A CRISE DO SISTEMA PARTIDÁRIO BRASILEIRO

Resumo

O sistema democrático contemporâneo é uma conquista decorrente do avanço das sociedades em suas realidades jurídicas, sociais e políticas. Para garantir a estabilidade das democracias é indispensável uma organização da autoridade popular pela construção de um desenho organizacional composto por instituições sólidas detentoras de conexão contínua com o povo fora dos períodos de sufrágios. O que se vive, no entanto é a ineficiência das instituições partidárias em suas funções representativas. Analisa-se a problemática e procuram-se alternativas para sua resolução.

Artigo

A CRISE DO SISTEMA PARTIDÁRIO BRASILEIRO

Weslley Tuão Vicente

RESUMO

O sistema democrático contemporâneo é uma conquista decorrente do avanço das sociedades em suas realidades jurídicas, sociais e políticas. Para garantir a estabilidade das democracias é indispensável uma organização da autoridade popular pela construção de um desenho organizacional composto por instituições sólidas detentoras de conexão contínua com o povo fora dos períodos de sufrágios. O que se vive, no entanto é a ineficiência das instituições partidárias em suas funções representativas. Analisa-se a problemática e procuram-se alternativas para sua resolução.

PALAVRAS-CHAVE

Partidos. Sistema Partidário. Democracia. Instituições. Representatividade

SUMÁRIO

I-Aspectos Gerais. II- Crise de Representatividade. III- Reflexos no desempenho eleitoral dos escrutínios de 2018. IV- Outros obstáculos da lide política. V – Urgências.

I-Aspectos Gerais

O sistema democrático contemporâneo é uma conquista decorrente do avanço das sociedades em suas realidades jurídicas, sociais e políticas. O modelo democrático representativo vigente é uma forma segura e racional de garantir a expressão dos anseios do Povo, servir como estrutura da organização social e delimitar o Poder, tendo como característica marcante a soberania popular e a transição periódica dos governos constituídos tendo como fim o estabelecimento do bem comum acima das ambições de grupos ou indivíduos específicos.

Os modelos Estatais Constitucionais contemporâneos possuem objetivos elevados para o Estado de Direito, elucidados por Luís Roberto Barroso (2016, p.115):

Institucionalizar um Estado democrático de direito, fundado na soberania popular e na limitação do poder;  1 assegurar o respeito aos direitos fundamentais, inclusive e especialmente os das minorias políticas; contribuir para o desenvolvimento econômico e para a justiça social; Prover mecanismos que garantam a boa administração, com racionalidade e transparência nos processos de tomada de decisão, de modo a propiciar governos eficientes e probos.2

Para garantir a preservação, integridade e estabilidade das Democracias é indispensável uma organização da autoridade popular pela construção de um desenho organizacional composto por instituições sólidas e legítimas detentoras de conexão contínua das exigências do povo com os atos dos seus representantes mesmo fora dos períodos de sufrágios.

Dentro desta seara institucional se encontram os partidos políticos, expressão da centralização das demandas sociais para a representação de pautas, do qual a função é a de oxigenar a pauta política. Roberto de Oliveira Campos ensina que “Nada substitui o partido político na tríplice função de condensar aspirações, formar lealdades ao sistema, disciplinar o protesto e rotinizar a substituição de lideranças.”3

Perceptível se torna a ineficiência prática da realização desta conexão na realidade hodierna da política brasileira. Os partidos políticos se descolaram de

1 Grifo meu.

2 Adaptado de Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 5ª edição, 3ª Tiragem, São Paulo, 2016, Editora Saraiva, Página 115.

3 SOUZA, Maria do Carmo Campello de. Estado e Partidos Políticos no Brasil (1930 a 1964). 3ª edição. São Paulo, 1990, Editora Alfa-Omega. Página 21.

sua função representativa se afastando das evoluções sociais. As agremiações tornaram-se, em parte, instrumentos de poder dos caciques políticos ou instrumentos fisiológicos de trocas espúrias.

