A CRISE CAUSADA PELA PANDEMIA DA COVID-19 E SEUS IMPACTOS NAS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS

Resumo

Através do presente artigo que faz uma abordagem sobre a crise sanitária global, a qual merece ser considerada por sua origem na crise ecológica já vivenciada, busca-se analisar os efeitos econômicos decorrentes de grave recessão que impactam as micro e pequenas empresas. Com isso, pontua-se os últimos acontecimentos ocorridos na esfera legal, bem como se faz uma breve crítica ao regramento específico das micro e pequenas empresas, de modo que a regulamentação precisa ser revista urgentemente, com vistas a excluir esses “gargalos” existentes, tornando o instituto da Recuperação Judicial do pequeno e microempresário mais próximo da realidade, porém trazendo também o posicionamento de alguns doutrinadores que acreditam numa solução extrajudicial mais adequada para o momento.

Artigo

A CRISE CAUSADA PELA PANDEMIA DA COVID-19 E SEUS IMPACTOS NAS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS

 Emília Lucy Cerqueira Garcez[1]

Roberta Souza dos Santos Andrade[2]

  

RESUMO

 Através do presente artigo que faz uma abordagem sobre a crise sanitária global, a qual merece ser considerada por sua origem na crise ecológica já vivenciada, busca-se analisar os efeitos econômicos decorrentes de grave recessão que impactam as micro e pequenas empresas. Com isso,  pontua-se os últimos acontecimentos ocorridos na esfera legal, bem como se faz uma breve crítica ao regramento específico das micro e pequenas empresas, de modo que a regulamentação precisa ser revista urgentemente, com vistas a excluir esses “gargalos” existentes, tornando o instituto da Recuperação Judicial do pequeno e microempresário mais próximo da realidade, porém  trazendo também o posicionamento de alguns doutrinadores que acreditam numa solução extrajudicial mais adequada para o momento.

 Palavras-chave: Crise Sanitária. Covid-19. Impactos Econômicos. Micro e Pequenas Empresas.

  

INTRODUÇÃO

            A pandemia da Covid-19 causada pelo novo Corona vírus (SARS-CoV-2), que se disseminou em 187 países, representa uma crise de saúde global com profundo impacto econômico e sobretudo uma oportunidade para considerarmos a crise ecológica.

            Tendo em vista a alta velocidade de propagação do vírus e a ausência de conhecimento científico sobre o Corona vírus, foi reconhecido o status de pandemia e por consequência decretado o estado de calamidade pública, que levou ao estudo sobre a melhor estratégia a ser adotada, sendo utilizado o isolamento social horizontal para conter a rápida transmissão da doença até que fosse preparado o Sistema Público de Saúde.

          Neste cenário, com a suspensão das atividades empresariais houve uma drástica redução das receitas das empresas em diversos segmentos aumentando de forma considerável o desemprego e afetando fortemente as diversas relações contratuais com a superveniência desses fatos.

            Diante do contexto, o trabalho se desenvolve a partir de um estudo sobre a origem pandêmica da Covid-19 que culminou numa grave crise sanitária, ensejando severos reflexos sociais e econômicos nas micros e pequenas empresas no Brasil.

ORIGEM DA PANDEMIA DA COVID-19

            Enquanto a pandemia aumenta de forma inimaginável o índice de letalidade no mundo, o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, diz que o planeta estava passando pela “pior crise global desde a fundação das Nações Unidas, há 75 anos”.[3]

            Desperta reflexão ao mesmo tempo que a humanidade atravessa tempos difíceis, o planeta pode respirar. O novo coronavírus leva a economia global à recessão, mas seu corolário é a diminuição da poluição. A catástrofe na Saúde é uma benção ambiental!

            Segundo Serge Morand, Ecologista e Diretor de estudos no Centro Nacional de Pesquisa Científica da França (CNRS), a probabilidade da Covid-19 ter surgido em um vírus de morcego é de 98%, conforme apresentado nas colunas do jornal Libération, no dia 26 de março de 2020.[4] Todavia, o coronavírus de morcego não é transmissível aos seres humanos, pois a estrutura de seu genoma deve evoluir para poder entrar nas células humanas, portanto a mutação ocorre mais frequentemente por meio de outras espécies animais, que assumem a função de passarelas, tornando o vírus compatível com os seres humanos. No caso do novo Sars-CoV-2, o vírus responsável pela Covid-19, acredita-se que possa ter feito um pit stop evolutivo num mamífero chamado pangolim permitindo essa humanização.

            Com isso, onde a responsabilidade humana está envolvida é que a destruição da biodiversidade aumenta o risco de uma epidemia. “Se desmatamos e urbanizamos, os animais selvagens perdem seu habitat e isso promove seu contato com animais domésticos e humanos”, É provável que o contato silvestre tenha sido o principal vetor de transmissão.

       “Desde a década de 1960, mais e mais epidemias atingiram seres humanos, animais e plantas – e com a interconexão entre países aumentando, essas epidemias rapidamente se tornam pandemias. Com a globalização, todas as condições são favoráveis à explosão de epidemias: perda da biodiversidade, industrialização da agricultura e aumento do transporte de mercadorias e pessoas”, adverte o especialista.

      Para evitar novas crises ecológicas como a da Covid-19, a humanidade deve, portanto, admitir que a saúde e até a civilização humana só podem ser mantidas com ecossistemas funcionais. No entanto, deve-se preservar a biodiversidade repensando a agricultura e adotar um desenvolvimento sustentável.

