VIVÊNCIAS DE EXTENSÃO E PESQUISA NA FACULDADE NACIONAL DE DIREITO/UFRJ (07/1986 A 07/1991): UMA VIAGEM SENTIMENTAL

Resumo

O artigo versa sobre a trajetória pessoal da autora desde o ingresso na Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, cursada entre julho de 1986 a julho de 1991, bem como as memórias de suas experiências nas atividades de ensino, pesquisa e extensão no período universitário, sobretudo no “Projeto Conscientização de Direitos”, capitaneado pela gestão Horácio Macedo na comunidade da Maré, e pelas professoras Maria Guadalupe Piragibe da Fonseca e Rosângela Lunardelli Cavallazzi, no Setor de Pesquisa e Extensão da FND. A partir de sua perspectiva pessoal, sua jornada acadêmica é contextualizada dentro daquele fértil período de mudanças institucionais e sociais de reconstitucionalização do país, da UFRJ e da Faculdade Nacional de Direito. Também é abordado como a combinação das atividades acadêmicas com participação na política estudantil e realização de estágios sociais resultou na singularidade de sua formação.

Artigo

VIVÊNCIAS DE EXTENSÃO E PESQUISA NA FACULDADE NACIONAL DE DIREITO/UFRJ (07/1986 A 07/1991): UMA VIAGEM SENTIMENTAL

A Marielle Franco: tudo o que Maré pode ser

Resumo

O artigo versa sobre a trajetória pessoal da autora desde o ingresso na Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, cursada entre julho de 1986 a julho de 1991, bem como as memórias de suas experiências nas atividades de ensino, pesquisa e extensão no período universitário, sobretudo no “Projeto Conscientização de Direitos”, capitaneado pela gestão Horácio Macedo na comunidade da Maré, e pelas professoras Maria Guadalupe Piragibe da Fonseca e Rosângela Lunardelli Cavallazzi, no Setor de Pesquisa e Extensão da FND. A partir de sua perspectiva pessoal, sua jornada acadêmica é contextualizada dentro daquele fértil período de mudanças institucionais e sociais de reconstitucionalização do país, da UFRJ e da Faculdade Nacional de Direito. Também é abordado como a combinação das atividades acadêmicas com participação na política estudantil e realização de estágios sociais resultou na singularidade de sua formação.

Ensino, pesquisa, extensão, “Projeto conscientização de direitos”, memórias da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ.

Autora: Geisa de Assis Rodrigues. Graduada pela UFRJ/1991. Mestre em Direito pela UERJ/1996. Doutora em Direito pela UERJ/2000. Pós-doutora no Brazil Institut do Kings College de Londres/2015. Procuradora Regional da República da 3ª Região, ingresso no Ministério Público Federal/ 1995. Professora da Escola Superior do Ministério Público da União desde 1995. Professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie desde 2013. [email protected]

1.0 Como tudo começou: o sonho universitário de uma jovem de periferia

Longe de ser um fleumático artigo jurídico, este breve retrospecto sobre as minhas vivências na Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no período de 1986 a 1991, será, em verdade, uma viagem sentimental[1] a um período seminal de minha vida.

No fim da década de 1980 as Universidades brasileiras eram frequentadas por apenas 5% da população do país, principalmente jovens das classes médias e altas urbanas[2]. A canção de Martinho da Vila “O Pequeno burguês”[3], de 1969, que retrata o cotidiano dos que têm como única opção custear seus próprios estudos noturnos em instituições privadas após um longo dia de trabalho, ainda fazia total sentido.

O ingresso nas Universidades públicas de maior prestígio não era uma meta comum para quem não tinha uma relação de pertencimento com o ambiente acadêmico. Para uma moça latino-americana, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes, parafraseando Belchior[4], e vinda de Duque de Caxias[5], na periferia do Rio de Janeiro, acalentar o sonho de cursar Direito em uma Universidade Pública era uma verdadeira ousadia.

E esse sonho só foi possível porque foi precoce. Aos treze anos decidi que gostaria de trilhar este caminho, principalmente porque, de alguma forma, intuí, desde bem cedo, que a educação formal era a única estrada para a liberdade e a igualdade. Por sorte também nunca fui seduzida pela figura do príncipe encantado, que sempre foi vendido como um redentor de nossas vidas, quando, no fundo, acaba por reduzir os nossos horizontes. Ter um parceiro de jornada como o tenho há quase 25 anos, e dois belos filhos é uma história muito mais bonita do que qualquer conto de fadas.

Estudei no Instituto de Educação Governador Roberto Silveira[6], em frente à minha residência, até a sétima série, quando, preocupada com o impacto das recorrentes greves de professores, conquanto legítimas, na minha formação[7], consegui uma bolsa integral no Colégio São Jose[8], em Duque de Caxias, de propriedade da família de uma amiga. Fiquei um ano e consegui outra bolsa de estudo integral para fazer o, então, segundo grau no Instituto Benhur de Ensino[9], colégio que adotava a metodologia da rede Miguel Couto Bahiense especializada na aprovação de vestibulares, situada no bairro do Meier, distante exatos 23 km da minha casa. Pegava um ônibus e um trem diariamente para ir à escola, nos dias de educação física saia de casa às 5 horas da manhã, uma hora antes do horário habitual.