As eleições de 2018 apresentaram, no entanto, a resposta popular aos fenômenos acima elencados. Em meio a uma intensa crise política partidos tradicionais e fortes com relevância desde a redemocratização e detentores grande força no ditame da lide governamental acabaram por perder assentos, políticos de grande relevância não foram reeleitos e partidos com influência menor acabaram por conquistar um aumento no número de cadeiras nos Parlamentos.

II- Crise de Representatividade

Os movimentos políticos e sociais brasileiros têm sido influenciados pelos noticiários que, diuturnamente, revelam desdobramentos de operações policiais envolvendo os mais altos atores dos Poderes da República, fruto de procedimentos como a Lava-jato, que descobriu esquemas de corrupção envolvendo Partidos Tradicionais (como PT, PMDB e PP), empreiteiras (como a Camargo Corrêa, OAS e Odebrecht) e empresas estatais (como a Petrobrás).

Esta realidade de comportamento criminoso sistemático teve como fruto o aprofundamento do descrédito por parte da população com relação às instituições de representação e de seus agentes por expor um perfil patrimonialista dos Partidos Políticos, que se utilizam das estruturas estatais para atender desejos pessoais.

Some-se à problemática o funcionamento que os institutos da vida política têm traçado, com aquisição de um caráter corporativista e oligarca.

Mesmo no funcionamento do Congresso Nacional os partidos políticos têm perdido sua relevância de atuação por conta da atomização de seus contingentes. Para a obtenção de maiorias parlamentares o Poder Executivo se vê em um campo minado cercado por dezenas de interesses conflitantes.

Estes interesses são ainda mais conflitantes devido à situação de fragmentação partidária, propiciada pelo sistema eleitoral brasileiro que não é composto por regras rígidas direcionadas a impedir a multiplicação de siglas.

Esta realidade acaba por insuflar as condutas corruptas para sustentar as dinâmicas políticas do presidencialismo de coalizão instituído, conforme ensina Luís Roberto Barroso:

“A gestão da coalizão se torna complexa e onerosa, exigindo a composição de múltiplos interesses, frequentemente contraditórios. Sem surpresa, a instabilidade se torna a marca das coalizões de governo no Brasil.”4

A situação da pulverização partidária é tão drástica que os governos por vezes têm realizado negociações não mais com os partidos, mas com as bancadas parlamentares.

A criação de partidos apelidados de “nanicos” ou “fisiológicos” por sua composição pequena e inexpressividade ideológica está intimamente ligada às previsões de acesso ao fundo partidário e à propaganda gratuita de rádio e televisão e em nada somam para a construção do debate político.

A multiplicação de siglas não possui caráter de representação ideológica do eleitorado brasileiro. Pelo contrário, dificulta a formação de agrupamentos partidários coerentes, harmoniosos, ideológicos e unidos. As agremiações, em muitos casos, perderam o sentido de identificar uma demanda social e são desmunidos de programas de governo ou projetos sofisticados para oferecer ao eleitorado. O sistema eleitoral vigente acaba por tonificar a construção de estruturas não mais entorno de ideias, mas de indivíduos carismáticos capazes de conquistar votos pela sua atratividade popular.

Esta realidade de atomização do número e tamanho de partidos dificulta a negociação de apoios firmados pelo Poder Executivo com as siglas do Poder Legislativo em busca de apoio às pautas e construção de governabilidade, abrindo margem para favorecimentos que corroboram para a prática de corrupção por meio da distribuição de ministérios, funções em empresas públicas, cargos em autarquias, ou outras bonificações.

Quando o chefe de governo não tem habilidade política à ponto de formar maioria sólida no Congresso Nacional o resultado prático é a construção de uma

4 BARROSO, Luís Roberto. A reforma política: uma proposta de sistema de governo, eleitoral e partidário para o Brasil. Revista de direito do Estado: RDE, n.3, p.287-360, jul./set., 2006.

situação de ingovernabilidade e fragilidade institucional, sujeitando o Poder Executivo Federal a um total isolamento, o que gera incapacidade de implementação de medidas políticas;

Nos quadros internos os partidos têm se enfraquecido e perdido a coesão de seus membros já que suas manobras são frequentemente ditadas pelos “caciques” sem a menor participação dos filiados, gerando uma quebra do processo de expressão das correntes partidárias. Exemplo disso é a quase inexistência da realização de prévias nos processos de decisão dos candidatos aos pleitos eleitorais.