DO COLAPSO NOS SISTEMAS DE SAÚDE À AMEAÇA DE GRAVE RECESSÃO ECONÔMICA

            A pandemia da COVID-19 tem se apresentado como um dos maiores desafios sanitários em escala global deste século. Em meados do mês de Abril, poucos meses depois do início da epidemia na China, já haviam ocorrido mais de 2 milhões de casos e 120 mil mortes no mundo, que prosseguem sem previsão final. Atualmente, em 17 de maio de 2020, foram registrados no mundo cerca de 4,66 milhões casos confirmados e 312 mil mortes e no Brasil, 234 mil casos confirmados e 15.662 mortes pela COVID-19, ocupando o 4º em número de casos confirmados.[5]

 A ausência de conhecimento científico sobre o novo Corona vírus, sua alta velocidade de propagação e o alto índice de letalidade em populações com alguma vulnerabilidade, geram incertezas sobre quais seriam as melhores estratégias a serem utilizadas para o enfrentamento da epidemia em diferentes partes do mundo, principalmente por não se saber as características de transmissão da COVID-19 num contexto de desigualdade social que prevê a existência de população em situação de aglomeração vivendo em condições precárias de habitação e de saneamento, o que torna esse desafio ainda maior.

            Em meio a esse cenário de crise sanitária mundial ocasionado pela rápida contaminação do novo Corona vírus, a Organização Mundial de Saúde – OMS declarou, no dia 11/03/2020, o status de pandemia e em seguida foi promulgado o decreto nº 6/2020, no dia 20/03/2020, reconhecendo o estado de calamidade pública.

            Ambas as medidas visaram a contenção imediata da disseminação, em território nacional, da COVID-19, buscando estabelecer regras de comportamento que deveriam ser adotados.

            De forma objetiva, a estratégia em resposta à pandemia da COVID-19 poderá ser subdivida em quatro fases: contenção, mitigação, supressão e recuperação.[6]

            A primeira fase, denominada de “contenção”, inicia antes do registro de casos em um país ou região pelo rastreamento ativo dos passageiros vindos do exterior e seus possíveis contatantes, ou seja, é um movimento de antecipação à propagação do vírus, visando evitar ou postergar a transmissão comunitária. Na atual pandemia considera-se que uma fase de contenção exemplar foi essencial para que o impacto inicial da pandemia fosse menor em Taiwan, Singapura e Hong Kong, mesmo estando próximos da China.

            A segunda fase, denominada de “mitigação”, inicia quando a transmissão sustentada da infecção já está instalada no país. O objetivo é diminuir os níveis de transmissão da doença para os grupos com maior risco de apresentarem quadros clínicos graves, além, claro, do isolamento dos casos positivos identificados. Essas medidas, denominadas de “isolamento vertical”, são em geral acompanhadas de algum grau de redução do contato social. Em geral começa com o cancelamento de grandes eventos, seguido paulatinamente por ações como a suspensão das atividades escolares, proibição de eventos menores, fechamento de teatros, cinemas e shoppings, recomendações para a redução da circulação de pessoas. É o que se convencionou chamar de “achatar a curva” da epidemia.

            A terceira fase, denominada de “supressão” pode ser necessária quando as medidas anteriores não conseguem ser efetivas, seja porque sua implementação não pode ser concretizada de forma adequada e imediata (p.ex.: insuficiência de testes diagnósticos necessários para identificar indivíduos infectantes logo no início da epidemia) ou porque a redução alcançada na transmissão é insuficiente para impedir o colapso na atenção à saúde. Na fase de supressão são implantadas medidas mais radicais de distanciamento social, de toda a população. Aqui o objetivo é adiar ao máximo a explosão do número de casos, por tempo suficiente até que a situação se estabilize no campo da assistência à saúde, procedimentos de testagem possam ser ampliados e, eventualmente, alguma nova ferramenta terapêutica ou preventiva eficaz (p.ex.: vacina) esteja disponível. Há controvérsias[7] em relação a essas medidas de “isolamento horizontal”, particularmente no que concerne às suas repercussões econômicas, sociais e psicológicas em âmbito populacional.[8]

            Por fim, a quarta fase, denominada de “recuperação”, quando há sinal consistente de involução da epidemia e o número de casos se torna residual. Essa última fase requer uma organização da sociedade para a reestruturação social e econômica do país no que se prevê a intervenção do Estado.

            No Brasil, a questão de qual seria a estratégia mais adequada para o contexto atual da epidemia, se o “isolamento vertical” ou o “isolamento horizontal”, tem dominado o debate em diferentes setores da sociedade civil, mas também entre pesquisadores e profissionais direta ou indiretamente envolvidos com o enfrentamento da epidemia. Esse debate tem analogia com o dilema da escolha de intervenções baseadas em “estratégias de alto risco” ou “estratégias populacionais”.[9]

Segundo Geoffrey Rose, as intervenções baseadas em “estratégias de alto risco” seriam aquelas orientadas para a redução do impacto da doença e suas complicações em um subconjunto populacional considerado de mais alto risco. Já a “estratégia populacional” propõe uma abordagem preventiva para toda a população. No âmbito das doenças crônicas, com alta prevalência, há uma preferência por estratégias populacionais, pois os benefícios das ações preventivas seriam sentidos não só pela população de mais alto risco, mas por todos.  Assumindo que os riscos à saúde se distribuem continuamente numa população, uma abordagem populacional abrangeria um maior contingente de pessoas responsáveis pela maior carga da doença em âmbito populacional.