Era muitíssimo dedicada aos estudos, afinal precisava superar as adversidades para ficar em pé de igualdade com os demais. Esta trajetória, por óbvio, não foi solitária, meus pais, irmãos e irmãs, cunhados e cunhadas me apoiaram como puderam, me isentando dos trabalhos domésticos para que eu me concentrasse nos estudos, custeando o curso de inglês na Cultura Inglesa, se cotizando para pagar meus almoços nos dias de horário integral na escola, pagando livros, bilhetes de cinema, teatro, e sempre com muito carinho. Aliás, se tínhamos limitações financeiras sempre houve amor em profusão. Apesar das dificuldades tenho clareza que as minhas condições pessoais foram totalmente excepcionais e que se tivéssemos naquela época as políticas de ações afirmativas que temos hoje, como cotas em instituições públicas de nível superior, o Prouni e o FIES em universidades privadas de qualidade, muitas outras jovens poderiam ter trilhado este mesmo caminho.

Optei pelo Direito porque tinha o ideal da justiça social, muito influenciada pelo movimento católico da opção preferencial pelos pobres, compreendia que vivia em um país bastante iníquo e autoritário e, como muitos jovens o fazem até hoje, elegi um curso que me desse instrumentos de combater injustiças, ao tempo em que me assegurasse uma profissão da qual eu pudesse sobreviver com dignidade. Confesso que escolhi cursar Direito na Faculdade Nacional de Direito da UFRJ e não na Universidade do Estado do Rio de Janeiro por sua localização no centro do Rio de Janeiro, para a qual bastaria eu pegar uma única condução, o que, naquela época, representava mais conforto no meu cotidiano. Por cinco anos transitei pelo ecossistema do Terminal Rodoviário da Central do Brasil, sendo uma das espécies de sua fauna de ambulantes, prostitutas, rufiões, estudantes, operários, trabalhadores em geral, nas manhãs, tardes, noites e madrugadas. Aprendi como tantos outros o truque de sobreviver diariamente aos riscos de se viver em periferia.

Escolhi ingressar na Universidade no segundo semestre, preferindo me dedicar no primeiro semestre à preparação para o exame do Cambridge Proficiency Examination, cuja inscrição era, e ainda é, uma pequena fortuna[10], o que me foi de muita valia pois o domínio do inglês é ainda o calcanhar de Aquiles na formação de muitos jovens pobres estudiosos.

Aos 18 anos eu tinha consciência que a Universidade me descortinaria um novo mundo, cheio de possibilidades, mas associado a muitos riscos, como a vida sempre o é. Contudo, tinha plena consciência de que não poderia sucumbir aos inevitáveis cantos de sereia que podem nos desviar do curso em direção à Ítaca de cada um. Esta é uma diferença que ainda persiste nos dias de hoje, quem tem mais recursos econômicos pode errar e ter novas chances até se reerguer, aos demais não se permite a saída dos trilhos, não se permite falhas e reveses. E quem chega lá sabe disso. Assim, em cada oportunidade que se abre para uma jovem como eu, junto com o sentimento de alegria pela conquista sempre há o medo de não sermos capazes de cumprir a promessa.

Já na primeira semana de aula fiz duas importantes constatações. A primeira foi que a ditadura militar, que tinha chegado em seus estertores em 1985, ainda estava bem viva na Faculdade Nacional de Direito em 1986 nos discursos de alguns professores e alunos, na explícita terra arrasada em que se tornara aquela instituição de glorioso passado em virtude de expurgos de professores e alunos que resistiram ao autoritarismo, de contratação de profissionais sem o crivo do concurso público, os quais chamávamos de “janelados”, nos impactos do fechamento do Centro Acadêmico Cândido de Oliveira de 1969 a 1978[11], enfim, da longa ausência de um livre trânsito de ideias, tão fundamental em um ambiente acadêmico de qualidade. A segunda foi que havia um irresistível sopro de mudança no ar, que havia um grupo de professores e alunos que debatiam um novo projeto de país, que estavam antenados com os novos rumos para a universidade pública e gratuita, que discutiam autonomia universitária e indissociabilidade entre pesquisa, ensino e extensão, e que apesar das dificuldades no âmbito da Faculdade de Direito contavam com o apoio do inolvidável Horácio Macedo, primeiro reitor eleito da UFRJ.

O encontro com esse grupo de discentes, boa parte responsáveis pelo ressurgimento do Centro Acadêmico Cândido de Oliveira, e de professores[12], como as inesquecíveis Rosângela Lunardelli Cavallazi e Maria Guadalupe Piragibe da Fonseca, foi fundamental para manter a certeza de que todo o esforço valeria a pena.

