O DIREITO À DESCONEXÃO E OS DESAFIOS DA ADVOCACIA ANTE A VIRTUALIZAÇÃO DO JUDICIÁRIO

Resumo

O presente artigo tem como escopo a análise do direito à desconexão do trabalho com enfoque nos impactos causados pela ausência de autogestão e excesso de jornada no teletrabalho. O direito à desconexão do trabalho é um meio de assegurar a saúde, uma vez que a virtualização do Judiciário pode trazer consequências graves à saúde mental, em razão do stress elevado, constante pressão e ausência de descanso e lazer devido ao excesso de conexão. Objetiva-se comprovar a hipótese de que em razão da conexão excessiva, a saúde mental pode ser gravemente afetada, desencadeando doenças como estresse, síndrome de Burnout e depressão.

Artigo

O DIREITO À DESCONEXÃO E OS DESAFIOS DA ADVOCACIA ANTE A VIRTUALIZAÇÃO DO JUDICIÁRIO

 Fernanda Prado dos Santos

Advogada graduada pela Universidade Candido Mendes, Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela IBMEC/RJ, sócia e fundadora do escritório Fernanda Prado Sociedade Individual de Advocacia. Mentora jurídica e membro da comissão de apoio à advocacia empreendedora na OAB/RJ.

 

Thaís de Siqueira Campos Azevedo

Advogada graduada pela Universidade Candido Mendes, especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Candido Mendes e Pós-graduanda em Direito e Processo do Trabalho pela IBMEC/RJ, sócia e fundadora do escritório Thaís de Siqueira Campos Advocacia. Membro da comissão de estudos em direito e processo do trabalho na OAB/RJ.

 

 RESUMO

O presente artigo tem como escopo a análise do direito à desconexão do trabalho com enfoque nos impactos causados pela ausência de autogestão e excesso de jornada no teletrabalho. O direito à desconexão do trabalho é um meio de assegurar a saúde, uma vez que a virtualização do Judiciário pode trazer consequências graves à saúde mental, em razão do stress elevado, constante pressão e ausência de descanso e lazer devido ao excesso de conexão. Objetiva-se comprovar a hipótese de que em razão da conexão excessiva, a saúde mental pode ser gravemente afetada, desencadeando doenças como estresse, síndrome de Burnout e depressão.

Palavras-chave: Direito à desconexão. Saúde mental. Audiência virtual. Teletrabalho. Home office. Síndrome de Burnout.

  1. INTRODUÇÃO

As relações de trabalho sofreram grandes modificações diante das revoluções sociais vivenciadas nos últimos séculos. Com as diversas facilidades trazidas pela tecnologia moderna, o homem precisou adaptar-se às novas ferramentas e formatos de trabalho, para atender às necessidades mercadológicas que lhe são impostas.

Com a pandemia do COVID-19, o processo de inserção no meio digital ganhou mais força e os empregadores perceberam que é possível aderir ao teletrabalho, sendo uma forma viável para redução de custos e aumento da competitividade empresarial. Entretanto, sob o manto destas justificativas, não se deve preterir garantias mínimas asseguradas ao trabalhador. O direito ao descanso, ao lazer e à desvinculação completa ao trabalho são requisitos necessários para a manutenção de uma vida saudável.

O teletrabalho surge como uma provável ameaça a esses direitos, visto que a partir de um computador o advogado poderá estar conectado à empresa ou ao cliente em qualquer local que se encontre. Neste sentido, o presente artigo busca trazer uma análise do direito à desconexão, ainda pouco explorado por aqueles que se dedicam ao assunto. Serão apresentados conceitos e análises do que venham a ser teletrabalho e home office.

Espera-se que, a partir das linhas apresentadas, seja possível desenvolver um estudo mais aprofundado acerca do teletrabalho. Visa-se instigar os estudiosos do tema a dedicar maior atenção ao instituto do direito à desconexão, o qual desponta como uma forma viável de assegurar direitos básicos inerentes a toda a advocacia.

 

  1. AUDIÊNCIAS VIRTUAIS E JUÍZO 100% DIGITAL

O cenário atual de pandemia, inequivocamente, acelerou o processo de virtualização do Judiciário e não se pode olvidar que tudo isso foi de encontro ao que já era previsto no ordenamento jurídico.