            A adoção de diferentes estratégias de isolamento social, vertical ou horizontal, deve ser pautada em uma análise da situação e progressão da epidemia em um determinado contexto. Dessa forma, sob o ponto de vista estritamente teórico, uma estratégia efetiva de “isolamento vertical” poderia ser a mais eficiente também por reduzir as repercussões econômicas e sociais associadas ao “isolamento horizontal”.

            Ocorre, porém, que as condições para a execução de um “isolamento vertical” efetivo, na situação atual da epidemia no Brasil, são muito limitadas. Isso se dá, em parte, pela alta velocidade de expansão da infecção, a tão conhecida falta de estrutura no sistema de saúde pública e as dificuldades para o monitoramento e vigilância estrita de casos e contatos, uma vez que a proporção de assintomáticos se aproxima de 80% dos infectados.

            Além disso e, principalmente, pela ausência de um sistema de testagem amplo estabelecido logo no início da epidemia de forma a permitir a identificação precoce dos infectados.

            De fato, a experiência da China mostra que, no início da epidemia, cerca de 86% das infecções não foram detectadas, mas constituíram a fonte de infecção para cerca de 79% dos casos. Não à toa, os progressos no controle da epidemia na China só ocorreram após a implantação de medidas amplas e drásticas de distanciamento social. Nos países que apresentam amplas restrições tanto na capacidade de testagem nos momentos iniciais da epidemia como na cobertura da assistência ao paciente grave, como os Estados Unidos e a Itália, o “isolamento vertical” foi inicialmente executado, porém, a evolução rápida do número de casos exigiu, ainda que tardiamente, a introdução da estratégia de supressão via “isolamento horizontal”. Da mesma forma, no Reino Unido, a estratégia de isolamento vertical foi inicialmente preconizada, mas a evolução da epidemia e as projeções disponíveis levaram a uma mudança de rumo, com a adoção da estratégia de supressão baseada em isolamento social horizontal.

            Há tempos que a comunidade científica do campo das doenças infecciosas alerta sobre o advento de novas pandemias. O século XXI presenciou várias epidemias que puderam ser contidas em algum nível temporal ou geográfico, como as duas epidemias de coronavírus (pelo SARS-CoV e a síndrome respiratória do Oriente Médio – MERS), as epidemias de Ebola na África e a epidemia de gripe aviária (H5N1). Em conjunto elas provocaram menos mortes do que a COVID-19. A pandemia de influenza H1N1 de 2009, para a qual uma vacina estava disponível, foi devastadora, estimando-se que entre 150 mil a 575 mil pessoas morreram de causas associada à infecção. O número de mortes que serão provocadas por COVID-19 é uma incógnita, mas estimativas atuais indicam que poderá superar 2 milhões de óbitos, mesmo com a implantação de medidas de supressão precoces. Pouco se sabe sobre como a epidemia se propagará e afetará as comunidades de baixa renda.

            Aqui, o panorama é incerto e as estimativas do número de casos e óbitos por COVID-19 esbarram na ausência de dados confiáveis, seja dos casos ou da implantação efetiva das medidas de supressão, frente às recomendações contraditórias das autoridades em cada nível de governo.

            E não houve alternativa senão a implantação de medida de supressão total denominada “lockdown” ou isolamento compulsório para restrição da circulação de pessoas no intuito de reduzir a curva de contágio do vírus. Já passamos de 3 meses da condição de isolamento social e ainda não alcançamos a curva decrescente.

            Essa epidemia encontra a população brasileira em situação de extrema vulnerabilidade, com altas taxas de desemprego e cortes profundos nas políticas sociais. Ao longo dos últimos anos, especialmente após a aprovação da Emenda Constitucional nº 95, que impõe radical teto de gastos públicos e com as políticas econômicas implantadas pelo atual governo, há um crescente e intenso estrangulamento dos investimentos em saúde e em pesquisa no Brasil. É justamente nesses momentos de crise que a sociedade percebe a importância de um sistema de ciência e tecnologia forte e de um sistema único de saúde que garanta o direito universal à saúde.

            No momento, as decisões imediatas devem buscar salvaguardar vidas, garantindo a assistência de boa qualidade ao paciente grave e também minimizar os danos econômicos, sociais e psicológicos das populações mais vulneráveis, por meio da adoção de medidas fiscais e sociais.

            Infelizmente, está sendo inevitável o efeito jurídico imediato dos impactos econômico e social advindos da medida de supressão pela quebra de contratos, pelo inadimplemento das prestações e pela consequente mora no cumprimento das obrigações jurídicas.

A IMPORTÂNCIA DAS MICROS E PEQUENAS EMPRESAS NA ECONOMIA

            As micro e pequenas empresas desempenham um papel fundamental para o crescimento econômico do país pela criação de empregos e renda para a população, e também pode-se dizer que promovem a redução das desigualdades sociais.

            Conforme os dados extraídos do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – SEBRAE[10], estima-se que “os pequenos negócios respondem por mais de um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Juntas, as cerca de 9 milhões de micro e pequenas empresas no País representam 27% do PIB, um resultado que vem crescendo nos últimos anos.”

Pela pesquisa feita, a produção gerada pelas micro e pequenas empresas quadruplicou em dez anos, saltando de R$ 144 bilhões em 2001 para R$ 599 bilhões em 2011, em valores da época.