Ter me iniciado no ensino, na pesquisa e na extensão na Faculdade Nacional de Direito da UFRJ em 1986, algo que ainda não acontece em muitos cursos de Direito nos dias de hoje, foi uma experiência arrebatadora que influenciou todo meu futuro trajeto profissional. Agradeço imensamente aos organizadores desta edição especial da Revista Eletrônica da OAB/RJ e à amiga e atual professora da FND/UFRJ Sayonara Grillo Coutinho pelo estímulo fundamental para que eu, dentro da minha louca rotina atual, pudesse reservar alguns momentos para reviver aqueles tempos e, sobretudo por poder agradecer a todos que me ajudaram nesta importante travessia.

2.0 Em meio ao caos da realidade: extensão, pesquisa e ensino vivenciados na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (1986 a 1989)

Não sei se foi bem assim, mas a minha lembrança é de que no fim de uma manhã marcada pelo medo de um professor de sociologia de voz tonitruante que nos lembrava o quanto éramos ignorantes, pelo constrangimento causado pelo professor de direito político que exigia palmas após seu discurso apoplético contra o “perigo amarelo” representado pela China, pelo estranhamento da aula de direito civil ministrada como se estivéssemos na Alemanha estudando o BGB[13], surge o colega Luís Cláudio dos Santos Branco, o querido Claudinho, com um discurso simpático e acolhedor nos convidando para conhecer o Setor de Extensão e Pesquisa da Faculdade. Foi como encontrar um oásis no deserto!

Em 1986 me engajei no SEP, coordenado pelas professoras Maria Guadalupe e Rosângela Cavallazzi, como voluntária principalmente nas atividades relacionadas ao Projeto “Conscientização de Direitos”, como demonstra este recadinho da professora Maria Guadalupe no ofício circular 04/87-SEP de 25 fevereiro de 1987.

De fato, o projeto era de toda a Universidade como se revela do Seminário de Extensão Universitária “Vamos Entrar nessa Maré” de 24 de setembro de 1986 e o logo do campus Maré.

É muito importante que se contextualize o que estava acontecendo na Universidade no período. O físico Horácio Macedo se tornara no ano anterior Reitor da Universidade e nunca conheci ninguém a quem o epíteto de “Magnífico” mais se amoldasse. Horácio Macedo tinha um projeto de tornar a nossa Universidade mais democrática, com mais qualidade acadêmica e mais próxima da sociedade, na linha do discutido pela ANDES desde 1982[14]. Sempre atendia os estudantes com carinho e paciência, compreendia as angústias dos professores e sobretudo queria que a Universidade estivesse aberta para os problemas da vizinha Favela da Maré do campus do Fundão. Por isso, a área de extensão era uma efetiva prioridade, extremamente bem conduzida pelo professor Moacir de Góes e pela professora Dulce Helena Chiaverini, verdadeiros parceiros do SEP da Faculdade de Direito, como atesta o evento “Direito vai Maré vem”, I Seminário Externo de Extensão da FND, realizado em junho de 1987 em nossa Faculdade com o apoio da Reitoria.

Ontem, e infelizmente ainda hoje, conforme meu discurso registrado pela amiga Sayonara no evento supramencionado, um dos desafios do projeto era a desmistificação da favela “símbolo de banditismo, violência, rebeldia aos padrões do bem viver”.

Na época a Reitoria teve que enfrentar importantes questões de segurança, pois já havia um intenso tráfico de drogas capitaneado por “Jorge Negão”[15], os problemas dele decorrentes e de seu obtuso combate. Muitos pais temeram pela segurança pessoal de seus filhos, inclusive os meus. Os coordenadores do projeto tinham certeza de que a Maré era maior do que isso. As diversas associações de moradores da área, os movimentos de saúde, sua imensa população trabalhadora a representavam muito mais. Por isso, com a criação de um protocolo não houve nenhum registro de incidentes.

O respeito mútuo entre Universidade e comunidade nos permitiu transitar de forma segura nas ruas e vielas do Complexo da Maré (o que infelizmente ainda não é uma realidade para seus próprios moradores) colocando seus problemas e angústias em nossos mapas.

É importante que se compreenda que a pesquisa e a extensão não eram a regra na atividade dos docentes e discentes deste período na FND. Por isso, com certeza se não houvesse o apoio da Reitoria muito pouco teria sido realizado.

Conforme previra a professora Guadalupe, em 1987 eu me tornei bolsista CNPQ dentro do Projeto “Conscientização de Direitos”. A bolsa do CNPQ foi a minha primeira remuneração estável por um trabalho intelectual[16]. A moeda do Brasil era o cruzado e eu acho que percebia Cz$ 350,00, o que imagino que seja correspondente ao valor atual da bolsa que é de R$ 400,00. Recordo-me da minha felicidade na fila do Banco do Brasil para sacar a bolsa que me permitiria comprar alguns livros, pagar a minha condução e contribuir nas contas dos bares, lanchonetes e pizzarias que frequentávamos, ou seja, era o meu caminho para a tão sonhada autonomia. Neste último quesito, até então era subsidiada pela generosidade dos meus colegas.

