AS RELAÇÕES DE EMPREGO COM OS IMPACTOS DO COVID-19 E AS NEGOCIAÇÕES PARA DIMINUIÇÃO DOS DANOS.

Resumo

COVID-19 e os impactos ocasionados na relação de emprego e as negociações para diminuição dos danos.

Artigo

AS RELAÇÕES DE EMPREGO COM OS IMPACTOS DO COVID-19 E AS NEGOCIAÇÕES PARA DIMINUIÇÃO DOS DANOS.

RESUMO

COVID-19 e os impactos ocasionados na relação de emprego e as negociações para diminuição dos danos.

INTRODUÇÃO

Em dezembro de 2019 surgiu em Wuhan, na China, um vírus avassalador e misterioso, com transmissão rápida que causa doença pulmonar grave e mortal, causando a pandemia Covid-19.

Rapidamente o vírus se espalhou fazendo vítimas pelo mundo, levando a Organização Mundial de Saúde – OMS, a declarar emergência internacional de saúde pública. A partir disso o mundo entrou em guerra contra o Covid-19.

Diante desses acontecimentos, a população mundial e suas autoridades vêm tomando medidas para conter ou retardar a propagação do vírus. No Brasil, isso deu início em março de 2020, por meio do decreto Legislativo 6 de 2020, onde foi decretado o estado de calamidade pública com previsão de duração até dezembro de 2020.

Buscando proteger a economia e a vida das pessoas o governo federal editou inúmeras Medidas Provisórias com o objetivo de garantir e proteger as relações de emprego e economia em meio à crise.

Medida Provisória 927/20

A medida provisória 927/20 que entrou em vigor na data 22 de março de 2020, foi uma das primeiras medidas promulgadas pelo governo, que visa flexibilizar as relações de empregos e autoriza uma série de medidas trabalhistas que poderão ser adotadas pelos empregadores com o fim de evitar a extinção de empresas e manter ativos postos de trabalhos, tudo por conta dos fortes impactos do COVID-19 que hoje assola o mundo, aliado ao fato do estado de calamidade ora reconhecido pelo Decreto Legislativo de nº 6 de 20 de março de 2020.

Estas medidas se aplicam durante o estado de calamidade pública a todos os empregados urbanos, domésticos, rurais, estagiários e terceirizados.

Em sua essência a MP tenta trazer oxigênio para milhares de empresas que, em razão das medidas governamentais de enfrentamento ao COVID-19, foram obrigadas a cessar suas operações que sem funcionamento ficaram impossibilitadas de arcar com as suas obrigações contratuais, em especial os pagamentos de tributos e a remuneração de seus empregados.

A MP trouxe como oxigênio a possibilidade dos empregados e empregadores celebrarem acordos por escrito, de modo que venha manter a renda dos trabalhadores e empresas ativas.

Em sua estrutura, o imperativo é de flexibilização dos contratos de trabalho, autorizando assim uma série de medidas no âmbito das relações de empregos, sejam elas bilaterais ou unilaterais com um único fim, manter ativos postos de trabalho.

Das Medidas Bilaterais:

 No que se refere às medidas bilaterais, temos o artigo 2º da MP 927/20, que em sua essência abre uma serie de possibilidades para pactuação de acordos entre empregado e empregador, que terão preponderância sobre quaisquer instrumentos normativos, legais e negociais, desde que respeitado os limites constitucionais.

Art. 2º Durante o estado de calamidade pública a que se refere o art. 1º, o empregado e o empregador poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício, que terá preponderância sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição.

Este artigo autoriza ampla flexibilização nas leis trabalhistas para que empregado e empregador acordem por escrito aquilo que for melhor para as partes, desde que respeitado a premissa maior, evitar despedidas em massa e fechamento de empresas, face o caso extremo ora vivenciado. Este entendimento se coaduna com princípio da preservação e função social da empresa.

O empregadores deverão ter cautela no momento de aplicação deste artigo ao celebrar um acordo, pois além dos limites constitucionais, deverão observar também os princípios que regem a relação de emprego, pois a depender do caso pode colocar o trabalhador numa situação de vulnerabilidade extrema, o que pode abrir margens para futuras discussões judiciais.

 Das Medidas Unilaterais

Por conseguinte, temos o artigo 3º da MP 927/20, prevê a possibilidade de empregadores tomarem ações de forma unilateral, ou seja, medidas que podem ser tomadas pelo empregador, independentemente da concordância do empregado.

Assim dispõe o artigo 3º da MP 927/20:

Art. 3º Para enfrentamento dos efeitos econômicos decorrentes do estado de calamidade pública e para preservação do emprego e da renda, poderão ser adotadas pelos empregadores, dentre outras, as seguintes medidas:

I – o teletrabalho;

II – a antecipação de férias individuais;

III – a concessão de férias coletivas;

IV – o aproveitamento e a antecipação de feriados;

V – o banco de horas;

VI – a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;

VII – o direcionamento do trabalhador para qualificação; e

VIII – o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS.

Em suma, os artigos 2º e 3º compõem a estrutura da medida provisória que traz a possibilidade de empregado e empregador acordarem aquilo que for melhor para ambos, de um lado, o empregado que visa manter o seu emprego e renda, de outro, o empregador que visa manter sua empresa em funcionamento e auferindo lucros.

Dos dispositivos afetados da MP 927/2020.

 A MP 927/20, não atendia de forma efetiva os anseios das negociações oriundas das relações de emprego, fato que abriu margens para promulgação de nova medidas provisórias, bem como foram afetados os artigos 29 e 31 da MP, sendo objeto de ampla discussão nos tribunais superiores.

Fato que motivou diversos pedidos cautelares formulados no âmbito das ADIs 6342, 6344, 6346, 6348, 6349, 6352 e 6354, nas quais foram questionados diversos dispositivos da MP nº. 927/20, sob a ótica da inconstitucionalidade, entre eles o art. 29 e 31.

 

Do artigo 29, da Medida Provisória 927/20.

 

O artigo 29 da MP antes determinava que o empregado contaminado pelo covid-19, teria que comprovar o nexo causal entre doença e a atividade prestada, in verbis: 

 

Art. 29.  Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.

Ou seja, para que o empregado tenha direito aos benefícios previstos na legislação, como por exemplo, no campo trabalhista, garantia de emprego de doze meses após a cessação do auxílio-doença acidentário, bem como, eventuais indenizações que porventura possam ser devidas, deveria o empregado comprovar o nexo causal com a atividade desempenhada.

Diante da pertinência do caso, o STF suspendeu os efeitos do art. 29, mas não afirmou que o COVID-19 é uma doença ocupacional, pois naquele momento não se pode presumir, devendo ser analisado cada caso para verificação da presença do nexo causal para caracterização de doença ocupacional, podendo ocorrer a presunção aos funcionários essenciais que trabalham na linha de frente ao combate a pandemia pelo COVID-19.

Do artigo 31 da Medida Provisória 927/20.

Outro dispositivo afetado foi o artigo 31 da MP 927/20 que trazia em seu bojo limitações no poder de atuação dos auditores fiscais.

Assim dispõe:

Art. 31.  Durante o período de cento e oitenta dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória, os Auditores Fiscais do Trabalho do Ministério da Economia atuarão de maneira orientadora, exceto quanto às seguintes irregularidades:

I – falta de registro de empregado, a partir de denúncias;

II – situações de grave e iminente risco, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas à configuração da situação;

III – ocorrência de acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas às causas do acidente; e

IV – trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.

 

 Em si, o artigo tentava, de certa forma, aliviar a carga sobre os ombros das empresas das investidas dos auditores fiscais face a situação de calamidade ora vivenciada, pois o imperativo no entender do governo seria manter a sobrevivência das empresas nesse momento de recessão.

Na ocasião, em julgamento, o STF considerou que esta restrição na atuação dos auditores fiscais do trabalho não iria de encontro com a situação ora vivenciada, pois em tempo de pandemia, superlotação dos hospitais, diversas orientações governamentais de combate ao COVID-19, medidas de saúde e higiene a serem rigorosamente cumpridas pelas empresas e empregados, faz-se imperioso a atuação forte e ostensiva dos auditores para que fiscalize as empresas, tudo em prol do combate ao Coronavírus.

Assim, em sessão realizada por vídeo conferência, o STF suspendeu a eficácia desses dois artigos 29 e 31 da MP 927/20, entendeu o Pleno que estes artigos não se harmonizavam com alguns princípios constitucionais.

 Percebe-se que as medidas iniciais da MP 927/20, conjuntamente com algumas modificações realizadas pelo Supremo Tribunal Federal, foram de extrema importância para empregadores e empregados, um norte para atenuar os danos advindos da pandemia que afetou seriamente as relações de emprego, obrigando empregado e empregador a negociar as suas posições no âmbito do direito trabalhista, respeitando os limites constitucionais previstos.

Por fim, a MP 927/20 está longe de ser o melhor dos mundos, tanto é que o governo, no enfrentamento ao COVID-19, vem lançando novas medidas provisórias a fim de encontrar um equilíbrio nas negociações das relações de emprego que acima de tudo devem ser pautadas na ideia de preservação do trabalhador em sua dignidade, bem como na preservação da atividade empresarial, trazendo amparo para as partes com a manutenção de emprego e renda.

MEDIDA PROVISÓRIA 936/2020

Dentre as medidas editadas temos a Medida Provisória de nº 936 de 2020, que tem como objetivo proteger o emprego durante a calamidade pública.

Essa proteção foi materializada de duas formas: (i) redução de do salário proporcional à jornada de trabalho, (ii) suspensão do contrato de trabalho e (iii) suspensão do contrato de trabalho para realização de curso em prazos diversos do previsto no artigo 476-A da CLT, sem a exigência de norma coletiva e de ajuste expresso do empregado.

A chamada MP da preservação do emprego e da renda visa atender o setor privado, excluindo de forma direta e taxativamente o setor público, e auxiliar o mais rápido possível os trabalhadores no enfrentamento do estado de calamidade pública e da emergência de saúde pública internacional decorrente do Covid-19. Até hoje essa medida é o maior programa de estímulo a manutenção do emprego da história do Brasil.

A MP cria, de forma corajosa, em seu artigo 3º o pagamento de Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, a redução proporcional da jornada de trabalho e, consequentemente, do salário e a suspensão do contrato de trabalho.

Destacamos que a MP 936 em seu artigo 2º, parágrafo único, dispõe sobre a exclusão da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, os órgãos da administração pública direta e indireta, às empresas públicas e sociedade de economia mista, às suas subsidiárias e organismos internacionais, ou seja, estão excluídos todos os empregados públicos de qualquer órgão da administração pública. Por fim, a aplicação da MP se estende para todos os empregados privados regidos pela CLT, sejam rurais, domésticos, terceirizados e temporários.

 

 BEm – Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e Renda

O BEm é o programa criado pela MP 936, constituido em prestação mensal que será custeado pela União, com base de cálculo no valor mensal do seguro desemprego que o empregado teria direito quanto da dispensa imotivada, com o valor máximo de R$ 1.813,03 (mil oitocentos e treze reais e três centavos).

Diferente das regras aplicadas ao seguro desemprego, o BEm não possui carência, ou seja, independe do tempo de vínculo de emprego, não precisa de período aquisitivo. Sendo sua única restrição os empregados que já percebem benefícios previdenciários, ou seja, aposentados, ou quem recebe auxílio doença ou auxílio doença previdenciário.

O pagamento do BEm ao empregado será realizado após 30 dias contados da data de comunicação do empregador ao Ministério da Economia e ele ocorrerá quando o empregado tiver a redução proporcional da jornada de trabalho e salário ou a suspensão do contrato de trabalho.

A redução de jornada de trabalho e salário

 A redução proporcional de jornada de trabalho e de salários de que trata a MP 936, autoriza a redução de jornada e salário do empregado do setor privado em 25%, 50% e 70%, mediante acordo por escrito entre o empregado e o empregador ou através de acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva.

Sendo a redução da jornada de trabalho e salário de 25% poderá ser feita em qualquer faixa salarial mediante acordo individual por escrito ou acordo coletivo de trabalho. Para os casos de redução proporcional entre 50% e 70%, só poderão ocorrer para os empregados que percebam até 3 salários mínimos – R$ 3.135,00 (três mil, cento e trinta e cinco reais), ou que percebam salário igual ou superior a duas vezes o teto da previdência – R$ 12.202,12 (doze mil, duzentos e dois reais e doze centavos) cumulativamente ao diploma de ensino superior.

A proposta deverá ser encaminhada ao empregado com dois dias de antecedência e o aceite do empregado deverá ser EXPRESSO, após o empregador deverá comunicar o sindicato de classe e o Ministério da Economia em até 10 dias da data de ajuste.

Tal medida só terá vigência no máximo por até 90 dias garantido ao empregado estabilidade provisória de emprego por todo o período da redução e, após terminado o período de redução, por igual período, ou seja, caso o empregado tenha sofrido a redução de jornada e salário por 60 dias, ele terá garantido o emprego por 120 dias – 60 dias do período de redução acrescidos de 60 dias.

Em caso de dispensa imotivada durante o período de estabilidade provisória de empregado, o empregador deverá pagar ao empregado, além das verbas rescisórias devidas, (i) 50% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia para os salários reduzidos entre 25% a 49%; (ii) 75% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia para as reduções entre 50% a 69%; (iii) 100% do salário a que o empregado teria direito no período de garantia para as reduções iguais ou superiores a 70%. Alguns doutrinadores defendem que só existe garantia de emprego enquanto existir emprego, caso aconteça a extinção da empresa dentro do período de estabilidade não seria nada devido ao empregado.

Importante frisar que a redução proporcional deve preservar o salário hora, ou seja, será reduzido o valor hora de trabalho diário do empregado proporcionalmente a redução da jornada diária.

 Na prática, deverá o empregador que reduzir a jornada de trabalho e o salário na proporção de 25% comunicar ao empregado com 2 dias de antecedência e, mediante aceite formal e expresso, pactuar acordo individual de trabalho, após, no prazo não superior a 10 dias comunicar ao Ministério da Economia e ao sindicato de classe. Feito isso e não sendo o empregado beneficiário de qualquer auxílio previdenciário, terá o recebimento do BEm após 30 dias.

Destaca-se que o benefício não tem natureza salarial, ou seja, não serve como base para cálculo para fins tributários, trabalhistas ou previdenciários.

 SuspenSão Contratual

A suspensão do contrato de trabalho significa paralisar o contrato de trabalho, ou seja, o trabalhador não trabalha e o empregador não paga, sendo assim, não existe computação do tempo de serviço, as hipóteses de suspensão de contrato de trabalho já previstas na legislação não existem na forma de negociação entre empregado e empregador.

A MP 936 autoriza a suspensão do contrato de trabalho por prazo não superior a 60, podendo ser fracionado por dois períodos de 30 dias enquanto durar o estado de calamidade decretado através do decreto nº6 de 2020, negociado através de acordo individual de trabalho ou acordo coletivo de trabalho e convenção coletiva de trabalho aos empregados que percebam até R$ 3.135,00 ou percebam salário igual ou superior a duas vezes o teto da previdência, R$ 12.202,12 cumulativamente ao diploma de curso superior.

Essa medida não difere da redução proporcional da jornada e do salário, aqui o empregador deverá informar ao Ministério da Economia no prazo não superior a 10 dias de celebração do acordo sob pena de pagar ao empregado o salário integral por todo o período de suspensão não comunicado, como dito anteriormente, o aceite por parte do empregado deve ser de forma expressa. Ainda, o empregado também tem direito a estabilidade provisória de emprego pelo dobro do tempo em que for acordado a suspensão do contrato de trabalho.

Para o empregador pactuar a suspensão do contrato de trabalho temos algumas particularidades, as empresas com receita bruta inferior a R$4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais) em 2019 a suspensão total e terá direito a 100% do valor do seguro-desemprego a que o empregado teria direito se fosse despedido. Empresa com receita bruta superior a R$4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais) em 2019 o empregado terá direito a 70% do valor do seguro-desemprego + 30% do valor do salário pago pelo empregador. A parcela paga pelo patrão terá natureza indenizatória e não servirá de base de cálculo para a Previdência, FGTS ou tributária.

Alguns doutrinadores como a Dra. Vólia Bomfim defendem que a durante a suspensão contratual as parcelas percebidas como gratificações, adicionais, horas extras e noturnas podem ser suprimidas, entretanto os benefícios sociais, tais como, plano de saúde e dentário, refeição e outros devem ser mantidos pelo empregador. Em relação ao vale transporte pode ser imediatamente suspenso uma vez que a finalidade é custear a locomoção entre casa-trabalho e trabalho casa.

Ressalta-se que ambas as medidas podem ser acordadas ao mesmo empregado, não simultaneamente, por exemplo, caso a situação econômica do empregador esteja ruim ao ponto de ser necessário a interrupção da atividade, o empregador poderá acordar em um primeiro momento a suspensão do contrato de trabalho por 30 dias, após as atividades recomeçam o empregador volta a produzir, porém sem força total, ele poderia reduzir a jornada e o salário do mesmo empregado por mais 30 dias. Todas as medidas serão tomadas para garantir a manutenção do emprego e a atividade empresarial.

ANÁLISE DA mp 936/2020 COM A ADI 6363/2020

Analisando a autorização de redução proporcional de jornada e de salário e a suspensão do contrato de trabalho mediante acordo individual entre empregado e empregador percebemos o confronto ao princípio da irredutibilidade salarial, contido na CRFB em seu artigo 7º, VI que só permite a redução de salário mediante acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva, ou seja, é contrária CRFB, o que torna a autorização contida na MP 936 inconstitucional sendo a sua aplicação e seus efeitos nulos.

Justamente por isso, por esse confronto aos princípios constitucionais, foi proposta a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade – ADI 6363/2020 pelo Partido Rede de Sustentabilidade para afastar o uso de acordo individual entre empregado e empregador para redução de salário e suspensão do contrato de trabalho em sede de liminar, o Exmo. Ministro Relator Ricardo Lewandowski concedeu a tutela de forma parcial para determinar que os sindicatos devem ser informados acerca de acordo individual devendo se manifestar sobre eles.

No entanto, o entendimento do julgado pelo Plenário o entendimento prevaleceu contrário, mantendo a MP 936 originária, destacando que condicionar acordos individuais celebrados ao crivo dos sindicatos prejudicaria a segurança jurídica e colocaria em risco valores constitucionais como a proteção social, ainda colocaria em risco a eficácia da MP e seu propósito.

A MP 936 tem como fonte o princípio da garantia de emprego e a manutenção do emprego, chegamos ao conflito de princípios constitucionais. De um lado a MP 936 que pretende a proteção do trabalhador com a manutenção do emprego, o fortalecimento da economia, lado outro, a transgressão do princípio da irredutibilidade salarial que também decorre do princípio de proteção ao trabalhador.

Tais princípios foram criados, fortalecidos e praticados com o objetivo de proteger a parte hipossuficiente da relação empregatícia, qual seja, o empregado que é a parte dessa relação que está sujeita aos mandos e desmandos de seu empregador, sendo o papel da entidade sindical fiscalizar a conduta do empregador com a classe trabalhadora.

Levamos em consideração o momento de edição da MP 936 em razão da calamidade pública instaurada no mundo, como medida excepcional e emergencial com a intenção de salvaguardar a vida como todo, não apenas o empregado e empregador, mas sociedade, é preciso que a sociedade tenha o papel de proteção ao empregado e empregador.

Desde o decreto de calamidade pública foram editadas inúmeras MPs com a intenção de proteger a economia, o empregados e as empresas, dos efeitos ainda desconhecidos provenientes do Covid-19, das consequências do isolamento social e da paralisação das atividades consideradas não essenciais, mas nenhuma medida garante estabilidade de emprego enquanto durar o estado de calamidade.

Prevaleceu, então a constitucionalidade da MP 936 onde autoriza a formalização de pacto individual de trabalho para redução de salário e suspensão do contrato de trabalho devendo o Sindicato de classe ser comunicado.

A MP 936 só garante estabilidade provisória de emprego para o empregado que pactuar individualmente ou através de acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho pela redução proporcional da jornada e salário ou suspensão do contrato de trabalho.

Caso a atividade empresária não resista, sendo extinta e finalizada as atividades empresariais, a dispensa será lícita e serão devidas ao empregado todas as verbas rescisórias, quais sejam: férias proporcionais acrescidas do terço constitucional, décimo terceiro proporcional, saldo de salário, levantamento do FGTS. A multa fundiária de 40% originária por força do artigo 18 da Lei 8.036/90 passará para 20%. O empregado não terá que cumprir e nem receber aviso prévio pois a dispensa se deu por fato de força maior.

Levamos em consideração o momento de edição da MP 936 em razão da calamidade pública instaurada no mundo, como medida excepcional e emergencial com a intenção de salvaguardar a vida como todo, não apenas o empregado e empregador, mas sociedade, é preciso que a sociedade tenha o papel de proteção ao empregado e empregador.

A MP 936/20 tenta, através de suas medidas – ainda que controversas, proteger e socorrer tanto o empregador quanto o empregado e o BEm busca aliviar o trabalhador dos impactos oriundos das medidas. Hoje devemos nos unir para que todos possam sair bem e que, mais do que nunca, nosso País possa ser um bom lugar para investir, trabalhar e estudar. Ainda que não tenhamos a certeza prática de como tudo será, precisamos estar de mãos dadas em cuidar dos trabalhadores e dos empregadores, UM não sobrevive sem o OUTRO. Fazemos parte de uma engrenagem, precisamos das duas peças para sobreviver.

 

Medida Provisória 944/2020

Com o momento atual enfrentado pelo mundo, tem sido algo comum a adoção pelo Poder Executivo de Medidas Provisórias a fim de minimizar os efeitos inevitáveis desse terrível vírus que se instalou e insiste em ficar no país. Algumas dessas medidas, para não dizer a maioria, apresentam cunho trabalhista e econômico, que são os setores que vêm sendo intensamente prejudicados desde o início deste isolamento social vivenciado por todos.

  Uma dessas medidas é a MP 944, de 03 de Abril de 2020, que instituiu o Programa Emergencial de Suporte a Empregos, que visa a amparar empresários, sociedades empresárias e sociedades cooperativas, excetuando as sociedades de crédito, na realização de operações de créditos, com a finalidade expressa de pagar a folha salarial dos empregados. Tal procedimento abrangerá a totalidade da folha de pagamento do contratante, limitando-se ao valor de até 2 vezes o salário mínimo por empregado, o que ocorrerá por 2 meses.

Para que se possa ser beneficiário das condições estabelecidas nesta medida, as instituições elencadas acima deverão cumprir alguns critérios, são eles: ter receita bruta anual superior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), calculada com base no exercício de 2019; ter folha de pagamento processada por instituição financeira participante, podendo fazer parte também todas as instituições financeiras sujeitas à supervisão do Banco Central do Brasil. Tais requisitos podem ser encontrados no artigo 2° caput, § 2º e § 3º.

  Além desses critérios, a medida apresenta como continuação, em seu § 4º e incisos, do artigo 2°, obrigações impostas aos participantes que, caso não sejam cumpridas, implicará em um vencimento antecipado da dívida (§5°), quais sejam: fornecer informações verídicas; não utilizar os recursos disponibilizados para fim diverso do pagamento da folha salarial de empregados; e não rescindir o contrato de trabalho dos empregados, salvo por justa causa, no período compreendido entre a data de adesão da linha de crédito e o sexagésimo dia após o recebimento da última parcela da linha de crédito. Essas obrigações podem ser vistas como uma forma de garantir o emprego aos trabalhadores, uma vez que submeterá os empregadores a um tipo de penalidade, o que traz o aspecto de estabilidade provisória.

A presente medida também estabelece a porcentagem de participação do Governo em relação ao financiamento do Programa Emergencial de Suporte a Empregos, fixando em 85% o valor disponibilizado pela União, ficando os outros 15% sob responsabilidade dos próprios recursos das instituições financeiras participantes, além de ambos suportarem os riscos de inadimplência e eventuais perdas financeiras na mesma proporção.

  Outro ponto fundamental é o prazo que as instituições financeiras terão para aderir ao Programa Emergencial de Suporte a Empregos nas operações de crédito, que recebeu a data limite de 30 de junho de 2020, e que deverá observar uma taxa de juros de três inteiros e setenta e cinco centésimos por cento (3,75%) ao ano sobre o valor ora concedido, o que é considerado um valor bem baixo uma vez que não haverá correção monetária, ficando estabelecido também um prazo de trinta e seis meses para o pagamento, que deverá ser iniciado no período de carência de seis meses, no qual haverá capitalização de juros.

   A medida provisória nomeou o BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social como agente financeiro da União frente ao Programa, e receberá R$ 34.000.000.000,00 (trinta e quatro bilhões), a fim de efetuar o repasse, em nome da União, às instituições financeiras participantes, sendo o BNDES igualmente responsável por repassar à União os reembolsos dos recursos recebidos, dentro do prazo de trinta dias, que será contado a partir da data de seu recebimento.

   Como vantagem oferecida às instituições financeiras privadas e públicas estaduais participantes do Programa Emergencial de Suporte a Empregos, ficam dispensadas algumas condições, são elas:

  1. Apresentação de certidão de quitação das obrigações referentes ao registro de empregados;
  2. Quitação eleitoral;
  3. Apresentação do Certificado de Regularidade do FGTS;
  4. Apresentação de Certidão Negativa de Débito – CND;
  5. Comprovação de recolhimento do ITR, relativo ao imóvel rural;
  6. Consulta prévia ao Cadin – Cadastro Informativo de créditos não quitados do setor público federal.