Assim, em 29 de abril de 2020 foi regulamentada pela Corregedoria Geral da Justiça (CGJ) a realização de audiências virtuais, pouco após ter sido declarado o estado de calamidade pública, tornando disponível e possível aos tribunais o acesso à plataforma “Webex” para a realização de audiências e pautas de julgamento por videoconferências.

Desta forma, aos poucos foram sendo inseridas na rotina do Judiciário as audiências de conciliação por videoconferência, sessões de julgamento com sustentação oral e até mesmo audiências de instrução na Justiça do Trabalho, e conforme palavras dos juízes do TJRJ, “As audiências virtuais são uma realidade, não só em tempos de pandemia, mas como na vida diária[1].

Como a virtualização veio ganhando força, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou recentemente a Resolução nº 345, o Juízo 100% digital, cuja previsão é a de que todos os atos processuais sejam realizados exclusivamente por meio eletrônico e de maneira remota, valendo também para as audiências e sessões de julgamento que vão ocorrer por videoconferência, sendo, no entanto, facultativa a escolha por esse sistema e a decisão de adotá-lo ou não será de cada tribunal.

Na mesma resolução, fica estabelecido, ainda, que a Justiça deve prestar atendimento remoto durante o horário de expediente dos tribunais, por meio de: telefone; e-mail; videochamadas; aplicativos digitais ou outros meios de comunicação. Por ser facultativo, caberá à parte demandante informar a sua escolha pelo Juízo 100% Digital quando do ajuizamento da ação, sendo que a parte demandada poderá a isso se opor.

Nos termos da referida resolução, as partes poderão se retratar uma única vez até a prolação da sentença quanto à escolha pelo Juízo 100% Digital. Na hipótese de isso ocorrer, o processo continuará com o magistrado já designado para o caso.

A resolução segue a diretriz estabelecida no Código de Processo Civil, art. 236, § 3º, em que se admite a utilização dos meios eletrônicos para a prática dos atos processuais. Tendo em vista que os atos processuais e as audiências virtuais privilegiam a celeridade, principalmente no tocante a cortes superiores, é inegável que muitos advogados e as partes sofrerão redução nas despesas com deslocamento, estadias e demais gastos que ocorrem durante uma viagem de trabalho, pois poderão participar das sessões de julgamento e realizar sustentações orais dentro do seu escritório ou na própria residência.

Desta forma, concluímos que esse novo cenário trazido pela pandemia do COVID-19, a virtualização do Judiciário, levou muitos ao teletrabalho, formato de labor que se tornou essencial para garantir a manutenção da economia do país.

Os empregadores não tiveram tempo hábil para pensar em outra solução a não ser determinar que todos os seus empregados ficassem em casa e trabalhassem na modalidade teletrabalho. Entretanto, todos as cautelas devem ser observadas para que o direito do empregado não seja mitigado e a saúde mental dos profissionais seja mantida.

  1. TELETRABALHO E HOME OFFICE, DIFERENÇAS E BREVES CONSIDERAÇÕES

Antes de adentrar ao tema do direito à desconexão, é importante destacar as peculiaridades existentes entre o regime de teletrabalho e o home office, pois é importante que saibamos diferenciar esses institutos.

Embora o teletrabalho seja uma modalidade bastante difundida no mundo profissional, principalmente pela popularização das tecnologias da informação e da comunicação, em tempos de pandemia tornou-se uma alternativa para manter as atividades de escritórios e empresas que não puderam continuar com a atuação presencial em razão dos riscos de contaminação.

A reforma trabalhista regulamentou o teletrabalho, por meio dos artigos 75-A ao 75-E da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), podendo esta modalidade ser, preponderantemente, desenvolvida em qualquer local fora das dependências da empresa, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo. O regime de teletrabalho não está sujeito ao controle de jornada, bem como marcação de ponto, conforme Art. 62, III da CLT.

Deverá também constar expressamente em contrato individual de trabalho ou em aditivo que a modalidade adotada pela empresa será o teletrabalho, devendo-se proceder com as devidas anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) do trabalhador.