A política de assistência estudantil é fundamental para que os estudantes com menos recursos materiais possam viver a Academia em toda a sua plenitude, o que, inclui, por óbvio, as atividades sociais, sem que precisem se dedicar a trabalhos que os excluam do universo acadêmico, que não se limita apenas à sala de aula. Residência universitária para os alunos de fora da cidade, bolsas de apoio, de pesquisa, de extensão, subsídios para alimentação em bandejões são políticas públicas de educação que criam a ambiência necessária para que os processos de aquisição de conhecimento se desenvolvam e permitam que todas as potencialidades desabrochem.

A primeira fase do Projeto “Conscientização de Direitos” da qual participei foi realizada em conjunto com a Faculdade de Nutrição. Conforme demonstra a primeira página do questionário que aplicávamos na comunidade da Maré, perguntávamos às pessoas sobre seus problemas no dia-a-dia, de saúde e de alimentação.

Pela primeira vez ouvi falar em segurança alimentar e nos programas oficiais de redução de fome e compreendi a alimentação como um real fator condicionante da saúde. Essa perspectiva interdisciplinar também abrangia o próprio conhecimento jurídico, pois nosso questionário contemplava questões de Direito Constitucional (exercício de cidadania), Direito Civil (locação, propriedade e posse), acesso à justiça, Direito Trabalhista e de seguridade social, dentre outros. Ora, ser iniciado à vivência da interdisciplinaridade de forma tão natural foi realmente um grande ativo em minha formação.

Além da pesquisa que realizávamos, havia o Setor de Orientação e Assistência Jurídica no campus do Fundão, estruturado desde 1986 na Sub-Reitoria de Desenvolvimento e Extensão na qual atuavam os estagiários forenses (do 7º ao 10º período) com orientação de advogadas (Rosa Virgínia Cristhoforo de Carvalho, Francisca Alves de Sousa e Silvia Pessoa Fonseca de Andrade), prestando assessoria jurídica em alguns temas jurídicos (demandas coletivas, separação consensual e litigiosa, divórcio, posse e guarda de menores, tutela/curatela, interdição, questões trabalhistas, indenizações, partilhas, titulação de imóveis, contratos em geral, procurações, alvarás..), conforme cartilha de divulgação abaixo.

Assim, de um amplo projeto de pesquisa, iniciativas extensionistas eram agregadas a depender de cada instituto da Universidade. No nosso caso, o SOAJ era totalmente integrado à pesquisa, pois tínhamos reuniões conjuntas, quando debatíamos os casos mais relevantes e os dados de pesquisa que interessavam os atendimentos, participávamos das palestras à comunidade (por exemplo, a palestra sobre IPTU proferida em 22/11/1987).

Produzíamos conhecimento científico, como o artigo “Contribuição para a análise da questão fundiária em favelas – Parque Maré”, apresentado na Xª Jornada Interna de Iniciação Científica, realizada de 9 a 13 de novembro de 1987, em co-autoria por mim (3º período), Sayonara Grillo Coutinho (2º período) e Luís Cláudio dos Santos Branco (7º período).

Já no ano de 1988 os aspectos jurídicos da pesquisa foram ampliados e passamos a fazer um diagnóstico sócio-jurídico, agora apenas com alunos do Direito. Nosso questionário passou a ter 36 itens, dentre os quais o conhecimento e/ou participação em questões jurídicas.

O ensino também era privilegiado, pois muitos dos conceitos que debatíamos não eram aprendidos na sala de aula tradicional. Tivemos o privilégio de participar do curso de extensão “Introdução à metodologia da pesquisa no direito”, de 6 de abril a 20 de novembro de 1988, com a professora Jane Tereza Gonzaga de Oliveira, tendo como palestrantes os professores Carlos Alberto Plastino (PUC/RJ), Gisele Cittadino (PUC/RJ) e Luiz Alberto Warat (UFSC).

Em 1º de outubro de 1988 participamos do I Simpósio de Teoria Jurídica e Práticas Sociais do Projeto Conscientização dos Direitos, cujo programa era Direito e Justiça no final do século (Dogma e crítica no Direito, Dimensões simbólicas no Direito, O Espaço das novas relações jurídicas no Judiciário), Conscientização de direitos e transformação social (movimentos sociais e Direito, Estado e Direito, Direito e compromisso social) e Fórum de debates de extensão jurídica (Uma proposta de ensino, pesquisa e extensão).

Também participamos da XIª Jornada Interna de Iniciação Científica, de 7 a 11 de novembro de 1988, com o artigo “Anotações sobre assessoria jurídica e movimentos populares urbanos”, eu (já no 5º período), Sayonara Grillo Coutinho (4º período) e Ana Paula de Almeida Cavalcanti Ribeiro (4º período), sob orientação de Rosa Virgínia Cristhoforo de Carvalho, uma das advogadas do SOAJ.

Já nesta fase eu era supervisora dos bolsistas e como demonstram os registros das minhas atividades de maio e junho, já contávamos com a participação de vários estudantes além da Sayonara, Lucila, Leonardo, Gisele, Ercília, Márcia, Johnny, Anna Paula, Daniele, Márcia Markman, Marco Antônio, Márcia Fernandes, Severiano, Raquel, Marília e Rosane, que iam a campo fazer a coleta dos dados.