Na esfera social a situação é igualmente danosa. Os Partidos não possuem capacidade de engajamento social, que têm sido realizado por movimentos sociais e grupos de pressão. A falta de capilaridade popular é resultado também da não assimilação dos novos fluxos e tendências por parte das ligas partidárias como as redes sociais (A utilização das redes sociais tornou-se foco central das campanhas e requisito fundamental para o sucesso eleitoral. As redes sociais tornaram-se termômetro das oscilações comportamentais da população e são acompanhadas persistentemente pelas mídias jornalísticas, pelos partidos e por pesquisadores.) 5e utilização de ferramentas virtuais como uso de portfólios e websites.

Esta configuração parece indicar um desequilíbrio do Sistema Partidário já que, as agremiações não são mais capazes de ordenar as sustentações eleitorais, executar políticas, realizar pressão popular e governamental, articular a organização interna, mobilizar os membros, representar os movimentos da sociedade ou exercer influências.

III-   Reflexos no desempenho eleitoral dos escrutínios de 20186

O Estado em que se encontra o Sistema Partidário acarretou efeitos no desempenho dos próprios partidos nas urnas, bem como no desempenho de agentes importantes na política brasileira.

5 Relatório completo do uso das redes sociais nas Eleições de 2018: “Policy Paper 1. Redes Sociais nas Eleições 2019.” Sala de Democracia Digital. FGV DAPP, Rio de Janeiro, 05/10/2018.

6 Os cálculos feitos nesta seção são baseados nos dados disponíveis em http://divulga.tse.jus.br/. Acesso em 20/10/2018

A composição partidária da Câmara dos Deputados teve aumento, o número de partidos com representação na Casa Legislativa saltou de 25 em 2018 para 30, na composição de 2019. No Senado Federal o número de partidos passou de 15, da composição de 2015, para 21, na composição de 2019.

Na tabela abaixo é exposta a evolução das composições dos 4 maiores partidos com representação na Câmara dos Deputados em 2018 e do PSL (sigla que obteve aumento mais expressivo do número de cadeiras conquistadas) na própria Câmara Federal, no Senado e nas Assembleias Legislativas.

   

Câmara dos Deputados

 

Senado Federal

 

Assembleias Legislativas

Anterior às eleições de 2018 Composiçã o eleita em 2018 Anterior às eleições de 2018 Composiçã o eleita em 2018 Anterior às eleições de 2018 Composiçã o eleita em 2018
 

MDB

 

51

 

34

 

19

 

12

 

142

 

93

 

PSDB

 

49

 

29

 

11

 

8

 

86

 

67

 

PT

 

61

 

56

 

13

 

6

 

91

 

71

 

PP

 

50

 

37

 

5

 

6

 

41

 

62

 

DEM

 

43

 

29

 

5

 

6

 

15

 

50

 

PSL

 

8

 

59

 

0

 

4

 

15

 

63

Partidos Proeminentes e tradicionais desde a redemocratização tiveram suas bancadas reduzidas. O MDB, que teve influência nas relações políticas de todos os governos desde a redemocratização, teve sua bancada diminuída em ambas as casas do Congresso Nacional e na composição das Assembleias Legislativas.

O PSDB também encolheu. É importante destacar o derretimento da Bancada em São Paulo, reduto eleitoral do partido, que se encolheu de 22 para 8.

Já o PSL na ordem inversa dos resultados tradicionais ampliou o seu contingente vertiginosamente tanto a nível Federal quanto Estadual. O Partido que quebrou a proeminência da liderança de PT e PSDB nas Eleições Presidenciais dos

últimos 6 pleitos, aumentou notoriamente sua bancada em ambas as casas do Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas, crescendo notoriamente no Estado do Rio de Janeiro, atingindo 14 cadeiras onde antes tinha apenas 2 e no Estado de São Paulo passando de 1 para 15 parlamentares e superando o número de eleitos pelo PSDB, liderança tradicional no Estado.