É essencial que fique formalizado como se dará o custeio e o fornecimento de materiais e equipamentos necessários para prestação da atividade, conforme disciplina o art.75-D da CLT, sendo esta, também, uma obrigação do empregador.

Já o home office, diferente do teletrabalho, pode ser utilizado, eventualmente, pelos funcionários sem que seja um período longo fora das dependências da empresa. E para tanto, não há necessidade de previsão em contrato de trabalho.

Geralmente, o home office surge como benefício a ser concedido ao empregado, uma vez por semana, por exemplo, ou em caso de medidas emergenciais, como enchentes, greve no transporte público, ou como prevenção contra o novo COVID-19. Dessa maneira, mantêm-se incólumes todas as cláusulas previstas no contrato de trabalho, inclusive, o controle de jornada.

  1. O CENÁRIO DO ADVOGADO AUTÔNOMO

Não se pode deixar de falar sobre a realidade do advogado autônomo e dos impactos que a pandemia do COVID-19 causou, pois os tribunais e o CNJ editaram diversos atos normativos, no sentido de que o expediente forense estaria suspenso, assim incluindo cancelamento de audiências, tribunais de portas fechadas sem atendimento ao público, prazos cancelados e ainda sem previsão de retomada.

Esse conjunto de ações foi extremamente impactante para os advogados autônomos, pois este é um ano em que expectativas, projetos e idealizações ficaram estagnados. Não havia meios físicos e psicológicos para os advogados trabalharem, não fazia mais sentido o advogado manter uma estrutura de escritório com despesas de salas comerciais e funcionários, pois as demandas estavam paralisadas.

Nesse sentido, em meio a toda essa turbulência psicológica, diante das incertezas no novo cenário apresentado por causa do COVID-19, foram publicadas diversas medidas provisórias na seara trabalhista, podendo-se citar as mais importantes como MP 936/2020, MP 927/2020 e a Portaria 10486/2020, que trataram da redução de jornada e salário do empregado, da adoção do teletrabalho de forma mais flexível que a CLT e do Benefício Emergencial.

Nesse momento, o advogado autônomo não pôde se entregar ao desânimo e à desesperança e teve que se reinventar, estudar, atualizar e assistir a muitas lives de juízes, desembargadores, doutrinadores e procuradores do trabalho a respeito das novas medidas adotadas pelo governo. É inédito, mas naquele cenário o único canal de estudo que o advogado possuía eram as lives, em que podia acompanhar o entendimento dos magistrados e consequentemente adotar uma linha de raciocínio para orientar seus clientes.

O advogado sabia que se o movimento não fosse nesse sentido a sua situação poderia ser muito pior, pois certamente seria acionado por seus clientes e alguma orientação ou parecer teria que prestar, uma vez que não poderia deixá-los sem assistência nesse momento tão delicado que vivia a economia do país. E foi uma questão de muito pouco tempo para que as mensagens de WhatsApp, ligações, e-mails não parassem de chegar, pois os clientes precisavam saber como iriam passar a agir dali em diante, queriam saber que atitudes podiam tomar e quais seriam as consequências.

Após esse turbilhão de acontecimentos, aos poucos o Judiciário foi retornando, entretanto com algumas limitações e com outras dificuldades. O advogado autônomo passou a travar mais uma batalha, tendo que novamente se atualizar e adaptar-se à realidade das audiências virtuais, aos atendimentos dos cartórios por e-mail, ao atendimento presencial de forma bem reduzida em alguns tribunais, às orientações aos seus clientes no sentido de informatizá-los e transmitir o máximo de segurança possível quanto aos novos procedimentos, e ao mesmo tempo ainda lidar com todo o zelo da circulação de um vírus em que ainda está sendo testada uma vacina.

Toda essa dinâmica foi e está sendo vivenciada por diversos advogados autônomos que ainda conseguem ter fôlego para atuarem na profissão de forma honrosa e abrilhantada, e com o excesso de questões que vêm enfrentando, muitas vezes não sabem conduzir a gestão do tempo, ficando com a sua rotina comprometida.

