TRANSEXUALIDADE E INFÂNCIA: buscando um desenvolvimento saudável

Resumo

Esse estudo traz reflexão sobre tratamento dado no Sistema Único de Saúde às crianças transgêneras, objetivando contribuir com argumentos neste campo dos estudos de gênero e de saúde pública, ao mesmo tempo favorecer que esse tópico ganhe visibilidade na academia e na sociedade. Sustentado em referenciais teóricos, apresentam-se contextualizações sob enfoque histórico, sociológico, médico, psicológico, pedagógico e jurídico. A metodologia utilizada na pesquisa foi revisão literária e artigos das áreas de sociologia, história, filosofia e de especialistas no campo das ciências médicas e sociais via buscas na BVS Brasil, Scielo e Google Acadêmico, e por artigos com a palavra “transgênero”.

Artigo

TRANSEXUALIDADE E INFÂNCIA: buscando um desenvolvimento saudável[1]

 

Ana Lodi[2]

Kelly Kotlinski Verdade[3]

Resumo: Esse estudo traz reflexão sobre tratamento dado no Sistema Único de Saúde às crianças transgêneras, objetivando contribuir com argumentos neste campo dos estudos de gênero e de saúde pública, ao mesmo tempo favorecer que esse tópico ganhe visibilidade na academia e na sociedade. Sustentado em referenciais teóricos, apresentam-se contextualizações sob enfoque histórico, sociológico, médico, psicológico, pedagógico e jurídico. A metodologia utilizada na pesquisa foi revisão literária e artigos das áreas de sociologia, história, filosofia e de especialistas no campo das ciências médicas e sociais via buscas na BVS Brasil, Scielo e Google Acadêmico, e por artigos com a palavra “transgênero”.

Palavras-chave: Transgêneros Infantis. Identidade de Gênero. Despatologização. Educação de profissionais de saúde

Keywords: Transgender Children. Gender Identity. Despatologization. Education of health professionals.

Introdução

No Brasil, o Ministério da Saúde oferece atenção às pessoas em processo de transexualização por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) desde a publicação da Portaria Nº 457, em 2008. Para obter esse atendimento, as pessoas transgêneras devem atender requisitos como: maioridade, acompanhamento psicoterápico por, pelo menos, dois anos, laudo psicológico/psiquiátrico favorável e diagnóstico de transexualidade[4]. Nada é dito sobre crianças. Repetimos, sem notar, comportamentos arraigados, até sermos exigidos a tomar posicionamentos que o convívio, ainda que profissional, com as transidentidades nos obriga. Se não os notamos é como se estes não ocorressem. Assim, não podem ser negados, portanto, não são entendidos como reais.

Sem conexão com essa realidade forçada pelas convenções sociais, existem pessoas, segundo Lanz (2014, p.66), que mesmo arriscando tudo – status, emprego, família e reputação – ‘deixam seus armários’ e aventuram-se a transpor as muralhas do gênero, tornando-se ‘transgressores de gênero’. Enfrentam os mecanismos de pressão social para a conformidade, e a permanente vigilância e repressão institucional, que as obrigam a viver à margem da sociedade, sujeitas a interdições, proibições e punições.  São rechaçados socialmente. Sem acesso à educação formal, empregabilidade ou sustento, forçados a se prostituir, julgados pelo comportamento, dito promíscuo, pela sociedade que os coloca nessa situação de vulnerabilidade, e condenados como não merecedores de respeito, por não cumprir com as expectativas da sociedade.

As famílias têm um papel fundamental na vida de transgêneros jovens. Aquelas que apoiam, protegem os jovens transgêneros, evitando, os resultados negativos e ajudando a promover saúde positiva e bem-estar; enquanto que, as famílias que rejeitam os jovens transgêneros os afetam negativamente e contribuem para aumentar os seus problemas de saúde e os seus estados de saúde mental. Quando percebem a não adequação da criança, toda a família também passa pelos estágios do processo de adequação à identidade transgênera: negação / choque, raiva / medo, tristeza, autodescoberta, aceitação e por fim orgulho (OLSON, FORBES, BELZER, 2011, p. 5). Assim, tanto criança e família, precisam ser acolhidas e bem orientadas pelas equipes de atendimento primário de saúde[5], para que essas fases se desenvolvam da maneira menos traumática o possível para a criança e seu saudável desenvolvimento. Então, como ampliar o olhar dos profissionais de saúde para transgêneros desde a infância de forma a atendê-los fora da ideia hegemônica de heterocisnormatividade[6], com eficácia nos serviços, buscando desenvolver desde cedo em todo o seu potencial?

Nossa sociedade possui erroneamente uma concepção binária e sexualizada, onde gênero é desempenho no espaço público. Essa concepção binária dos gêneros reproduz o pensamento moderno de sujeitos universais, atribuindo-lhes determinadas características que, supõe-se, sejam compartilhadas por todos. Nascemos sem forma, como uma folha em branco “esperando o carimbo da cultura que, por meio de uma série de significados culturais, assume o gênero” (BENTO, 2006, p. 71), ou seja, presumidamente sem nenhum conceito do que é ser masculino ou feminino ao nascer, aprenderemos com a interação cultural:

Após o nascimento da criança, os investimentos discursivos dirigem-se para a preparação do corpo, a fim de que este desempenhe com êxito os papéis de gênero; bonecas, saias e vestidos para as meninas; bolas, calças, revólveres para os meninos… O mundo infantil se constrói sobre proibições e afirmações. (BENTO, Ibid.).

Bento (Ibid.) diz: “Essa pedagogia dos gêneros tem como objetivo preparar aquele sujeito para a vida referenciada na heterossexualidade, construída a partir da ideologia da complementaridade dos sexos”. É interessante notar que esse discurso é atualmente utilizado em um jogo de palavras invertido pelos políticos conservadores para “acusar” de querer impor uma “ideologia de gênero” todo aquele que confronta a vida referenciada na heterossexualidade construída a partir desta ideologia da complementaridade dos sexos. Confronto esse que tanto perturba essa referenciada heterossexualidade, pedagogicamente ensinada às crianças através de premiações ou reprimendas. A noção de que educação para o respeito não é doutrinação possivelmente tenha uma importância primordial, uma vez que esses valores sociais são muito arraigados e fundamentais, e precisam ser desconstruídos. É como se as “confusões” nos papéis provocassem, direta e imediatamente, “perturbações” na orientação sexual (BENTO, Ibid.). A confusão se agrava quando falamos em performances de gênero, pois, os conceitos forjados desde a infância, são mais fortes justamente no que tange as performances de gênero hegemônicas:

A infância é o momento em que os enunciados performativos são interiorizados e em que se produz a estilização dos gêneros: “Homem não chora”, “Sente-se como uma menina”, “Isto não é coisa de uma menina”. Esses enunciados performativos têm a função de criar corpos que reproduzam as performances de gênero hegemônicas. Conforme sugeriu Louro, são evocações ritualizadas da lei heterossexual. (BENTO, 2006, Ibid.).

E assim atrofiam-se sentimentos e comportamentos espontâneos, substituindo-os por performances no espaço público. Por vezes, até mesmo no espaço familiar. Bento (2006, p. 105) sugere uma possibilidade de percepção das performances de gênero que desfaça “os limites e as fronteiras que separam o natural do antinatural, o real do irreal, a verdade da mentira, o humano do não humano”, evitando assim a patologização e a vulnerabilidade da população de transgêneros pela negação de oportunidades. Dessa forma, poderíamos produzir mais conhecimento sobre o tema no Brasil e oferecer o tratamento promotor de saúde adequado aos jovens transgêneros desde a infância.

Saber como promover saúde para transgêneros desde a infância é de extrema necessidade se levarmos em consideração o quanto crianças não estão emocionalmente equipadas para lidar com a pressão do grupo social para corresponder à conformidade e com a permanente vigilância e repressão institucional a desvios das performances de gênero hegemônicas. Em uma de suas entrevistas Rosostolato (2016), afirma que:

No caso de crianças transgêneras, a discriminação e o preconceito fazem com que esta, que não possui recursos e defesas construtivas, retraia-se e isole-se. Ela acaba se sentindo diferente, como um ser doente e anormal. Ela vai definhando e perdendo sua autoestima. Assim, fica vulnerável emocionalmente e propensa à depressão. O afeto vai se embotando e a criança fica sem referências positivas.

Podemos inferir que a falta de atenção primária no atendimento às questões de socialização e a não aceitação da sociedade que não está preparada para entender e/ou aceitar a criança trans como ela é, compõe justamente o sofrimento mental que gera nas crianças trans os quadros psicológicos ou psiquiátricos descritos como patologia.

De acordo com Bento e Pelúcio (2012), não há em nenhuma pesquisa a testabilidade e verificabilidade necessárias para afirmar que transexualidade é doença, dado que não é da ordem do verificável, sendo do campo das subjetividades:

Os princípios científicos de testabilidade e verificabilidade reivindicados por documentos como o DSM-IV podem ser questionados em cada uma das classificações ali apresentadas. No caso da transexualidade ou nos chamados “transtornos de identidade de gênero”, a pretensão de cientificidade não se sustenta. Basta que analisemos um excerto referente a “Achados laboratoriais associados”, constante do referido manual. Nele se lê que não existe qualquer teste diagnóstico específico para o Transtorno da Identidade de Gênero. Na presença de um exame físico normal, geralmente não se indica o cariótipo de cromossomas sexuais e avaliações de hormônios sexuais. A testagem psicológica pode revelar identificação ou padrões de comportamento do gênero oposto. […] O SOC[7] também reconhece limitações de um conhecimento cientificamente comprovado por testes laboratoriais para produção do diagnóstico de “disforia de gênero”, mas alimenta a esperança de que as incertezas clínicas possam resolver-se no futuro por meio da investigação científica. Afirmação risível, não fossem suas consequências graves nas vidas de inúmeras pessoas. (Idem, p. 578).

É exatamente nesse ponto que a sociologia entra em atrito com a ciência médica. Uma grande quantidade de médicos ainda insiste na patologização, mantendo o tema agregado dentro de aspectos controlados pela medicina como transtornos da sexualidade, e, assim, o controle sobre os corpos. A sociologia encara o assunto como mais uma variável do comportamento sexual humano, não um transtorno.

Alguns médicos apresentam sensibilidade para a matéria, mesmo não se afastando da abordagem biomédica. O Protocolo Olson, Forbes, Belzer, Gestão do Adolescente Transgênero (2011, p. 1), já em seu resumo justifica a necessidade de capacitar os profissionais da área de saúde para estarem aptos a lidar com ela:

Médicos da Atenção Básica estão em uma posição única e poderosa para promover a saúde e obter resultados positivos para transgêneros jovens. Embora nem todos os adolescentes transexuais desejem a transição fenotípica para coincidir com seu gênero e corpo físico, a maioria o faz. O processo de transição é complexo e requer o envolvimento multidisciplinar, um terapeuta de saúde mental especializado em gênero, uma equipe médica que envolva clínicos, psiquiatras, psicólogos, urologistas, ginecologistas e endocrinologistas. Encontrar serviços especializados de saúde médica e mental é extremamente difícil para estes jovens, que estão em grave situação de risco para vários problemas psicossociais, incluindo familiares e rejeição dos colegas, assédios, traumas, abusos, habitação inadequada, problemas legais, falta de apoio financeiro e problemas educacionais.

Assim, ela se mostra mais inclinada a preocupar-se com os fatores sociais que causam a desestabilização emocional que geram a necessidade de atendimento psicoterápico, do que com fatores biologizantes. E acredita ser imprescindível extensa pesquisa que amplie a compreensão da experiência dos transgêneros, particularmente, dos jovens. E recomenda:

[…] a identificação de previsores de persistência da disforia de gênero desde a infância até a adolescência e uma investigação aprofundada sobre o impacto das intervenções para jovens transgêneros. Finalmente, a análise dos ambientes sociais da juventude transexual é fundamental para o desenvolvimento de intervenções apropriadas necessárias para melhorar a vida das pessoas trans. (OLSON-KENNEDY et al., 2016, p. 172).

Primordial é que as pesquisas existam e seus resultados venham a ser aplicados, pois há altas taxas de suicídio entre os jovens transgêneros. Olson estima que cerca de 50% dos jovens transgêneros do Children’s Hospital de Los Angeles já tentaram suicídio (OLSON, 2015 apud GROSSMANN, 2016). Outro estudo do Hospital da Criança de Cincinnati publicado no periódico Suicide and Life-Threatening Behaviour mostra que 30% dos jovens transgêneros relatam ter tentado suicídio pelo menos uma vez, e 42% têm histórico de automutilação. Os autores também ressaltam que quase 63% dos jovens sofreram bullying, 23% foram suspensos/expulsos da escola, 19% envolveram-se em brigas e 17% repetiram o ano. Nesta pesquisa não foram encontrados registros de estudos acadêmicos sobre suicídio de transgêneros infantis no Brasil até 30 de agosto de 2016, sugerindo uma total invisibilidade do tema.

A capacitação profissional de operadores da saúde a partir da perspectiva de não patologizar a identidade trans e a possibilidade de refletir sobre a problemática em rotular crianças transexuais como doentes é o principal desafio do poder público para dar a esses jovens um projeto de humanidade que não apague as diferenças, e sim ensine estes profissionais a dar o atendimento que respeite a alteridade e as diferenças. Aprender a olhar o mundo de maneira não normalizadora exige mais do que pensar em famílias diversas ou em inclusão. É preciso questionar a própria pressuposição de que é necessário reproduzir o existente quando podemos começar a transformá-lo.