Contribuímos até mesmo para roteiro de vídeo sobre o projeto, que não me lembro se foi gravado.

Ainda em 1988 foi criado o Curso de Especialização em Teoria Jurídica e Práticas Sociais como resultado de uma nova metodologia de ensino .Foi um importante resultado do projeto pois ensejou a formação de futuros profissionais com a metodologia crítica do Direito.

Em 1989 as atividades do SEP foram assumidas pelo Núcleo Interdisciplinar de Direito e Sociedade – NIDS/CCJE, quando realizei o curso “Uma introdução crítica ao direito”, de abril a julho daquele ano, que consolidou, do ponto de vista acadêmico, muitos dos conhecimentos adquiridos até então e me permitiu alçar novos voos já na direção da minha profissionalização a partir do sétimo período, sem que jamais me afastasse das atividades acadêmicas que posteriormente vim a desempenhar também como docente.

Esses documentos, guardados com todo carinho, atestam que a FND da UFRJ esteve na vanguarda da concretização da indissociabilidade entre pesquisa, extensão e ensino. Tudo que hoje se considera como mais moderno em termos de ensino jurídico, especialmente quanto ao uso de metodologias ativas analógicas, como sala de aula invertida, aprendizagem por meio de problemas, mapas mentais, assim como o protagonismo estudantil, já existia em nosso projeto. Essa ação extensionista com ênfase na responsabilidade social da universidade se enquadra na atual concepção de clínica jurídica[17], que preconiza o aprendizado dos alunos a partir de solução de problemas reais de pessoas e comunidades, sempre sob supervisão acadêmica.

Ainda que o tempo tenha demonstrado a inventividade do Projeto Conscientização de Direitos, foi necessário arrostar muitas dificuldades e resistências no seio da FND. Também nós estagiários sabíamos que a mudança de paradigma seria muito árdua. Preparando meu relatório das atividades de 1988, afirmei[18]:

Por isso, agradeço a todos os esforços, os riscos e alguns efetivos prejuízos pessoais assumidos pelas professoras Maria Guadalupe, a quem carinhosamente chamávamos de “condessa” por sua elegância, e Rosangela Cavallazzi, que nos inspirava com sua juventude animada e divertido sotaque catarinense, que lideraram de forma destemida todo esse processo na nossa unidade, e reconheceram todo o potencial daqueles universitários para o aprendizado crítico e o compromisso social.

3.0 Sinergia de atividades acadêmicas, movimento estudantil e estágios sociais

O espírito da época também exerceu muita influência nos tempos da minha graduação. Afinal de contas, queríamos passar o Brasil a limpo, acabar com o entulho autoritário e participar do processo constituinte de 1987 que culminou com a advento da Constituição-cidadã em 1988. Como uma das vítimas da ditadura militar, a Faculdade de Direito da UFRJ estava bem desestruturada e seu processo de reerguimento foi capitaneado pelos estudantes por meio do glorioso Centro Acadêmico Cândido de Oliveira, que desde 1934 foi um importante ator no cenário dos movimentos sociais no Rio de Janeiro[19].

Muitos dos que participavam da pesquisa e da extensão também se dedicavam ao movimento estudantil que se posicionava em relação às novas eleições para Governador e Prefeito, questões de política externa, mas também sobre a necessidade de concurso público para novos professores, manutenção dos serviços do bandejão a preços módicos (por muito tempo minhas refeições foram exclusivamente no bandejão da Faculdade), obras de reforma e renovação do ensino dentre tantas outras questões. Liamos o “Direito Achado na Rua”, de José Geraldo de Souza Junior da UNB, a partir das ideias de Ricardo Lyra Filho, o projeto de Constituição “Muda Brasil” do professor Fábio Konder Comparto da USP e o anteprojeto da Comissão de Notáveis Afonso Arinos, discutíamos extensão e questões do processo constituinte quase que diariamente.

Por óbvio, também esse foi um importante espaço de aprendizagem. Eu participei de duas gestões do Centro Acadêmico, a gestão “Pró-seguir”, de 1988 a 1989, e a gestão “Mesmo que uns não queiram”, de 1989-1990, atuando principalmente no que era uma espécie de departamento responsável por questões de ensino. Íamos aos encontros regionais e nacionais de estudantes de Direito, que contavam com uma grande participação estudantil e com excelentes palestras de professores de todo o Brasil. Por exemplo, em 1987 participei do IX Encontro Nacional de Estudantes de Direito, realizado em Tramandaí no Rio Grande do Sul pelo CAAR, como delegada, e ativamente no curso sobre a nova escola Jurídica nos dias 19 e 20 de outubro.

Já em 1988 em junho (17 a 19 ) participamos do Encontro Regional de Estudantes de Direito, organizado pelo CALC, e sediamos o X Encontro Nacional dos Estudantes de Direito de 23 a 30 de julho na UFRJ.

Eram momentos de grande confraternização, intercâmbio de experiências e de ideias das mais diversas, o que nos permitia ter uma visão mais próxima da realidade de nosso país[20].