  1. O DIREITO À DESCONEXÃO

Conforme já noticiado diversas vezes na mídia, grandes empresas e escritórios já cogitam aderir definitivamente ao teletrabalho; conforme narrado, há autorização do CNJ para que os tribunais adotem o Juízo 100% Virtual. Sem sombra de dúvidas a virtualização do Judiciário e o teletrabalho poderão trazer benefícios, pois o advogado e as partes não perderão tantas horas deslocando-se, possibilitando que a produtividade seja maior e melhor, ante a otimização de tempo.

Mas, em contrapartida, corre-se o risco de trabalhar mais e assim o advogado não conseguir separar a vida pessoal da profissional, já que poderá executar as tarefas profissionais dentro de sua residência.

É relevante ressaltar que o direito à desconexão é garantia fundamental do trabalhador, por se tratar de norma de saúde, higiene e segurança do trabalho prevista no Art. 7º da Constituição Federal. No caso de advogados empregados, mantê-los conectados ao trabalho sem o devido controle nos momentos em que deveriam estar descansando fere o que modernamente vem sendo chamado de direito à desconexão.[2]

O direito à desconexão nasce da moderna relação entre tecnologia e trabalho, consistindo no direito a desconectar-se do seu trabalho. É o direito a “se desconectar completamente da empresa, ou seja, desligar o computador, o telefone, ou qualquer que seja o meio pelo qual ele se comunique com o seu empregador.”[3]

Esse regime de trabalho necessita de proteção, e o desembargador do TRT15 e professor Jorge Luiz Souto Maior[4] publicou artigo sobre o direito à desconexão, suscitando que este não seria somente um direito individual do trabalhador, mas da sociedade e também da família.

Por se tratar de uma construção doutrinária e jurisprudencial, há um projeto de lei sobre o tema tramitando no Senado, o de nº 4.044 de 2020, citando novas teorias jurídicas sobre a regulamentação do teletrabalho e decisões judiciais a favor da imposição de “limites a fim de preservar a vida privada e a saúde do trabalhador.”[5]

O projeto de lei tem como objetivo alterar o § 2º do Art. 244, acrescenta o § 7º ao Art. 59 e os Arts. 65-A, 72-A e 133-A ao Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, de modo a dispor sobre o direito à desconexão do trabalho, disciplinando o teletrabalho quanto às regras da jornada de trabalho, períodos de descanso e férias.[6]

Segundo o texto do PL 4.044/2020, o empregador não poderá solicitar normalmente a atenção de um empregado em regime de teletrabalho, por telefone ou por qualquer ferramenta de comunicação eletrônica, fora do horário de expediente.

Além disso, o empregado em gozo de férias deverá ser excluído dos grupos de mensagens do trabalho e removerá de seus dispositivos eletrônicos privados quaisquer aplicativos de internet (sem excluir outras ferramentas tecnológicas que vierem a ser criadas) voltados exclusivamente para uso no trabalho. O uso de novas tecnologias de informação e comunicação no âmbito do ambiente de trabalho, no entanto, já vem sendo pauta de debate nos tribunais há algum tempo.

Ao analisar a complexa discussão da jornada de trabalho e os direitos fundamentais, verifica-se que existe a preocupação em acompanhar as tendências do mundo atual na forma como deve ser tratada a rotina dos empregados e este é um tema que já tramita no Senado, visto que a legislação trabalhista não protege de forma eficiente essa nova realidade, havendo a necessidade de regulamentação mais assertiva.

  1. O DESAFIO DA DESCONEXÃO DO ADVOGADO AUTÔNOMO

Com o advento do teletrabalho e a virtualização do Judiciário, haverá mais tempo para que o advogado autônomo consiga desempenhar melhor suas atividades, uma vez que não haverá necessidade de se deslocar ou perder horas aguardando audiências e pautas de sustentação oral.

Além disso, a virtualização também possibilita a realização de reuniões com clientes por meio de ferramentas como Google Meet, Teams e Zoom, por exemplo, e até mesmo o primeiro atendimento. Não é difícil, portanto, imaginar que as videoconferências serão mantidas quando a pandemia passar. E em razão da necessidade de se adequar à nova realidade, os advogados perceberam que a comunicação por vídeo é perfeitamente viável.