     Importante dizer que a medida trouxe também uma limitação à formalização do contrato, na qual pessoas jurídicas que possuem débito com o sistema de seguridade social, não poderão participar do Programa, pois não estão aptas a contratar com o Poder Público nem dele receber benefícios ou incentivos fiscais creditícios.

Outrossim, para que possa fiscalizar e supervisionar o cumprimento das operações de crédito pelas instituições financeiras, no que concerne ao Programa, foi nomeado competente para a função o Banco Central do Brasil, que pode, juntamente com o Conselho Monetário Nacional buscar a melhor forma para regular e fiscalizar as instituições participantes.

  O que ficou demasiadamente comum também durante o curso da pandemia, foi o uso da tecnologia e redes sociais para a manifestação de opiniões e debates, inclusive acerca dos assuntos referentes às medidas provisórias editadas constantemente. Foi em um desses ocorridos que a renomada professora e escritora Vólia Bomfim Cassar, emitiu seu posicionamento e reflexão, defendendo que deve haver a ponderação entre princípios, quais sejam aqueles em prol dos trabalhadores, que visa a irredutibilidade salarial, o emprego, e a obrigação do Estado em gerir a economia do país, evitando uma recessão econômica, e os princípios em prol da medida provisória, que, se não forem balanceados, podem sim ser transformados em fome e pobreza extrema, o que viola os direitos humanos. E, por fim, ratificou “(…) entendo que ponderando esses dois (princípios) provisoriamente, o princípio da preservação do emprego, da renda, do desemprego, prevaleça temporariamente sob o princípio da irredutibilidade de salário.”.

  Diante de tudo aqui exposto, é possível notar que as microempresas não foram contempladas com essa medida, o que gerou alguns questionamentos e críticas, sendo até levantada a hipótese de ser um risco econômico a injeção de subsídios nessa área da economia por apresentar maior probabilidade de inadimplência. No entanto, já se encontra em pauta para discussão e aprovação solução que intervenha e minimize os efeitos da pandemia também para os microempreendedores, de forma que supra da mesma forma que a MP 944, a folha de pagamento salarial dos empregados.

É difícil dizer quando e qual será a última medida tomada a fim de proteger a classe trabalhadora, bem como oferecer um escape ao empregador, e estabilizar o cenário econômico do país e vida do cidadão brasileiro. O que pode ser dito agora é que ambos os lados precisam ser flexíveis e adaptáveis, procurando sempre a melhor maneira de levar as alterações legislativas de forma que equilibre e dê fôlego tanto a médios e pequenos empresários, como ao cidadão de baixa renda, que necessita de sua renda para levar o alimento para seu lar.

CONCLUSÃO

As Medidas Provisórias 927, 936 e 944 foram criadas com objetivo da preservação e manutenção do emprego e a diminuição dos reflexos no desemprego que já está sendo gerado pela pandemia do COVID-19 e a recessão em que o país deve passar até o final do ano e ainda, com um crescente percentual de desemprego, uma vez que as Medidas Provisórias criadas acima são com soluções temporárias. Contudo, caso a paralização ocorra por mais tempo, terão que ser criadas medidas e soluções para a tentativa de manutenção e preservação do emprego.

Lembrando por fim, que os acordos equilibrados feitos entre empregado e empregador, diminui a possibilidade de revisão judicial com a alegação de desequilíbrio contratual por qualquer uma das partes.

Dados dos Autores:

Evelin Gomes de Sá Sant’Anna OAB/RJ 144.826

Graduação Univer Cidade; Pós-graduação em direito público – Universidade Católica de Petrópolis; Pós-graduação em direito do trabalho e processo do trabalho – Faculdade Damásio; MBA em trabalho, processo do trabalho e previdenciário – Faculdade Legale; Mentora da OAB/RJ.

 

Thiago Pereira OAB/RJ 176.685

Graduação Mackenzie-Rio;

Mentorado OAB/RJ

Thatiane Batista da Silva Pontes OAB/RJ 227.136

Graduação – Estácio de Sá;

Pós-graduanda: Direito do Trabalho e Previdenciário – Universidade Cândido Mendes;

Mentorado OAB/RJ

Erica Medeiros OAB/RJ 216.855

Graduação – Estácio de Sá;

Pós Graduanda em Direito Processual – PUCMINAS Online

Mentorado OAB/RJ