O sucesso do Partido que parece contrariar uma tendência de atrofiamento das agremiações pode ser explicado entre outros fatores pela influência gerada pelo candidato à Presidência da República pelo partido, Jair Bolsonaro, que atraiu um contingente expressivo de votos, num efeito próximo do exercido pelo Candidato Fernando Collor sobre o PRN e pela penetração hábil nas redes sociais, não explorada tão profundamente por partidos mais tradicionais.

Alguns Partidos menores encolheram ainda mais, como a Rede Sustentabilidade que possuía 2 deputados e agora apenas 1 na câmara federal, enquanto Partidos que começam a figurar no cenário político como o Partido NOVO aumentaram as suas representações, que formou sua primeira bancada na Câmara dos Deputados elegendo 8 parlamentares.

A renovação dos eleitos para a Câmara dos Deputados superou a metade das vagas e apenas 8 dos 54 senadores que tomarão posse em 2019 são candidatos reeleitos.7

Grandes figuras da política nacional não conquistaram cadeiras, como os atuais presidente e vice-presidente do Senado Federal, Eunício Oliveira (MDB) e Cássio Cunha Lima (PSDB) e os Senadores influentes Lindbergh Farias (PT), Roberto Requião (MDB), Renan Calheiros (MDB), Garibaldi Alves (MDB), Edson Lobão (MDB), Marconi Perillo (PSDB), Beto Richa (PSDB) e a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), entre outros.

Esta panorama parece retratar a situação dos Partidos Políticos junto à população brasileira atual. Os Partidos Políticos tradicionais parecem não saber se posicionar nas novas dinâmicas sociais, se atrofiando dentro das próprias máquinas partidárias sem exercer influências relevantes nas mídias e nas redes sociais e sem

7 Para mais informações https://www.bbc.com/portuguese/brasil-45780660. Acesso em 20/10/2018

permitir exercícios democráticos dentro das próprias agremiações. Um grande atributo que influiu a decisão dos eleitores no último pleito foi o envolvimento dos candidatos e partidos em casos de corrupção.

Na ordem inversa começam a despontar alguns partidos que parecem entender melhor as dinâmicas contemporâneas se abrindo a movimentos mais representativos dos filiados, atraindo figuras que despertam carisma ou entendendo melhor as dinâmicas das novas tecnologias.

Os eleitores decidiram, ainda, optar por novos representantes na esperança de mudanças positivas das pautas e decisões governamentais, rejeitando os políticos tradicionais e a própria política tradicional.

IV-   Outros obstáculos da lide política

O desenho institucional adotado pela Constituição da República Federativa do Brasil em 1988 embora portador de grandes avanços em relação aos ditames arbitrários do Regime Militar e das constituições anteriores que vigoraram na Nação traz consigo grandes problemas advindos dos desdobramentos políticos da Assembleia Nacional Constituinte.8

O Regime Político e as relações estabelecidas entre os Poderes Executivo e Legislativo haviam sido construídas para a implementação de um sistema parlamentarista. Quando a proposta de aprovação do Parlamentarismo estava para ser aprovada em plenário, o presidente José Sarney e outras lideranças que almejavam a Presidência da República formaram alianças e costuraram a rejeição do sistema com o pacto de realização de plebiscito para decisão do tema.

O resultado destas movimentações constituintes foi a obtenção de um terceiro sistema cuja característica marcante é a irregularidade das faculdades dos Poderes instituídos. Concebeu-se um Presidencialismo Imperial, no qual o Poder Executivo é insuflado de autoridade, característica aferível na utilização exacerbada de Medidas Provisórias. Ao mesmo tempo o Presidencialismo tornou-se refém de

8 Sobre os acontecimentos narrados a respeito da Assembleia Nacional Constituinte e seus resultados no desenho institucional versa Luís Roberto Barroso em Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 5ª edição, 3ª Tiragem, São Paulo, 2016, Editora Saraiva, Página 506.

maiorias do Congresso Nacional para todos os seus anseios criando uma dependência exacerbada.