Exercíamos a nossa liberdade de manifestação sempre que possível em eventos a favor do ensino público, de reformas na Faculdade, contra nomeação de Diretor de Faculdade, em favor de concursos para a nossa instituição e tantas outras causas. Um dos momentos mais marcantes de nossas manifestações, era o Enterro do Golpe Militar, que ocorreu em três edições.

Vestíamo-nos de viúvas para retratar as mortes e as perdas sofridas, mas não esquecíamos a irreverência juvenil como quando vestimos galinhas de verde (ainda não éramos tão conscientes quanto aos maus-tratos aos animais) e as condecoramos em meio à distribuição de um bolo[21].

Também durante esse período, de 1987 a 1990, eu e Sayonara participamos do Estágio Nilson Marques da organização não governamental Apoio Jurídico Popular, indicadas pelo Setor de Pesquisa e Extensão da FND. O estágio tinha como propósito aprimorar a formação de profissionais para a assessoria jurídica a movimentos populares. Frequentávamos um curso regular para debater diversos temas jurídicos com especialistas como os inesquecíveis Miguel Lanzellotti Baldez, Miguel Pressburguer, João Batista Petersen, João Luiz Duboc Pinaud, e tantos outros. Participamos de eventos como Seminário “Corrente Jurídica Alternativa”, de 9 a 30 de novembro de 1987, e o Seminário Direitos dos Povos, em 29 de abril de 1988.

Neste estágio, atuamos em projetos específicos como o Projeto de Usucapião Coletivo na Favela Chácara do Céu, junto com o Centro de Defesa de Direitos Bento Rubião e o Instituto de Políticas Públicas da UFRJ, orientados pelo advogado e arquiteto Eduardo Guimarães, e a Oficina Jurídica Nilson Marques, quando fizemos trabalhos com a Federação dos Bairros de Duque de Caxias, Cooperativa de Mutirões Campo Alegre- Nova Iguaçu, Sindicato dos Servidores Municipais de Paracambi e o COTAC – Sindicato dos Engenheiros do Estado do Rio de Janeiro.

Além de todo o aprendizado, do desenvolvimento das habilidades escritas e orais e de atuação em grupo, que engrandeceram a minha formação, fiz amigos para a vida toda, que vinham de outras experiências acadêmicas e sociais como Francisco da Silva Teles, da Cândido Mendes, Eduardo Marcelo de Lima Salles, da SUAM, Dalton Coutinho Callado, da UERJ, e Vlademir Alexandrino da Silva Junior, também da FND/UFRJ.

Vivenciei, assim, uma verdadeira sinergia de múltiplas experiências no universo acadêmico: ensino, pesquisa, extensão, movimento estudantil e estágios sociais que conduziram ao que é considerado como excelência acadêmica.

4.0 Legado maior: acreditar na existência dourada do sol mesmo que em plena boca nos bata o açoite da noite

Adoro esses versos da canção de Aldir Blanc e João Bosco, de 1976, “O cavaleiro e os moinhos”, que, para mim, sintetizam o maior legado de toda minha experiência acadêmica: aprender que o esforço, a luta, a caminhada em si valem a pena quando se consegue sonhar.

Essas minhas memórias não pretenderam avaliar os impactos sociais e acadêmicos das iniciativas das quais participei para além das minhas próprias transformações. Mas a minha sensação, como uma otimista incorrigível que sou, é que esse movimento acadêmico contribuiu para avanços significativos no ensino jurídico. A Constituição de 1988, a melhor constituição possível para o Brasil ainda hoje, é o emblema das possibilidades desses câmbios positivos no país na seara jurídico.

Podemos citar de forma aleatória várias mudanças, que devem ser celebradas mesmo que haja muito a ser feito, que advieram desse período: o estudo da Constituição em todas as disciplinas de Direito Público e de Direito Privado, a relevância da gramática dos direitos fundamentais em todas as searas, com a ampliação para estudos de inclusão de gênero, raça, pessoas com deficiência, idosos, além das temáticas sociais mais clássicas, o debate acadêmico sobre o direito urbanístico e ambiental, a mudança da lógica da remoção de favelas para a de inclusão desse espaço na cidade com a revisão de institutos jurídicos específicos, a democratização de acesso ao nível superior pelas políticas afirmativas e toda a riqueza que essa diversidade aporta para as instituições, o desenvolvimento da pesquisa e da extensão nos cursos jurídicos dentro das práticas curriculares de graduação e de pós-graduação etc. Esse processo ainda está em curso e cabe às atuais e futuras gerações de professores e estudantes prosseguirem, continuarem acreditando que mesmo com interlúdios de sombras a existência dourada do sol se impõe.

Um dos critérios de avaliação de qualquer Universidade é a qualidade de seus egressos. Boa parte dos meus companheiros de academia são agentes de transformação em diversas esferas, no Poder Judiciário, no Ministério Público, na Defensoria Pública, na advocacia pública e privada, na docência, na comunicação social e na política.