Aumentar a quantidade e a qualidade de pesquisa científica no Brasil visando melhorar a compreensão da disforia de gênero e da experiência dos transgêneros, particularmente dos jovens, pois pouco se estuda sobre transgêneros infantis, possibilita a análise dos ambientes sociais da juventude transexual que são fundamentais para o desenvolvimento das intervenções apropriadas necessárias por provedores médicos, visando a despatologização e a melhora da vida das crianças e jovens trans; encarando práticas médicas e sociológicas como complementares, não sendo a transexualidade doença, e sim uma das variações de existência humana, de maneira que as intervenções venham a ajudar as crianças e os jovens em não-conformidade de gênero a prosperar.

O objetivo deste trabalho é fazer uma análise introdutória acerca das crianças transgêneras que possa contribuir para aumentar a consciência dos profissionais da área de Saúde sobre as demandas clínicas, direitos e necessidades dos transgêneros infantis.

1 Metodologia

Este estudo foi realizado a partir de uma revisão da literatura e artigos de alguns dos principais autores clássicos das áreas de sociologia, história e filosofia bibliográfica da segunda metade do séc. XX em particular as últimas décadas até os atuais especialistas nacionais e estrangeiros no campo das ciências sociais, através de buscas na base de dados da BVS Brasil[8], Scielo[9] e Google Acadêmico[10], por artigos que trouxessem a palavra “transgênero”. A mesma metodologia foi utilizada para as áreas de saúde, jurídica, e educação. A busca iniciou-se através do cruzamento das palavras “transgênero” ou “transexual” e “criança”, “infância” ou “infantil”.

Foram utilizados os Manuais DSM IV e V. Pesquisas complementares foram feitas na internet por legislação específica e de portarias, bem como de matérias jornalísticas embasadas em pesquisas após a verificação das fontes da pesquisa.

Foram analisados 165 textos, sendo utilizados 46%, 36% de autores estrangeiros e 64% de autores nacionais. No Brasil, não se observou muitos artigos relacionados ao tema criança transgênera. A maioria dos artigos brasileiros retrata a realidade dos adultos transgêneros, demonstrando a escassez de dados sobre o assunto. Os dados mais precisos sobre o tema vêm de pesquisas americanas, canadenses, e holandesas.

2 Discussão

 

A despeito de existir atualmente uma maior ocupação dos espaços político-sociais, acadêmicos e em novelas de emissoras de grande difusão, ainda há no imaginário coletivo a imagem do transexual marginal. Politicamente, a maior demanda é por visibilidade nos meios de comunicação que traga respeito à condição trans.

Polêmicas existem a respeito das mudanças ocorridas nos diagnósticos de TIG no último DSM-5 e os profissionais de saúde não podem se eximir de se posicionar diante delas. É ignorado por quase todos que a inclusão da transexualidade no DSM e no CID-10 e a concepção de um diagnóstico diferenciativo foram fundamentadas pelos resultados de um estudo com dez pessoas transexuais de idade adulta – estudos clínicos que representavam um grupo diminuto de indivíduos – realizado por Leslie Lothstein (1983). No DSM-IV, no CID-10 e no SOC, as pessoas transexuais são construídas como portadoras de um conjunto de indicadores comuns que as posicionam como transtornadas, independentemente das variáveis culturais, sociais e econômicas.

Os profissionais que defenderam a remoção do TIG do DSM-5 citaram preocupações sobre danos causados para as pessoas transexuais, devido à estigmatização e aumento do desconforto e risco; eles veem a identidade de gênero como análoga à homossexualidade, que já foi removido do DSM em 1973. Aqueles profissionais que eram a favor da manutenção do diagnóstico do TIG para o DSM-5, afirmavam que ele atendia a critérios de ser um transtorno mental e que, sem o diagnóstico de TIG, as pessoas transexuais não serão capazes de receber os tratamentos de saúde geral e de saúde mental necessários para um diagnóstico preciso, e deixariam de receber o apoio tão necessário durante o processo de transição, referindo-se às questões relacionadas ao financiamento das ações de saúde necessárias a esses pacientes (BENTO e PELÚCIO, 2012, p. 572).

Até mesmo entre os ativistas encontram-se divergências. Enquanto muitos transgêneros lutam a favor do movimento pela despatologização, outros brigam ferozmente pelo não despatologização. Os transgêneros mais abastados têm acesso à medicalização e processos cirúrgicos, quando é o caso, na rede privada. Já os menos privilegiados ou mais vulneráveis dependem do SUS para receber o atendimento de adequação corporal. Argumentam estes que, caso a transexualidade deixe de ser considerada doença, não poderão mais receber tratamento gratuito pelo SUS.

Os profissionais da saúde insistem em diagnosticar o gênero, apesar de não conseguirem cientificidade que autorize psicólogos, psiquiatras, endocrinologistas e outras especialidades que fazem parte das equipes multidisciplinares a avaliarem as pessoas transexuais e travestis como doentes, dado que não existe nenhum exame clínico que conduza a produção do diagnóstico para determinar a ocorrência do “transtorno”. Assim sendo, não é possível elencar quais são e como se devem estabelecer os limites discerníveis entre “os transtornados de gênero” e “os normais de gênero”. Parte-se, então, não de ciência, mas das subjetividades de verdades pré-estabelecidas socialmente sobre o que deve ser gênero, e quais as normas e regras aceitas para o masculino e feminino (BENTO[11], 2011. p.100).

Se não existem critérios formais que possam distinguir o normal do anormal em termos de gênero, a patologização só serve para o controle dos corpos. Esse pensamento levou vários grupos de estudiosos e militantes no mundo todo a se unirem em torno de uma campanha de despatologização – A Campanha “Pare a Patologização!” (BENTO e PELÚCIO, Ibid.). A patologização nega direitos básicos a esses cidadãos quando exclui essas pessoas do mercado de trabalho, das escolas, e dos serviços de saúde.

2.1 Questão sócio-política

A população transgênera tem cidadania precária, é extremamente vulnerável e desumanizada. Oportunidades lhe são negadas. É tratada através de uma concepção de não humano, de maneira patologizante que os leva às clínicas e presídios[12].

Para muitas pessoas trans o ser transgênero, para além de uma identidade de gênero, é uma condição sociopolítica de inadequação. Portanto, não tem que ser patologizada pela não-conformidade com a categoria de gênero em que foi enquadrada ao nascer. O termo opõe-se a Cisgênero, que é a condição sociopolítica de adequação e conformidade com a categoria de gênero em que a pessoa foi classificada ao nascer.

Retirar o estigma da patologização é dizer que a transexualidade é questão de gênero e não de doença e os movimentos contra a patologização defendem o direito de todos se expressarem a partir dos atributos convencionados como femininos e masculinos que julgarem convenientes, sem receber classificações ou sanções sociais. Defende-se o direito das pessoas de modificarem seus corpos livremente para adequá-los às suas necessidades particulares e contingentes. (FERRARI e CAPELARI, 2014).

2.2 Treinamento social para a aceitação

             As famílias com uma criança transgênera têm em comum a preocupação do que acontecerá à criança com a chegada da puberdade, sendo esta apenas uma questão de tempo. Procuram, então ajuda profissional de psicólogos, endocrinologistas e assistentes sociais que possam auxiliar as crianças que não se encaixam nas denominações habituais de “menino” e “menina”.

O diagnóstico oficial da psiquiatria para crianças como essas características era chamado de “transtorno de identidade de gênero”. Embora adolescentes e adultos transgêneros possam realizar tratamentos hormonais, a forma predominante de tratamento de crianças pequenas que não estão satisfeitas com seus gêneros é orientá-las em direção à aceitação de seus sexos biológicos.

A denominação oficial do diagnóstico dessas crianças também mudou, de “transtorno de identidade de gênero” para o menos estigmatizante — embora ainda controverso — “disforia de gênero”.  O acolhimento às famílias que buscam por ajuda precisa ser especializado, possibilitando que essas famílias sejam bem orientadas pelas equipes de atendimento primário de saúde. Imperativo se faz que os profissionais envolvidos possam definir o gênero de uma forma emancipadora, não ancorada no próprio sistema político e jurídico que o normatiza, pois serão esses profissionais que irão ensinar à família a pensar e teorizar o gênero independentemente do sexo.

Os médicos que trabalham em clínicas “de afirmação de gênero” dizem que a melhor maneira de evitar resultados trágicos é permitir que quando ainda crianças vivam suas identidades de gênero da forma que quiserem — seja como um menino, como uma menina ou algo entre isso.

Eles dizem que, já que a identidade de gênero está fortemente conectada ao cérebro, crianças a partir dos três anos já podem começar a manifestá-la. Assim, quanto mais cedo a sociedade permite que as crianças expressem o gênero que elas acreditam pertencer, mais felizes, menos ansiosas e mais ajustadas socialmente elas ficam. Quanto ao pequeno subconjunto de crianças que demonstram acreditar pertencer a um gênero não binário, isso significa deixá-las fazer a “transição social” vivendo como um menino ou menina em tempo integral.

Kenneth Zucker[13], psicólogo que fundou uma das primeiras clínicas de identidade de gênero destinada a adolescentes, o Centro de Vícios e Saúde Mental em Toronto, foi um dos primeiros a adotar o chamado modelo holandês, que recomenda um tratamento para adolescentes com disforia de gênero a base de drogas para bloquear a puberdade. O motivo que leva este estudo a concordar com essa abordagem é que esses medicamentos são reversíveis, portanto, servem essencialmente para ganhar tempo: o adolescente pode decidir desistir de tomá-los e passar pela puberdade com o gênero que foi atribuído ao nascer; ou, depois de alguns de anos, ele pode optar por continuar a sua transição, iniciando o tratamento com estrogênio ou testosterona. Esses medicamentos desligam o eixo hipotálamo-pituitária-gonadal (HPG) e a produção de testosterona ou estrogênio é temporariamente interrompido. O bloqueio da puberdade permite ao jovem explorar o gênero e participar mais plenamente do processo de terapia de saúde mental sem ser consumido pelo medo de um processo de desenvolvimento iminente que resultará na aquisição de características sexuais secundárias indesejáveis. Os agonistas da GnRH têm sido usados com segurança por décadas em crianças com outras condições médicas, incluindo a puberdade precoce central. A supressão da puberdade deve, idealmente, começar nos primeiros estágios do desenvolvimento puberal e pode ser administrada por meio de injeções intramusculares ou subcutâneas, ou através de um implante que é inserido no braço. O monitoramento para assegurar a supressão do eixo HPG deve ocorrer regularmente. Jovens transgêneros poderão no futuro, caso queiram, continuar o tratamento e receber hormônios para completar a transição fenotípica de gênero. Agonistas da GnRH mudaram a paisagem da intervenção médica para jovens com disforia de gênero e estão rapidamente se tornando o padrão de prática em clínicas particulares e fora do Brasil.

Há que se destacar um ganho com essa abordagem. A autorização dos procedimentos de transgenitalização, mesmo para adultos, é muito recente no Brasil. As resoluções do Conselho Federal de Medicina (resoluções do CFM no 1482/1997, no 1652/2002 e a vigente no 1955/2010) sempre estabeleceram como um dos critérios a maioridade de 21 anos, para que os/as usuários/as transexuais fossem autorizados a realizar procedimentos hormonais e cirúrgicos considerados experimentais ou não. Desta forma o Processo Transexualizador foi e está estruturado para atender exclusivamente a adultos. A utilização de bloqueadores hormonais na puberdade evita o aparecimento dos caracteres sexuais secundários durante, os quais seriam bem mais difíceis de fazer desaparecer após a adolescência, até que a criança ou adolescente tenha idade e maturidade emocional para decidir sobre o Processo Transexualizador após os 21 anos. Caso desista, basta parar de tomar os bloqueadores hormonais e seu próprio organismo voltará a produzi-los e retomará seu curso genético.  Atrasos, no entanto, podem levar a problemas emocionais semelhantes aos que têm sido associados com atraso constitucional da puberdade. Embora essa abordagem tenha sido pouco estudada, há os que defendam o uso da idade de dezesseis anos como uma “diretriz a considerar” como início precoce de utilização de hormônios do gênero oposto em uma base, caso a caso, após avaliação cuidadosa dos riscos e benefícios potenciais para os jovens e com consentimento dos seus pais.

No entanto, Zucker recentemente foi alvo de ataques por sua abordagem com crianças pequenas. Ele estaria afastando-as de uma nova identidade de gênero e tentando convencê-las a aceitar os gêneros com os quais nasceram. Alguns dos críticos compararam seus métodos com a “terapia de conversão”, as tentativas desacreditadas de “desfazer” a homossexualidade.

Dr. Zucker afirma que ele sente que em muitos casos pais, escolas e grupos de defesa da comunidade podem aconselhar uma transição muito cedo. Há uma necessidade maior do que nunca para o curso natural da variância de gênero e disforia ser compreendido. O foco da clínica está na avaliação intensiva e no tratamento e não incluiu a participação na educação da comunidade sobre este tópico. Esta é uma oportunidade significativa perdida.

2.3 Aderência a tratamentos médicos e psicológicos

 

A AIDS trouxe como benefício para a população trans a procura mais assídua pelos serviços de saúde. Passados 30 anos da epidemia, essa população já é compreendida como tendo outras enfermidades além do HIV/AIDS. Todavia, mesmo com o trânsito mais assíduo no Sistema Único de Saúde, a verdade é que os profissionais de saúde ainda agem com muito estranhamento, alheios que estão às mudanças sociais, não compreendem as especificidades dessa parte da população. Até mesmo porque nunca foram treinados para isso, nem nas fileiras acadêmicas, nem na prática profissional.

Estamos longe de ter um atendimento com qualidade integral, universal e equânime, ainda que o Processo Transexualizador pelo SUS seja uma antiga reivindicação do grupo. Mas vale a pena destacar a importância de políticas públicas específicas para a inclusão das populações mais vulneráveis, como os transgêneros, visando a maior permanência em espaços, outrora impensáveis, nas dependências do SUS, para que tratem da sua saúde e mantenham aderência aos tratamentos através da adequação do sistema à demanda.

Em uma palestra ministrada pela Dra. Johanna Olson, ela citou pesquisas feitas desde os anos 70 que apontam que são infundados os temores a respeito de crianças tão jovens já serem capaz de afirmar seu gênero:

Pesquisas demonstram que a constância de gênero permanece intacta a partir dos três ou cinco anos de idade. Ou seja, uma criança de sete anos que afirma que é de outro gênero sabe muito bem o que está falando – tanto quanto uma criança da mesma idade que afirma que é cisgênero. (OLSON, 2015[14], Ibid.).

Na mesma palestra, a médica aborda outro aspecto interessante – o fato de familiares e amigos duvidarem da identidade de gênero de uma pessoa jovem quando essa espera até tornar-se adolescente para se expor:

Dizemos para nossos filhos que não há como eles saberem qual é seu gênero aos três anos de idade. Eles são jovens demais! Mas daí, se eles esperam até se tornarem adolescentes para nos contar, nós dizemos ‘Por que você esperou tanto para me dizer que é transgênero? Por que você não me contou quando tinha três anos?’. (OLSON, op. cit.)

Quão mais completa for a compreensão, por parte dos profissionais da área de saúde, sobre o universo que cerca a questão da criança transgênera, como ser merecedora de atenção já na infância, maior será a possibilidade de aderência da família ao atendimento devido, uma vez que poderão ser mais bem preparados para reconhecer, acolher e cuidar, promovendo, assim, saúde para minimizar o impacto nos agravos ao seu desenvolvimento e, desta forma, maximizar positivos futuros prognósticos sociais.

2.4 As altas taxas de suicídio entre jovens transgêneros

             Em 2003, Cohen-Kettenis, Owen, Kaijser, Bradley e Zuck realizaram um estudo, que chamaram de Lista de Verificação do Comportamento da Criança, em inglês, Child Behavior Checklist (CBCL), que examinou características demográficas, competência social e problemas comportamentais em crianças com problemas de identidade de gênero em Toronto, Canadá (N = 358) e Utrecht, Holanda (N = 130) para avaliar o autodano e o suicídio. As crianças transgêneras — calcula-se que sejam 1,5% do total, nos EUA, — têm de duas a três vezes mais chances que seus colegas de cometer suicídio ou sofrer de depressão profunda. (Nossa tradução).

O alto índice de suicídios entre os jovens transgêneros justifica o emprego de todos os recursos possíveis na despatologização, no treinamento adequado dos operadores da saúde, e consequente treinamento social para a aceitabilidade das crianças trans como apenas mais uma variável da subjetividade da expressão do gênero humano.

Quase ninguém percebe que o poder dos seus opressores, reais e imaginários, deriva exatamente da sua total alienação em decidir e agir por sua própria conta e risco. O poder dos “ditadores” surge e se reforça cada vez que uma pessoa, oprimida e molestada, desiste de fazer alguma coisa para se livrar da opressão. Como afirmou Foucault, o poder não se encontra em “grandes esferas” e altos escalões, mas nas práticas e nas relações mais elementares das pessoas seu dia-a-dia. (LANZ, 2016) [15].

Mas aqui falamos de crianças. Como podem elas ter instrumentos para lutar com seus socializadores? Tendo em conta esse processo de estigmatização, que produz atos de violência contra a população trans, levando-as, com frequência, à morte, não é de estranhar que problemas de saúde mental, significativos sejam enfrentados pelos transgêneros jovens, incluindo, abuso de substâncias psicoativas e transtorno de estresse pós-traumático.

Sem a abordagem correta, a criança transgênera não tem poder para enfrentar seus opressores nessas relações do dia-a-dia. A discriminação e o preconceito fazem a criança, que não possui recursos e defesas construtivas, retrair e isolar-se. Ela acaba se sentindo diferente, como um ser doente e anormal. Ela vai definhando e perdendo sua autoestima. Assim, fica vulnerável emocionalmente e propensa à depressão, que pode levar a automutilação e ao suicídio. O afeto vai se embotando e a criança fica sem referências positivas. (OLSON, op. cit.).

2.5 Construção de valores que permitam a existência da diversidade

 

O dispositivo desumano de divisão, classificação, hierarquização e “normalização dos corpos” dos indivíduos, e sua consequente repressão e punição se dá pela socialização na infância. Se pudermos criar nossas crianças a partir do pressuposto da ampla eliminação do dispositivo binário de gênero, não haverá mais repressão e punição. Cada um poderá ser feliz sendo o que é. E qualquer adequação corporal necessária será encarada como uma cirurgia plástica para aumentar os seios ou diminuir o nariz.

Como ainda não temos uma sociedade assim, temos que pensar na possibilidade de não sexualizar a criança antes do tempo e permitir a ela a dignidade social de uma transição parcial e gradual, que parece mais sensato. Olson afirma que nunca se registrou um caso em que uma criança foi prejudicada por ter realizado a transição social e depois voltar atrás. Por transição social, entenda-se as mudanças que não necessitam de qualquer intervenção médica, como mudança de nome e de pronomes, mudança de roupas, e apresentar-se em situações sociais em outro gênero. “Pura questão de logística, não médica”, afirma a doutora. (OLSON, 2015).

Essas mudanças não geram redesignação corporal, mas já permitem a criança se sentir muito melhor. Como ela ainda não tem características sexuais secundárias, ao se vestir e se apresentar social como do gênero desejado ela já se sente contemplada na sua identidade de gênero. Ainda segundo Olson (2015), não há discussões clínicas sobre os efeitos nocivos dessa mudança de ideia porque elas vitalmente não existem. Inclusive, alguns jovens disseram: “E, foi meio constrangedor dizer para meus pais que eu tinha mudado de ideia’, mas nenhum jamais disse ‘Minha vida foi para o ralo e eu não consegui ir para a faculdade”. (Nossa tradução).  A médica acredita que com o passar dos anos, esse constrangimento será apenas história de vida. O contrário, forçar uma criança trans a reprimir sua identidade de gênero e fingir ser quem não é, trará graves consequências ao psiquismo e risco de autodano.

Olson (op. cit.) afirma também que não há qualquer tipo de exame que se possa fazer, para saber se a criança realmente é transgênero ou apenas não se ajusta aos padrões de gênero:

O garotinho que não tira a fantasia de princesa de sua irmã está apenas experimentando novas cores e novos estilos? A menininha que quer passar máquina zero na cabeça igual a seu irmão é uma moleca? Ou eles são transgêneros? Muitos garotos amam as princesas, e muitas meninas gostam de esporte e cortes de cabelo sem frescura. Isso não quer dizer necessariamente que eles são trans. As estatísticas apontam que a maioria deles não é. Como, então, saber quais são trans? (Nossa tradução).

Olson assegura que as crianças nos oferecem o que ela chama de “preditivos de persistência”, que seriam como indicativos que irão permanecer ao longo do tempo em suas identidades como, por exemplo:

Elas dizem que SÃO de outro gênero, ao invés de dizerem que gostariam de ser de outro gênero…

[…] Elas ficam muito perturbadas por seu gênero de nascimento. Essas são as crianças que tentam cortar partes do corpo com cortadores de unha, fio dental, ou tesouras. São as crianças que tomam banho de roupa. Elas sofrem com ferimentos causados a si mesmas e pensamentos suicidas, porque viver e não se sentir autêntico é muito, muito ruim para elas.

[…] Roupas de banho e roupas íntimas são uma grande diferença entre as crianças que só querem se vestir com as roupas de outro gênero e as crianças que nos dizem que realmente SÃO de outro gênero. É muito comum que crianças transgêneras peçam para usar roupas íntimas de acordo com o gênero com que se identificam.

[…] Quando se pergunta para essas crianças como elas se enxergam quando crescerem, a resposta vem num gênero diferente daquele com que nasceram. (OLSEN, op. cit.). (Nossa tradução).

Outra orientação de Olson é permitir o uso de bloqueadores hormonais para bloquear o início de uma puberdade indesejada em jovens com disforia de gênero. Ao invés disto, essas crianças estão sendo forçadas a aprender algo que o íntimo delas diz que está errado, mas ninguém acredita. E por vezes são punidas por isso. Na idade que ela tem que “aprender” o mundo, esse mundo se apresenta com conceitos toscos limitantes, que não as deixam viver livres para ser o que são, forçando-as dentro das caixinhas do binarismo homem-mulher. A médica enfatiza que esses são apenas indícios e não há um manual de regras para se identificar uma criança transgênera. O melhor a se fazer, insiste, é simplesmente escutá-las: “Ninguém melhor do que você mesmo sabe qual é seu gênero, e o mesmo vale para as crianças. Às vezes pergunto para elas: ‘qual é seu gênero quando você está sonhando?”. (OLSEN, op. cit.). (Nossa tradução).

Conclusão

Apesar de hoje grande parte da sociedade ainda confundir os conceitos, ou talvez ter pouco acesso aos debates recentes no âmbito das ciências sociais sobre sexo, gênero, orientação sexual e expressão de gênero, de alguma forma, já sabemos que são coisas distintas.

O biológico em nós exerce bem pouca influência na deliberação das nossas atitudes sociais, dado que a espécie humana é predominantemente vinculada à socialização. Apesar disso, é erroneamente entendido como consensual que os atos de humanos, machos e fêmeas, têm procedência biológica instintiva.

Gênero é um dispositivo de construção cultural, social e politicamente formulado em códigos de conduta, utilizado para classificar e hierarquizar pessoas com o propósito de exercer controle social compulsório através de normas muito rígidas e não resultado de determinantes biológicos que levariam machos e fêmeas a agir socialmente de maneira altamente específica e diferenciada. Assim sendo, não há motivos para se entender como verdade absoluta alguma norma de comportamento pré-estabelecida como imutável. Portanto, muito menos razão há para tratar os desviantes da mesma, como marginais, doentes e abjetos, com preconceito e discriminação, ou medicalizando suas condições. Se há algo a ser reavaliado pela sociedade, por sua vez, são aqueles que medicalizam / patologizam para lucrar com a imensa indústria farmacológica fazendo dinheiro com a patologização e medicalização de corpos.

No Brasil, como em vários outros lugares do mundo, qualquer coisa que fuja ao binarismo de gênero é tratado com preconceito e discriminação.  Como os transgêneros rompem com os paradigmas do que foi classificado como masculino e feminino, são colocados à margem da sociedade. Contudo, expressar a própria sexualidade é uma parte fundamental do desenvolvimento psicológico saudável de qualquer pessoa.

Os transgêneros se encontram à margem das identificações possíveis, a partir das normas que regulam e ditam o que é normal e o que não o é, quais são possíveis e quais não são. Ou seja, os corpos das pessoas trans são abjetos, numa noção buttleriana, visto que são corpos que não possuem vida, não possuem existência, não há a possibilidade de existirem, mas existem. E isso incomoda as pessoas, pois somos produzidos a partir de um discurso heteronormativo.

Nos últimos anos, verificou-se uma mudança substancial no modo como as crianças que desafiam as normas de gênero são consideradas pelas suas famílias e pelo público em geral. Patologizada e tratada durante décadas como uma doença mental, a não conformidade de gênero na infância parece estar imbuída de novo significado, como evidenciado por um número crescente de vozes públicas que alegam a variância de gênero como parte da diversidade humana. Chame isso de mudança de paradigma: da desordem à diversidade, do tratamento à afirmação, da patologia ao orgulho, da cura à comunidade. Contudo, o mesmo não pode se dizer dos mais variados profissionais chamados a lidar com a questão: advogados, professores, assistentes sociais; mas especialmente, os profissionais da área de saúde – médicos, enfermeiros, e psicólogos, que são os primeiros envolvidos na atenção à criança transgênera.

Pessoas trans são tratadas de maneira desrespeitosa e encaram a discriminação e o abuso não unicamente na sociedade, como também, e de forma mais contundente, onde precisam receber mais cuidados – no atendimento dos serviços de saúde, este que deveria ser universal e de qualidade para todos, sem distinção de raça, credo, gênero, religião, ou orientação sexual.

Em toda esta discussão, em nenhum momento se trata da identidade de gênero como sendo um processo que se desenvolve desde a infância, o que atrasa a atenção à saúde física e emocional da criança.

Os profissionais de saúde com frequência não se apresentam aptos a reconhecer, acolher e cuidar de uma pessoa que tenha o gênero destoante, uma vez que desconhecem as mudanças recentes na linguagem, mudanças nas variações de identidade e mudanças no foco de intervenção com crianças não conformes de gênero.

Uma parte indescritível dos operadores da saúde segue lidando com a condição transgênera como transtorno mental apoiada em estudos efêmeros, com pequenas amostragens, sem os princípios científicos de testabilidade e verificabilidade, referendando protocolos e manuais como DSM, CID e SOC, que podem ser questionados em cada uma das classificações ali apresentadas. Se questionados, os achados laboratoriais associados não sustentam o diagnóstico, pois não existe qualquer teste para o “transtorno” de gênero. Com amostragens tão ínfimas, onde todos os pesquisadores afirmam que mais estudos são necessários, não faz sentido insistir em biologizar a transexualidade. Por que seguir apoiando marcações sociais profundas em bases biológicas frágeis, que explicam a condição transgênera como “descargas” hormonais anormais durante a gravidez, sem quaisquer dados com bases incontestáveis.

Essas “verdades” científicas em forma de protocolos e manuais médicos chegam ao público –  aos médicos, enfermeiros, psicólogos, e demais profissionais de saúde, bem como a outros profissionais que decidiram fatos primordiais sobre a vida e a existência das pessoas trans, como os operadores da justiça – como se fossem inquestionáveis,  condenando toda uma parcela da população com rótulo de doente, de aberração, que somado a outros componentes sociais, religiosos e interesses políticos e financeiros, acabam por ser demasiadamente perigosos e penosos – custam vidas, quando não literalmente, matam socialmente pessoas desde crianças. Retiram-lhes a possibilidade de se desenvolver, estudar, trabalhar, ter uma vida comum.

Ser destro, canhoto ou ambidestro tem base biológica e nenhum dos casos é considerado patologia. Anualmente vários bebês nascem com polidactilia[16], que exige atenção médica para uma adequação corporal e nem por isso são dados como seres abjetos, necessitados de tratamento para saúde mental.

Ainda que um dia seja possível contemplar uma base biológica para a identidade de gênero, esta nada mais será que uma variação humana, que por vezes possa necessitar de atenção médica para adequação corporal, mas que se não fosse o treinamento social para a heterocisnormatividade, não geraria nenhum desconforto psicoemocional nas crianças trans e que jamais seria encarada e classificada medicamente como distúrbio, transtorno ou patologia. Evitaríamos assim também as demais questões jurídicas e sociais associadas ao tema, sendo todos os seres tratados com o devido respeito à dignidade da pessoa humana.

Modificar a formação dos profissionais de saúde com uma formação mais especializada fará com que esses estejam aptos a tratar pessoas transgêneras desde a infância fora da ideia hegemônica de heterocisnormatividade; despatologizando a identidade trans. Este trabalho apoia a intervenção médica oportuna, para atingir congruência de gênero/corpo combinada com terapia de saúde mental afirmativa, com uma abordagem apropriada para minimizar os resultados negativos para a saúde e maximizar resultados futuros positivos para crianças transexuais.

Através desta explanação esperamos ter contribuído para a discussão sobre a retirada do termo patologizante “transtorno de identidade de gênero” do CID-11 e DSM-V, pois se faz necessária não apenas para a retificação dos documentos das pessoas transgêneras, mas também para a supressão da heterocisnormatividade nos tratamentos das pessoas intersexo e, como dito por FERRARI e CAPELARI (2014) em “A Despatologização do Transtorno de Identidade de Gênero: Breves Considerações em Defesa do Direito à Identidade Sexual, Intimidade e Saúde dos Indivíduos Trans”: ao livre acesso aos tratamentos hormonais e às cirurgias sem a tutela psiquiátrica, à luta contra a transfobia, propiciando a educação, inserção social e laboral das pessoas trans. Ainda que exista a preocupação concreta que, após a despatologização, os direitos adquiridos como, por exemplo, a garantia de acesso gratuito ao processo transexualizador pelo Sistema Único de Saúde (portaria GM nº 1707 de 18 de Agosto de 2008) seja revogada o que, claramente, constituiria um óbice financeiro à grande maioria dos indivíduos trans.

As consequências de não afirmar a identidade de gênero de uma criança podem ser graves e podem interferir com sua capacidade de desenvolver e manter relacionamentos interpessoais saudáveis. No contexto escolar, essa angústia também impedirá o foco do aluno transgênero na aula e comprometerá sua capacidade de aprender. Quanto mais tempo um jovem transgênero não for afirmado, mais significativas e duradouras as consequências negativas podem se tornar, incluindo perda de interesse na escola, aumento do risco de uso de álcool e drogas, má saúde mental e suicídio.

Falar sobre gênero nas escolas terá o efeito de remover grande parte da pressão que os alunos enfrentam para se enquadrar em expectativas estreitamente definidas de que poucos, se é que alguém, pode realmente se enquadrar.

Pais e profissionais devem ajudar a criança a vivenciar a experiência trans. A avaliação psicológica adequada é necessária. E sendo confirmado que se trata de uma criança transgênera, fornecer o apoio necessário para que essa criança possa vivenciá-la de maneira integral, sem censura. Como dito por Saadeh, não é fácil para nenhum pai ou mãe se adaptar a essa transformação, mas quando se pensa em respeito e aceitação pela diferença e por quem é de verdade o filho ou filha, fica mais fácil.

No Brasil, a cirurgia só pode ser feita após os 21 anos, mas o uso dos hormônios pode começar a partir dos 18. Identificado que não resta dúvida sobre a transexualidade da criança/adolescente, é possível tentar autorização junto ao Conselho Federal de Medicina para começar o tratamento hormonal antes.

Com base na pesquisa existente e no discurso público, considera-se urgentemente necessário que tais profissionais tenham em suas grades acadêmicas matérias que versem sobre o campo da sexualidade humana. Modificar a formação dos profissionais de saúde fará com que esses estejam aptos a tratar pessoas transgêneras desde a infância fora da ideia hegemônica de heterocisnormatividade; despatologizando a identidade trans; não seguindo o DSM-V; e desvinculando a ideia de identidade de gênero da cirurgia, passando essa a ser autodeclarável. Pelo relatório dos pais, as crianças com disforia de gênero mostram uma taxa aumentada de automutilação / suicídio à medida que envelhecem. Este risco não foi simplesmente um artefato da presença de problemas comportamentais e emocionais, embora estes problemas fossem correlatos significativos de autoagressão / tentativas de suicídio.

Para aumentar a consciência dos profissionais da área de saúde sobre as demandas, direitos e necessidades da população de transgêneros, particularmente dos infantis, é indispensável, mais do que uma rápida palestra sobre o tema, um programa completo de treinamento que desconstrua estereótipos, e os qualifique e instrumentalize para a empreitada de ajudar as famílias a entenderem e cuidarem de suas crianças.

Desta maneira, embasado no que foi estudado através das pesquisas de Bento, Olson, Saadeh, e Lanz, entre os demais estudiosos, entendemos que os serviços de saúde às pessoas trans não são adequados, são falhos e podem ser aprimorados. Com o objetivo de prevenir ou aliviar a angústia que os jovens transgêneros muitas vezes vivenciam, com base nos argumentos de Bento, de Olson e nos manifestos internacionais a favor da despatologização, propomos algumas medidas que podem contribuir para ampliar o conhecimento e, desta forma, qualificar melhor a atenção à saúde das pessoas trans e intersexo, em particular da criança transgênera, objetivando atingir congruência de gênero/corpo combinada com saúde mental, através de abordagem apropriada e assim enfrentar o estigma causado pela falta de informação neste tema, minimizando o impacto nos agravos ao seu desenvolvimento saudável, e maximizando prognósticos sociais futuros positivos:

  1. Preparação de profissionais das diversas áreas de especialidade (medicina, psicologia e afins) para compreensão, aceitação e acolhimento das pessoas transgêneras desde a infância através de produção de módulos teóricos que conceituem gênero e identidades de gênero; desconstruindo estereótipos relacionados às identidades trans dentro das grades acadêmicas da formação dos profissionais de saúde.
  2. A retirada da transexualidade como patologia dos manuais de diagnóstico.
  3. O financiamento pelo Estado ao processo transexualizador para as pessoas adultas que assim o decidam autonomamente, via autodeterminação, evitando assim que essas venham a ficar emocionalmente doentes pela incongruência corporal.
  4. Educar gestores do SUS e dos demais servidores da saúde para que reconheçam, com sensibilidade, na população trans – adultos e crianças – atores que necessitam desse serviço, e devem ser respeitados em suas demandas e necessidades.
  5. O fim das cirurgias genitais em meninos e meninas intersexuais e que se estabeleçam protocolos médico-legais internacionais que protejam seus direitos.
  6. Os profissionais da área de saúde devem rotineiramente pesquisar a presença de pensamentos e comportamentos suicidas em crianças com disforia de gênero, particularmente durante a segunda metade da infância;
  7. Distanciar-se das exigências e imposições sociais ou religiosas para poder acolher a criança.
  8. Sustentar a diferença, compreender a situação, manter o diálogo e ajudar a criança no que for necessário.
  9. Educação e apoio às famílias de crianças transgêneras para compreensão, aceitação e acolhimento dos seus membros transgêneros.
  10. Orientar os pais para que permitam à criança “socialmente em transição” a viver de forma consistente com a sua identidade de gênero. Isso inclui vestir-se, interagir com colegas e usar nomes e pronomes de uma maneira consistente com o seu gênero identificado. Para a maioria dos jovens transgêneros, a transição social fornece alívio tremendo e imediato, permitindo-lhes florescer social, emocional e academicamente, sem medicalização precoce.
  11. Passar segurança para a criança, que pode acontecer, concomitantemente, com o diálogo e as explicações que os pais podem fornecer. Com isso, é possível abordar a sensação e os sentimentos que ela possui sobre si mesma, procurando esclarecer que esta diferença não interfere na relação dela com os amigos e que não há nada de errado.
  12. Orientar os pais quanto a amenizar eventuais discriminações na escola conversando com a diretoria e professores. A conversa e o apoio dos pais fortalecem o filho que inevitavelmente experimentará o sofrimento causado pelo preconceito. Mas proteger não é esconder ou enclausurar a criança num mundo fechado. Ela precisa ser encorajada a se relacionar com as outras crianças e não se sentir envergonhada. Isso facilita a aceitação.
  13. Proibição total de práticas pseudoterapêuticas, de natureza clínica ou religiosa, visando a “recuperação” de crianças e jovens transgêneros.
  14. Campanhas sistemáticas de informação ao grande público para promoção de saúde sobre o que é a condição transgênera, separando a questão de gênero da questão de orientação sexual e combatendo sistematicamente a transfobia.
  15. Permitir o uso de bloqueadores hormonais para bloquear o início de uma puberdade indesejada em jovens com disforia de gênero.

São necessários estudos mais profundos para realmente capturar as populações “ocultas” e a falta de acesso aos cuidados médicos formais.

Referências

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Notas de Rodapé:

[1] Artigo apresentado no 1º Congresso Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente das Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil, no dia 7/6/2017, na sede da OAB-RJ.

[2] Especialista em Gênero, Sexualidade e Direitos Humanos pelo GEDIHS/ENSP da FIOCRUZ (2017). [email protected]

[3] Mestre em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Brasil (2013). Coordenadora Executiva do Fundo Social ELAS, Brasil. [email protected]

[4] Portal Brasil 2016. Cirurgias de mudança de sexo são realizadas pelo SUS desde 2008.  Ministério da Saúde. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/precária-e-justica/2015/03/cirurgias-de-mudanca-de-sexo-sao-realizadas-pelo-sus-desde-2008. Acesso em 21 de outubro de 2016.

[5] Internacionalmente tem-se apresentado ‘Atenção Primária à Saúde’ (APS) como uma estratégia de organização da atenção à saúde voltada para responder de forma regionalizada, contínua e sistematizada à maior parte das necessidades de saúde de uma população, integrando ações preventivas e curativas, bem como a atenção a indivíduos e comunidades

[6] Heterocisnormatividade é essa relação absoluta, linear e direta, existente na nossa sociedade entre sexo, gênero e orientação sexual. Um dispositivo totalitário e hegemônico resultante da aplicação compulsória das normas binárias de conduta de gênero a todas as relações estabelecidas entre as pessoas na nossa sociedade. (LANZ, 2014, p.40).

[7] A Harry Benjamin International Gender Dysphoria Association (HBIGDA) publica e revisa regularmente o Standards of Care (SOC). O propósito principal deste documento é articular um consenso profissional internacional acerca do manejo psiquiátrico, psicológico, médico e cirúrgico das “Desordens da Identidade de Gênero”. Ao mesmo tempo objetiva orientar os profissionais no entendimento dos “parâmetros dentro dos quais podem oferecer assistência às pessoas com este tipo de problema”. WPATH, 2012. Para uma leitura do Standards of Care (sétima versão), consultar <www.wpath.org>.

[8] Site: <http://brasil.bvs.br>

[9] Site: <http://www.scielo.org/php/index.php>

[10] Site: <https://scholar.google.com.br>

[11] No livro Corpo, Gênero e Sexualidade: instâncias e práticas de produção nas políticas da própria vida / SANTOS, L.H.S. RIBEIRO, P.R.C. (orgs.). – Rio Grande: FURG, 2011. 154 p.: il. – Texto de Berenice Bento: Luta globalizada pelo fim do diagnóstico de gênero? – MANIFESTO – transexualidade não é doença! Pela retirada da transexualidade do DSM e do CID!

[12] Os conceitos de cidadania precária e de desumano como pensados por Berenice Bento – Travestis e Transexuais: Construção de Identidade. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=2Kf7vzRiw0I> no YouTube. Acessado em 15 de outubro de 2016. Conceito de Humano em Berenice discute o que é gênero. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=rpch8gR7tpg> no YouTube. Acessado em 15 de outubro de 2016.

[13] Entrevista concedida ao BuzzFeed News Reporter. Texto de Azeen Ghorayshi. Publicado 27 de outubro de 2016. Disponível em <https://www.buzzfeed.com/azeenghorayshi/garota-americana-o-quao-jovem-n-jovem-demais-para?utm_term=.xabpW0m8oX#.bsEJW8MZY9>. Acesso em 16 de setembro de 2016.

[14] Matéria assinada por Marcio Caparica no site da UOL – Cultura e Cidadania LGBT no dia 20/10/215 que se refere à palestra dada pela Dra. Olson na 14a. Gender Odyssey Conference. Disponível em <http://ladobi.uol.com.br/2015/10/duvidas-criancas-transgenero>. Acesso em 23/09/206. A Gender Odyssey Conference é uma conferência internacional que discute os interesses de pessoas transgênero e fora da conformidade de gênero. Em 2015, uma das principais palestrantes da conferência foi a médica Johanna Olson, diretora do Centro de Desenvolvimento e Saúde da Juventude Trans do Hospital Infantil de Los Angeles, onde atende quase 500 pessoas transgênero com idades entre 3 e 25 anos.

[15] <http://leticialanz.blogspot.com.br/2016/10/de-onde-vem-o-poder-dos-seus-opressores.html>.

[16] Anomalia causada pela manifestação de um alelo autossômico variável, dominante com expressividade consistindo na alteração quantitativa anormal dos dedos da mão (quirodáctilos) ou dos dedos do pé (pododáctilos).

Palavras Chaves

Transgêneros Infantis. Identidade de Gênero. Despatologização. Educação de profissionais de saúde.