Ou seja, é inegável que as micro, pequenas e médias empresas ocupam um papel essencial na economia brasileira, sendo responsáveis pela circulação de riquezas.

            As micro e pequenas empresas são as principais geradoras de riqueza no Comércio no Brasil, já que respondem por 53,4% do PIB deste setor. No PIB da Indústria, a participação das micro e pequenas (22,5%) já se aproxima das médias empresas (24,5%). E no setor de Serviços, mais de um terço da produção nacional (36,3%) têm origem nos pequenos negócios.

OS IMPACTOS NAS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS

            Segundo pesquisa feita pelo Serviço Brasileiro de Apoio ao Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), 88% dos empresários declararam queda de faturamento semanal de 69% com relação a uma semana normal, somente entre os dias 3 e 7 de abril de 2020. Além disso, o estudo também avalia o impacto em 14 segmentos econômicos, como varejo, moda, serviços de alimentação, construção civil, beleza, logística e transporte, oficinas e peças automotivas, serviços de saúde, serviços educacionais, turismo, artesanato, indústria de base tecnológica, pet shops e serviços veterinários e economia criativa (eventos e produções).

            Logicamente, os impactos nas micro e pequenas empresas irão se diferenciar de um Estado da Federação para outro, pois os impactos vêm se refletindo de acordo com a realidade social de cada um, mas já há um consenso de muitos economistas apontando o turismo como o segmento mais afetado.

            É possível apresentar os efeitos econômicos no Brasil, e seus desdobramentos a seguir.

        Desde o início da crise, o mercado varejo brasileiro já apresenta uma queda de 29% no faturamento. Entre 3 e 5 de maio, a queda foi de 32%. De acordo com pesquisa do Sebrae, o pequeno negócio do varejo tem sofrido mais, tendo registrado queda de 69% com relação a uma semana normal.

            Em razão da continuidade do isolamento, as pessoas começam a estabilizar seus hábitos de consumo, com alguma tendência de queda pelo aumento do desemprego e pela redução da renda.  Mas, por outro lado, está sendo uma boa oportunidade para o comércio eletrônico e delivery em geral que demonstram algum crescimento.

            Já no setor de alimentos, houve uma queda de 71% no faturamento de restaurantes entre 3 e 5/5 com relação a uma semana normal, de acordo com a Cielo, mas com previsão de estabilização ou até ligeira melhora (ainda em patamares muito abaixo dos de antes da crise).

            No segmento de construção civil, houve crescimento no varejo de materiais de construção de 15% entre 3 e 5/5 com relação ao mesmo período de 2019 porque as obras públicas continuam em ritmo quase normal, exceto nas capitais e regiões metropolitanas onde o governo decretou “lockdown”. As lojas de material de construção continuam funcionando com os devidos ajustes e protocolos sanitários, o mesmo ocorrendo com lojas de móveis e eletroeletrônicos em parte do País. Segundo projeção da consultoria LCA, o setor da construção civil pode encolher até 10% em 2020, isso depois de um encolhimento de 30% entre 2014 a 2018 e um breve refresco de 1,6% em 2019. No segmento de reformas, reparos e serviços domésticos permanece a forte queda na demanda por pequenas reformas e obras de autoconstrução.

            Por fim, no segmento de logística e transporte, apesar de o aumento dos serviços de entrega para o consumidor e do e-commerce, no geral, o segmento deve continuar com baixa demanda por conta da restrição de movimentação e fechamento de lojas e estabelecimentos, o que se estima cerca de 36% abaixo da média do último ano.

MEDIDAS ADOTADAS DURANTE A CRISE SANITÁRIA PARA MINIMIZAR OS EFEITOS ECONÔMICOS

  A pandemia de COVID-19 ao causar uma crise global sanitária trouxe efeitos econômicos, sendo estes as principais preocupações das autoridades atualmente porque mais de 15 milhões de pequenas empresas, que representam 30% do Produto Interno Bruto Nacional, sofrem os maiores impactos, seja pelas medidas tomadas para controlar a doença, ou pela mudança no comportamento do consumidor.

Para tanto, denota-se um efeito “cascata” com a grave recessão económica do país, sendo certo que o referido período de distanciamento e suspensão parcial das atividades laborais estabelecidos em decorrência da declaração de estado de calamidade pública, que afeta diretamente as atividades empresariais que movimentam a economia do país.

             Apesar da queda brusca em alguns setores, outros são mais demandados neste momento de crise. Porém, para conseguirem desempenhar suas atividades de forma eficiente tiveram que buscar ajuda tecnológica o que levou muitas micro e pequenas empresas a se aliarem à startups com o objetivo de conseguir soluções e/ou serviços para atender seus respectivos clientes.  Assim sendo, essas empresas têm migrado para um modelo de comercialização totalmente digital.

             Com os estabelecimentos fechados fisicamente, os mercados digitais juntamente com as startups que auxiliam na entrega, beneficiam-se com o isolamento social. Por isso essas empresas que vêm sendo bastante úteis aos consumidores não devem ser muito impactadas neste momento.

             Por outro lado, um dos setores altamente afetado e que talvez seja um dos últimos a ter permissão para voltar a funcionar normalmente é o setor de entretenimento. Provavelmente será o último a se recuperar pela falta de previsão de eventos, pois todos foram cancelados ou postergados.

A situação vivenciada pelos empresários brasileiros diante da pandemia mundial demandará esforço e cooperação de todos os setores da sociedade, principalmente do Estado através das medidas emergenciais por parte de todas as esferas governamentais.

             Diante desse panorama, o Governo e diversas outras instituições vêm adotando uma série de medidas com o fito de mitigar os prejuízos já causados pela disseminação do vírus, tendo como máxima a previsão do regime de “Isolamento social” para a população brasileira.

            Sendo assim, o Governo Federal anunciou, no dia 16/03/2020, duas medidas para reduzir os efeitos econômicos relacionados à pandemia do novo Corona vírus (Covid-19) nas micro e pequenas empresas. As ações foram definidas para resguardar empregos e o pagamento de salários.[11]

            A primeira medida trata do adiamento do recolhimento do imposto do Simples Nacional, pelo período de três meses, o que vai corresponder a uma renúncia temporária de R$ 22,2 bilhões da União. A medida vai beneficiar, aproximadamente, 4,9 milhões de empresas, que são optantes do regime tributário. O pagamento dos impostos será adiado para o segundo semestre deste ano.

A segunda será a liberação de R$ 5 bilhões pelo Programa de Geração de Renda (Proger), mantido com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).  A quantia será repassada aos bancos públicos para que eles concedam empréstimos voltados a capital de giro das micro e pequenas empresas.

Frente a isso, o BNDES anunciou a destinação de R$ 55 bilhões[12] a todas as empresas que hoje se encontram ativas em sua carteira de crédito. Desse montante, R$ 20 bilhões serão repassados do PIS/PASEP ao FGTS, possibilitando o saque das contas pelos trabalhadores, conforme as definições que serão estabelecidas pelo Ministério da Economia.

Seguindo esse exemplo, várias instituições financeiras adotaram medidas de auxílio e obtenção de crédito, cabendo destaque para a Caixa Econômica Federal que dará apoio às micro e pequenas empresas, com redução de juros de até 45% nas linhas de capital de giro, e com taxas a partir de 0,57% ao mês.

Também será disponibilizada carência de até 60 dias nas operações parceladas de capital de giro e renegociação; linhas de crédito especiais, com até seis meses de carência, para empresas que atuam nos setores de comércio e prestação de serviços, mais afetadas pelo momento atual; e linhas de aquisição de máquinas e equipamentos, com taxas reduzidas e até 60 meses para pagamento.

Ainda para os micros e pequenos negócios (MEIs, MEs, LTDAs e EIRELIs) urbanos e rurais (paulistas), a linha de crédito será fornecida pelo Banco do Povo[13], com redução da taxa de juros de 1% para 0,35% ao mês e prazo para pagamento alongado de 24 para 36 meses, já incluindo o prazo de carência, que aumentou de 60 para 90 dias.

            Outras ações para a geração e manutenção de empregos tratam de adiar o prazo de pagamento do FGTS por três meses, de simplificar as exigências para contratação e renegociação de crédito e de facilitar o desembaraço de insumos e matérias primas industriais importadas antes do desembarque, como também a criação do programa emergencial com medidas de redução proporcional de jornada de trabalho e salário e de suspensão temporária do contrato de trabalho para manutenção do emprego e da renda.

            Além disso, o SEBRAE colocou todo o seu corpo técnico dedicado a oferecer soluções aos donos de pequenos negócios e construiu um conjunto de propostas que foi entregue ao Ministério da Economia sugerindo ações em quatro frentes:

  • Redução de custos: políticas públicas para redução de aluguéis, folhas de pagamento, encargos trabalhistas, empréstimos bancários, entre outros;
  • Viabilização de fluxo de caixa: linhas especiais para alongamento de prazo com fornecedores e empréstimos bancários, disponibilização de sistemas de garantias, prorrogação do prazo para recolhimento de tributos, unificação da data do FGTS;
  • Manutenção de empregos: ampliação e simplificação do uso de banco de horas, férias coletivas, redução e/ou escalonamento de jornada de trabalho, home office e suspensão do contrato de trabalho com direito ao seguro desemprego por período limitado;
  • Orientação: apoio ampliado, especializado e gratuito aos empresários de micro e pequenas empresas, com foco na adequação da operação dos negócios, permitindo a redução dos custos, manutenção dos empregos e sobrevivência das MPE neste período.

            Contudo, como a disseminação do Corona vírus (covid-19) ainda está acontecendo, a economia como um todo tem sido, e ainda será altamente impactada, de maneira que o único consenso que temos é que iremos ter um cenário de recessão da economia global para 2020.

            Além do mais, segundo dados da RAIS (Relação Anual de Informações Sociais) de 2018 o total de pessoas empregadas nas pequenas empresas é de 46,6 milhões, o que mostra a enorme necessidade de criar soluções imediatas para evitar mais demissões.

            No entanto, em que pese as medidas já anunciadas, alguns estudos indicam que ainda não serão suficientes para garantir a sobrevivência das sociedades empresárias brasileiras, principalmente das micro, pequenas e médias empresas que, por terem porte reduzido, acabam sofrendo de forma significativa com a queda de faturamento e podem não conseguir o “fôlego” necessário para ultrapassar esse período de crise aguda.

            É necessário focar nas micros e pequenas empresas dada sua relevante importância no cenário econômico e que encontram mais dificuldade na obtenção de capital de giro e no acesso a linhas de crédito. Ressalta-se que essas empresas vivem para o pagamento de salários e de fornecedores, dependendo do dinheiro de caixa todo mês.

            É possível fazer um paralelo de isolamento com a recessão, mas as ações ganham contornos urgentes em razão do colapso das receitas das empresas em diversos segmentos aumentando de forma drástica o desemprego.

            Os economistas, Vinícius Carrasco, Alexandre Scheinkman e Armínio Fraga apostam numa proposta de linha de crédito bancada pelo setor público, diferente do que se vê na prática bancária, mas depende de articulação política que acaba encontrando o impasse pela cacofonia de ideias que se afastam da execução e foge da importante gestão de crise.

Infelizmente, tal circunstância já faz parte da realidade dos brasileiros, pelo histórico de crise política, de modo que a população tenta se adaptar ao necessário distanciamento social e novos comportamentos sanitários sugeridos pelos órgãos governamentais.

            É falsa a dicotomia entre salvar vidas e a economia, pois suspender o isolamento não aqueceria a economia e nem preservaria os empregos em sua plenitude, mas, pelo contrário, poderia ocasionar mais vítimas em razão da falta de estrutura hospitalar e de equipamentos.

            De acordo com o economista Armínio Fraga, “Dá a impressão de que há um custo econômico, e há. Mas dá também a impressão de que há uma alternativa sem custo, que seria fazer o isolamento vertical. Mas isso não é verdade, e que, para socorrer a economia, é preciso agir rapidamente, o que não está acontecendo. ”

            É crucial que o governo apresente uma estratégia englobando quatro grandes ações de resposta à crise: Apoio à rede hospitalar, manutenção do abastecimento e da logística, ajuda à população mais pobre, além do socorro às empresas.

            Vive-se uma situação com grande potencial de instabilidade, pois já havia um índice alto de desemprego e a economia já vinha crescendo de forma tímida. Os economistas continuam afirmando que o Brasil tem recursos, pois poderíamos gastar de 3%, 4% do PIB, um pouco menos que os EUA(5%), deixando claro que são gastos temporários e que cabe uma resposta firme de política social e econômica.

            A comunidade jurídica tem questionado se estão sendo adotadas todas as medidas possíveis a fim de evitar a insolvência dos agentes econômicos.

De início, sobressai a publicação da Lei n.o 13.979 de 6 de fevereiro de 2020, que “dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do Corona vírus responsável pelo surto de 2019”.

Como se verá a seguir, atento à esse cenário catastrófico, o legislativo brasileiro apresentou no dia 01/04/2020, Proposta Legislativa n.o 1.1397/2020 (“PL”), que institui medidas de caráter emergencial destinadas a prevenir a crise econômico-financeira do agente econômico, que somente terão eficácia enquanto estiver vigente o Decreto Legislativo no 6, de 20 de março de 2020 (Reconhecimento do estado de calamidade pública em razão da pandemia causada pelo Covid-19), ou durante o período de eventual prorrogação do estado de calamidade pública.

Neste contexto é que o PL 1.1397/20 é apresentado pelo Relator – Deputado Hugo Leal, sob o ponto de vista emergencial, objetivando o auxílio imediato às empresas, assumindo um caráter preventivo à insolvência.

Em linhas gerais, o que se estabelece através do Projeto de Lei proposto é a criação de um Microssistema Preventivo à Insolvência, contendo uma série de modificações transitórias à Lei n° 11.101/2005 (Lei de Recuperação e Falência), bem como o aproveitamento de algumas benesses do instituto da Recuperação Judicial para sociedades empresarias que não conseguem sequer efetivar o pedido de Recuperação Judicial durante esse período de crise vivenciado em razão do COVID-19, devido aos seus requisitos legais.

Algumas medidas merecem o devido destaque (PL. 1397/20, art. 3o):

  • a maior abrangência do enquadramento legal a todos os agentes econômicos;
  • suspensão de excussão judicial ou extrajudicial de garantias;
  • suspensão de decretação de falências;
  • suspensão de mandado de despejo;
  • suspensão de resolução unilateral de contratos;
  • suspensão de cobrança de multas decorrente desse período do COVID-19.

Além disso, merece relevo a criação do instituto da Negociação Preventiva (PL. 1397/20, art. 5o), que inaugura um novo cenário propício para a negociação entre o devedor e o credor, apropriando-se de algumas regras típicas da Recuperação Judicial, como é o caso da suspensão das condutas do credor em face do devedor (Art. 3 do PL), bem como regras da jurisdição voluntárias como a nomeação de “negociar” para o fim de intermediar a questão sub judice.

Ainda com relação às modificações, não se poderia deixar de falar da Recuperação Extrajudicial, que sofreu significativas alterações com vistas a facilitar a sua utilização e proporcionar uma melhor alternativa às empresas, com a redução de quóruns estabelecidos pela Lei n° 11.101/101, suspensão das condutas do credor em face do devedor e outras.

E o melhor disso tudo é que as micro, pequenas e médias empresas também poderão se utilizar de todos esses benefícios estabelecidos pelo novo Projeto de Lei, além de terem sido destinadas com regras específicas que alteram os dispositivos da Recuperação Judicial para elas.

Tais modificações estão previstas no art. 14 do PL 1.1397, que consta com a seguinte redação:

Art. 14. O plano especial de recuperação judicial de microempresa e empresa de pequeno porte, previsto nos arts. 70 a 72, Seção V do Capítulo III da Lei no 11.101/2005, passa a obedecer às condições abaixo previstas:

I – abrangerá todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, ressalvados os créditos não sujeitos à recuperação judicial por expressa determinação legal;

II – preverá parcelamento em até 60 (sessenta) parcelas mensais, iguais e sucessivas, podendo admitir a concessão de desconto ou deságio e, se corrigidas monetariamente, observarão a taxa de juros equivalente à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic) para títulos federais;

III – preverá o pagamento da primeira parcela no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias, contado da distribuição do pedido de recuperação judicial ou de seu aditamento nos termos deste Capítulo.