Falando por mim, eu consigo identificar como aquisições diretas desse período da minha vida importante ativos como o raciocínio crítico, a resiliência e capacidade de adaptação, o foco nas diversas tarefas que se apresentam, um rico repertório de leituras e de vivências, e, sobretudo, uma responsabilidade em relação aos desvalidos, aos que não têm voz, aos que ainda no século XXI não podem desenvolver todas as suas potencialidades. Foi fundamental entender que jamais saberia tudo, que a humildade epistemológica é fundamental, mas esse período me fez crer que eu tinha as ferramentas para aprender.

Portanto, a Faculdade Nacional de Direito da UFRJ, agregada às minhas experiências educacionais anteriores, cumpriu o desiderato constitucional de ensejar “o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a cidadania e sua qualificação para o trabalho”, nos exatos termos do artigo 205 da Constituição Federal. Minhas futuras experiências profissionais e acadêmicas partiram desse marco inicial. Por isso, não tenho como agradecer a todos que permitiram esse processo, colegas, professores, com destaque para os moradores da Favela da Maré que tão bem nos acolheram, e à menina que eu fui que me tornou a mulher que ainda hoje, trinta anos depois, faz coro com o poeta: “E continuo acreditando na possibilidade do amor. Tenho a certeza do entendimento entre os seres humanos, logrado sobre o sofrimento, sobre o sangue e sobre os cristais quebrados”[22]. Dedico este texto a Marielle Franco, um cristal quebrado, que sempre nos recordará tudo o que a Maré pode ser.

Notas:

[1] Tomei por empréstimo a linda expressão da escritora e colega de Ministério Público Federal Paula Bajer Fernandes. Viagem sentimental ao Japão. SP: Apicuri Editora. 2013.

[2] Segundo se depreende dos dados do Censo do IBGE, bem como do texto do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP). Evolução do ensino superior: 1980-1998. Brasília, O Instituto, 1999.

[3] “Felicidade passei no vestibular, mas a Faculdade é particular …”

[4] Da canção “Apenas um rapaz latino-americano” do querido Belchior.

[5] Em 1991, quando me formei só havia 2,64% de sua população com nível superior e seu IDH era abaixo da média do país (0.49). Embora muitos desses índices tenham melhorado, este quadro ainda persiste hoje. Esses dados são acessíveis, inclusive com a série histórica desde 1991 em https://datapedia.info/cidade/2838/rj/duque-de-caxias, acesso em 03/10/2021.

[6] Dessa época me lembro com muita nitidez das minhas professoras do antigo primário as Tias Lucy, Sandra, Geisy (adorava ter o nome quase igual da professora!) e Sônia que estimularam o meu interesse pela escola.

[7] O direito de greve é o direito dos trabalhadores prejudicarem aqueles que se beneficiam com a exploração de seu trabalho. No caso dos professores de instituições públicas essa lógica não se aplica totalmente, pois os mais prejudicados são os estudantes, igualmente vítimas das inadequadas condições de trabalho dos professores. Não por acaso o maior intelectual brasileiro do século XX, Paulo Freire, afirmou: ‘É como profissionais idôneos – na competência que se organiza politicamente que está talvez a maior força dos educadores – que eles e elas devem ver-se a si mesmos e a si mesmas. É neste sentido que os órgãos de classe deveriam priorizar o empenho de formação permanente dos quadros do magistério como tarefa altamente política e repensar a eficácia das greves. A questão que se coloca, obviamente, não é parar de lutar mas, reconhecendo-se que a luta é uma categoria histórica, reinventar a forma também histórica de lutar” (Pedagogia da autonomia. Saberes Necessários à Prática Educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. p. 68). Sabemos que as greves dos professores do Estado do Rio de Janeiro dos fins de 1970 e início de 1980 foram importantes para a organização política da classe (para mais informações sobre esse assunto, vide SOBREIRA, Henrique Garcia. Alguns aspectos da reorganização dos professores públicos no Estado do Rio de Janeiro (1977-1980), Educação & Sociedade, ano XXII, n. 77, Dezembro 2001), todavia, como estudante a minha sensação era de extremo desamparo.

[8] Minha amiga de infância Conchita Cozzolino me ajudou neste momento. O professor Paulo de História cursava Direito e sempre conversávamos sobre isso.

[9]Já no segundo grau os professores que eu recordo são Herman de Matemática, Bértalo de Biologia, Altair de literatura, Carlos de química, Ricardo de Física e Geraldo de História.

[10] O valor da inscrição para a prova de dezembro é R$ 1.100,00, conforme previsto no site https://www.culturainglesa.com.br/lp/exame-certificado-cambridge.

[11] Conforme lembra o registro dos 90 anos do Caco: “Centro de resistência, o CACO e seus dirigentes foram perseguidos pela ditadura. Como reação à edição da Lei Suplicy de Lacerda, o movimento da Reforma recusa-se a disputar as eleições oficiais, criando o CACO-Livre, que acabou por receber mais apoio dos estudantes que o CACO oficial, dirigido por membros da Aliança Libertadora Acadêmica (ALA). A sucessivas suspensões, prisões e até tortura não intimidaram seus militantes, que tiveram papel de destaque em inúmeras manifestações contra o regime militar. Em 69, o ápice do endurecimento da ditadura não deixa o CACO passar incólume: é fechado definitivamente de 1969 a 1978”. Caco- Centro Acadêmico Cândido de Oliveira- 90 anos de História. Série Memorabilia. UFRJ: Rio de Janeiro, 2008.p. 162

[12] Professores como Gustavo Senechal, Nelson Massini, Luis Felipe Haddad, Edina, Castro Aguiar, Alaor, Gil e outros foram muito importantes para mim também e cada um, à sua maneira, representava essa mudança de ares.

