A PRESTAÇÃO DE CONTAS ENQUANTO UM PROCEDIMENTO OBRIGATÓRIO A SER ADOTADO POR TODOS OS ADVOGADOS

  

Resumo

Abordaremos neste artigo a responsabilidade de prestação de contas pelo Advogado ao Cliente à Luz do Direito, como Princípio de Integridade, não somente como uma questão ética, mas também como exigência legal, devendo agir de acordo com a Lei 8.906/94 - denominada Estatuto da Advocacia e da OAB (EAOAB), e de acordo com o que preceitua a Resolução nº 02/2015 - Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil (CEDOAB).

Artigo

Conforme preceitua o Código de Ética e Disciplina da OAB, é indispensável ao Advogado o dever de atuar com honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé, exercendo sua atividade advocatícia com indispensável senso profissional e zelando pela sua reputação pessoal e profissional.

Da mesma forma, o Estatuto da Advocacia e da OAB, dispõe em seu art. 31, que: O advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia.

Não devem os Advogados permitir que o anseio de ganho material sobreleve à finalidade social do seu trabalho, a fim de tornar-se merecedor da confiança do cliente e da sociedade como um todo. (CEDOAB).

Dá-se início à relação advogado-cliente, mediante Contrato e, de acordo com a orientação prevista no art. 48 do CEDOAB: A prestação de serviços profissionais por advogado, individualmente ou integrado em sociedades, será contratada, preferentemente, por escrito.

O Contrato de Honorários Advocatícios deverá ser redigido de forma clara, contendo explicitamente: o objeto; honorários e forma de pagamento; despesas extras inerentes ao processo; serviços de terceiros, como perícia técnica; a responsabilidade do pagamento das custas judiciais e, ônus de sucumbência, informando ao cliente seu significado e a diferença entre os honorários contratuais e os sucumbenciais.

Em conformidade com o Art. 22 do EAOAB:  A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência.

Em seu Art. 23 do EAOAB, dispõe que:

Art. 23 - Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor.

A fim de não pairar dúvidas ao cliente quanto ao recebimento destes valores, deverá o Advogado informá-lo que, dependendo do resultado da causa, é obrigação do cliente arcar com este custo de acordo com o Art. 85 do NCPC que dispõe:

Art. 85 - A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor, informando também que a retenção deste tipo de honorários é uma permissão legal, podendo ser separados e devidamente descontados do valor repassado a ele.

No tangente ao desconto dos honorários ou  à compensação de créditos, dispõe o art. 48, §2º do CEDOAB, que:

Art. 48 (...)

  • 2º - A compensação de créditos, pelo advogado, de importâncias devidas ao cliente, somente será admissível quando o contrato de prestação de serviços a autorizar ou quando houver autorização especial do cliente para esse fim, por este firmada,

 O que significa que somente poderá ser feita com prévia autorização do cliente ou previsão contratual, por isso a importância de formalização contratual por escrito.

É através do Mandato que o cliente confere ao Advogado o poder de representá-lo judicial ou extrajudicialmente e agir em seu nome, conferindo a ele o direito de percepção de valores e indenizações ganhos em Sentença, ou através de acordos firmados, conforme preceitua o Art. 653 do Código Civil:  Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato.

Nesta ceara, de acordo com o art. 668 do CPC, "o mandatário é obrigado a dar contas de sua administração, qualquer que tenha sido o modo de constituição do mandato".

As relações entre advogado e cliente baseiam-se na confiança recíproca (Art. 10 do CEDOAB).

Havendo suspeita de má fé ou sinais de irregularidades com os valores relacionados ao cliente, poderá o mandato outorgado ao Advogado ser suspenso ou até encerado.

Considerado como um tema relevante e bastante complexo, a prestação de contas tem uma relação bastante significativa no trato profissional entre o Advogado-cliente. É inerente ao exercício da advocacia lidar com valores que pertencem aos seus contratantes, podendo ser da percepção dos honorários advocatícios, recebimentos de indenizações, pagamento de custas processuais, honorários de peritos e demais despesas relativas aos processos como viagens, fotocópias, ligações internacionais, dentre outras.

Conforme dispõe o artigo 12, do Código de Ética e Disciplina da OAB, recai sobre o advogado a obrigação de prestar-lhe contas, pormenorizadamente, sem prejuízo de esclarecimentos complementares que se mostrem pertinentes e necessários.

A Prestação de Contas poderá ocorrer, a qualquer momento, por solicitação do cliente por dúvidas sobre os valores cobrados; no caso de serviços que não foram devidamente esclarecidos ou na existência de valores indenizatórios estipulados em sentença judicial. Poderão ocorrer outras formas como: a prestação espontânea, quando o advogado, de forma proativa, fornece ao cliente um relatório detalhado das despesas, dos valores recebidos e dos serviços prestados; a Prestação de Contas Administrativa, quando através de representação junto ao Tribunal de Ética e Disciplina da OAB e, a Prestação Judicial, que ocorre quando o cliente recorre ao Poder Judiciário para exigir a prestação de contas ao Advogado.