  • 1o Não serão aplicáveis as disposições constantes do arts. 71, parágrafo único, e 72, § 1o, da Lei no 11.101/2005.
  • 2o Para os fins desta Lei, o atual parágrafo único art. 72, da Lei no 11.101/2005, passa a ser renumerado para § 1o, acrescentando-se o seguinte novo § 2o, que terá vigência somente no período previsto no art. 15 desta Lei:

“Art.  72.  …………………………..

  • 1o ………………………………………………
  • 2o O juiz também julgará improcedente o pedido de recuperação judicial e extinguirá o processo sem julgamento do mérito.” (NR)

Repare-se que o legislador teve atenção para um dos principais “gargalos” da Recuperação Judicial específica para a empresa de pequeno porte e microempresa, regulado pelos artigos 70-72 da Lei 11.101/05, qual seja: o prazo de pagamento.

Isto porque, como consta da legislação atual (artigo 71, I, da Lei 11.101/2005) o pagamento poderá ser feito em até 36 (trinta e seis) vezes, prevendo a primeira parcela no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias contados da distribuição do pedido.

Como visto acima do texto do PL, tais prazos foram dilatados, permitindo o pagamento em até 60 (sessenta) vezes e prevendo a primeira parcela no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias, a contar da distribuição do pedido.

Muito embora o elogiável esforço do legislador em melhorar o cenário para as empresas de pequeno porte e microempresas, alterando as regras específicas da Recuperação Judicial, o fato é que, ainda assim, tal regramento apresenta condições menos benéficas ao micro e pequeno empresário do que no sistema convencional de Recuperação.

Isto é, no momento em que o legislador pré-estabelece os termos da proposta de reestruturação, ele exige que o microempresário negocie dentro de um confuso procedimento judicial com seus credores acerca da aprovação de um plano que deverá prever desembolsos “em parcelas iguais e sucessivas, corrigidas monetariamente e com incidência de juros SELIC”, tornando a regulamentação não muito atrativa.

Já o projeto de Lei n° 2.373/20 apresentado pelo Senador Rodrigo Cunha que institui um Regime Jurídico de Insolvência Emergencial e Transitório que deverá viger apenas até o final do ano de 2020, prevê a criação de um regime especial de recuperação extrajudicial bastante simples, para microempresas e empresas de pequeno porte, por meio de registro de Declaração de Impacto Econômico da Pandemia, para que tais devedores, que não têm acesso ao custoso procedimento de recuperação judicial, consigam repactuar suas dívidas. Para fazer jus a esse benefício, o micro e pequeno empresário renuncia ao direito de discutir judicialmente a exigibilidade das dívidas inseridas na declaração.

A medida se assemelha a uma espécie de “REFIS” de dívidas privadas, já com prazos de vencimento e descontos previamente estipulados.

Há também a postergação do depósito elisivo e, assim, evita-se a decretação de falência até o final do ano de 2020. E, ainda, haverá ajustes provisórios nas regras aplicáveis aos novos pedidos de recuperação judicial que vierem a ser ajuizados no ano de 2020.

Observa-se que os referidos Projetos de Lei ainda se encontram em trâmite no Legislativo, podendo ser alterado a todo instante até a sua aprovação.

Justamente por vivermos tempos sombrios e por desconhecermos a extensão dos acontecimentos futuros é que alguns doutrinadores e operadores do Direito entendem que a solução não é legislativa no momento por acreditar que podemos incorrer no risco de colapsar o judiciário e os institutos da Lei se tornarem atrasados e obsoletos. As legislações e interpretações hermenêuticas sempre nascem atrasadas pela delonga legislativa que não acompanha os fatos.

 Dessa forma, tendo em vista o caráter de extrema urgência se entende por soluções extrajudiciais.

             Sob a ótica de alguns juristas, doutrinadores, e advogados a solução mais rápida e eficaz se dá através de um Programa para estimular a economia pensando numa recomposição e não estagnar em apenas moratórias diante do encolhimento brutal dos caixas das empresas. Essas medidas incluem liberação de linhas de crédito emergenciais e planos de aceleração de pagamentos, evitando-se ao máximo a judicialização dessas discussões.

            Com isso, as providências sugeridas devem contar com a criação desse programa que será direcionado aos Órgãos do Ministério da Economia, a partir de um procedimento simples, eletrônico e auto-declaratório mediante as seguintes características: (i) Não intervenção do poder judiciário, (ii) Suspensão ou moratória com contrapartidas com o prazo improrrogável de 4 meses, no intuito de não sufocar a economia, mas com tempo e desconto suficientes para que os devedores possam aderir e pagar; (iii) A declaração de moratória poderia ser apresentada preferencialmente a empresários de menor porte e àqueles que sofreram perdas significativas na receita, da ordem de 30% pelo menos. (iv) A declaração de moratória abarcaria todas as dívidas vencidas no período de emergência até a data de retomada das atividades (com exceção de dívidas trabalhistas e tributárias); (v) Com a prorrogação do vencimento das dívidas, a declaração de moratória suspenderia de forma automática execuções, protestos, juros, multas, cláusulas de vencimento cruzado ou acelerado. (vi) A declaração de moratória constituiria um título executivo e concederia um desconto percentual e escalonado para as dívidas que forem pagas nesse período: quanto mais rápido paga, maior o desconto. (v) Não pagas dentro do prazo, as dívidas venceriam pela sua totalidade, incluindo juros, multas e prejuízos advindos do inadimplemento. (vi) Pagas dentro do prazo, as obrigações seriam quitadas na sua integralidade e o devedor exonerado.

