O novo Código de Ética e Disciplina da OAB

Resumo

O presente artigo tem o objetivo de apresentar as principais inovações no Código de Ética e Disciplina da OAB - CED, que está disciplinado nos artigos 31/33 da Lei 8906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB). Buscar-se-á analisar, os parâmetros norteadores da conduta ética na atividade da advocacia. Importante observar que as normas disciplinares não são uma exaltação moralista, mas sim, normas cogentes que tem o intuito de balizar esta atividade profissional, em razão de sua importância para o Estado Democrático brasileiro. A advocacia, como atividade imprescindível à administração da justiça, tem um caráter público e social inerente. Desta forma, desde 1995 que o Conselho Federal da OAB, através do CED, buscou concretizar os principais elementos que devem servir de norte para o advogado no exercício de seu múnus. Com o intuito de atender às demandas contemporâneas, em 2015 alguns temas foram incluídos no CED e outros, que já estavam disciplinados, ganharam um tratamento sob uma nova ótica. Desta feita, analisar-se-á no primeiro capítulo do presente artigo a atividade da advocacia; posteriormente, no segundo capítulo observar-se-á a importância do advogado para o Estado Democrático de Direito. Após a percepção do papel desta atividade profissional, analisar-se-á ética no exercício da advocacia. Assim, estabelecidos esses pressupostos teóricos, nos dois últimos capítulos observar-se-á as principais alterações/inclusões que foram realizadas no CED.

Artigo

Sumário: Introdução – 1. A advocacia – 2. O advogado e o Estado Democrático Brasileiro – 3. A ética no exercício da advocacia – 4. O Código de Ética de 1995 – 5. O Código de Ética de 2015 – Conclusão.

Introdução

A expressão “Deontologia Jurídica” significa o estudo de alguma coisa (“logia”) que deve ser feita (“deonto”) na advocacia (“jurídico”). Dessa forma, tal disciplina tem o objetivo de delimitar, em todos os sentidos, os termos balizadores do que deve ser feito no exercício da advocacia, no que tange as questões procedimentais, institucionais, principiológicas e sobre tudo, éticas. A história da advocacia tem início nas civilizações orientais, mas para o presente estudo, tratar-se-á da formação deste ramo profissional na perspectiva de sua organização no âmbito das sociedades ocidentais, inicialmente na Grécia e Roma. Desde o início a advocacia foi observada como a defesa de interesses através do uso da argumentação, sendo o primeiro “advogado” reconhecido da civilização ocidental, Péricles, na Grécia. Na verdade, a primeira atividade que se assemelha a exercida hoje pelo advogado foi à desenvolvida na Grécia e Roma pelos “oradores”. Os relatos históricos afirmam que estes foram os primeiros a defender interesses alheios a partir da argumentação com ampla habilidade de convencimento. Os oradores utilizavam de forma ampla as falácias (argumentos aparentemente verdadeiros, mas falsos), para exercerem a atividade de convencimento. Em razão das falácias, que muitas vezes produziam conclusões equivocadas, os oradores passaram a sofrer restrições na oratória, como limitação no tempo de sua fala, obrigatoriedade de um juramento para o exercício dessa atividade, em que se comprometiam a defender apenas àqueles que possuíam um “direito justo”. A utilização da falácia e as restrições fazem com que a oratória entre em declínio. Assim, os oradores são substituídos pelos jurisconsultos (mais conhecedores de direito do que de oratória). Os jurisconsultos começaram a exercer a oratória em suas defesas orais, e os oradores começaram um aperfeiçoamento técnico no direito. Os relatos históricos demonstram que a advocacia, como é conhecida nos termos contemporâneo, teve seu início a partir da união entre as atividades exercidas pelos “oradores” e pelos “jurisconsultos”. Desta forma, pode-se concluir que a atividade da advocacia decorre do exercício da oratória a partir de um conhecimento jurídico especializado. Por isso, o termo “ad vocatus” significa “aquele que é chamado para estar junto de alguém”, ou seja, aquele que é chamado para defender os interesses de alguém através do uso da argumentação com um conhecimento jurídico especializado. A atividade da advocacia entra em declínio no período da antiguidade (Grécia), em razão das guerras de conquista realizadas pelo Império Romano e a intensa interferência da Igreja, em razão do fundamentalismo difundido à época. A retomada da importância da advocacia, agora como profissão organizada, ocorre em Roma com o Imperador Justiniano, no século VI, obrigando a realização de um registro para todos que fossem exercer a oratória a partir de conhecimentos jurídicos. Foram impostos diversos requisitos para a inscrição, como nos termos atuais, tais como exame de jurisprudência; boa reputação; proibição de pactuar quota litis; e não abandonar a defesa, uma vez aceita. Tais requisitos para inscrição no registro criado pelo Imperador relatam o primeiro momento histórico em que a advocacia é exercida de forma organizada. Notase, sobretudo a partir de algumas das exigências citadas para a inscrição, uma ampla preocupação com a “ética” no exercício profissional (“boa reputação”), bem como a preocupação com a proteção dos interesses do cliente, uma vez que o advogado deveria conduzir a defesa até o fim. Já na Idade Média, no século XIII, Luiz IX, em razão da sua forte ligação com a atividade da advocacia, cria em 1235 a Ordem dos Advogados da França. Esta entidade profissional era restrita a um número pequeno de advogados, em razão das altas taxas cobradas. Na Universidade de Bolonha na Itália surgem os Glossadores, estudiosos que interpretavam as leis romanas, e os pós – Glossadores, estudiosos que reestudaram o Direito Romano em Bolonha. Posteriormente na Universidade de Estudos Gerais de Coimbra a advocacia ganha uma natureza social, sobretudo com a atuação do Padre Ives de Halairy (Santo Ivo), que realizava assistência jurídica gratuita e foi autor do primeiro decálogo da advocacia (10 mandamentos do advogado). Em Portugal, foram com as Ordenações Filipinas que pela primeira vez buscouse organizar a advocacia, tendo reflexos diretos no Brasil, uma vez que esse diploma tinha vigência em solo brasileiro. As ordenações determinavam, entre outros aspectos: (i) Tempo de oito anos para o curso jurídico (estudos realizados na Universidade de Coimbra em Direito Canônico ou Direito Civil); (ii) Exame para atuar na casa da suplicação (atual Tribunal de Justiça); (iii) Impossibilidade de advogar contra a lei; (iv) Responsabilidade Civil do advogado; (v) Normas ético profissionais; e (vi) Penas disciplinares aplicadas pelo juiz. Nota-se uma maior preocupação com a conduta ética, uma vez que a disciplina da responsabilidade do advogado ganha orientação mais intensa, além de normas próprias acerca do conteúdo ético da profissão. No Brasil, mesmo no período pós independência, as ordenações continuaram regulando as relações privadas no Brasil. A Constituição Federal de 1824 realizou uma reestruturação do Poder Judiciário, levando em conta as provisões constantes nas ordenações acerca do exercício da advocacia. Em 11 de agosto de 1827 foram criados os primeiros cursos de direito do Brasil (Recife – Olinda e Largo de São Francisco – USP). Em 21 de agosto de 1843 ocorreu a criação do Instituto dos Advogados do Brasil – IAB, com duas finalidades essenciais: (i) Estimular o estudo de direito no Brasil; e (ii) Constituir a Ordem dos Advogados do Brasil, com objetivo de ser um órgão de fiscalização e defesa dos advogados. Nesse primeiro momento, embora o IAB tenha alcançado o objetivo de disseminar o estudo do direito no país, não obteve êxito na constituição do órgão de classe da advocacia, o que ocorreria apenas através do Decreto n° 22.784/1931, editado por Getúlio Vargas. No ano de 1933 ocorreu a instalação do Conselho Federal da OAB. A Lei n° 4215/1963 revogou o Decreto n° 22.784/1931 e passou a disciplinar o exercício da advocacia no país, tratando dos principais temas sobre essa atividade, entre eles: (i) Assuntos gerais do exercício da advocacia; (ii) Fiscalização do advogado; (iii) Seleção e requisitos para o exercício da advocacia; e (iv) Prerrogativas funcionais. Importante ressaltar, que tanto o Decreto de 1931, quando a Lei de 1963 tinham como orientação e objetivo central disciplinar a seleção e inscrição dos advogados, não tendo como norte a previsão de prerrogativas e suas defesas. Esses dois primeiros Estatutos da Advocacia (Decreto n° 22.784, de 14/12/1931 e Lei n° 4215, de 27/04/1963) fizeram exclusivamente previsão da advocacia entendida como profissão liberal, autônoma. Tais diplomas não contemplaram a advocacia extrajudicial e o advogado assalariado dos setores público e privado. Essa legislação foi responsável em disciplinar o exercício da advocacia até o ano de 1994. Diante de novas demandas sociais e da imprescindibilidade de uma adequação do exercício da advocacia à realidade contemporânea, em 1994 foi elaborado um novo Estatuto da Advocacia e da OAB – EOAB, com o objetivo de regular a advocacia de acordo com a nova realidade brasileira. Apenas com o estatuto de 1994 (Lei n° 8906/1994) que a advocacia passou a ser compreendida como exercício profissional de postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e como atividade de consultoria, assessoria e direção jurídica. Importante ressaltar que o Estatuto de 1994 é consequência da importância que a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 133 dispensou à advocacia, uma vez que considerou essa atividade como indispensável à própria administração da justiça. Diante desse breve histórico da advocacia no mundo e no Brasil é perceptível, desde a atuação dos oradores, jurisconsultos, glosadores e pós-glosadores e na própria advocacia já organizada, que a ética sempre caminhou ao lado dessa atividade, permeando o seu núcleo e balizando seus objetivos e finalidades. A natureza pública e social da advocacia exige uma reflexão profunda acerca da postura desse profissional no exercício de sua atividade. Em razão do exposto, a Lei n° 8906/1994 nos artigos 31 a 33, disciplinou um capítulo sobre a Ética do Advogado. O artigo 33 determina que o advogado tem que cumprir todos os deveres consignados no Código de Ética e Disciplina – CED e o seu parágrafo único afirma que esse Código deve regular os deveres do advogado para com a comunidade, o cliente, o outro profissional e, ainda, a publicidade, a recusa do patrocínio, o dever de assistência jurídica, o dever geral de urbanidade e os respectivos procedimentos disciplinares2 . O CED foi inicialmente editado pelo Conselho Federal da OAB, com fundamentos nos artigos 33 e 54, V da Lei n° 8906/1994, e publicado no Diário da Justiça da União de 01/03/1995. Em 04/11/2015 o Código de 1995 sofre diversas alterações, com o objetivo de adequar o exercício profissional as novas demandas sociais, sobretudo a partir das diversas formas de realização da advocacia no país. Para uma melhor compreensão das razões e principais mudanças que o CED sofreu, o presente artigo abordará no primeiro capítulo parâmetros da própria atividade da advocacia; posteriormente no capítulo segundo observar-se-á a relação direta da advocacia com a estrutura do Estado Democrático de Direito e sua importância para o exercício da cidadania e efetivação dos Direitos Fundamentais. No terceiro capítulo analisar-se-á a relação entre a ética e a atuação do advogado, demonstrando uma verdadeira delineação de conduta no exercício desse múnus público. Os dois últimos capítulos serão destinados a análise comparativa entre o Código de Ética e Disciplina da OAB de 1995 e de 2015 para uma melhor compreensão das principais alterações. 2 Art. 33 da Lei 8906/94: O advogado obriga-se a cumprir rigorosamente os deveres consignados no Código de Ética e Disciplina. Parágrafo único. O Código de Ética e Disciplina regula os deveres do advogado para com a comunidade, o cliente, o outro profissional e, ainda, a publicidade, a recusa do patrocínio, o dever de assistência jurídica, o dever geral de urbanidade e os respectivos procedimentos disciplinares. 1. A advocacia A atividade principal do advogado sempre foi a postulação em juízo. Segundo Paulo Lobo, os atos privativos do advogado são ampliados a cada dia. A tendência é a utilização de mecanismos extrajudiciais de solução de conflitos (arbitragem e mediação), reduzindo-se cada vez mais a importância da postulação em juízo3 . O EOAB disciplina a possibilidade do exercício da advocacia em diversos aspectos. Foi a primeira vez em que a atividade do advogado assalariado, tanto no setor público, quanto no privado, recebeu uma tutela legal específica. O EOAB definiu, inclusive, os direitos básicos do advogado assalariado, tendo como os principais: O piso salarial, honorários de sucumbência, jornada de trabalho e independência técnica que não pode ser prejudicada pela relação de emprego, nem nas hipóteses de regime jurídico público de dedicação exclusiva, como no caso dos Defensores Públicos. Para o EOAB o advogado é o bacharel, inscrito no quadro de advogados da OAB, que realiza atividade de postulação ao Poder Judiciário, como representante judicial de seus clientes, e atividades de consultoria e assessoria em matérias jurídicas. Apenas os inscritos na OAB podem usar a denominação de advogado. Os cursos jurídicos não formam advogados, mas bacharéis em direito. Por isso, deixam de ser advogados os profissionais que têm sua inscrição cancelada, ressaltando que os profissionais licenciados não perdem a qualificação de advogado, embora tenham o exercício profissional suspenso. O artigo 1° do EOAB disciplina quais são os atos privativos da atividade de advocacia. Apenas os advogados legalmente inscritos na OAB podem praticar esses atos, sob pena de exercício ilegal da profissão. As hipóteses previstas no artigo 1° não são exaustivas, mas sim numerus clausus. Esse artigo não exclui outras atividades que por sua natureza enquadram-se na atividade própria da advocacia4 . 3 LÔBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 4ª ed. Ver. E atual. São Paulo: Saraiva, 2007. P. 21. 4 Art. 1° da Lei 8906/94: Art. 1º São atividades privativas de advocacia: I – a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais; II – as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas. § 1º Não se inclui na atividade privativa de advocacia a impetração de habeas corpus em qualquer instância ou tribunal. § 2º Os atos e contratos constitutivos de pessoas jurídicas, sob pena de nulidade, só podem ser admitidos a registro, nos órgãos competentes, quando visados por advogados. § 3º É vedada a divulgação de advocacia em conjunto com outra atividade. A ADIN n° 1.127-8: Considerou constitucional o artigo 1° do EOAB, mas impôs interpretação restritiva ao dispositivo legal (decidiu pela inconstitucionalidade do termo “qualquer” constante no inciso I), excluindo da atividade privativa do advogado a postulação nos Juizados Especiais e na Justiça do Trabalho. A principal atividade privativa da advocacia é a postulação perante órgãos do Poder Judiciário5 . Postulação (Jus Postulandi) é o ato pelo qual se requer a prestação jurisdicional do Estado. Desta forma, não restam dúvidas de que o advogado tem o monopólio da assistência e da representação das partes em juízo. Em regra, ninguém poderá postular em juízo sem a assistência de um advogado, o que torna nulo qualquer ato privativo do advogado praticado por quem não possui essa capacidade postulatória. Além da postulação, a atividade privativa da advocacia também engloba situações que não dizem respeito à administração da justiça, que nos termos defendidos pelo professor Paulo Lobo gerou uma ruptura com os estatutos anteriores que privilegiavam a advocacia como sendo unicamente a postulação em juízo6 . O professor cita, a título de exemplo, a mediação e a arbitragem, que decorrem, inclusive do processo de desjudicialização da própria atividade do advogado, a direção, coordenação e chefia de qualquer atividade de caráter jurídico, tanto no setor privado, como no setor público. Além disso, a Lei n° 8934/94 que dispõe sobre o registro de empresas mercantis exige o visto do advogado nos atos e negócios jurídicos7 . As atividades citadas necessariamente fazem com que a atuação do advogado tenha uma relação direta com a exigência de condutas éticas e adequadas a esta função. Desta forma, pode-se, inclusive, afirmar que a ética é uma decorrência natural do exercício da advocacia. Ainda na análise do artigo 1° do EOAB a afirmação anterior ganha força no que tange as normas de divulgação da atividade da advocacia, constantes no artigo 1°, parágrafo 3°. O EOAB proíbe a divulgação conjunta da advocacia com outra atividade. Não importa a natureza dessa outra atividade (civil, comercial, econômica, não lucrativa, pública ou privada), a advocacia não pode estar associada a outra atividade seja ela qual for8 . O Conselho Federal da OAB ajuizou a ADIN n° 1.539 contra a primeira parte do artigo 9° da Lei n° 9099/95, com fundamento no artigo 133 da CF. O STF manteve a constitucionalidade desse artigo, desobrigando a presença do advogado em causas de até vinte salários mínimos. 5 Art. 92, CRFB/88: Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário: I – o Supremo Tribunal Federal; I-A o Conselho Nacional de Justiça; II – o Superior Tribunal de Justiça; II-A – o Tribunal Superior do Trabalho; III – os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais; IV – os Tribunais e Juízes do Trabalho; V – os Tribunais e Juízes Eleitorais; VI – os Tribunais e Juízes Militares; VII – os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios. 6 LÔBO, Paulo. Ob. Cit. P. 25. 7 A Confederação Nacional da Indústria propôs a ADIN n° 1194, requerendo a declaração de inconstitucionalidade do parágrafo 2° do artigo 1°, EOAB, prescindindo da participação do advogado na assinatura dos atos e contratos de pessoas jurídicas. O STF declarou a constitucionalidade do dispositivo. A Lei n° 9841/99, artigo 6°, parágrafo único estabelece que não é aplicado a microempresa e às empresas de pequeno porte o artigo 1°, parágrafo 2° do EOAB. 8 COSTA, Elcias Ferreira da. Deontologia Jurídica – ética das profissões jurídicas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. P. 117. Tal proibição demonstra a preocupação do legislador com o exercício dessa atividade, uma vez que preserva a total autonomia do exercício da advocacia, através da impossibilidade de sua vinculação com qualquer outra atividade. Isso garante a independência do advogado e a liberdade para determinar os rumos da estratégia jurídica pretendida. Tais disposições são confirmadas no artigo 2° do EOAB, que elenca as características essenciais da advocacia. Entre elas estão a indispensabilidade (caput do artigo 2°); inviolabilidade (parágrafo 3° do artigo 2°); função social (parágrafo 1° do artigo 2°); e independência. O artigo 133 da CRFB/88 trata de duas dessas características, a indispensabilidade e a inviolabilidade. O princípio da indispensabilidade está presente no diploma constitucional, por razões de ordem pública e de relevante interesse social. É uma garantia da parte e não do profissional. Desta forma, são figuras indispensáveis a administração da justiça: O advogado (postula); o juiz (julga); e o Promotor (fiscaliza a aplicação da lei). A partir da análise das atividades privativas do advogado, bem como algumas de suas principais características, observar-se-á no próximo capítulo a inserção e importância dessa atividade para o Estado Democrático de Direito, sobretudo no que tange a sua natureza pública e social. 2. O Advogado e o Estado Democrático Brasileiro A advocacia possui natureza não estatal para que lhe possa ser assegurada a independência diante do próprio Estado. Segundo Márcio Moreira, o EOAB no seu artigo 2° equipara a atividade da advocacia a serviço público com finalidade social9 . Nas palavras de Fábio Konder Comparato: “O múnus público (encargo a que não se pode fugir, devido ao interesse social) da advocacia, marcado pelo monopólio do jus postulandi privado em todas as instancias, com raras exceções, bem demonstra que a atividade judicial do advogado não visa apenas a satisfação de interesses privados, mas a realização da justiça, finalidade última de todo processo litigioso10”. 9 MOREIRA, Márcio Martins. Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil Anotado. São Paulo: Cone editora, 2005. O artigo 2°, p. 1° do EOAB determina: O advogado é indispensável à administração da justiça. § 1º No seu ministério privado, o advogado presta serviço público e exerce função social. 10 COMPARATO, Fábio Konder apud LOBO, Paulo. Ob. Cit. P. 34. A função pública é inerente a advocacia, sobretudo no que tange a participação efetiva do advogado no processo, contribuindo para a aplicação da lei e consagração dos Direitos Fundamentais no caso concreto. A advocacia é um verdadeiro múnus público. Nessa linha de intelecção, importante os dizeres de Paulo Lobo acerca do tema: “Múnus público é o encargo a que se não pode fugir, dadas as circunstancias, no interesse social. A advocacia, além de profissão, é múnus, pois cumpre o encargo indeclinável de contribuir para a realização da justiça, ao lado do patrocínio da causa, quando atua em juízo. Nesse sentido, é dever que não decorre de ofício ou cargos públicos11”. Desta forma, é inerente a própria atividade o caráter público da advocacia. Confirmando a importância dessa atuação, o EOAB elencou nos artigos 6° e 7° os direitos e deveres do advogado. Aliás, sobre esse ponto, importante a percepção de que o EOAB trata de forma indistinta os direitos e/ou prerrogativas do advogado. Prerrogativas são gênero das quais os direitos são espécies. As prerrogativas estão presentes em todo o EOAB não ficando restritas ao capitulo dos direitos. Importante ressaltar que prerrogativas não são privilégios, mas sim, direito exclusivo e indispensável ao exercício de determinada profissão no interesse social. No caso da advocacia configura condições legais de exercício do seu múnus público12 . Os artigos 15/17 do Regulamento Geral do EOAB – RGE determinam que o Presidente do Conselho Seccional e da Subseção ao tomar conhecimento do fato que tenha violado ou possa violar direitos ou prerrogativas da profissão, deve adotar as providencias judiciais e extrajudiciais cabíveis, designando advogados com poderes bastantes e integrando a defesa, como assistente, quando necessário. Nessa linha, o artigo 3°, ‘j’, da Lei n° 4898/65 afirma que o ato de abuso de autoridade é tipificado como crime contra a garantia de exercício profissional. A independência do advogado ante o juiz e os demais agentes públicos é uma das principais prerrogativas, que garante ao advogado a liberdade necessária para exercer o seu papel. O artigo 6° do EOAB completa o preceito constitucional da 11 LOBO, Paulo. Ob. Cit. P. 34. 12 Ibid. P. 54. indispensabilidade do advogado à administração da justiça, ressaltando a isonomia de tratamento entre o advogado, juiz e promotor de justiça13 . Nessa linha, o artigo 7°, inciso II, EOAB disciplina a inviolabilidade do Exercício profissional. Paulo Lobo, mais uma vez apresenta critérios e dimensões para medirmos esta característica da advocacia. De acordo com o professor a inviolabilidade pode ter: (i) Dimensão Positiva (art. 2°, p. 3° e art. 7°, II e XIX e p. 2° e 3° do EOAB), com imunidade profissional por manifestações e palavras, proteção do sigilo profissional e dos meios de trabalho, incluindo local, instalações, documentos e dados; e (ii) Dimensão Negativa, em que a OAB tem o poder exclusivo de punir disciplinarmente os excessos cometidos pelo advogado14 . O mesmo professor nos ensina que a inviolabilidade é espécie do gênero imunidades. A imunidade pode ser penal (importa a descriminalização do tipo penal); ou civil (o advogado não pode ser imputável por responsabilidade civil, inclusive por danos morais, em virtude de ofensas decorrentes do exercício da profissão) 15 . Entre as várias formas e espécies de imunidade, ressaltar-se-á a imunidade profissional por manifestações e atos, que nos dizeres de José Renato Nalini: “A imunidade profissional estabelecida pelo EOAB é a imunidade penal do advogado por suas manifestações, palavras e atos que possam ser considerados ofensivos por qualquer pessoa ou autoridade16”. Na visão do autor a imunidade prevista no EOAB abrange as ofensas realizadas em juízo ou em qualquer órgão da Administração Pública. A imunidade é relativa as partes, aos magistrados e a qualquer autoridade pública, judicial ou extrajudicial. As ofensas a autoridade judiciária não são consideradas crimes contra a honra (consagração ao princípio da igualdade). No que tange ao sigilo profissional, este faz parte dos direitos fundamentais do cidadão, que são invioláveis inclusive em face do legislador infraconstitucional. O que é protegido pelo ordenamento jurídico é o sigilo do cliente, e não um segredo próprio do 13 O STJ, no Resp. n° 684.532, decidiu que a ofensa de juiz a advogado em audiência é crime contra a honra e não apenas abuso de autoridade, admitindo-se o recebimento de queixa-crime pela difamação e seu julgamento pelo juízo competente. 14 LOBO, Paulo. Ob. Cit. P. 57/58. 15 Ibid. P. 58/59. 16 NALINI, José Renato. Ética Geral e Profissional. 5ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2006. P. 350. advogado. O sigilo é uma norma de ordem pública, não pode ser afastado pelas partes. É inerente ao direito de defesa. O advogado não pode quebrar o sigilo, mesmo com a autorização do cliente, salvo nos casos de estado de necessidade para a defesa da dignidade ou dos direitos legítimos do próprio advogado, para conjurar perigo atual e iminente contra si ou contra outrem e quando for acusado pelo próprio cliente. O não cumprimento do sigilo, o que demonstra a natureza pública e social da advocacia, gera punição para o advogado, sendo considerada infração disciplinar punível com a sanção de censura (36, I do EOAB) e crime de violação de segredo profissional, punível com pena de detenção de 3 meses a um ano (154 do CP). Algumas das prerrogativas do advogado foram citadas para demonstrar que essa atividade goza de proteção própria, justamente em razão do seu caráter público e sua função social. No que tange a esta última, a função social da advocacia está presente na própria finalidade dessa profissão. De acordo com Elcias Ferreira da Costa a finalidade natural da advocacia é evidente: “Primeiro, descobrir o direito do cliente e, uma vez descoberto, promover a sua eficácia e concreção; em segundo lugar, colaborar com o Poder Judiciário na composição dos litígios e na aplicação do direito objetivo, segundo a justiça; terceiro, cooperar diretamente na efetividade da ordem jurídica na comunidade (…) Entretanto, importa muito considerar que não é da finalidade da advocacia colaborar com o Poder Judiciário na aplicação do direito objetivo com desprezo da justiça; o direito objetivo legalista, colhido mediante um interpretação literal, distanciado do espírito da lei ou incompatível com este, conduz ao predomínio da injustiça. O advogado deverá ter seu coração e sua inteligência voltados sempre para a busca da justiça na aplicação racional do direito objetivo17”. Para identificarmos a função social da advocacia pode-se ter como ponto de partida essas três acepções apresentadas pelo autor. Inicialmente, é o advogado que informa o direito ao cliente e que leva o pleito ao ambiente judiciário. Dessa forma, a efetividade de qualquer direito positivado (ou não) passa pela interveniência do advogado. Em segundo, é certo que o advogado é quem tem contato com o fato concreto, com o verdadeiro conflito de interesse. É através do profissional do direito, a partir de sua capacidade postulatória, que o fato concreto chega ao Judiciário. Desta forma, o advogado tem uma participação intensa na composição do conflito em 17 COSTA, Elcias Ferreira da. Ob. Cit. P. 75/77. conjunto com o Poder Judiciário, aproximando a norma e o julgador da realidade fática. Por último, é com a atuação do advogado que a harmonia social é solidificada, sobretudo, no que tange a efetivação dos Direitos Fundamentais na comunidade. O advogado na perspectiva da função social de sua atividade é responsável pela interpretação efetiva da norma, uma vez que as construções jurídicas são feitas no momento da postulação. Tal fato outorga efetividade a norma, garantindo que a mesma seja aplicada nos termos de sua finalidade e em total adequação as contradições concretas da sociedade. Nessa linha de intelecção, e na certeza de que a socialidade é a essência da atividade da advocacia na busca pelo justo, pode-se afirmar que a ética na sua realização é uma consequência natural e inevitável. O preâmbulo do CED (1995 e 2015) afirma de forma contundente que são imperativos da conduta do advogado: “Lutar sem receio pelo primado da Justiça; pugnar pelo cumprimento da Constituição e pelo respeito à Lei, fazendo com que o ordenamento jurídico seja interpretado com retidão, em perfeita sintonia com os fins sociais a que se dirige e as exigências do bem comum; ser fiel à verdade para poder servir à Justiça como um de seus elementos essenciais; proceder com lealdade e boa-fé em suas relações profissionais e em todos os atos do seu ofício; empenhar-se na defesa das causas confiadas ao seu patrocínio, dando ao constituinte o amparo do Direito, e proporcionando-lhe a realização prática de seus legítimos interesses; comportar-se, nesse mister, com independência e altivez, defendendo com o mesmo denodo humildes e poderosos; exercer a advocacia com o indispensável senso profissional, mas também com desprendimento, jamais permitindo que o anseio de ganho material sobreleve a finalidade social do seu trabalho; aprimorar-se no culto dos princípios éticos e no domínio da ciência jurídica, de modo a tornar-se merecedor da confiança do cliente e da sociedade como um todo, pelos atributos intelectuais e pela probidade pessoal; agir, em suma, com a dignidade e a correção dos profissionais que honram e engrandecem a sua classe18”. O preâmbulo do CED demonstra de forma inequívoca que em razão do caráter social e público da advocacia, o compromisso do advogado é atuar de forma ética para efetivar a justiça no caso concreto. 18 Preâmbulo do Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil. 3. A ética no exercício da advocacia Com o objetivo de analisar o conceito de ética aplicado a atividade profissional, buscar-se-á inicialmente definir o próprio conceito de ética. Pode-se afirmar que ética: “1. Parte da Filosofia que estudo os valores morais e os princípios ideais da conduta humana. É ciência normativa que serve de base à filosofia prática. 2. Conjunto de princípios morais que se devem observar no exercício de uma profissão; deontologia. 3. Parte prática da filosofia social, que indica as normas a que devem ajustar-se as relações entre os diversos membros da sociedade19”. Percebe-se no conceito da palavra ética constante no dicionário que a mesma está vinculada ao termo moral, bem como as atividades profissionais. Como exposto anteriormente, tal expressão ganha contornos mais intensos na atividade da advocacia, em razão do seu caráter público e social. A ética tem relação direta com a conduta humana, ou melhor, com a prática de boas condutas nas relações pessoais, profissionais e sociais em geral. Ne linha, o professor Felipe D’Amore Santoro afirma que: “É inegável que na ética devem existir sim normas de conduta que indiquem limitação, restrição e contenção, para garantir uma coexistência de membros da mesma sociedade. Nesse contexto pode-se considerar como sociedade desde uma comunidade, uma empresa, uma entidade de classe ou profissão, até mesmo uma nação ou uma organização internacional de nações. Estas normas são, na maioria das vezes, escritas, trazem princípios garantidores de que indivíduos da mesma sociedade, que buscam os mesmos objetivos, ou ainda que sejam objetivos divergentes, empenhemse em nivelar suas ações20”. Desta forma, percebe-se que a postura ética é imprescindível não apenas para a atuação do advogado, mas para a manutenção das condições mínimas de convívio social, uma vez que estabelece padrões de conduta que servirão de norte para o respeito aos demais indivíduos da comunidade. 19 Michaelis – Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Ed. Melhoramentos, Disponível em: http://www.uol.com.br/michaelis/indexdic.htm?busca=ética&busca2=ética. Acesso em julho de 2016. 20 SANTORO, Felipe D’ Amore. Curso de Ética, Deontologia e o Estatuto da Advocacia. São Paulo: Pillares Editora, 2006. P. 16. No que tange a relação direta da ética com a atividade do advogado, esta deve ser tratada como um atributo inerente a própria profissão. Assim, inicia-se a análise dessa relação com a afirmação do jurista Ruy de Azevedo Sodré: “A ética profissional do advogado consiste, portanto, na persistente aspiração de amoldar sua conduta, sua vida, aos princípios básicos dos valores culturais de sua missão e seus fins, em todas as esferas de suas atividades21”. Diante da exposição do autor, percebe-se que a ética do advogado está relacionada com uma atuação profissional adequada aos termos do objetivo e finalidades dessa profissão, função social e interesse público. A regulação da conduta ética do advogado é facilitada, em razão da existência de um código, tema que será analisado nos capítulos posteriores, em que todas as normas são regularmente sistematizadas, com a presença dos deveres e sanções para o seu descumprimento. Em razão desses parâmetros éticos impostos à atividade da advocacia, na hipótese de descumprimento dos mesmos, o EOAB tem previsão expressa acerca da responsabilidade disciplinar do advogado. As infrações disciplinares estão elencadas no artigo 34, EOAB e as possíveis sanções disciplinares no artigo 35/40, EOAB (Censura – Advertência que tem o objetivo de impedir o advogado de praticar novamente o ato; Suspensão – sanção mais grave que a censura. A reincidência de qualquer sanção gera a suspensão. Em regra pode durar de 30 dias a 12 meses; Exclusão – gera o cancelamento da inscrição. Pode voltar a advogar, desde que faça uma nova inscrição; Multa – sanção acessória; e Advertência – seria uma censura com circunstâncias atenuantes. A censura fica registrada no assentamento do advogado, enquanto a advertência não). Na verdade, nos termos bem expostos pelo professor Nalini, o advogado tem deveres éticos para consigo mesmo22. Dentre eles estão a probidade e a imprescindibilidade de tornar-se um “instrumento de concretização da defesa dos interesses jurídicos de seus constituintes”. Nota-se que o advogado deve atuar com plena transparência e cooperação com o seu representado. Tal exigência é inequívoca, uma vez que o próprio EOAB e o CED disciplinam normas específicas acerca da relação advogado – cliente, reforçando a presença da ética nessa relação. 21 SODRÉ, Ruy de Azevedo. La abogacia. Buenos Aires. 1934 apud NALINI, José Renato. Ob. Cit. P. 339. 22 NALINI, José Renato. Ob. Cit. P. 343. Importante observar que a ética profissional não deve partir de valores absolutos e atemporais, mas sim, de premissas que tenham adequação com o contexto social, histórico e temporal, ou seja, que estejam de acordo com as demandas da contemporaneidade. Apenas dessa forma, poder-se-á observar se as condutas do profissional do direito estão (ou não) corretas com a moralidade que dele se espera. No que tange a advocacia brasileira, a ética profissional foi disciplinada no estatuto anterior e no CED de 25 de Junho de 1934. A Lei 8609/1994 optou em concentrar a disciplina relacionada à ética profissional no CED editado pelo Conselho Federal da OAB em 1995, como será exposto no próximo capítulo. No capítulo de ética profissional, o EOAB de 1994 disciplinou apenas preceitos gerais, delimitando os parâmetros orientadores do CED. Importante ressaltar que os deveres éticos presentes no Código não são meras recomendações, mas sim, normas jurídicas dotadas de obrigatoriedade, que devem ser cumpridas sob pena da imputação de algumas sanções, previamente expostas no próprio Código e no EOAB. O EOAB ao determinar esses balizadores para o CED estabeleceu normas gerais nos artigos 31/3323. O art. 31, p. 1º apresenta o principal norte da ética profissional, a independência. No exercício das suas atividades, o advogado deve estar comprometido apenas com a busca da justiça para o seu cliente. Nada mais pode delinear a sua atuação, nenhum interesse que não seja a busca pela realização dos interesses do seu cliente através dos parâmetros estabelecidos pela lei e pelo o que é justo. O artigo 33, caput e p. único do EOAB faz referência ao CED, determinando que o advogado deve cumprir os deveres consignados neste diploma. Desta forma, imprescindível para compreensão dos termos práticos da ética na atividade da advocacia, a análise do Código de Ética de 1995 e das alterações de 2015. 23 Art. 31. O advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia. § 1º O advogado, no exercício da profissão, deve manter independência em qualquer circunstância. § 2º Nenhum receio de desagradar a magistrado ou a qualquer autoridade, nem de incorrer em impopularidade, deve deter o advogado no exercício da profissão. Art. 32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa. Parágrafo único. Em caso de lide temerária, o advogado será solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria. Art. 33. O advogado obriga-se a cumprir rigorosamente os deveres consignados no Código de Ética e Disciplina. Parágrafo único. O Código de Ética e Disciplina regula os deveres do advogado para com a comunidade, o cliente, o outro profissional e, ainda, a publicidade, a recusa do patrocínio, o dever de assistência jurídica, o dever geral de urbanidade e os respectivos procedimentos disciplinares. 4. O Código de Ética de 1995 Não é de hoje a necessidade de regulação da ética do advogado a partir de um diploma específico. Para uma breve digressão histórica acerca do tema, confere-se trecho da obra do professor Paulo Lobo: “A lei Cíntia (de 204 a.C.), em Roma, puniu os advogados com impedimentos para receber remuneração em virtude de procedimentos reprovável de muitos práticos. Ordenanças dos reis espanhóis, em 1495, foram editadas para evitar malícia e tirania dos advogados que usam mal de seus ofícios24”. Após o advento da Lei 8906/1994 é editado pelo Conselho Federal da OAB e publicado em 01/03/1995 o primeiro Código de Ética, pós EOAB. Esse diploma está dividido em seis capítulos, nos seguintes termos: (i) Regras deontológicas fundamentais; (ii) Relações com o cliente; (iii) Sigilo profissional; (iv) Publicidade; (v) Honorários profissionais; e (vi) Dever de urbanidade. Esse Código, pela primeira vez, além de disciplinar os deveres éticos do advogado, estabelece os procedimentos disciplinares necessários para sua efetividade. As normas gerais para o processo disciplinar foram tratadas no EOAB, em razão da imprescindibilidade do tema ser tratado por lei. Os ritos e procedimentos foram destinados ao CED para permitir sua adaptação às mudanças que se fizerem necessária. O órgão responsável pelo cumprimento do CED é o Tribunal de Ética e Disciplina da OAB, instalada em todos os Conselhos Seccionais, sendo órgão indispensável para esses Conselhos. Chama a atenção o artigo 1° do CED, praticamente mantido nas alterações de 2015, uma vez que apresenta as diretrizes deontológicas básicas ao advogado. O referido dispositivo impõe uma conduta moral, tanto do ponto de vista individual, quanto social. A moral, como exposto em capítulo anterior, torna-se um parâmetro para imputar outros deveres ao advogado. Percebe-se este fato, na seguinte afirmação: “Coloca-se de igual modo, a moral individual, social e profissional como cerne da conduta do advogado. A moral no dispositivo ora em comento, acaba por servir, de fundamentação para positivação de diversos deveres que são atribuídos aos 24 LOBO, Paulo. Ob. Cit. P. 193. advogados pelos demais dispositivos do CED, que extrairão da fundamentação moral positivada o seu fundamento de validade, na medida em que determinarão os deveres advindos de um conceito que é inicialmente indeterminado no plano jurídico25”. Dessa forma, a moral “positivada” se presta ao fundamento de diversas outras condutas tipificadas pelo CED, um verdadeiro pilar norteador para as demais deliberações disciplinares da atividade advocatícia26 . O que foi possível perceber na análise desse dispositivo do CED/95, reproduzidos no CED/2015, foi a tentativa do Conselho Federal em dar concretude a expressão “moral”, pautando o atuar do advogado. Todos os deveres éticos do advogado, distribuídos pelo CED e as consequentes sanções em razão do seu descumprimento, tem base no pilar fixado por esse dispositivo. Visto isso, no próximo capítulo, já pautado na análise das alterações de 2015, verificar-se-á os seus reflexos para a atividade do advogado. 5. O Código de Ética de 2015 A orientação da conduta ética no exercício profissional deve estar de acordo com a complexidade e as novas demandas da sociedade contemporânea. Na tentativa de atender a essas demandas, em razão dos avanços tecnológicos, das novas técnicas de advocacia preventiva e extrajudicial, além das dinâmicas atuais das relações comunitárias, surgem novas formas de atuação para o próprio advogado. Assim, o 25 GONZAGA, Alvaro de Azevedo. Estatuto da Advocacia e Novo código de ética e disciplina da OAB: comentados/Alvaro de Azevedo Gonzaga, Karina Penna Neves, Roberto Beijato Junior. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016. P. 193. 26 Artigo 2° do CED/1995: O advogado, indispensável à administração da Justiça, é defensor do Estado democrático de direito, da cidadania, da moralidade pública, da Justiça e da paz social, subordinando a atividade do seu Ministério Privado à elevada função pública que exerce. Parágrafo único. São deveres do advogado: I – preservar, em sua conduta, a honra, a nobreza e a dignidade da profissão, zelando pelo seu caráter de essencialidade e indispensabilidade; II – atuar com destemor, independência, honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé; III – velar por sua reputação pessoal e profissional; IV – empenhar-se, permanentemente, em seu aperfeiçoamento pessoal e profissional; V – contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das leis; VI – estimular a conciliação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios; VII – aconselhar o cliente a não ingressar em aventura judicial; VIII – abster-se de: a) utilizar de influência indevida, em seu benefício ou do cliente; b) patrocinar interesses ligados a outras atividades estranhas à advocacia, em que também atue; c) vincular o seu nome a empreendimentos de cunho manifestamente duvidoso; d) emprestar concurso aos que atentem contra a ética, a moral, a honestidade e a dignidade da pessoa humana; e) entender-se diretamente com a parte adversa que tenha patrono constituído, sem o assentimento deste. IX–pugnar pela solução dos problemas da cidadania e pela efetivação dos seus direitos individuais, coletivos e difusos, no âmbito da comunidade. Conselho Federal da OAB, em 19/10/2015, editou o novo Código de Ética e Disciplina da OAB, publicado em 04/11/2015. O novo CED é fruto de um processo democrático de debates ocorridos no Conselho Federal da OAB. O Código surge a partir de uma proposta elaborada por uma comissão de notáveis conselheiros federais, sob a relatoria do decano do plenário Paulo Roberto de Gouveia Medina27 . O projeto foi submetido a uma intensa consulta pública pela internet e consulta às instituições e entidades, avaliada pelo Colégio de Presidentes de Seccionais e pelos representantes da advocacia brasileira. Assim, buscar-se-á nesse capítulo apresentar as principais modificações que o CED sofreu e sua repercussão para a conduta ética do advogado. De pronto, ocorreu uma modificação no artigo 2° com a inclusão dos incisos X, XI, XII e XIII28. Percebe-se uma preocupação em impor ao advogado uma conduta que tenha como norte a repercussão de sua atuação no ambiente social, tendo em vista o papel fundamental que exerce na administração da justiça. Buscou-se ainda reforçar o vínculo que o advogado tem com o seu órgão de classe, exigindo o cumprimento das obrigações que o advogado tem com a OAB, por exemplo, quando faz parte integrante de alguma comissão 29. Chama a atenção a preocupação no inciso XIII com a advocacia dativa, quando da impossibilidade de defensoria pública atuar, em que o advogado deverá cuidar da causa com o mesmo zelo que o faz nas causas em que é contratado. Nota-se também uma preocupação com a advocacia pública, que agora tem capítulo próprio, disciplinado no artigo 8°30. Dessa forma, ficam para trás qualquer discussão acerca da submissão da advocacia pública aos termos do CED, estando, portanto, submetidos a ele os procuradores federais, estaduais e municipais. No capítulo referente às relações com o cliente o texto ganha novas disposições no caput do artigo 9°, com uma preocupação nos deveres de transparência e informação. 27 A Comissão Especial foi formada pelos advogados Claudio Stábile Ribeiro (presidente), Carlos Roberto Siqueira Castro, Elton Sadi Fülber, José Danilo Correia Mota, José Lucio Glomb e tendo como relator Paulo Roberto de Gouvêa Medina, decano da OAB. 28 X – adotar conduta consentânea com o papel de elemento indispensável à administração da Justiça; XI – cumprir os encargos assumidos no âmbito da Ordem dos Advogados do Brasil ou na representação da classe; XII – zelar pelos valores institucionais da OAB e da advocacia; XIII – ater-se, quando no exercício da função de defensor público, à defesa dos necessitados. 29 GONZAGA, Alvaro de Azevedo. Ob. Cit. P. 253. 30 Art. 8º As disposições deste Código obrigam igualmente os órgãos de advocacia pública, e advogados públicos, incluindo aqueles que ocupem posição de chefia e direção jurídica. § 1º O advogado público exercerá suas funções com independência técnica, contribuindo para a solução ou redução de litigiosidade, sempre que possível. § 2º O advogado público, inclusive o que exerce cargo de chefia ou direção jurídica, observará nas relações com os colegas, autoridades, servidores e o público em geral, o dever de urbanidade, tratando a todos com respeito e consideração, ao mesmo tempo em que preservará suas prerrogativas e o direito de receber igual tratamento das pessoas com as quais se relacione. Além do que já disciplinava o CED anterior, em que o advogado deve informar ao cliente de todos os riscos de sua pretensão, a partir de 2015 deve comunicar ao cliente qualquer circunstancia que possa influir na resolução de submeter-lhe a consulta ou confiar-lhe a causa. Constituiu, portanto, infração ética o advogado que tenta seduzir o cliente a ingressar com a demanda, sem a justa e clara orientação. Os deveres de informação do advogado para com o cliente ganham mais intensidade nos artigos 10/26. Para demonstrar tal fato, ressalta-se o artigo 12, caput e p. único, em que o advogado que renuncia a causa fica obrigado a devolver ao cliente valores, bens e documentos que lhe foram confiados, com exceção dos honorários pagos pelo serviço até então prestado31 . Tais disposições referentes a relação do advogado com o cliente também impõe obrigações ao cliente, que deve ter conduta transparente, essencialmente no que tange as informações necessários sobre o caso que possam influenciar na atuação do advogado. Tal postura está expressamente determinada com a inclusão do p. 2º no artigo 1632 . No que tange as questões criminais, o p. único do artigo 23 elucida que não há causa criminal indigna de defesa. Tal disposição ressalta o papel do advogado, não apenas como um defensor de seu assistido, mas como um defensor da aplicação correta da norma, do contraditório, ampla defesa e do próprio Estado Democrático de Direito, garantindo a todos, tratamento condizente com o Princípio da Dignidade Humana33 . No que tange a relação do advogado com terceiros, antes das alterações, tais disposições estavam elencadas no capítulo que imputava ao advogado o “Dever de Urbanidade”. Após as alterações, esse capítulo tem o título alterado para “Das relações 31 Artigo 9º do CED: Art. 9º O advogado deve informar o cliente, de modo claro e inequívoco, quanto a eventuais riscos da sua pretensão, e das consequências que poderão advir da demanda. Deve, igualmente, denunciar, desde logo, a quem lhe solicite parecer ou patrocínio, qualquer circunstância que possa influir na resolução de submeter-lhe a consulta ou confiar-lhe a causa. Artigo 10, CED: As relações entre advogado e cliente baseiam-se na confiança recíproca. Sentindo o advogado que essa confiança lhe falta, é recomendável que externe ao cliente sua impressão e, não se dissipando as dúvidas existentes, promova, em seguida, o substabelecimento do mandato ou a ele renuncie. Artigo 11, CED: O advogado, no exercício do mandato, atua como patrono da parte, cumprindo-lhe, por isso, imprimir à causa orientação que lhe pareça mais adequada, sem se subordinar a intenções contrárias do cliente, mas, antes, procurando esclarecê-lo quanto à estratégia traçada. Artigo 12, Parágrafo único, CED: A parcela dos honorários paga pelos serviços até então prestados não se inclui entre os valores a ser devolvidos. 32 Artigo 16, parágrafo 2º, CED: O advogado não será responsabilizado por omissão do cliente quanto a documento ou informação que lhe devesse fornecer para a prática oportuna de ato processual do seu interesse. 33 Artigo 23, parágrafo único, CED: Não há causa criminal indigna de defesa, cumprindo ao advogado agir, como defensor, no sentido de que a todos seja concedido tratamento condizente com a dignidade da pessoa humana, sob a égide das garantias constitucionais. com os colegas, agentes políticos, autoridades, servidores públicos e terceiros”. Foram inseridas novas disposições nos p. primeiro e segundo do atual artigo 27 e no artigo 29, caput e p. único34 . O dever de urbanidade foi estendido aos pleitos eleitorais no âmbito da própria OAB. Além disso, frente a qualquer ofensa a honra do advogado ou a imagem da OAB instaurar-se-á processo ético disciplinar para a devida apuração. O artigo 29 disciplina a relação entre os próprios advogados que exercem sua atividade simultaneamente na mesma causa. Nesse caso, todos os envolvidos devem tratar-se de forma digna, evitando que algum deles seja tratado como subalterno e tenha remuneração incompatível. O respeito mútuo entre os próprios advogados é imprescindível para que o respeito seja exigido também de todos aqueles que não compõem a advocacia. Tais dispositivos reforçam a obrigação de todos os agentes elencados no título do capítulo IV no respeito à atividade da advocacia, bem como respeito a própria instituição OAB. Uma das principais inovações é a advocacia pro bono, que ganha no CED capítulo específico, no artigo 30 e seus parágrafos, possibilitando a advocacia gratuita aos necessitados economicamente. Tais disposições, além de conceituarem a atividade “pro bono”, também estabelecem limites éticos ao seu exercício, proibindo a sua utilização para fins político-partidário ou eleitorais. O CED também estabelece maior rigor ético aos dirigentes da OAB, estabelecendo regras rigorosas de conduta, incluindo presidentes e conselheiros, nos artigos 31/34. Todos os que exercem cargos ou funções na OAB e na representação da classe passarão a se submeter a um expresso regramento quanto à conduta a ser observada. Ressalta-se que antes das alterações, não havia dispositivo correspondente no Código, o que demonstra o quanto a ética é fundamental para a valorização da advocacia e o respeito da classe. Tal preocupação pode ser confirmada com a proibição 34 Artigo 27, parágrafo 1º, CED: O dever de urbanidade há de ser observado, da mesma forma, nos atos e manifestações relacionados aos pleitos eleitorais no âmbito da Ordem dos Advogados do Brasil. Artigo 27, parágrafo 2º, CED: No caso de ofensa à honra do advogado ou à imagem da instituição, adotar-se-ão as medidas cabíveis, instaurando-se processo ético-disciplinar e dando-se ciência às autoridades competentes para apuração de eventual ilícito penal. Artigo 29, CED: O advogado que se valer do concurso de colegas na prestação de serviços advocatícios, seja em caráter individual, seja no âmbito de sociedade de advogados ou de empresa ou entidade em que trabalhe, dispensar-lhes-á tratamento condigno, que não os torne subalternos seus nem lhes avilte os serviços prestados mediante remuneração incompatível com a natureza do trabalho profissional ou inferior ao mínimo fixado pela Tabela de Honorários que for aplicável. Parágrafo único. Quando o aviltamento de honorários for praticado por empresas ou entidades públicas ou privadas, os advogados responsáveis pelo respectivo departamento ou gerência jurídica serão instados a corrigir o abuso, inclusive intervindo junto aos demais órgãos competentes e com poder de decisão da pessoa jurídica de que se trate, sem prejuízo das providências que a Ordem dos Advogados do Brasil possa adotar com o mesmo objetivo. ao advogado que exerce cargo ou função em órgão da OAB de atuar em qualquer processo que tramite nesses órgãos, exceto em causa própria. O sigilo profissional, importantíssimo para o exercício da advocacia também sofreu algumas alterações em 2015. Foi inserida no capítulo referente ao tema a redação do artigo 36, tornando inequívoco o fato de o sigilo ter natureza de ordem pública, sendo imposto ao profissional, independentemente de solicitação feita pelo cliente. Nessa linha, o dever de sigilo é estendido aos advogados que exerçam funções de mediador, conciliador e arbitro. Outra inovação é a permissão de publicidade dos serviços dos advogados por meios eletrônicos, como redes sociais, desde que de forma moderada, sem tentativa de captação de clientela, nos termos do artigo 46, caput e p. único. O caráter meramente informativo da publicidade profissional está configurado no artigo 39 do Código e é reforçado nas vedações do artigo 40. Os honorários advocatícios ganham capítulo próprio nos artigos 48/54. Pode-se elencar como as principais alterações referentes ao assunto: (i) A preferência que os honorários sejam estipulados por escrito, sem vedação a outras formas (art. 48); (ii) Na contratação de profissionais para serviços auxiliares, pagamento de custas e emolumentos, na hipótese do advogado adiantar as despesas, será lícito reter tais valores na prestação de contas com o cliente até o correto pagamento (art. 48, p. 3º); (iii) Às disposições com relação aos honorários são estendidas a mediação, conciliação e arbitragem (art. 48, p. 4º); (iv) Vedação da diminuição dos honorários pactuados em decorrência da resolução extrajudicial do litígio (art. 48, p. 5º); (v) Cumprimento ao valor mínimo previsto na tabela de honorários instituída pelo Conselho Seccional (art. 48, p. 6º); (vi) Execução, preferencial, dos honorários contratuais e de sucumbência de forma destacada em relação ao crédito do cliente, inclusive, com guias separadas (arts. 48, p. 7º e 51); (vii) Quando o objeto do serviço jurídico versar sobre prestações vencidas e vincendas, os honorários poderão incidir sobre o valor de umas e outras (art. 50, p. 2º); (viii) No caso de substabelecimento os honorários de sucumbência poderão ser repartidos entre o substabelecente e o substabelecido, proporcionalmente. Qualquer controvérsia acerca desses valores poderá ser solucionada com a ajuda de mediador, indicado pela OAB (art. 51, p. 1º/3º); (ix) O advogado pode levar a protesto o cheque ou a nota promissória emitida por cliente a seu favor, depois de frustrada a tentativa de recebimento amigável (art. 52, p. único); e (x) O pagamento pode ser feito por meio de cartão de crédito (art. 53). Com relação ao processo disciplinar, pautado em capítulo próprio nos artigos 55/69, a grande maioria dos dispositivos foi mantida, mas algumas alterações chamam a atenção para um maior rigor no balizamento da atividade profissional. Desta forma, verificar-se-á às principais alterações: (i) Requisitos para a instauração de ofício do processo disciplinar (art. 55, p. 1º); (ii) A representação deverá ser formulada ao Presidente da Seccional, da Subseção ou ao Presidente do Tribunal de Ética e Disciplina (art. 56, caput e p. único); (iii) Requisitos da representação (art. 57); (iv) A instrução do processo pode ser delegada ao Tribunal de Ética e Disciplina (art. 58, p. 1º) e deverá conter o histórico disciplinar do representado (art. 58, p. 2º); (v) Prazo de 30 dias para o relator proferir parecer acerca da instauração do processo disciplinar ou arquivamento, sob pena de redistribuição do feito (art. 58, p. 3º); (vi) Definiu como competente para julgar as representações contra membros do Conselho Federal e do Presidente do Conselho Seccional a segunda câmara do Conselho Federal reunida em plenário (art. 58, p. 5º, primeira parte); (vii) Estabeleceu a competência do Conselho Pleno do Conselho Federal para julgar representações contra membros da Diretoria do Conselho Federal, membros Honorários Vitalícios e detentores da Medalha Ruy Barbosa (art. 58, p. 5º, segunda parte); (viii) Estabeleceu a competência do Conselho Seccional para julgar representações contra dirigentes das subseções (art. 58, p. 6º); (ix) Especifica os casos em que o relator poderá indeferir a produção de provas (art. 59, p. 6º); (x) Cabe ao relator, ao final da instrução, proferir parecer com o enquadramento legal aos fatos imputados (art. 59, p. 7º); (xi) O prazo para apresentação das razões finais pelas partes, deixa de ser sucessivo e passa a ser comum (art. 59, p. 8º); (xii) O relator será designado por sorteio e não mais designado pelo Presidente do Tribunal (art. 60); (xiii) Os requisitos e o conteúdo do acórdão referente ao julgamento final do processo disciplinar estão especificados de forma detalhada (arts. 61 e 62); (xiv) O procedimento para revisão do processo disciplinar, agora está delineado (art. 68); e (xv) Previsão acerca da possibilidade do advogado que tenha sofrido sanção, requerer a sua reabilitação (art. 69). O novo Código também ganha disciplina mais robusta acerca dos seus próprios órgãos disciplinares, com a ampliação da competência do Tribunal de Ética, nos termos do artigo 71, e uma seção própria sobre as corregedorias gerais, no artigo 72. Assim, percebe-se que a tentativa do Conselho Federal, com a revisão do CED, foi fortalecer a atividade da advocacia, delimitando a relação desse profissional com a OAB, os demais advogados, agentes públicos e a própria sociedade. Tais alterações demonstram a preocupação do órgão de classe com as novas demandas sociais e com a pluralidade das relações contemporâneas, legitimando ainda mais a importância da advocacia no Estado Democrático de Direito. Conclusão As especificidades da atividade da advocacia e a sua imprescindibilidade para a existência da democracia, tornam inevitáveis a preocupação com a postura ética desse profissional. Desta forma, o CED, em vigor desde 1995, passou no ano de 2015 por inúmeras alterações que buscaram adequar o seu texto as novas práticas exigidas pela sociedade contemporânea. Alguns pontos, sempre espinhosos, foram enfrentados pelo novo texto merecendo tratamento cuidadoso. Foi o caso da relação do advogado com a OAB, fortalecida pelos termos do artigo 8º do CED, em que o advogado tem que cumprir com todas as obrigações assumidas na OAB. Isso faz com que o zelo e o comprometimento com a instituição sejam intensificados. A relação com o cliente também ganha novo contorno, essencialmente para reforçar os parâmetros de transparência e cooperação exigidos nessa relação, imputando obrigações não apenas ao advogado, mas também ao próprio cliente, que tem que informar ao advogado todos os fatos relativos a causa. O mesmo ocorre na relação entre os próprios advogados. O respeito a essa atividade é exigido entre os profissionais e entre todos que permeia a atividade da advocacia, como agentes políticos, autoridades e servidores públicos. A tutela dessas relações mereceu, inclusive, capítulo próprio. A advocacia pro bono pela primeira vez é disciplinada no CED, demostrando a preocupação e o reconhecimento da natureza social da atividade da advocacia. Um retrato do Código também passa a ser o rigor ético imposto aos dirigentes da OAB. Uma preocupação que tem o objetivo de legitimar pleitos da OAB perante outros órgãos públicos e privados. A condução das atividades de direção tem que ser pautada pela lisura, ética e moral. O sigilo profissional ganha grande reforço, tornando inequívoca a sua natureza pública. Desta forma, a obrigação do advogado está presente independentemente de solicitação prévia do cliente. Tal fato segue a linha de orientação que busca intensificar a conduta ética do advogado, especialmente nas relações com o cliente. O novo Código também reconhece o avanço social dos meios de comunicação, permitindo que em caráter meramente informativo, o advogado utilize as redes sociais, deixando claro no artigo 40 todas as vedações acerca da publicização da atividade profissional. As disposições referentes aos honorários advocatícios tornam-se mais claras e adequadas a realidade da profissão, como a possibilidade de utilização de cartão de crédito, bem como o protesto de cheque ou nota promissório emitida pelo cliente em favor do advogado. As alterações no CED tiveram o principal objetivo de adequar a atividade da advocacia com o contexto social imposto por este novo século. Sem dúvida, tais alterações foram pautadas e tiveram como premissas o fato de estar-se diante da emergência material dos direitos, frente ao embate da inclusão x exclusão. Existem dificuldades no reconhecimento da legitimação das novas reivindicações por direitos. Tais reinvindicações passam, necessariamente pela atuação do advogado. A postura ética desse profissional ajuda a exercitar o que o direito vem a ser no seu processo histórico de formação. Algumas das enunciações jurídicas vêm a ser evidentes nesse processo histórico e algumas insuficientes. Por isso, não de pode achar que o direito se materializa na legislação, pois o não direito mais frequentemente o faz também. Com isso, os advogados, são chamados a ter uma atitude de vigilância. Um exemplo dessa postura ética e vigilante que se espera do advogado está positivado no artigo 34, VI do EOAB, ao afirmar que constitui infração disciplinar advogar contra literal dispositivo de lei, mas, estará isento de sanção, quando o faz na boa fé, com base em precedentes ou na injustiça da lei. Desta forma, é percebe-se que há uma simetria entre direito e lei e direito e justiça e não necessariamente um é tomado pelo outro. A lei muitas vezes consagra a injustiça, por isso, a atualização dos parâmetros éticos do exercício da advocacia, fazem com que esse profissional esteja sempre na busca pelo caráter efetivo da norma, consagrando sua essência cultural, histórica e transformadora. A efetividade que se espera, consagrada pela a atuação do advogado, foi instrumentalizada ainda mais com as alterações substantivas realizadas no Código de Ética e Disciplina da OAB, intensificando os parâmetros éticos impostos a essa atividade.

Referências Bibliográficas

CARDELLI, Haroldo e CREMASCO, José Antonio. Manual de ética profissional do advogado. São Paulo: Millenium, 2005. COSTA, Elcias Ferreira da. Deontologia Jurídica. Ética das profissões jurídicas. Rio de Janeiro: Forense, 2008. GONZAGA, Alvaro de Azevedo. Estatuto da Advocacia e Novo código de ética e disciplina da OAB: comentados/Alvaro de Azevedo Gonzaga, Karina Penna Neves, Roberto Beijato Junior. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016. LÔBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. São Paulo: Saraiva, 2008. MACEDO, Gerônimo Theml de. Estatuto da Advocacia e da OAB e Legislação Complementar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. MOREIRA, Márcio Martins. Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil Anotado. São Paulo: Cone editora, 2005. NALINI, José Renato. Ética Geral e Profissional. São Paulo: RT, 2006. SANTORO, Felipe D’ Amore. Curso de Ética, Deontologia e o Estatuto da Advocacia. São Paulo: Pillares Editora, 2006.

Palavras Chaves

Advocacia. Ética profissional. Estatuto da OAB. Código de Ética e Disciplina da OAB.