A Prestação de Contas tem como Natureza Jurídica, o dever da transparência e, o cumprimento desta obrigação além de fortalecer a reputação e a credibilidade do Advogado, garante a segurança financeira do cliente.

Tais prestações deverão ser fornecidas, de forma detalhada e de fácil compreensão, de todos os serviços prestados, devidamente especificadas as atividades realizadas, tais como as descrições das despesas como as de deslocamentos, custas judiciais, fotocópias e outras.

Constitui também dever do Advogado, a mantença e a guarda de documentos, assim como os comprovantes de seus honorários de despesas, a fim de justificá-los, quando solicitado.

No caso de recebimento de indenização em nome do cliente, deve o Advogado repassá-lo o mais breve possível, descontando apenas o que for devido a título de honorários, conforme previamente ajustado em Cláusula Contratual. Como consequência da falta de prestação de contas, o Advogado poderá sofrer sanções rigorosas.

Uma ação judicial por parte dos clientes, exigindo a apresentação de todos os documentos com as devidas justificativas dos gastos, valores recebidos e dos serviços prestados, poderá gerar consequências negativas em sua imagem profissional.

Com a comprovação de que o Advogado causou prejuízo ao seu cliente, seja pela retenção indevida de valores ou pela má administração desses recursos, ele poderá ser condenado a reparar os danos materiais, e se for o caso, responderá, também, pelos danos morais causados.

Caso o Advogado receba quantias em nome do cliente, como indenizações, retendo em seu poder, não repassando ou prestando contas desses valores de forma correta, sem a prestação de contas e sem qualquer justificativa legal poderá, também, configurar o crime previsto no art. 168, do Código Penal de Apropriação Indébita, cuja pena é de reclusão de 01 a 04 anos, além de multa.

Além das possiblidades de sofrer uma Ação Cível e Penal, a falta de prestação de contas por violar preceito do Código de Ética e Disciplina da OAB, o Advogado poderá ser denunciado à OAB, resultando na abertura de um Processo Ético-disciplinar. As sanções aplicáveis pela OAB incluem advertência, suspensão temporária do exercício profissional ou, em casos mais graves, até mesmo a exclusão dos quadros da OAB, impedindo o advogado de exercer a profissão.

De acordo com o Art. 34, incisos XX e XI do EAOAB:

Art. 34 - Constitui infração disciplinar:

(...)

XX - Locupletar-se, por qualquer forma, à custa do cliente ou da parte adversa, por si ou interposta pessoa;

XXI -Recusar-se, injustificadamente, a prestar contas ao cliente de quantias recebidas dele ou de terceiros por conta dele.

Entende-se por Locupletamento, o ato de enriquecer-se injustamente às custas de outra pessoa ou de um patrimônio alheio, ocorrendo quando se obtém uma vantagem econômica ou qualquer benefício sem a devida justificativa legal, prejudicando outrem. Está associado à ideia de "enriquecimento ilícito ou sem causa", um princípio que impede que alguém obtenha ganhos indevidos sem dar algo em troca ou sem uma justificativa válida.

Sendo a confiança um dos pilares fundamentais dessa relação, a falta de transparência poderá manchar a imagem e reputação do Advogado no mercado jurídico. Com a perda da credibilidade, o resultado certamente será a perda e dificuldade de atrair clientes, resultando em grandes prejuízos financeiros.

Além de ter sua reputação profissional prejudicada, caso o cliente ingresse com uma Ação de Prestação de Contas e o Juiz, em decisão judicial julgar a favor do cliente, o Advogado será obrigado a prestar as contas, e caso não o faça com os valores devidos já determinados, poderá em fase de execução de sentença, ter seus recursos penhorados com seus bens e contas bancárias bloqueadas.

A condenação do Advogado em uma Ação de Prestação de contas, além dos valores devidos, deverá arcar com o pagamento de multas, custas processuais, ônus de sucumbência, e eventualmente, o pagamento de honorários advocatícios ao Advogado da outra parte.

Caso faça parte de um escritório de advocacia ou de uma sociedade, a responsabilidade pela má conduta do Advogado recairá aos demais sócios e/ao escritório como um todo, que  responderão de forma solidária, estendendo as sanções a todos os membros, vindo a prejudicá-los não só financeiramente, quanto à imagem reputacional.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), exerce um papel importante e fundamental na fiscalização quanto às condutas éticas do Advogados. Caso o cliente se sinta prejudicado, poderá ingressar com uma representação ética-disciplinar contra seu Advogado junto ao Tribunal de Ética e Disciplina da OAB (TEDOAB).

Como dito anteriormente, em conformidade com o EAOAB, a falta de prestação de contas é considerada uma infração ética grave, e o não cumprimento, poderá resultar em dever de prestá-las de forma clara e detalhadas aos seus clientes, de forma tempestiva, devolvendo os valores corrigidos monetariamente além de sofrer sanções disciplinares.