[13] O Bugerliches Gezetzbuch (ou BGB) é o código civil da Alemanha de 1900.

[14] Conforme “Indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão: percursos de um princípio constitucional”. MACIEL, Alderlândia da Silva e Mazzilli, Sueli. Fonte: 33ª Reunião da ANPED, acessível em http://www.anped11.uerj.br/Indissociabilidade.pdf. 03/20/2021.

[15] “Jorge Negão” é retratado como um Chefe de Quadrilha, atuação diversa das futuras facções criminais do Rio de Janeiro conforme estudado por MATTOS, Carla dos Santos. Uma etnografia da expansão do crime no Rio de Janeiro. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 32, n. 91, p. 3.

[16] Dei aulas particulares de inglês e fiz “bicos” como animadora de festa infantil para ter alguma renda extra.

[17] As clínicas jurídicas foram pensadas pelos norte-americanos nos moldes das clínicas médicas vide FRANK, Jerome. Why not a clinical Lawyer School? University of Pennsylvannia Law Review, v. 81, n. 8, June 1933.

[18] “Outra dificuldade ainda não ultrapassada, o que na verdade só se dará a médio e longo prazo, é a volta à sala de aula, do conhecimento adquirido na favela e mesma a possibilidade de elaboração de críticas mais elaboradas no direito positivo. O que acontece é um grande sentimento de impotência por parte dos estagiários, sabemos que o conhecimento despejado na sala de aula não é verdadeiro não condiz com a realidade da maior parte da população brasileira, mas nos faltam as palavras, ou seja, o arsenal teórico suficiente para questionarmos com eficiência os professores. Além do mais essa volta está dependendo muito de cada indivíduo, o que não a torna efetiva e possível de atuar estruturalmente, pois fica dependendo das especificidades de cada pessoa”.

[19] Caco – Centro Acadêmico Cândido de Oliveira – 90 anos de História. Série Memorabilia. UFRJ: Rio de Janeiro, 2008. Conforme muito bem lembrado pelo colega José Fernandes Junior: “(…) o Centro Acadêmico fazia praticamente tudo na faculdade: cuidávamos da manutenção do prédio, limpeza, problemas da biblioteca como reposição de livros, fornecimento de xerox, além de acompanhar cada etapa da reforma do prédio desde o projeto até a licitação.” (p. 282).

[20] Também havia os mais festivos Jogos Jurídicos Nacionais, e me lembro de ter participado da edição de 1988, quando nos sagramos campeãs no futebol de salão derrotando as poderosas equipes da PUC/SP e da USP, que já tinham atlética naquela época. Não me lembro de ter participado de um treino sequer, mas o Claudinho, nosso técnico, só tinha uma orientação “passa para a Natasha” e a nossa craque, de saudosa memória, convertia.

[21] Caco – Centro Acadêmico Cândido de Oliveira- 90 anos de História. Série Memorabilia. UFRJ: Rio de Janeiro, 2008. José Fernandes Júnior, uma das lideranças estudantis mais queridas e divertidas da época, não me deixa mentir: “Houve um ano em que não havia muita mobilização e ficamos em dúvida se iríamos conseguir fazer a manifestação. Ligaram do Jornal do Brasil querendo saber se íamos fazer alguma coisa. Eu falei para Geisa, que hoje é Procuradora da República, avisar que iríamos fazer a primeira revoada de galinhas. Fui chamado ao Comando Militar do Leste, ao gabinete do Secretário de Justiça, na época era o Hélio Sabóia, que me disse que não devíamos fazer o ato. No dia do enterro, ao chegar à faculdade, encontramos a imprensa, esperando o ato. Como o CACO tinha finanças, peguei o táxi junto com o André Vilaron, fomos até São Cristovão, e enchemos o porta-malas de galinhas, enquanto a Geisa chamava a bateria-mirim da Vila Isabel e algumas alunas iam ao Saara comprar tecido verde-oliva e anilina verde. Vestimos as galinhas de túnicas verde-oliva com medalhinhas e pintamos todas as penas, perfeitamente fardadas. Fizemos, também, um bolo enorme em forma de caixão. Quando o Exército chegou soltamos as galinhas e começamos a distribuir pedaços de bolo aos populares. Esse evento saiu na capa do Pasquim com a seguinte manchete: “No dia do golpe generais emerdalhados” (p. 283).

[22] NERUDA, Pablo. Confesso que vivi: memórias. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2019, p.324.

Palavras Chaves

Ensino, pesquisa, extensão, “Projeto conscientização de direitos”, memórias da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ.