novos investimentos para atualização dos serviços

Novos investimentos para atualização dos serviços são aqueles que dão concretude ao comando legal (e muitas vezes contratual) de preservação da atualidade dos serviços concedidos. Geralmente, surgem em duas hipóteses: (i) ou são investimento que, a rigor, deveriam ter sido previstos inicialmente à época da licitação do projeto como investimentos contingentes e não o foram, sobretudo pela dificuldade que é modelar esse tipo de obrigação e precificá-la adequadamente ou (ii) são investimentos decorrentes de inovações tecnológicas, naturalmente imprevisíveis, mas necessárias para agregar confiabilidade na operação e conforto aos usuários na prestação dos serviços.[31]

         A primeira hipótese é bem ilustrada pelas concessões mais antigas, nas quais as obrigações de investimentos para modernização (de equipamentos, tecnológica e da própria infraestrutura) do empreendimento não constavam originalmente dos contratos. Isso é especialmente verdade no caso de projetos brownfield em que a concessionária assumiu com o objetivo originário de apenas operar a infraestrutura e, com o passar do tempo, se viu obrigado a realizar vultosos investimentos para manter a capacidade de atendimento da demanda dos usuários. Esse déficit na modelagem de projetos, particularmente no setor ferroviário, é marcante no brasil, sobretudo nas concessões realizadas na década de 90.

         Exemplos desse fenômeno são as concessões federais de ferrovias e as concessões metroviária e ferroviária de transporte de passageiros do Estado do Rio de Janeiro.[32] Licitados na década de 90, esses contratos não previam originalmente qualquer investimento por parte das concessionárias, como o aumento do número de trens ou mesmo a substituição do material rodante obsoleto, construção ou readequação de estações, obras de segregação da via para evitar conflitos urbanos, entre outros. Com o passar do tempo, ficou claro que seriam necessários novos investimentos para modernização – manutenção da atualidade dos serviços – como a aquisição de novos trens, a implantação de novos sistemas de sinalização e readequação de estações.

Ilustra o caso a renovação antecipada da Malha Paulista (ainda em negociação no momento de elaboração desse artigo) que prevê, dentre outros, a inclusão de novos investimentos na ferrovia como o “aumento do trem-tipo, dos atuais 80 vagões para 120 vagões (…) modernização da linha tronco (…) modernização dos trechos operacionais dos ramais existentes e a recuperação dos trechos não operacionais”,[33] que são típicos investimentos da categoria atualização dos serviços.

Interessante notar que novos investimentos para manutenção da atualidade dos serviços têm sido incluídos por meio de aditivos aos contratos de parceria, muitas vezes, sem essa alcunha, isto é, sem qualquer referência que sugira tratar-se de novos investimentos.[34] Dada a essencialidade e inerência desses investimentos ao empreendimento, esse fenômeno não causa estranheza. Porém, rigorosamente, está-se diante de novos investimentos e, portanto, de alteração contratual que, ao menos em tese, deveria ser objeto de reflexão acerca da sua pertinência e amplitude qualitativas (mas não quantitativa já que, conforme defendido acima, esses limites não deveriam ser aplicáveis aos contratos de parceria). Essa discussão será retomada no item 4.

Já como exemplo da hipótese de novos investimentos para atualização dos serviços que têm como escopo inclusão de inovações tecnológicas, vale mencionar o setor de telecomunicações, que sofreu (e vem sofrendo) profundas alterações em decorrências de novas tecnologias. As principais concessões no setor de telecomunicação – as de serviço telefônico fixo comutado – já perderam grande parte de sua relevância hoje. Outro exemplo são os investimentos para adaptação das praças de pedágio em rodovias concedidas aos mecanismos de pagamento da tarifa por meio de tags eletrônicos.

2.1.1. O problema das obrigações genéricas de manutenção da atualidade

Antes de avançar às demais categorias, porém, é preciso distinguir esses novos investimentos das obrigações genéricas de manutenção da atualidade dos serviços concedidos, conforme disposto no art.6º §2º da Lei 8.987/95,[35] sempre que não houver menção expressa à preservação do equilíbrio contratual.

É comum contratos preverem genericamente a obrigação das concessionárias de manterem a atualidade dos serviços, sem especificar, contudo, no que consiste essa exigência, nem preverem que essas obrigações devem ser objeto de revisão do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. Isso era recorrente nos contratos celebrados na década de 90[36] mas até os contratos mais modernos ainda insistem numa linguagem abstrata, que não traduz obrigações claras para a concessionária. A título ilustrativo veja-se a redação utilizada no contrato de concessão das rodovias do Centro Oeste Paulista:[37]

“15.1 A CONCESSIONÁRIA deverá observar a atualidade na execução das obras e serviços objeto deste CONTRATO, caracterizada pela modernidade dos equipamentos, das instalações e das técnicas da prestação dos serviços de operação e manutenção do SISTEMA RODOVIÁRIO, com a absorção dos avanços tecnológicos advindos ao longo do PRAZO DA CONCESSÃO, inclusive no que se refere à sustentabilidade ambiental, que agreguem valor e representem benefícios e qualidade aos serviços concedidos, elevando o nível dos serviços oferecidos aos USUÁRIOS.”

O que significa “modernidade dos equipamentos das instalações e das técnicas da prestação dos serviços”? Será que se optou por essa linguagem de forma deliberada, para compreender na cláusula toda e qualquer novidade que o concedente queira incluir na concessão, sem que a concessionária tenha direto de pleitear o reequilíbrio contratual? Independentemente das motivações subjacentes, cláusulas com esse tipo de linguagem esclarecem nada ou muito pouco acerca das reais obrigações da concessionária relativas à manutenção da atualidade dos serviços. Pior, tem o condão de gerar incentivos perversos e atrair licitantes que vislumbrem nessa linguagem fluida espaço para questionar obrigações.

Curioso observar que o mesmo contrato prevê, na sequência, que na “verificação da atualidade dos serviços prestados, a ARTESP levará em consideração o atendimento satisfatório pela CONCESSIONÁRIA dos INDICADORES DE DESEMPENHO estabelecidos pelo ANEXO III e suas eventuais revisões.[38] Parece, então, que as obrigações de manutenção da atualidade cingem-se à observância dos indicadores de desempenho contratual que, por já serem obrigação da concessionária, a rigor, em nada acrescentam aos encargos contratuais. Seria um tipo de retórica contratual?

Exigir a ‘manutenção da atualidade’ sem determinar de que forma e mediante execução específica de quais obrigações ou atingimento de quais parâmetros específicos de desempenho, e sem prever que essas obrigações serão objeto de recomposição do equilíbrio contratual, tem, na prática, o efeito de atribuir o conteúdo dessa obrigação ao total arbítrio do concedente, o que faz da cláusula nula.[39] Nesses termos genéricos e que não asseguram à concessionária o equilíbrio da equação econômico-financeira do contrato, a cláusula é puramente potestativa e, portanto, a obrigação não é oponível à concessionária.[40]

Por outro lado, quando o contrato de parceria deixar claro em que consiste a obrigação de manter a atualidade dos serviços, conferindo diretrizes e especificações que permitam aos licitantes dimensionar as obrigações, então estar-se-á diante de investimentos contingentes para manutenção da atualidade dos serviços (que podem ter sido precificados na origem ou não).

Também investimentos contingentes para expansão da infraestrutura (conforme descritos no item 2.1) podem se enquadrar como investimentos para ‘manutenção da atualidade’,[41] porém, na visão deste trabalho, se o novo investimento decorre da necessidade de manutenção da atualidade dos serviços, deve ser enquadrado nessa categoria e não como expansão de infraestrutura propriamente dita.

Por fim, apenas na ausência de previsão contratual ou na presença de previsão genérica e inespecífica, as exigências de manutenção da atualidade dos serviços serão, rigorosamente, novos investimentos.

2.2. Novos investimentos prementes

A segunda categoria contempla os novos investimentos prementes ou emergenciais, necessários para prestação dos serviços. Essa categoria é provavelmente a mais abrangente das três, uma vez que contempla desde novos investimentos verdadeiramente urgentes até investimentos que são prementes porque essenciais à prestação contratual, mas que não foram incluídos no escopo original do contrato.

Como exemplo de novo investimento emergencial, vale mencionar o caso da PPP de Ampliação do Sistema Produtor Rio Manso, responsável pelo abastecimento de água da Região Metropolitana de Belo Horizonte, em Minas Gerais.[42] Em 2015, no auge da crise hídrica[43] e diante do risco de desabastecimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte, concedente e concessionária celebraram aditivo ao contrato de PPP para construção de nova adutora para captação de água no Rio Paraopeba, como alternativa hídrica.[44]

Já como exemplo de novo investimento premente por escopo não previsto originalmente no contrato, cita-se a PPP para construção e operação do Centro Administrativo do Distrito Federal, destinada a abrigar cerca de quinze mil servidores dos órgãos centrais da Administração Direta, Fundacional, de Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista do Governo do Distrito Federal.[45] O projeto, à época de sua licitação, não contemplou no escopo da concessionária a aquisição e instalação de mobiliário, o que seria, naturalmente, essencial para fruição do espaço pelos servidores. Como consequência, quando o empreendimento foi concluído, não pode ser ocupado, especialmente pela ausência desse mobiliário para receber os servidores que se instalariam nos imóveis da PPP. [46] Cogitou-se então incluir tais mobiliários como novos investimentos, o que acabou não se concretizando.

         A situação de urgência, nesses casos, manifesta-se pelos riscos ao Poder Público e usuário inerentes à demora na realização desses novos investimentos via nova licitação (quando viável tecnicamente). Isto é, há circunstâncias nas quais “time is of the essence” e a não execução daquele investimento em determinado prazo pode gerar desde consequências desastrosas à população – como a supressão do abastecimento de água no exemplo da nova adutora mencionado acima – quanto um custo irracional e desnecessário ao Poder Público – como no caso do centro administrativo, hipótese em que a não ocupação do local pelo concedente significaria continuado dispêndio com alugueis para manutenção de seus servidores em outros imóveis até que nova licitação para aquisição de mobiliário fosse realizada.

Reconhece-se, não obstante, que o conceito de emergencial tem carga subjetiva, pois leva em conta questões fáticas e circunstanciais que dificultam a conceituação de caráter geral. Especialmente, é preciso distinguir emergências em que não é possível responsabilizar alguém, das ‘emergências criadas’, nas quais é possível identificar a conduta, geralmente omissiva, de algum agente por trás da criação da emergência. Nesse último caso, a narrativa emergencial para inclusão de novos investimentos não deve ser usada para viabilizar alteração contratual que seria ilegítima.

2.3. Novos investimentos para expansão de infraestrutura

Por fim, a última categoria engloba os novos investimentos para expansão da infraestrutura de parcerias. Em reforço: é preciso não confundir essa categoria com as expansões já previstas em contrato enquanto investimentos contingentes, conforme discutido no item 2.1.

Novos investimentos para expansão de infraestrutura surgem, mais comumente, (i) em circunstâncias nas quais concedente e/ou concessionária avaliam que o empreendimento é exitoso, tanto da perspectiva do interesse público/usuário quanto do privado, e merece considerações quanto à sua expansão, que pode ocorrer no bojo do contrato já existente ou no contexto de nova licitação e (ii) para o atendimento de demandas específicas da sociedade afetada por determinado empreendimento como, por exemplo, a construção de novas alças de acesso ou passarelas no âmbito de concessões rodoviárias ou a extensão de linha férrea para atender certa localidade em concessões ferroviárias.

Talvez os melhores exemplos do primeiro caso sejam as parcerias público-privadas (PPP) no setor social, como educação, habitação e saúde. É notório como essas concessões administrativas revolucionaram a prestação de serviços sensíveis à população que são historicamente prejudicados pela ineficiência do setor público.

Para exemplificar, vale citar a PPP de Escolas do Município de Belo Horizonte/MG, que foi celebrada em 2012 e teve como escopo originário a construção e administração (manutenção das instalações elétricas e hidráulicas, segurança, limpeza, sustentabilidade ambiental e compra de mobiliário) de 37 unidades escolares ao longo de 20 anos. Posteriormente, em 2014, o contrato de PPP foi alterado para inclusão de 14 novas unidades.[47] Estudo que avaliou o impacto do projeto constatou que:

“Foi observado que a PPP possibilitou a construção de UMEIs em menos tempo e com um menor risco de atraso. De fato, o tempo médio de construção das unidades na PPP foi quase a metade do realizado por obra pública e enquanto 79% das unidades tradicionais foram entregues fora do prazo contratado de 13 meses, nenhuma unidade de PPP foi entregue acima deste prazo. Além disso, a PPP permitiu superar as limitações existentes no modelo tradicional, conseguindo aumentar a escala do programa de expansão da rede de educação infantil. Foi possível observar na PPP uma capacidade de entrega de UMEIs por ano superior ao que vinha sido obtido historicamente com o modelo tradicional.” (…) “Em relação ao impacto na operação das UMEIs, a pesquisa mostrou que na PPP os diretores têm mais tempo para focar nas atividades pedagógicas, pois gastam menos tempo na gestão dos serviços não pedagógicos. Adicionalmente, foi observada uma melhora expressiva nos serviços de manutenção das instalações físicas, tanto em termos de rapidez no atendimento como na qualidade final dos reparos. Resultado positivo foi encontrado também em relação à qualidade e disponibilidade de materiais de higiene, limpeza, lavanderia e rouparia fornecidos à escolar.”(…) a utilização de PPP gerou maior eficiência e escala na construção das UMEIs e, de forma geral, maior qualidade na sua operação.[48]

Ainda, novos investimentos para expansão da infraestrutura de concessões são comuns para atender demandas específicas de grupos sociais ou comunidades diretamente afetadas pelo empreendimento. Isso é especialmente recorrente no setor de transportes, a exemplo da inclusão de novo trecho rodoviário em concessão existente.[49] Particularmente no caso das concessões rodoviárias, as demandas por intervenções que se caracterizam como novos investimentos é tamanha que o Estado de São Paulo desenvolveu, para as concessões licitadas a partir de 2016, o ‘SISDEMANDA’, uma ferramenta específica “para recebimento, processamento e priorização técnica de demandas, investimentos e melhorias propostas por cidadãos, entidades privadas e integrantes da ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, tornando-se canal exclusivo e apropriado para gerenciamento de tais demandas, não devendo ser confundindo com sistema de Ouvidoria ou Atendimento aos USUÁRIOS.[50]

Vale mencionar também, como exemplo de novos investimentos para expansão da infraestrutura de parcerias, as ampliações de ramais no âmbito das prorrogações antecipadas de ferrovias, regradas pela Lei Federal 13.448/2017.[51] Em agosto de 2018 a ANTT aprovou os estudos técnicos e documentos jurídicos da proposta de prorrogação antecipada do prazo de vigência do Contrato de Concessão Ferroviária da Malha Paulista,[52] que preveem a expansão da malha com duplicações e semi-duplicações.[53] No mesmo sentido, é público o pedido da concessionária Rumo Logística para ampliar a extensão da concessão da Malha Norte, o que representaria rigorosamente um novo investimento para expansão de infraestrutura.[54]

3.  Os limites qualitativos à mutabilidade dos contratos de parceria para inclusão de novos investimentos

No contexto de consolidação do entendimento acerca da inaplicabilidade dos limites quantitativos para a mutabilidade de contratos de parceria, com o advento do art. 22 da Lei 13.448/17, é da perspectiva dessas três categorias – (i) novos investimentos para atualização dos serviços, (ii) novos investimentos prementes e (iii) novos investimentos para expansão de infraestrutura – que faz sentido avaliar os contornos e parâmetros dos limites qualitativos para inclusão de novos investimentos em concessões e PPPs.

Adiante, as categorias (i) e (ii) serão tratadas conjuntamente e a (iii) de forma separada.

3.1. Novos investimentos para manutenção da atualidade dos serviços e investimentos urgentes

         Essas categorias de novos investimentos devem ser confrontadas com os requisitos de legitimação da alteração contratual brevemente mencionados na introdução desse artigo: (i) necessidade, para o atingimento da finalidade – o interesse público – que motivou a contratação; (ii) vinculação ao objeto contratual; e (iii) preservação do equilíbrio contratual dos direitos do contratado. Como esse último requisito apenas pode ser avaliado diante das circunstâncias específicas do caso concreto, ele não será considerado nas reflexões adiante, embora seja pressuposto de legitimidade da alteração contratual nas parcerias.

         No caso dos investimentos para atualização dos serviços, como visto acima, são obrigações inerentes ao escopo contratual que, geralmente, ou deveriam ter sido previstos inicialmente à época da licitação do projeto como investimentos contingentes e não o foram ou são investimentos decorrentes de inovações tecnológicas, naturalmente imprevisíveis, mas necessários para agregar confiabilidade na operação e conforto aos usuários na prestação dos serviços.

         Justamente por essas características, exceto em casos excepcionais,[55] os novos investimentos para atualização dos serviços são, por sua própria natureza, necessários à prestação dos serviços, isto é, essenciais para alcançar o interesse púbico subjacente. Pode haver discussão técnica, inclusive da perspectiva de impactos fiscais para o ente concedente,[56] quanto ao melhor momento para inclusão desses novos investimentos e essa será inescapavelmente uma análise casuística. Contudo, não há dúvida sobre a aderência dessa espécie de novo investimento ao requisito da necessidade. De modo até mais intuitivo, é claro que os novos investimentos para manutenção da atualidade dos serviços estão vinculados ao objeto contratual, posto que não inovam quanto ao escopo das atividades que deles se beneficiarão. Assim, também está atendido, nesse caso, o requisito da vinculação.

         De forma semelhante, os novos investimentos para enfrentamento de situações prementes, exceto nos casos em que a premência se deu de forma deliberada pela atuação desidiosa ou mesmo dolosa de agentes envolvidos, também, pela sua natureza, já se subsume ao pressuposto de necessidade e, nesse caso, até de forma mais evidente que na hipótese dos investimentos para atualização dos serviços, dado que a necessidade é a própria motivação do novo investimento e sem ele o interesse público subjacente à contratação estaria de todo comprometido. A ideia de premência aqui está intimamente conectada à noção de continuidade do serviço público.

Já em relação ao requisito de vinculação, aqui ele se verifica como pressuposto lógico do requisito de necessidade, na medida em que a necessidade só será atendida de houver plena vinculação do novo investimento ao objeto original do contrato. Ainda que o investimento seja em nova infraestrutura (como, por exemplo, o caso da construção da nova adutora mencionado acima), ou seja, não adjacente ao projeto original,  se ele for necessário para enfrentar a situação de urgência, estará atendido o requisito de vinculação.

         Em resumo, propõe-se que a inclusão de novos investimentos em contratos de parceria que se enquadrem nas categorias de atualização dos serviços e atendimento de questões prementes estão sujeitos à avaliação de mera conformidade, isto é, a um juízo simplificado de viabilidade jurídica, pela própria natureza desses novos investimentos. Esse juízo simplificado significa que, desde que esses novos investimentos sejam destinados efetivamente para manutenção da atualidade dos serviços ou para enfrentar situações urgentes, o próprio enquadramento nessas categorias já seria o crivo jurídico de pertinência qualitativa desses novos investimentos aos contratos em curso.

         Isso não significa dizer que inexistem limites à mutabilidade contratual, em abstrato, nesses casos; mas sim que a própria natureza desses novos investimentos legitima a inclusão dessas obrigações nos contratos de parceria, pois pressupõe a subsunção aos requisitos de necessidade (para atingimento da finalidade que motivou a contratação) e vinculação (à natureza do objeto contratual e ao instrumento convocatório). No caso dos novos investimentos para atualização dos serviços pode-se ainda dizer que eles já integram o próprio objeto do contrato de parceria. A reflexão necessária, nessas hipóteses de inclusão de novos investimentos em parcerias, é tão somente de compatibilidade técnica e suficiência.

3.1.1. Análise de compatibilidade técnica e suficiência

         A análise de compatibilidade técnica e suficiência é uma avaliação tanto da perspectiva do poder concedente quanto da concessionária.

Da ótica da concessionária, a análise de compatibilidade técnica deve identificar e definir de que forma – com quais equipamentos, abordagens, intervenções, soluções de engenharia, etc. – o objetivo perseguido com a inclusão de novos investimentos para atualização dos serviços ou atendimento de questões prementes é alcançado.

Por exemplo, no caso de atualização dos serviços de transporte metroviário em que se verifica a necessidade de substituição de material rodante obsoleto por novos equipamentos. Há no mercado, dependendo da tecnologia em questão, um conjunto de alternativas mais caras ou mais baratas, de qualidade geral superior ou inferior, para opção. De modo similar, é necessário um crivo sobre a suficiência desses novos investimentos, no caso, exemplificada pelo número de trens necessários ao transporte da demanda do modal. A princípio e salvo circunstâncias específicas (como novos investimentos em fim de contrato), faz sentido que as escolhas sobre compatibilidade técnica e suficiência sejam fruto de consenso entre as partes[57] e que seja considerado, na decisão, o fato de que a concessionária será responsável pela manutenção e operação desses novos equipamentos.

Muito embora a avaliação de compatibilidade técnica e suficiência, em regra e na prática, seja feita posteriormente à decisão de inclusão do novo investimento, ela é importante para legitimar a alteração contratual da perspectiva dos limites qualitativos à mutabilidade dos contratos de parceria. Isto é, apenas serão legítimas as alterações contratuais para inclusão de novos investimentos visando à manutenção da atualidade dos serviços e o enfrentamento de situações prementes se tais investimentos forem adequados tecnicamente e suficientes para atender às necessidades do empreendimento. Isso busca proteger o empreendimento de acréscimos voluptuosos desnecessários ao atingimento da finalidade perseguida, tanto por parte do concedente quanto da concessionária.

Além disso, da perspectiva da concessionária, a análise de compatibilidade técnica e suficiência confunde-se com o requisito de legitimidade da alteração contratual associado à preservação do equilíbrio econômico-financeiro da parceria. Isso não significa apenas que o contrato deve ser reequilibrado; mas que ele deve ser reequilibrado tanto financeira quanto economicamente, sob pena de se promover um reequilíbrio incompleto.[58] No caso de reequilíbrio incompleto, defende-se que a concessionária poderia, inclusive, recusar a alteração contratual para inclusão do novo investimento.[59]

Daí porque faz sentido, de acordo com as melhores práticas, exigir contratualmente um procedimento prévio de avaliação do novo investimento com o objetivo de permitir que as partes avaliem tanto das suas respectivas perspectivas quanto da ótica do próprio empreendimento se o novo investimento é compatível tecnicamente e suficiente, ou não – e o que seria preciso fazer para tanto.

Por fim, da ótica do poder concedente, a análise de compatibilidade técnica e suficiência volta-se sobretudo às preocupações de política pública associadas à modicidade tarifária (nos casos em que há remuneração por tarifa) e questões de ordem fiscal, quando a viabilidade do empreendimento (ou especificamente do novo investimento) depende do dispêndio de recursos públicos. Neste último caso, é fundamental que o concedente avalie o comprometimento fiscal que o novo investimento lhe acarretará, de modo que a legitimidade do novo investimento dependerá da aderência às regras de responsabilidade fiscal por parte do concedente e de mecanismos que assegurem o fiel cumprimento das obrigações por ele assumidas.

3.2. Novos investimentos para expansão de infraestrutura

         A discussão é mais complexa quando a inclusão de novos investimentos decorre de hipótese prevista na categoria expansão de infraestrutura. Nesse caso e diferentemente das outras duas categorias, não há na largada subsunção aos pressupostos de necessidade e vinculação. E, não atendidos esses requisitos, não seria lícita a inclusão do novo investimento.[60] É preciso que a análise casuística, a partir de determinados critérios, indique a pertinência ou não da inclusão de determinado novo investimento em concessão visando à expansão de infraestrutura. Não obstante, importante lembrar que a própria Lei Federal 8.987/95 prevê a possibilidade de “expansão do serviço”.[61]

         É necessário responder a perguntas como: (i) é viável tecnicamente haver dois operadores da mesma infraestrutura? Por exemplo, no caso de novos investimentos para expansão de infraestrutura metroviária[62] ou para ampliação de rodovias; (ii) qual a relação de custo-benefício de executar determinada expansão de infraestrutura em novo contrato? Quais os custos adicionais – as perdas de escala e escopo – de haver dois operadores de uma mesma infraestrutura (por exemplo, construção e operação de dois centros de operação e controle, disponibilização de duas equipes para manutenção, dois times executivos, etc.)?[63] Quais os ganhos (por exemplo, melhores serviços aos usuários ou utilização de melhores tecnologias indisponíveis no passado)? (iii) Qual é o cronograma para execução desses novos investimentos dentro ou fora da concessão existente? Ele é compatível para atendimento das demandas públicas subjacentes?[64]

         Propositalmente, essas são questões que não abordam diretamente discussões jurídicas como seria, por exemplo, uma pergunta sobre a compatibilidade ou não de determinado novo investimento com o edital de licitação originário do projeto. Isso porque os crivos jurídicos, especialmente os pressupostos de necessidade e vinculação, serão respondidos a partir (ou seja, após) a discussão sobre as questões postas acima. Supor haver discussão jurídica independente das questões fáticas e técnicas relativas ao projeto específico é isolar o debate jurídico da realidade.

         Para exemplificar, pensemos num caso hipotético de novos investimentos para expansão de concessão ferroviária. De um lado, há consenso quanto à necessidade de ampliação daquele determinado trecho que, suponhamos, vá conectar a concessão hipotética com outra malha ferroviária de relevância nacional e equacionar problema logístico relevante para o País no curto/médio prazo.[65] De outro, é preciso avaliar o que vale mais a pena: fazer esses investimentos no bojo da concessão existente ou no âmbito de novo contrato; isto é, em que medida a expansão da ferrovia na própria concessão atende aos requisitos de necessidade e vinculação? Para tanto, seria necessário responder às perguntas elencadas acima que dependem, naturalmente, das particularidades do caso específico. Contudo, não obstante o caráter casuístico do juízo de necessidade, é possível ilustrar com alguns exemplos como essa verificação se faria em situações hipotéticas.

No caso das concessões comuns, por exemplo, faz sentido considerar uma análise de viabilidade econômico-financeira do novo investimento enquanto empreendimento autônomo, já que o projeto não conta com recursos adicionais do Poder Público, ou seja, a concessionária é remunerado apenas pela receita tarifária. Isso significa elaborar um fluxo de caixa do projeto e avaliar se o valor presente líquido (VPL) desse fluxo é positivo ou negativo, considerando uma taxa de desconto que reflita os riscos do empreendimento. Sendo o VPL positivo, então o novo investimento tem viabilidade isoladamente e poderia, ao menos em tese e exclusivamente da perspectiva econômico-financeira, manter-se como uma concessão autônoma. Contudo, sendo o VPL negativo, então o novo investimento não teria viabilidade econômico-financeira isoladamente o que, por si só, já seria indicativo da inviabilidade de concessão comum autônoma do trecho.[66],[67] Juridicamente, esse cenário corresponde à inviabilidade de competição, a justificar a inexigibilidade de licitação, nos termos do art. 25 da Lei 8.666/93.[68] Nesse último caso, faria mais sentido, portanto, incluir o novo trecho no contrato de concessão original.[69]

Não se ignora que a confecção de fluxo de caixa descontado está longe de ser um trabalho de ciência exata, o que significa que a depender dos inputs do fluxo, inclusive da taxa de desconto utilizada, resultados os mais díspares podem surgir. Mesmo que haja plano de negócios para efeito regulatório do empreendimento original, é possível que os novos investimentos sejam reequilibrados por fluxo de caixa marginal. Aqui há discussão interessante: se o projeto originariamente era brownfield, a taxa de desconto considerava o risco de expansão e não necessariamente de novas implantações (greenfield). Nesse contexto, é razoável supor que a taxa de desconto do fluxo do projeto original não seja suficiente para remunerar o risco de nova implantação. Todos esses elementos precisam ser levados em conta pelo governo na confecção desses estudos.

Já o requisito de vinculação se manifesta, a partir das respostas às perguntas mencionadas acima, na identificação de elementos que evidenciem a compatibilidade operacional do novo investimento em expansão da infraestrutura. Aliás, se o novo investimento, mesmo que viável economicamente, não for viável de forma autônoma da perspectiva operacional, então estará legitimada a alteração contratual para inclusão do novo investimento.

Imagine-se os desafios operacionais, por exemplo, de uma concessionária responsável pela operação e manutenção de rodovia cujos investimentos para duplicação são licitados separadamente. Os problemas de interface e de disputa sobre quem é responsável por determinada atividade ou evento seriam bastante significativos e potencialmente inviabilizadores, na prática, da expansão como empreendimento autônomo.[70]

Ainda no requisito de vinculação, é importante avaliar a compatibilidade espacial do novo investimento em expansão de infraestrutura, a partir da identificação da área geográfica de interferência do empreendimento original. Por exemplo, faz sentido que as expansões rodoviárias e ferroviárias sejam em trechos contíguos às parcerias originais.

A inclusão de novos investimentos para expansão de infraestrutura deve também submeter-se à análise de compatibilidade técnica e suficiência descrita no item 4.1.1, especialmente no tocante à inserção de novas obras nas parcerias. Nesse contexto, destaca-se a farta discussão no TCU sobre a precificação de novos investimentos na forma de obras, na qual o tribunal critica a suposta falta de desconto nos valores dessas obras em relação ao preço teto definido pelos sistemas de preços públicos, quando calculado o reequilíbrio contratual para inclusão de novas obras.[71]

Por último, é preciso enfrentar o disposto no art. 175 da Constituição Federal que determina ao Poder Público a realização de licitação para delegar a prestação de serviços públicos por meio de concessão ou permissão. [72]

Na linha do raciocínio desenvolvido até aqui, não cabe discutir a incidência do artigo 175 da Constituição Federal para os casos de novos investimentos que se enquadrem nas categorias de manutenção da atualidade dos serviços e de investimentos prementes, posto serem investimentos inerentes à consecução do contrato de parceria originário, intrínsecos ao próprio projeto. Eventual dúvida se coloca quando se está diante dos novos investimentos para expansão de infraestrutura, que pressupõem análise sobre em que medida seria viável e faria sentido licitar esses investimentos separadamente.

Nesse caso, defende-se que se atendidos os requisitos de necessidade e vinculação, na linha das reflexões feitas acima, a análise da exigência de prévia licitação se torna desnecessária porque, ao se responder às questões sobre necessidade e vinculação, estar-se-á, na prática, afastando a possibilidade de prévia licitação. Isto é, o novo investimento estará caracterizado como inerente à parceria originária e não como nova delegação, de que trata o art. 175. Não sendo nova delegação, não é o caso de incidência da exigência de prévia licitação.

4. Conclusões

O presente artigo discutiu os contornos do conceito de novos investimentos, os limites à mutabilidade dos contratos de parceria para inclusão de novos investimentos no curso da execução contratual e propôs uma sistemática para que tais limites sejam analisados à luz da finalidade desses novos investimentos, classificada em três categorias.

Para novos investimentos em atualização dos serviços ou com o objetivo de atender situações emergenciais, conforme explicado, concluiu-se não haver, da perspectiva jurídica, limites nem quantitativos nem qualitativos à mutabilidade contratual. Nesses casos, a análise de pertinência para inclusão dos novos investimentos deve ser tão somente de compatibilidade técnica e suficiência, posto que a própria natureza desses novos investimentos já pressupõe subsunção aos requisitos de necessidade e vinculação.

Em relação aos novos investimentos para expansão de infraestrutura, é necessária a análise de determinados critérios no caso concreto, detalhados acima, a fim de averiguar, então, o atendimento aos requisitos de necessidade e vinculação que delimitam juridicamente a alteração contratual nesse caso. Presentes esses requisitos, fica afastada a exigência de prévia licitação constante do art. 175 da Constituição Federal.

Evidentemente, essa reflexão teórica precisa ser alinhada a eventuais disposições contratuais que regulem o tema da inclusão de novos investimentos. Se o próprio contrato dispõe acerca de determinados limites, quantitativos e/ou qualitativos, eles devem ser observados, ainda que as regras contratuais guardem pouca relação com a lógica proposta neste trabalho.[73]

Não obstante, o ideal é que a modelagem contratual convirja para refletir a sistemática proposta para definição dos limites à mutabilidade contratual, de modo que teoria e prática se alinhem na condução de tema sensível à execução dos contratos de parceria.

Referências bibliográficas

BARROSO, Luís Roberto. Alteração dos contratos de concessão rodoviária. In: Brasil-Argentina: estudos em homenagem a Agustín Gordillo. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

BAUMOL,William J., PANZAR, John C., WILLIG, Robert D. Contestable markets and the theory of industry structure, Harcourt Brace Jovanovich, 1982.

CAMINHA, Uinie; LIMA, Juliana Cardoso. Contrato Incompleto: uma perspectiva entre direito e economia para contratos de longo termo. REVISTA DIREITO GV, São Paulo, 2014.

ENGLER PINTO, Gabriela Miniussi. A revolução silenciosa: o fim dos limites à mutabilidade dos contratos de concessão. Revista Colunistas – Direito do Estado, Rio de Janeiro, RJ, 28 jul. 2017.

GARCIA, Flávio Amaral. Mutabilidade nos contratos concessionais: aspectos endocontratuais e procedimentais. In O Direito Administrativo na Atualidade: estudos em homenagem ao centenário de Hely Lopes Meirelles (1917-2017) defensor do Estado de Direito. Malheiros, 2017.

HART, Oliver. Incomplete Contracts and Public Ownership: remarks, and an application to public-private partnerships. 2003. The Economic Journal, Vol. 113, No. 486, Conference Papers (Mar., 2003), pp. C69-C76;

JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público, 2003, p. 306.

MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O Contrato Administrativo, 2002.

MOREIRA, Egon Bockmann. Direito das concessões de serviço público. São Paulo: Malheiro, 2010;

NÓBREGA, Marcos. Contratos incompletos e infraestrutura: contratos administrativos, concessões de serviço público e PPPs. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, Belo Horizonte, ano 7, n. 25, abr./jun 2009.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 2011.

 PINTO, Gabriela Miniussi; RIBEIRO, Maurício Portugal. Pode o concessionário se opor à imposição de novos investimentos em contratos de concessão e PPP? Em quais circunstâncias? Artigo, 2017.

RIBEIRO, Maurício Portugal; Reequilíbrios incompletos de contratos de concessão e PPP: reequilíbrio econômico (que não caracteriza reequilíbrio financeiro) e reequilíbrio financeiro (que não caracteriza reequilíbrio econômico). Artigo, novembro, 2015.

RIBEIRO, Maurício Portugal; PRADO, Lucas Navarro. Alteração de Contratos de Concessão e PPP por Interesse da Administração Pública – Problemas Econômicos, Limites Teóricos e Dificuldades Reais. Revista de Contratos Públicos – RCP. Belo Horizonte, ano 2, n. 2, set. 2012/ fev. 2013.

RIBEIRO, Maurício Portugal. Concessões PPPs: melhores práticas em licitações e contratos. Atlas, 2011.

RODRIGUES, Bruno da Costa Lucas. Avaliação do impacto da utilização de parceria público-privada para a construção e operação de unidades municipais de educação infantil em Belo Horizonte. Dissertação (mestrado) – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa, 2015.

SILVAM José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição, 8ª ed., São Paulo, Malheiros, 2012.

SUNDFELD, C. A; CÂMARA, J. A; SOUZA, R. P. Concessão de serviço público: limites, condições e consequências da ampliação dos encargos da concessionária. In: OLIVEIRA, Farlei Maritns Riccio (coord.). Direito Administrativo Brasil-Argentina: estudos em homenagem a Agustín Gordilho. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

SUNFELD, Carlos Ari; Guilherme Jardim Jurksaitis (orgs.). Contratos públicos e direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2015.

SUNDFELD, Carlos Ari. Pareceres: direito administrativo contratual, Vol. II. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

Notas de Rodapé:

[1] O presente artigo apresenta as ideias seminais da dissertação a ser apresentada para o Mestrado Profissional em Direito Público da GV Direito São Paulo.

[2] Mestranda em Direito Público na FGV Direito São Paulo, Master of Laws (LL.M) pela Universidade de Columbia (Kent Scholar) e graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. É sócia da Portugal Ribeiro Advogados, com atuação especializada na modelagem e regulação de projetos de infraestrutura, com ênfase em concessões e PPPs. A autora gostaria de agradecer a Mauricio Ribeiro e Thiago Araújo pelas valiosas contribuições ao texto.

[3] O conceito de contrato de parceria utilizado neste artigo foi extraído do artigo Art. 1º, § 2º da Lei 13.334/16. Ressalta-se, contudo, que as reflexões desenvolvidas no presente estudo não se limitam aos empreendimentos desenvolvidos no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos – PPI.

[4] Segundo o qual “As alterações dos contratos de parceria decorrentes da modernização, da adequação, do aprimoramento ou da ampliação dos serviços não estão condicionadas aos limites fixados nos §§ 1o e 2o do art. 65 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993”, que, por sua vez, dispõem que: “§ 1o O contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50% (cinqüenta por cento) para os seus acréscimos. § 2o Nenhum acréscimo ou supressão poderá exceder os limites estabelecidos no parágrafo anterior, salvo: I – (VETADO); II – as supressões resultantes de acordo celebrado entre os contratantes.”

[5] Nesse sentido foi o parecer do Relator Deputado Sérgio Souza pela aprovação da Medida Provisória 752/16, que originou a Lei 13.448/17: “Note-se que estamos lidando com contratos de prazo bastante longo, contados por décadas. É evidente que o contexto econômico no qual tais contratos se inserem tende a mudar dramaticamente neste período e com ele as necessidades de ajustes nos contratos, notadamente novos investimentos. Desta forma, é temerário qualquer entendimento pela aplicabilidade do disposto no § 1º do art. 65 da Lei de Licitações (Lei 8.666/93) aos contratos de parceria, limitando os acréscimos e supressões a 25% do contrato. Seria como obrigar o gestor a um exercício irreal de futurologia, que projetará previsões perfeitas pelo longo prazo da concessão, com estreitíssima margem de ajustes. O órgão regulador certamente será obrigado a renegociações para além desses parâmetros em um prazo mais longo (para baixo ou para cima a depender da trajetória da economia), com o intuito de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. A natureza do contrato de concessão de infraestrutura, com custos afundados expressivos de longo prazo é completamente distinta dos contratos administrativos mais frequentes, de compras e obras públicas de menor porte, e requer uma flexibilidade bem mais significativa. Sendo assim, definimos, no art. 22, que os contratos de parceria poderão ser alterados, mediante acordo celebrado entre Administração Pública e contratantes, quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa ou qualitativa de seu objeto.”

[6]Em relação às PPPs, é razoável defender que não incide o aludido art. 65, na medida em que a Lei de PPP tratou de indicar, expressamente, os dispositivos da Lei Federal nº 8.666/93 que se aplicam aos contratos de PPP, quais sejam: (i) regras sobre limites para exigência de garantias dos licitantes/parceiros privados; e (ii) regras sobre procedimento para contratação, i.e., regras de procedimento licitatório. Como o art. 65 não estabelece regra procedimental, mas regra sobre o regime jurídico do contrato, parece-nos claro que não deveria se aplicar aos contratos de PPP.” Em RIBEIRO, Maurício Portugal; PRADO, Lucas Navarro. Alteração de Contratos de Concessão e PPP por Interesse da Administração Pública – Problemas Econômicos, Limites Teóricos e Dificuldades Reais. Revista de Contratos Públicos – RCP. Belo Horizonte, ano 2, n. 2, set. 2012/ fev. 2013. No mesmo sentido ver MOREIRA, Egon Bockmann. Direito das concessões de serviço público. São Paulo: Malheiro, 2010; SUNDFELD, Carlos Ari. Pareceres: direito administrativo contratual, Vol. II. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013; BARROSO, Luís Roberto. Alteração dos contratos de concessão rodoviária. In: Brasil-Argentina: estudos em homenagem a Agustín Gordillo. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

[7] Para ilustrar, veja-se o posicionamento de Luís Roberto Barroso: “Assim, no âmbito dos contratos de concessão, é possível afirmar que (…) [N]o caso das alterações quantitativas, além dessas exigências, aplica-se, como diretriz geral, o respeito aos percentuais previstos pela Lei nº 8.666/93, art. 65, ainda que esses limites possam ser superados se, no caso concreto, demonstrar-se a necessidade da alteração por conveniência do interesse público, bem como sua compatibilidade com os princípios constitucionais, sobretudo os da igualdade e da impessoalidade.” Concessão Rodoviária. Alterações no objeto do contrato: acréscimos de obras novas a pedido do Poder Público. Reestabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, possibilidade e limites. Parecer, abril de 2008.

[8] Por exemplo, quando a avaliação do limite da alteração ignora modificações anteriores para efeito de cálculo. Além disso, no contexto dos contratos de parceria, o “valor do contrato” enquanto referência adotada pelo § 1o art. 65 da Lei 8.666/93 é métrica aleatória, que pode tomar por base diferentes parâmetros, como valor dos investimentos, valor das receitas projetadas (a valores constantes ou a valor presente, estipulada determinada taxa), entre outros. Com tantas opções, há ampla margem para “manipulação numérica” no cálculo efetivo dos limites à mutabilidade contratual.

[9] Quais sejam: “I. não acarretar para a Administração encargos contratuais superiores aos oriundos de uma eventual rescisão contratual por razões de interesse público, acrescidos aos custos da elaboração de um novo procedimento licitatório; II. não possibilitar a inexecução contratual, à vista do nível de capacidade técnica e econômico-financeira do contratado; III. decorrer de fatos supervenientes que impliquem dificuldades não previstas ou imprevisíveis por ocasião da contratação inicial; IV. não ocasionar a transfiguração do objeto originalmente contratado em outro de natureza e propósito diversos; V. ser necessárias à completa execução do objeto original do contrato, à otimização do cronograma de execução e à antecipação dos benefícios sociais e econômicos decorrentes; VI. demonstrar-se – na motivação do ato que autorizar o aditamento contratual que extrapole os limites legais mencionados na alínea ‘a’, supra – que as consequências da outra alternativa (a rescisão contratual, seguida de nova licitação e contratação) importam sacrifício insuportável ao interesse público primário (interesse coletivo) a ser atendido pela obra ou serviço, ou seja, gravíssimas a esse interesse, inclusive quanto à sua urgência e emergência.” TCU, acórdão nº 215/1999. Plenário, publicado no DOU de 21.05.1999. É de se ressaltar que tal decisão é anterior à Lei 11.079/2004, que instituiu as concessões patrocinadas e administrativas. Ainda, impossível ignorar que a decisão do TCU trabalha com hipóteses tão genéricas e exigências de tão difícil comprovação que há sempre margem para que o TCU diga que o gestor não as cumpriu suficientemente.

[10] ENGLER PINTO, Gabriela Miniussi. A revolução silenciosa: o fim dos limites à mutabilidade dos contratos de concessão. Revista Colunistas – Direito do Estado, Rio de Janeiro, RJ, 28 jul. 2017.

[11] Retifico nesta oportunidade entendimento originalmente constante do artigo mencionado na nota de rodapé n. 10, que incluía como requisito da alteração contratual “não implicar violação à exigência constitucional de licitação prévia e ao princípio da vinculação objetiva ao instrumento convocatório”. O assunto será retomado no item 4.2.

[12] Apenas para exemplificar, o setor elétrico, ao tratar do segmento de transmissão, tem regramento e nomenclatura próprios para tratar de novos investimentos, os assim chamados “Reforços” (cf. resolução normativa nº 443, de 26 de julho de 2011, conforme alterada, especialmente art. 3º.)

[13] Como, por exemplo, a exigência em um contrato de concessão de rodovia de construção de uma passarela de pedestres em um trecho específico da rodovia apontado pelo contrato.

[14] Por exemplo, ainda no caso de uma concessão rodoviária, os investimentos em pavimento para que a rodovia alcance um determinado patamar de IRI (Índice de Irregularidade Internacional), indicador de desempenho que afere os desvios da superfície do pavimento em relação a um plano de referência, com o objetivo de avaliar a qualidade de rolamento e o conforto do usuário. Sobre a distinção entre obrigações de investimento e de desempenho ver RIBEIRO, Maurício Portugal, Concessões PPPs: melhores práticas em licitações e contratos. Atlas, 2011.

[15] Por exemplo, as concessões rodoviárias do Estado de São Paulo (2ª fase). Os contratos de concessão estão disponíveis em http://www.artesp.sp.gov.br/Style%20Library/extranet/transparencia/contratos-de-concessao.aspx. Os níveis de serviço em rodovias são geralmente avaliados e definidos pelo Highway Capactity Manual (HCM). Para mais informações sobre o HCM ver http://hcm.trb.org/?qr=1

[16] Por exemplo, a concessão do aeroporto do Galeão no Rio de Janeiro tem previsão para construção de nova pista de 3 mil metros, antes de o aeroporto atingir a marca de 262.900 movimentos anuais (cf. cláusula 8.8.1 do Plano de Exploração Aeroportuária – Anexo 2).

[17] Nesse sentido é o contrato de concessão metroviária do Estado do Rio de Janeiro, consolidado pelo Sexto Termo Aditivo: “Cláusula Primeira – Objeto do Aditivo (…)

  • 7º – Incluem-se ainda no objeto dos SERVIÇOS, outros trechos decorrentes de expansões, que venham a ser feitos no período da concessão, em continuidade às Linhas 1 e 2, entendendo-se como tal aquelas expansões que caracterizem o prolongamento dos atuais trechos em operação já concedidos e que, desta forma, requerem uniformidade dos sistemas de controle, de sinalização e de energia, acima da bitola e gabaritos estático e dinâmico das instalações, de forma a garantir a continuidade física das vias. Tais trechos serão considerados como partes integrantes das Linhas 1 e 2, conforme o caso. As implantações de expansões das linhas serão consideradas como prolongamento das linhas existentes, obrigando-se a CONCESSIONÁRIA a prestar os serviços nestes novos trechos com os mesmos padrões de operação definidos pelo ESTADO ao tempo da concessão ou deste ADITIVO, naquilo que altera tais padrões.”

[18] Aliás, até por força do art. 60, parágrafo único da Lei 8.666/93, que dispõe acerca da nulidade dos contratos verbais com a Administração Pública, a execução do contrato de parceria demanda, sempre que necessário para cumprimento de obrigações contingentes e da matriz de riscos contratual, a celebração de aditivos que formalizem tais ajustes, inclusive da ótica do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. Nesse ponto, discordo de Flávio Amaral Garcia, para quem “Sequer haverá necessidade de aditamento ao contrato, eis que se trata de cumprimento do objeto e não de sua alteração”. GARCIA, Flávio Amaral. Mutabilidade nos contratos concessionais: aspectos endocontratuais e procedimentais. In O Direito Administrativo na Atualidade: estudos em homenagem ao centenário de Hely Lopes Meirelles (1917-2017) defensor do Estado de Direito. Malheiros, 2017.

[19] Remeto aqui aos exemplos citados nas notas de rodapé ns. 15 e 16.

[20] Os documentos desta concessão estão disponíveis em http://www.antt.gov.br/rodovias/Concessoes_Rodoviarias/CONCER/Index.html.

[21] “Nova Subida da Serra de Petrópolis

Para a execução da Nova Subida da Serra, foi estimada uma verba de R$ 80.000.000,00 (oitenta milhões de reais), item 6.5.1 da Planilha de Quantidades.

Os serviços a serem executados terão seus preços aprovados e apropriados pelo DNER.

O valor real da obra, a menos ou a mais da estimativa prevista, será negociado com o DNER. (Redação do PER orginal).

[22] Inclusive para aventar a possibilidade de penalizar os agentes públicos envolvidos na celebração do aditivo. Vide Processo TCU 023.204/2015-0 e o Relatório de Acompanhamento TC 014.689/2014-6. Vale notar que o caso compreende diversas outras discussões e complexidades que extrapolam o propósito deste artigo.

[23] Controladoria Geral da União, Relatório nº 201505623, Fevereiro/2017, disponível em https://auditoria.cgu.gov.br/download/10200.pdf

[24] Conforme mencionado na introdução, é premissa deste artigo a autoplicabilidade do art. 22 da Lei 13.448/17.

[25] O free flow (ou Rodovia de Pedágio Aberto) é uma tecnologia de cobrança da tarifa de pedágio sem barreiras, por pórticos instalados nas rodovias, ou seja, sem a necessidade de praças de pedágio. Além de imprimir mais ritmo ao tráfego de veículos, a ideia do sistema é permitir a cobrança de pedágio em valor proporcional à distância efetivamente percorrida pelo usuário.

[26] Vide as seguintes cláusulas do contrato de concessão:

“16.1. Constituem as principais obrigações da CONCESSIONÁRIA, sem prejuízo das demais obrigações expressas neste CONTRATO, podendo seu descumprimento acarretar a sujeição às penalidades cabíveis de acordo com o regramento estabelecido pelo ANEXO XI: (…)

xxxiv. Promover todas as atividades necessárias à implantação de sistema de arrecadação de TARIFAS DE PEDÁGIO na modalidade FREE FLOW, cujos investimentos serão tratados como EVENTO DE DESEQUILÍBRIO nas REVISÕES ORDINÁRIAS, nos termos deste CONTRATO e observado o regramento estabelecido pelo ANEXO IV;”

“19.2. O PODER CONCEDENTE, sem prejuízo das demais disposições deste CONTRATO, assume os seguintes riscos relacionados à CONCESSÃO: (…)

xiv. Investimentos e impactos positivos ou negativos decorrentes da implantação de sistema de arrecadação de TARIFAS DE PEDÁGIO na modalidade FREE FLOW, ou outro que venha a existir;”

[27] Sexto Termo Aditivo: “Cláusula Primeira – Objeto do Aditivo (…)

  • 6º – Os trechos da Linha 1 indicados nas alíneas (d), (e) e (f) do § 2º, com exceção da Estação Uruguai, bem como os trechos da Linha 2 indicados nas alíneas (b) e (c) do § 3º, todos desta Cláusula, terão sua construção condicionada aos interesses do ESTADO e à disponibilidade de recursos para investimento, não constituindo, assim, direito ou obrigação da CONCESSIONÁRIA ou obrigação do ESTADO, a conclusão dos trechos de que trata este parágrafo, no todo ou em parte, durante a vigência do presente ADITIVO.”

[28] Nesse sentido, é paradigmático o caso da Nova Subida da Serra, tratado neste artigo. Também merece destaque a recente crítica do TCU à metodologia do fluxo de caixa marginal para reequilíbrio contratual nas rodovias federais em decorrência de novos encargos surgidos com a Lei do Caminhoneiros: “9.3. recomendar à SeinfraRodovias que instaure um ou mais processos de representação com vistas a apurar os indícios de irregularidades referentes ao reajuste da tarifa de pedágio em decorrência dos efeitos do art. 16 da Lei 13.103/2015 e, caso sejam confirmados esses indícios, a identificar os responsáveis pelo erro de cálculo no reajuste ora analisado e também pela edição da Resolução-ANTT 4.339/2014 que causou efeitos desastrosos para o interesse público em diversas concessões rodoviárias;” (Acórdão 1461/2018). A Resolução nº 4.339/2014 alterou a Resolução nº 3.651/2011, que criou e regulou a metodologia do fluxo de caixa marginal.

[29] Nesse sentido ver CAMINHA, Uinie; LIMA, Juliana Cardoso. Contrato Incompleto: uma perspectiva entre direito e economia para contratos de longo termo. REVISTA DIREITO GV, São Paulo, p. 155-200, jan-jun 2014; HART, Oliver. Incomplete Contracts and Public Ownership: remarks, and an application to public-private partnerships. 2003. The Economic Journal, Vol. 113, No. 486, Conference Papers (Mar., 2003), pp. C69-C76; NÓBREGA, Marcos. Contratos incompletos e infraestrutura: contratos administrativos, concessões de serviço público e PPPs. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, Belo Horizonte, ano 7, n. 25, abr./jun 2009.

[30] Art. 18, VII, Lei 8.987/95.

[31] Na visão da doutrina “Atualidade relaciona-se com outro ângulo do conceito de eficiência. Dentro de certos limites, um serviço pode ser eficiente ainda que não seja moderno. Haverá um certo ponto de ruptura entre ausência de modernidade e eficiência. As necessidades dos usuários podem ser atendidas satisfatoriamente por meio de serviços prestados segundo técnicas ultrapassadas pela evolução científica. Mas a manutenção das técnicas anteriores, diante de contínuas inovações da ciência, tenderá a produzir ineficiência. O progresso tecnológico produz redução de custos e de tempo e ampliação de utilidades ofertáveis ao público. Mais ainda, de novas necessidades. Portanto, não adotar novas técnicas significa desatender às necessidades a ela relacionadas. Essa questão fica muito clara a propósito da transmissão de dados à distância”. JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público, 2003, p. 306.

[32] É preciso contextualizar que esses contratos foram celebrados em período de dificuldades fiscais e que buscavam a desoneração do Governo Estadual dos seguidos déficits operacionais. Por isso, a urgência era a transferência da operação, mediante pagamento da maior outorga possível, a ser usada para pagar dívidas do Estado.

[33] Conforme voto DWE – 058, de 29 de agosto de 2018, que consta do Processo nº 50500.310500/2015-89, disponível em http://www.antt.gov.br/backend/galeria/arquivos/2018/09/04/Voto_DWE_0582018.pdf

[34] Esses investimentos não devem ser confundidos com o dispêndio relevante e periódico em manutenção mais pesada, que ocorre em vários negócios.

[35] Que dispõe que “A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço.”

[36] Por exemplo, o contrato de concessão de serviço público de transporte ferroviário de passageiros do Estado do Rio de Janeiro, que prevê na cláusula quarta: “Os SERVIÇOS objeto da CONCESSÃO de que trata o CONTRATO ora aditado deverão ser prestados pela CONCESSIONÁRIA de forma a assegurar a sua boa qualidade e segurança, satisfazendo, durante toda a vigência da CONCESSÃO, as condições de regularidade, continuidade, eficiência, conforto, segurança, atualidade tecnológica, generalidade e cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.” (Oitavo Aditivo). Disponível em http://www.agetransp.rj.gov.br/web/guest/contratos?_contratos_WAR_agetranspportlet_concessionaria=Supervia

[37] Disponível em https://www.parcerias.sp.gov.br/Parcerias/Documento/Download?codigo=26369

[38] Cláusula 15.1.2.

[39] Nos termos do artigo 122 do Código Civil, “São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes.”

[40] A cláusula puramente potestativa é aquela cujo conteúdo é de tal forma indeterminado que a sua execução dependeria do completo arbítrio de uma das partes (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 480-481. v. I.).

[41] Assim é o entendimento de Mauro Roberto Gomes de Mattos: “Nesse conceito (serviço adequado), também [inclui-se] a necessidade de modernização das técnicas, dos equipamentos e das instalações, bem como a melhoria e expansão do serviço (art. 6º, §2º). A expansão do serviço em determinados casos é imperiosa, pois a atualidade e modernidade não permitem a estagnação do serviço, que com o passar do tempo tem que se adequar às necessidades dos usuários. É claro que a expansão não poderá desnaturar a concessão obtida através da concorrência pública, ou seja, ela não poderá revelar um serviço novo, que deveria ser submetido a nova licitação.” O Contrato Administrativo, 2002, p. 219.

[42] As informações sobre o projeto podem ser encontradas em http://www.ppp.mg.gov.br/sobre/projetos-de-ppp-concluidos/ampliacao-do-sistema-rio-manso

[43] A gravidade da situação hídrica foi institucionalmente registradas nas Portarias 13, 14, 15, todas de 2015, do Instituto Mineiro de Gestão das Águas – IGAM: “Art. 1º. Fica declarada a situação crítica de escassez hídrica superficial na porção hidrográfica localizada a montante das coordenadas geográficas latitude 19°55’08’’S e longitude 44°10’08’’W, abrangendo o reservatório Vargem das Flores e sua bacia de contribuição, conforme mapa constante no Anexo Único desta Portaria.

Art. 2º. A declaração de situação crítica de escassez hídrica na porção hidrográfica em questão justifica-se pelas seguintes características:

  1. Diminuição das precipitações observadas nos últimos biênios;
  2. Situações de conflito entre a demanda e a disponibilidade hídrica;
  • Risco real de desabastecimento na Região Metropolitana de Belo Horizonte – RMBH, tendo em vista que a captação da água no reservatório Vargem das Flores se dá para fins de abastecimento público;
  1. Insuficiência de suprimento até o fim do período seco para abastecimento de água da população atendida pelo sistema Paraopeba, do qual o reservatório Vargem das Flores é integrante;
  2. Dificuldade de regularizar a vazão residual para garantir a conservação do recurso hídrico para as porções a jusante; e,
  3. Necessidade de tomada de ações visando o atendimento ao disposto no artigo 9º da Deliberação Normativa CERH/MG n.º 49/2015” (Portaria 15/2015).

[44] Conforme notas explicativas às demonstrações financeiras da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (2015), publicadas no Diário Oficial do Estado de Minas Gerais de 11.03.2016: “Em 03 de junho de 2015, a COPASA e a Odebrecht Ambiental – Rio Manso S.A. assinaram termo aditivo ao referido contrato de PPP para a realização de obras destinadas à captação de água bruta do Rio Paraopeba para tratamento na ETA Rio Manso (Estação de Tratamento de Água). visando garantir a capacidade de produção de água destinada ao abastecimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte.” Disponível em https://www.jusbrasil.com.br/diarios/111242021/doemg-executivo-11-03-2016-pg-64

[45] Informações disponíveis em http://www.fazenda.df.gov.br/area.cfm?id_area=1319

[46] Sobre a falta de mobiliário urbano no projeto ver 11.6.2. do Relatório de Auditoria Especial N.º 01/2017 – DINPC/COAPP/COGEI/SUBCI/CGDF, disponível em http://www.cg.df.gov.br/wp-conteudo/uploads/2018/02/65.pdf

[47] Conforme Terceiro Termo Aditivo, disponível em http://pbhativos.com.br/arquivos/03-CONCESSOES-E-PPPS/03.3%20-%20PPP%20EDUCACAO/PPP%20Educacao/3TA%20PPP%20SMED%20assinado.pdf

[48] RODRIGUES, Bruno da Costa Lucas. Avaliação do impacto da utilização de parceria público-privada para a construção e operação de unidades municipais de educação infantil em Belo Horizonte. Dissertação (mestrado) – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa, 2015.

[49] Por exemplo, quando as concessionárias de rodovia assumem trechos sob responsabilidade do Poder Público, a exemplo do relatado na Nota Técnica nº 038/2015/GEINV/SUINF – ANTT, que se manifestou pela inclusão de novo trecho rodoviário na Concessão da BR 163/MT. Disponível em http://www.antt.gov.br/backend/galeria/arquivos/nota_tecnica_n__038_2015_geinv_suinf.pdf

[50] Conforme cláusula 24.5 e seguintes do Contrato de Concessão do Lote Centro Oeste Paulista do Estado de São Paulo. Disponível em https://www.parcerias.sp.gov.br/Parcerias/Documento/Download?codigo=26369

[51] Art. 6º A prorrogação antecipada ocorrerá por meio da inclusão de investimentos não previstos no instrumento contratual vigente, observado o disposto no art. 3º desta Lei.

[52] Deliberação nº 629, de 29 de agosto de 2018.

[53] Conforme voto DWE – 058, de 29 de agosto de 2018, que consta do Processo nº 50500.310500/2015-89, disponível em http://www.antt.gov.br/backend/galeria/arquivos/2018/09/04/Voto_DWE_0582018.pdf

[54] Ver Valor Econômico, ANTT avalia pleito da Rumo de fazer extensão na Malha Norte disponível em http://www.valor.com.br/empresas/5062218/antt-avalia-pleito-da-rumo-de-fazer-extensao-na-malha-norte

[55] Quando uma atualização dos serviços implicar na prestação de um novo serviço inteiramente.

[56] Nos casos das parcerias que contam com algum pagamento público.

[57] Essa é uma visão que busca temperar os chamados poderes exorbitantes da Administração Pública, que conferem prerrogativa de alteração unilateral dos contratos “para melhor adequação às finalidades de interesse público” (art. 58, I da Lei 8.666/93), à realidade complexa dos contratos de parceria, que requer mais interlocução e consensualidade entre partes para o verdadeiro atingimento do interesse público.

[58]Em várias situações entre nós, as regras sobre o reequilíbrio dos contratos e a forma como elas são aplicadas resultam em reequilibrar o contrato apenas economicamente (mas não financeiramente), ou apenas financeiramente (mas não economicamente). Isso significa que as regras e práticas criadas para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro são insuficientes para dar completa eficácia à distribuição de riscos contratuais. Em outras palavras, a atribuição pelos contratos de concessão e PPP de riscos a uma das partes não necessariamente exime as outras partes de todas as consequências gravosas de tais eventos. (…)” RIBEIRO, Maurício Portugal; Reequilíbrios incompletos de contratos de concessão e PPP: reequilíbrio econômico (que não caracteriza reequilíbrio financeiro) e reequilíbrio financeiro (que não caracteriza reequilíbrio econômico). Artigo, novembro, 2015.

[59]Em conclusão, entendemos que, observados os demais limites qualitativos aplicáveis à mutabilidade contratual, o concessionário poderia opor-se à inclusão de novos investimentos, exceto no caso de reequilíbrio completo, isto é, tanto econômico quanto financeiro, do contrato de concessão.” ENGLER PINTO, Gabriela Miniussi; RIBEIRO, Maurício Portugal. Pode o concessionário se opor à imposição de novos investimentos em contratos de concessão e PPP? Em quais circunstâncias? Artigo, 2017.

[60] Ao tratar do requisito de vinculação, Carlos Ari Sundfeld afirma que “seria ilícito incluir, entre as obrigações assumidas pela concessionária em virtude da licitação, encargo novo que se afigurasse desprovido de qualquer conexão com o objeto licitado. É o que ocorreria, por exemplo, se o poder concedente transferisse à concessionária de serviço público rodoviário o dever de construir escolas ou postos de saúde ao longo da rodovia.” SUNDFELD, C. A; CÂMARA, J. A; SOUZA, R. P. Concessão de serviço público: limites, condições e consequências da ampliação dos encargos da concessionária. In: OLIVEIRA, Farlei Maritns Riccio (coord.). Direito Administrativo Brasil-Argentina: estudos em homenagem a Agustín Gordilho. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

[61] Art. 6o Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato. (…)

  • 2o A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço.

[62] O Metro de São Paulo, por exemplo, tem três agentes distintos operando a mesma infraestrutura metroviária: a própria Companhia do Metropolitano de São Paulo, a Concessionária ViaQuatro e a Concessionária ViaMobilidade, sendo que essas últimas têm acionistas em comum.

[63] Essas reflexões dialogam, no âmbito da Teoria dos Mercados Incontestáveis, com o conceito de subaditividade dos custos, que se verifica quando os custos de um único produto são menores se produzidos numa determinada quantidade e em uma única firma. Sobre o tema ver BAUMOL,William J., PANZAR, John C., WILLIG, Robert D. Contestable markets and the theory of industry structure, Harcourt Brace Jovanovich, 1982.

[64] Essa pergunta contribui inclusive para avaliação de eventual enquadramento desse novo investimento na categoria de demandas prementes.

[65] Em oposição ao prazo que seria necessário para realizar esses investimentos no contexto de uma nova licitação, naturalmente mais extenso pelas próprias exigências inerentes ao processo licitatório contemplando, inclusive, a fase de confecção dos estudos de viabilidade necessários para o empreendimento.

[66] Embora sem fazer essa reflexão de ordem econômica, a doutrina chega a mesma conclusão: “O segundo parâmetro geral que deverá ser observado nas alterações dos contratos administrativos está relacionado com a demonstração de que não é viável licitar de forma autônoma a alteração que se pretende introduzir no ajuste.” BARROSO Luís Roberto, Concessão Rodoviária. Alterações no objeto do contrato: acréscimos de obras novas a pedido do Poder Público. Reestabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, possibilidade e limites. Parecer, abril de 2008. No mesmo sentido, “também não podem ser objeto de inclusão na concessão original os encargos que, tomados isoladamente, admitam exploração econômica autônoma pelo sistema das concessões.” SUNDFELD, C. A; CÂMARA, J. A; SOUZA, R. P. Concessão de serviço público: limites, condições e consequências da ampliação dos encargos da concessionária. In: OLIVEIRA, Farlei Maritns Riccio (coord.). Direito Administrativo Brasil-Argentina: estudos em homenagem a Agustín Gordilho. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

[67] Não obstante, nada impede avaliar o projeto como uma concessão patrocinada ou mesmo como obra pública.

[68] Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: (…).

[69] Esse raciocínio foi desenvolvido pela ANTT no contexto da avaliação pertinência e legitimidade da construção e exploração do ramal ferroviária entre Rondonópolis/MT e Lucas do Rio verde/MT no âmbito da renovação antecipada da concessão da Malha Norte, conforme Parecer n. 01739/2016/PF-ANTT/PGF/AGU.

[70] É nesse sentido que as sugestões da Controladoria Geral da União, em relação à duplicação da BR 040, de que as obras de expansão poderiam ser conduzidas por licitação em apartado são pouco realistas. Vide nota de rodapé 23.

[71] Nesse sentido: “Como a precificação das modificações contratuais é feita sempre a partir de preços de referência da Administração, ou seja, aqueles considerados como limite para as contratações públicas, estes novos investimentos possuem condições mais vantajosas para os concessionários, razão pela qual são reiterados os pedidos de inclusão destes novos investimentos. Verifica-se que a ANTT não tem levado em conta a vantagem conseguida durante o procedimento licitatório, bem como quaisquer limites para tais inclusões.

Com isso, tem-se um modelo contratual sui generis na Administração Pública, com a existência de preços diferentes para um mesmo serviço. Ou seja, caso um serviço previsto inicialmente no contrato de concessão tenha que ser incrementado ao longo de sua vigência, os preços dos serviços marginais são calculados a partir de custos teto de referência da Administração Pública, em detrimento dos preços apresentados na proposta de negócios durante a licitação.

E esta peculiaridade tem exigido da ANTT a realização de atividades não previstas para uma agência reguladora, como a análise mais aprofundada dos novos projetos para o estabelecimento dos seus custos, a elaboração de orçamentos de referência, a fiscalização destas obras (de modo que atendam aos parâmetros de projeto), entre outras atividades características do DNIT, nos termos da Lei 10.233/2001. E isso ocorre mesmo para os casos em que obras e serviços já estão previstos no PER e têm suas quantidades aumentadas ao longo da vigência do contrato.

Exatamente esta metodologia utilizada pela ANTT, formalizada a partir da alteração feita na Resolução 3.651/2011, no ano de 2014, tem o potencial de ocasionar distorções nas revisões tarifárias das concessões vigentes, como é o caso em análise na presente representação.” TCU, Acórdão nº 290/2018, Plenário, Data da Sessão: 21/2/2018.

[72] Segundo a doutrina, a licitação “constitui um princípio instrumental da realização dos princípios da moralidade administrativa e do tratamento isonômico dos eventuais contratantes com o Poder Público”. José Afonso da Silva, Comentário Contextual à Constituição, 8ª ed., São Paulo, Malheiros, 2012. Como crítica a esse posicionamento vale mencionar a posição de Carlos Ari Sundfeld e André Rosilho: “A CF, no art. 175, não criou o dever de licitar concessões e permissões em geral, mas única e exclusivamente aquelas que envolvessem a prestação de serviços púbicos. Para ficar em apenas um exemplo, não se extrai do texto constitucional o mandamento de que concessões de direito real de uso serão em regra outorgadas por meio de licitação prevista no art. 37, XXI, inspirados, inclusive, em valores diversos ou mais abrangentes.” Não se ignora, ainda, as controvérsias sobre o significado de “serviços públicos”. Não obstante, “uma coisa é certa: a concessão e a permissão a que se refere o art. 175 da CF não dizem respeito à delegação da prestação de qualquer tipo de serviço. Isso porque o próprio art. 174 (caput e incisos do seu parágrafo único) elenca algumas das características típicas dessa espécie de contrato.” Onde está o princípio universal da licitação?, in Carlos Ari Sundfeld e Guilherme Jardim Jurksaitis (orgs.). Contratos públicos e direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2015, pp. 19-38.

[73] Por exemplo, o contrato de concessão rodoviária da Entrevias (Estado de São Paulo) definiu limites quantitativos específicos para inclusão de novos investimentos. Veja-se: “24.2. Os novos investimentos, não previstos inicialmente no PLANO ORIGINAL DE INVESTIMENTOS, e eventualmente implementados em função do conjunto de ciclos de REVISÃO ORDINÁRIA, não poderão, em seu conjunto, acarretar revisão do PRAZO DA CONCESSÃO que enseje o acréscimo de prazo superior a 15 (quinze) anos e/ou supere, em seu conjunto, o montante de 15% (quinze por cento) do montante inicial total de investimentos sob a responsabilidade da CONCESSIONÁRIA, de acordo com os valores e marcos de obra definidos no ANEXO XXI.

24.2.1. Os investimentos limitados ao valor de 15% do montante inicial, descritos na cláusula 24.2, apenas serão obrigatórios se a avaliação da hipótese de sua realização não apontar para a queda da nota de classificação de risco obtida pela concessão, ou, no caso de nova emissão de valores mobiliários ou obtenção de nova dívida bancária, a eventual consequência não seja nota inferior àquela obtida pela emissora ou mutuária original, sendo que esta nota, em escala nacional, será emitida pela Fitch ou, em escala equivalente, pela Standard and Poor’s (S&P) ou Moody’s.

24.2.2. O limite de valor apresentado no item 24.2. poderá ser superado, mediante justificativa própria e desde que previamente anuídos pela ARTESP com consentimento da CONCESSIONÁRIA, além de, quando o caso, dos FINANCIADORES e GARANTIDORES da CONCESSIONÁRIA.”