O procedimento de apuração das irregularidades ou violação legal cometidas por Advogados se instaurará de ofício junto à OAB, ou seja, independente da representação pelo cliente prejudicado ou seu representante legal, e a sua atuação ocorrerá quando a Instituição tomar conhecimento do fato por fonte devidamente identificada e idônea, agindo por sua própria conta, conforme estabelece o art. 55 do EAOAB:

Art. 55. O processo disciplinar instaura-se de ofício ou mediante representação do interessado.

  • 1º A instauração, de ofício, do processo disciplinar dar-se-á em                                      função do conhecimento do fato, quando obtido por meio de fonte                                      idônea ou em virtude de comunicação da autoridade competente;
  • 2º Não se considera fonte idônea a que consistir em denúncia                                     anônima.

A representação deverá ser formulada ao Presidente do Conselho Seccional ou ao Presidente da Subseção, por escrito ou verbalmente, devendo, neste último caso, ser reduzida a termo (art. 56), ou seja, deverão os fatos serem expostos por escrito a fim de registrar sua denúncia de forma oficial e formal.

No caso das Seccionais cujos Regimentos Internos atribuírem competência ao Tribunal de Ética e Disciplina para instaurar o processo ético disciplinar, a representação poderá ser dirigida ao seu Presidente ou será a este encaminhada por qualquer dos dirigentes referidos no caput deste artigo que a houver recebido. (§ único do art. 56).

Em muitos casos, a não observâncias dos procedimentos e formalidades que devem estar contidas no pedido inicial, prejudica a análise do caso de forma justa.

Desta forma, estabelece o EAOAB, em seu art.57:

Art. 57. A representação deverá conter:

I – a identificação do representante, com a sua qualificação civil e endereço;

II - a narração dos fatos que a motivam, de forma que permita verificar a existência, em tese, de infração disciplinar;

III - os documentos que eventualmente a instruam e a indicação de outras provas a ser produzidas, bem como, se for o caso, o rol de testemunhas, até o máximo de cinco;

 IV - a assinatura do representante ou a certificação de quem a tomou por termo, na impossibilidade de obtê-la.

Após recebida a denúncia, formalmente redigida, contendo os fatos, documentos comprobatórios e testemunhas, se houver, caberá ao relator responsável a determinação de instauração do processo ou seu arquivamento.

Recebida a denúncia, o processo disciplinar seguirá seu curso previsto nos arts. 58 a 69 do Código de Ética e Disciplina da OAB.

Além de sofrer a penalidade de Censura, que ocorre quando o Advogado devidamente notificado para apresentar a Prestação de Contas, e o mesmo não o fizer dentro do prazo  estabelecido, determinação emanada do órgão ou de autoridade da Ordem, em matéria da competência desta(...).(art.35, I do CEDOAB), poderá ser suspenso de advogar ou realizar qualquer ato privativo da profissão em todo o território nacional pelo prazo de 30 dias até 12 meses, ou no caso de reincidência, ser excluído dos quadros da OAB perdendo o direito de exercer a advocacia.

Na ocorrência de apropriação indevida de valores dos clientes, a suspensão perdurará até que satisfaça integralmente a dívida, inclusive com correção monetária.(art. 35, §2º do CEDOAB).

O prazo para se ingressar com uma ação judicial ou uma representação junto à OAB para solicitação de prestação de contas e reaver quantias recebidas ou acauteladas pelos Advogados de acordo com o art. 25-A e 43, do EAOAB é de 05 (cinco) anos, contados da data da constatação oficial do fato.

De acordo com o Código Civil Brasileiro (art. 206, IV), a prescrição da ação de prestação de contas é de 03 (três) anos, no caso de haver a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa (art. 34, XX do EAOAB).

CONCLUSÃO:

A Prestação de Contas é uma obrigação do Advogado e um direito de seus Clientes. Atuar com transparência, integridade e ética é fundamental para a relação cliente-advogado e para a boa reputação dos profissionais do Direito. A falta da prestação de contas poderá trazer consequências severas no âmbito cível, penal e administrativo, e em caso extremo, a perda do direito de advogar em todo o território nacional. Manter os clientes sempre informados sobre os honorários pagos e devidos, indenizações recebidas, despesas efetuadas, evita litígio, danos financeiros e reputacional. Manter a reputação pessoal e profissional é indispensável para o exercício da atividade advocatícia.

REFERÊNCIAS:

 - Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil – Lei nº 8.906/96.

- Código de Ética e Disciplina da OAB - Resolução nº 02/2015.

- Código de Processo Civil -  Lei nº 5.896/73.

- Código Civil – Lei nº  10.406/2002.

- www.chaptgtp.com.br.

-  www.migalhas.com.br/depeso/331007/da-prestacao-de-contas-do-advogado-ao-cliente.

- https://direitodesenhado.com.br/hon.

Palavras Chaves

PRESTAÇÃO DE CONTAS; HONORÁRIOS CONTRATUAIS; LOCUPLETAMENTO.