Embora exista a necessidade da existência de freios e contrapesos para a manutenção do equilíbrio entre os três Poderes, a configuração que foi arranjada pela Constituição Federal de 1988 nas relações entre Legislativo e Executivo é provida de desproporção em suas relações e origina um sistema Presidencialista com traços Parlamentaristas.

A adoção do regime proporcional de lista aberta para a eleição dos Cargos do Poder Legislativo somado à desvinculação destes sufrágios aos do Poder Executivo e atenuado pelo multipartidarismo extremado que se instaurou no Brasil dificultam mais ainda a relação entre os Poderes e impedem a construção de bases governamentais sólidas junto às Casas Legislativas.

A disposição destes vínculos implica numa gerência da administração pública por parte da chefia de governo marcada pela distribuição de cargos administrativos em troca da obtenção de uma maioria no Parlamento com o objetivo de implementar suas demandas. Este sistema ficou conhecido como Presidencialismo de Coalizão (denominação criada pelo cientista político Sérgio Abranches).

Como consequência destas dinâmicas um governo que não é capaz de manter uma base estável (formada por vezes nos últimos governos com interesses não republicanos) acaba por encontrar-se em um contexto de ingovernabilidade. Ocorre por fim, nestes casos, um desgaste político e social profundos. A capacidade de editar leis e alavancar políticas públicas é lesionada.

Este sistema é o grande responsável pela existência dos Partidos fisiológicos cuja a justificativa principal de existência não é o conteúdo programático- ideológico, mas a ganância pelos recursos do Estado e a barganha de cargos e verbas em troca de votos para aprovação das Pautas do Poder Executivo junto ao Congresso Nacional.

“O sistema partidário é caracterizado pela multiplicação de partidos de baixa consistência ideológica e nenhuma identificação popular. Surgem, assim, as chamadas legendas de aluguel, que recebem dinheiro do Fundo Partidário.”9

É importante ter em vista a problemática acima citada que não traz os melhores benefícios para a Política a nível eleitoral: a adoção do voto proporcional em lista aberta.10 O eleitor brasileiro acostumado, em muitos casos, a votar em candidatos carismáticos e a centrar suas atenções apenas no indivíduo acaba por esquecer-se ou ignorar o Partido com o qual aquele mesmo candidato possuí vínculo. Isto acaba por criar em muitas ocasiões maiorias parlamentares desconexas das ideologias populares.

Os Partidos Políticos em várias ocasiões optam por conseguir para a sigla, os chamados “Puxadores de voto”, candidatos muito conhecidos pela população por ocupação que desempenham ou por exposição midiática: celebridades, artistas, esportistas, influenciadores digitais entre outros, que por carisma pessoal atraem uma gigantesca quantidade de votos e levam consigo diversos de deputados da agremiação pelo quociente eleitoral.

Outrossim, o sistema vigente é de difícil compreensão por parte do eleitorado. Não é portador de uma atividade procedimental inteligível o que gera uma sensação de ausência de clareza no processo de escolha dos representantes, especialmente quando candidatos com menor votação são eleitos em detrimento de candidatos com melhor desempenho nos sufrágios.

A opção pelo voto proporcional em lista aberta ao prejudicar a compreensão do eleitor a respeito do processo de escolha dos seus representantes afeta também a atuação política dos cidadãos, gerando descrédito e descolamento entre eleitores e eleitos.

No campo das instituições legislativas temos ainda o problema de composição da Câmara dos Deputados. O Regime instaurado pela Constituição Federal de 1988 que estabelece um mínimo de 8 deputados por Unidade da Federação e um teto de 60 gera uma grande desproporcionalidade representativa

9 BARROSO, Luís Roberto. Reforma política no Brasil: os consensos possíveis e o caminho do meio.

10 Sobre o modelo: Sistema Eleitoral Brasileiro — a técnica de representação proporcional vigente e as propostas de alteração: breves apontamentos, de Vandré Augusto Búrigo. Revista de Informação Legislativa, ano 39, nº 154 (Senado, 2002).

com Estados, o que é inconcebível para a definição da própria competência de legitimidade da Câmara Baixa brasileira que se exprime na representação efetiva da população. Sobre esta problemática versa Luís Roberto Barroso:

5- Urgências

“De tal previsão resulta que Estados muito populosos tenham uma sub-representação, e que Estados menos populosos sejam super-representados. Isso faz com que o peso dos votos, por exemplo, de cidadãos de São Paulo e de cidadãos de Roraima não sejam os mesmos, não vigorando a máxima de um homem, um voto.”11

A necessidade de uma reforma política consistente é evidente 12. Estes imperativos tem encontrado em setores diversos da sociedade lugares de debate e proposição de ideias que, aplicadas à realidade prática de forma pragmática, podem configurar-se como caminho para a solução de problemas e melhoria do ambiente democrático.

Uma urgência fundamental que merece a concentração de esforços para amenizar os dilemas ligados à organização interna das agremiações partidárias é a necessidade de torná-las mais inclusivas, democráticas, organizadas e ligadas às tendências sociais e às correntes ideológicas internas dos próprios partidos. Estes objetivos podem ser alcançados através da adoção normativa do sistema de prévias eleitorais para ampliação da capacidade representativa das agremiações e conexão com suas bases.

A organização de prévias transmite à população um senso geral de transparência na escolha dos candidatos desde os primeiros passos da definição do processo eleitoral além de permitir uma aproximação com a sociedade civil organizada.

Esta medida permite ainda a dilatação da representação das correntes ideológicas das siglas, a despeito da organização autocrática que se instaurou em um número substancial dos Partidos, evitando desta forma uma desconexão total

11Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 5ª edição, 3ª Tiragem, São Paulo, 2016, Editora Saraiva, Página 51;0.

12 Para aprofundamento: “Reforma Política. Entre a urgência e o possível.” Revista Em Discussão. Ano 6. Nº 24/Fevereiro de 2015. Senado Federal dos Partidos com a população e mesmo com seus filiados, como afirma Rogério Silva, porta-voz do Movimento “Quero Prévias” em entrevista ao Jornal Nexo:

“[…] A política do futuro passará, sim, pela qualificação dos partidos, pelo aprofundamento da sua capacidade de produzir propostas e pela ampliação de uma certa porosidade para que os partidos possam escutar mais a sociedade, aprender mais com a sociedade e construir mais junto com a sociedade.”13

A proibição de coligações partidárias para todos os cargos em primeiro turno é uma solução que coopera na construção do fortalecimento ideológico e programático dos Partidos.

Uma medida que pode auxiliar na definição ideológica dos Partidos Políticos impedindo a existência de relações puramente fisiológicas entre agremiação e máquina estatal é a obrigatoriedade de lançamento de candidatura ao cargo Executivo da esfera de poder para que se lançam candidatos ao Legislativo. Neste sistema um Partido que lance candidatos à Assembleia Legislativa, por exemplo, terá de lançar também candidato ao Governo do Estado, um partido que lance vereadores terá de lançar candidato à Prefeito e um partido que lance candidatos à assentos em alguma ou ambas as casas do Congresso Nacional terá de lançar candidatura à Presidência da República. Isto traria maior riqueza ao debate de ideias nos pleitos eleitorais e garantiria a coerência ideológica.

Como forma de ampliar a representatividade das diversas alas ideológicas que compõem as agremiações partidárias visando reduzir a reprodução de siglas que possuem divergências programáticas mínimas que por isso acabam por causar dissidências e dar origem a novos Partidos é interessante conceber instituições internas representativas de correntes ideológicas próprias dos partidos, dando a elas participação direta na formação de chapas nas realizações de prévias e atribuindo a elas uma importância dinâmica nos movimentos internos dos Partidos, de forma que funcionassem como “partidos dentro dos partidos”.

13 Entrevista completa disponível em: https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2016/11/12/%E2%80%98Quero- pr%C3%A9vias%E2%80%99-%C3%A9-um-processo-de-escuta-dizem-organizadores-do-movimento. Acesso em 22/10/2018.

Visando amenizar a crise que se caracteriza na sensação de representatividade dos eleitores e a desconexão destes com os representantes eleitos dando clareza quanto ao processo de escolha dos parlamentares e assim aumentando sua legitimidade uma medida viável é alteração do Sistema Eleitoral para as disputas à Câmara dos Deputados, Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores do atual Proporcional em lista aberta para o Distrital Misto, explicado por Luís Roberto Barroso como o sistema em que “metade das cadeiras são preenchidas com voto majoritário no distrito e a outra metade de acordo com a votação proporcional do partido”.14

Esta forma de organização une as características positivas do voto proporcional e do voto distrital e ameniza os efeitos negativos deles, permitindo uma composição ideológica através do voto na sigla e a representação identificável e personalizada que permite a reinvindicação de pautas por parte do eleitorado através do voto no candidato do respectivo distrito.

O sistema é defendido pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal como “salvação da política do Brasil” em entrevista cedia à Folha de São Paulo. Em artigo escrito por ele em 2006 ele salienta as qualidades do modelo:

“A eleição distrital aproxima o candidato do eleitor, permite o controle mais eficiente de sua atuação parlamentar e barateia o custo da eleição. A eventual “municipalização” do pleito decorrente desse mecanismo é compensada pelo voto ideológico ou programático, que é dado no partido, no voto proporcional. O sistema de lista fechada fortalece os partidos, facilita a formação de maiorias políticas de sustentação do Governo e institucionaliza as relações de poder, ao diminuir a possibilidade de barganha individual de apoio por cada parlamentar. Candidatos do mesmo partido deixam se ser competidores entre si e o voto despersonaliza-se, passando a ser uma opção programática.”15

14 BARROSO, Luís Roberto. Reforma política no Brasil: os consensos possíveis e o caminho do meio. 15 BARROSO, Luís Roberto. A reforma política: uma proposta de sistema de governo, eleitoral e partidário para o Brasil. Revista de direito do Estado: RDE, n.3, p.287-360, jul./set., 2006.

BIBLIOGRAFIA

!Policy Paper 1. Redes Sociais nas Eleições 2019.” Sala de Democracia Digital. FGV DAPP, Rio de Janeiro, 05/10/2018.

“Reforma Política. Entre a urgência e o possível.” Revista Em Discussão. Ano 6. Nº 24/Fevereiro de 2015. Senado Federal

BARROSO, Luís Roberto. A reforma política: uma proposta de sistema de governo, eleitoral e partidário para o Brasil. Revista de direito do Estado: RDE, n.3, p.287-360, jul./set., 2006.

BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 5ª edição, 3ª Tiragem, São Paulo, 2016, Editora Saraiva.

BARROSO, Luís Roberto. Reforma política no Brasil: os consensos possíveis e o caminho do meio.

Entrevista “‘Quero prévias’ é um processo de escuta, dizem organizadores do movimento” https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2016/11/12/%E2%80%98Quero- pr%C3%A9vias%E2%80%99-%C3%A9-um-processo-de-escuta-dizem-organizadores- do-movimento

http://divulga.tse.jus.br/. Acesso em 20/10/2018 https://www.bbc.com/portuguese/brasil45780660. Acesso em 20/10/2018 Reforma Política e Eleições Limpas (Coalizão Democrática, 2014). P.16, 17.

SOUZA, Maria do Carmo Campello de. Estado e Partidos Políticos no Brasil (1930 a 1964). 3ª edição. São Paulo, 1990, Editora Alfa-Omega.

LISTA DE SIGLAS

DEM- Democratas.

MDB- Movimento Democrático Brasileiro.

OAS- Conglomerado atuante no ramo da engenharia civil. PMDB- Partido do Movimento Democrático Brasileiro.

PP- Partido Progressista.

PSDB- Partido da Social Democracia Brasileira. PSL- Partido Social Liberal.

PT – Partido dos Trabalhadores.

Palavras Chaves

Partidos. Sistema Partidário. Democracia. Instituições. Representatividade