Ocorre que com toda essa otimização de tempo proporcionada pela tecnologia, corre-se o risco de o profissional perder-se na autogestão e passar inúmeras horas trabalhando, uma vez que não há controle de sua jornada por outrem e ainda há a questão de ser acionado inúmeras vezes fora do horário comercial.

O famoso ditado popular “quem não é visto, não é lembrado” adequa-se ao meio tecnológico com muita força, porquanto muitas vezes, com a facilidade do mundo digital, clientes acionam os advogados autônomos sem se prender aos horários comerciais, muito menos se importando com a vida privada destes.

Portanto, torna-se evidente que a desconexão deve ser pensada em todas as formas de trabalho, sejam elas autônoma, celetista ou associada, devendo haver o desligamento tecnológico do ambiente de trabalho para o bem da saúde mental. Todavia, essa premissa não é a mesma em relação aos profissionais individuais, devendo, para tanto, a OAB reforçar campanhas de conscientização a fim de que profissionais entendam a importância do conceito de saúde na era da revolução digital e a importância de se desligar do trabalho.

Diante disso, torna-se necessário estreitar estudos a respeito da desconexão, não apenas no direito do trabalho, como em outros ramos do Direito, como meio necessário para preservar a saúde dos advogados.

  1. DA VIOLAÇÃO AO DIREITO À DESCONEXÃO E AS DOENÇAS PSÍQUICAS

Como já visto, o teletrabalho pode ser uma excelente opção, se obedecidos os limites entre a jornada de trabalho e a rotina pessoal, para que seja garantida qualidade de vida ao advogado de modo a prevenir doenças psíquicas como Burnout, depressão, estresse, todas advindas do excesso de jornada.

A desconexão dentro do teletrabalho causa preocupação, uma vez que a própria natureza da prestação desse regime permite uma maior confusão entre a atividade laboral e a vida privada. O que a princípio pareça benéfico pode trazer uma série de implicações no tocante à saúde do advogado autônomo, associado ou celetista, sendo um deles o risco psicossocial, situação específica com que ele irá se deparar: menor contato social, maior responsabilidade sobre a gestão do tempo, tanto nas atividades de trabalho quanto na dinâmica trabalho-família, auto-organização/disciplina e gerenciamento da produtividade.

Os que atuam no teletrabalho passaram a assumir um alto grau de autonomia para definir a forma de execução de suas tarefas, ficando expostos a inúmeros riscos que prejudicam a sua integridade física e mental se não houver uma fiscalização eficaz por parte do empregador, em caso de advogados associados e celetistas; ou a ausência de uma autogestão, no caso de advogado autônomo.

O direito à desconexão também já foi objeto de estudo na Organização Internacional do Trabalho (OIT), que publicou relatório destacando as vantagens do teletrabalho, como por exemplo: maior autonomia no tempo de trabalho e redução no tempo de deslocamento; mas também uma análise acerca das desvantagens, como a tendência de o empregado trabalhar por longas horas, o que pode elevar os níveis de estresse.[7]

Um dos riscos de doenças psíquicas advindas do excesso de trabalho é a síndrome do esgotamento profissional, como é conhecida a síndrome de Burnout, definida como um estado físico e mental de profunda extenuação e exposição significativa a situações de alta demanda emocional no trabalho.  É um tipo de estresse que se dá no contexto do trabalho, podendo ser caracterizado por três dimensões: esgotamento, aumento de distância mental do emprego e redução da eficácia profissional.

Neste sentido, busca-se evitar que a tecnologia seja utilizada como uma ferramenta de pressão e de exploração. É necessário que seja respeitado tal direito, na medida em que, submetido ao teletrabalho, o advogado estará mais exposto à penetração da sua vida profissional no âmbito da sua vida particular.

O direito à desconexão deve ser uma garantia assegurada a todos submetidos ao regime do teletrabalho, pois somente assim estará garantida a viabilidade deste instituto perante o ordenamento jurídico pátrio.

  1. CONCLUSÃO

A preocupação com a desconexão tem ocorrido em diversas categorias, cargos e funções, em especial ao teletrabalho, eis que a tecnologia hoje existente permite uma conexão online de vinte e quatro horas por dia, como se o advogado fosse uma máquina de movimento perpétuo, culminando na sua exaustão, o que deve ser veementemente reprimido pelo Legislativo e pelo Judiciário.

Portanto, ações devem ser promovidas pelas entidades de classe de modo a amparar a advocacia autônoma e prepará-la para os riscos advindos da revolução digital no tocante à saúde mental, sendo necessário que, enquanto não haja previsão legal, o hermeneuta amplie a interpretação dos conceitos já existentes no intuito de atingir as inovações sociais.

  1. REFERÊNCIAS

BRASIL. Código de Processo Civil (2015). Código de Processo Civil Brasileiro. Brasília, DF: Senado, 2015

BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto-Lei 5452, de 1 de maio de 1943. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em 27 de outubro de 2020

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,

DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988

BRASIL. Ministério da Economia/Secretaria Especial de Previdência e Trabalho. Portaria nº 10.486, de 22 de abril de 2020. Edita normas relativas ao processamento e pagamento do Benefício Emergencial de que trata a Medida Provisória nº 936, de 1º de abril de 2020. (Processo nº 19964.103985/2020-16). Diário Oficial da União. Publicado em: 24/04/2020. Edição: 78. Seção: 1. Página: 165

BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei 4.044, de 2020. Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/143754. Acesso em 27 de outubro de 2020

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Resolução nº 345, de 9 de outubro de 2020. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3512#:~:text=1%C2%BA%20Autorizar%20a%20ado%C3%A7%C3%A3o%2C%20pelos,da%20rede%20mundial%20de%20computadores.

Acesso em 27 de outubro de 2020

MAIOR, Jorge Luiz Souto. Do direito à desconexão do Trabalho. 2013, p. PDF. Disponível em https://www.jorgesoutomaior.com/uploads/5/3/9/1/53916439/do_direito_%C3%A0_desconex%C3%A3o_do_trabalho..pdf, acesso em 25 out. 2020

MENDONÇA, Talita Rodrigues. O Teletrabalho e o Direito à Desconexão como forma de garantir o gozo do Intervalo Intrajornada. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 6. Região. Recife, PE, v.19, n. 36.  p. 238 jan./dez./2018.

Plenário do CNJ aprova proposta para varas atuarem de modo 100% digital, Consultor Jurídico. 7 out. 2020. Disponível em https://www.conjur.com.br/2020-out-07/cnj-aprova-proposta-varas-atuarem-modo-100-digital, acesso em 23 out. 2020

 Notas:

[1] Disponível em: http://cgj.tjrj.jus.br/noticias/noticia/-/visualizar-conteudo/1017893/7206355. Acesso em 27 de outubro de 2020.

[2] Tribunal Regional do Trabalho 1ª Região, processo nº 0001609-74.2012.5.01.0024, relator Leonardo Dias Borges, publicado em DOU 03/09/2014

[3] MENDONÇA, Talita Rodrigues. O Teletrabalho e o Direito à Desconexão como forma de garantir o gozo do Intervalo Intrajornada. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 6. Região. Recife, PE, v.19, n. 36, p. 238 jan/dez/2018.

[4] MAIOR, Jorge Luiz Souto. Do direito à desconexão do Trabalho. 2013, p. PDF. Disponível em https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/108056/2003_maior_jorge_direito_desconexao.pdf?sequence=1, acesso em 26 de out 2020

[5] https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/08/14/projeto-regulamenta-direito-a desconexao-do-trabalho-em-periodos-de-folga, acesso em 26 de out.2020

[6] https://legis.senado.leg.br/sdleggetter/documento?dm=8871666&ts=1598305429608&disposition=inli acesso em 26 de out. 2020

[7] https://www.ilo.org/global/about-the-ilo/newsroom/news/WCMS_544108/lang–en/index.htm, acesso em 29 de out. 2020

 

Palavras Chaves

Direito à desconexão. Saúde mental. Audiência virtual. Teletrabalho. Home office. Síndrome de Burnout.