            Conforme entendimento dos acadêmicos e advogados, Dr. Marcelo Guedes Nunes e Dr. André  Santa Cruz, os descontos e prazos (cujos percentuais e extensões devem ser muito bem pensados) criam incentivos para que os empresários declarem a prorrogação. No entanto, há contrapartidas, como a confissão e convalidação das dívidas e a formação de um título executivo em favor dos credores. Além disso, a declaração obriga ao pagamento em prazo razoável, dando aos empresários perspectivas de recuperação de ao menos parte de seu caixa.[14]

            Convém lembrar que o stay period mediano de uma recuperação judicial é de 360 dias, sem contar a estatística de 2 anos de carência para o plano padrão.

            Os planos são aprovados com descontos de até 80% e prazos de pagamento que chegam a 20 anos. As recuperações são verdadeiras remissões de dívida. Se optarmos por essa via, se insistirmos em cartorializar as soluções, os pagamentos serão irrisórios e levarão 3 anos para serem retomados. As ações revisionais para cada contrato terão a mesma sorte: 4 anos até um julgamento definitivo, com alta probabilidade de uma severa redução.

            A conclusão é inexorável, pois caso optemos pela via judicial e o manejo dessas ações se generalize, os caixas não serão recompostos, portanto essa crise será duradoura e ocorrerá o estrangulamento da economia brasileira e não a sua salvação.

            Evitar a Judicialização será o mais prudente e razoável para que consigamos restabelecer a ordem econômica e social, portanto os conflitos podem receber soluções alternativas através da arbitragem, da mediação ou da conciliação.

            O Poder Judiciário deverá agir com muita cautela porque uma intervenção indevida pode prejudicar de forma irremediável a atividade empresarial e ainda trazer insegurança jurídica. As decisões judiciais devem observar uma uniformização.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 No presente artigo podemos asseverar que se enfrenta uma das maiores crises da história contemporânea, com milhares de vítimas, colapso no sistema de saúde, uma legião de desempregados, fronteiras fechadas, educação paralisada, teletrabalho, recessão econômica, indústrias fechadas.

A realidade é que em tempos difíceis, o mundo dos negócios está no meio de um turbilhão de mudanças. Entre adoção de home office, comércio eletrônico, delivery e outras formas de manter as vendas e serviços, muitas pequenas empresas precisam correr para se adaptar ao novo cenário. O vírus chegou no interior da China abalando o mundo e colocando a população em isolamento com planos, trabalhos, compromissos e projetos suspensos.

Enquanto a humanidade espera por um tratamento ou uma vacina contra a doença, experimenta-se uma nova forma de o indivíduo se relacionar com o mundo, com os outros e até com ele mesmo e das empresas reinventarem seu modelo de negócio em busca de sobrevivência.

Dentre tantas medidas editadas pelo Governo, ainda assim as micros e pequenas empresas deverão reduzir os custos ao máximo, renegociar contratos, avaliar as medidas provisórias, otimizar operação, comunicar com clareza seus produtos e serviços ao cliente, aprimorar as boas práticas, perante os fornecedores, entregadores e consumidores para o devido restabelecimento.

Portanto, tem-se inúmeros impactos negativos, mas oportunidades estão existindo e surgirão em busca do essencial e das relações mais empáticas que proporcionará uma chance de criar novas narrativas para o conceito de humanidade e uma diferente perspectiva sobre os negócios empresariais.

 

Notas de Rodapé:

[1] Emília Lucy Cerqueira Garcez

Advogada com especialização em Direito Privado pela Universidade Federal Fluminense (UFF), extensão em Direito Empresarial pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e LL.M em Direito Empresarial pela FGV-Rio. Presidente da Comissão Especial de Direito da Pequena e Média Empresa, Diretora da Diretoria de Assistência aos Advogados da Capital e Conselheira da OAB-RJ. Membro do Conselho do Fórum Permanente de Desenvolvimento do Estado do Rio de Janeiro na Câmara Setorial de Tecnologia.  Mentora no Projeto de mentoria da Startup Rio e no Projeto de mentoria da OAB-RJ.

[2] Roberta Souza dos Santos Andrade

Advogada com especialização em Direito Civil e Processo Civil (UNESA) e em Direito Digital e Compliance (IBMEC), Extensão Direito e Novas Tecnologias (UFRJ) e Carreira Jurídica (FEMPERJ). Delegada de Prerrogativas nos Processos Eletrônicos e Inteligência Artificial da OAB/RJ e Membro da Comissão da OAB Mulher.

[3] JEANNIN, Marine. Coronavírus: crise sanitária deve provocar reflexão estrutural sobre sobrevivência humana. rfi, 2020. Disponível em: <http://www.rfi.fr/br/mundo/20200402-coronav%C3%ADrus-crise-sanit%C3%A1ria-deve-provocar-reflex%C3%A3o-estrutural-sobre-sobreviv%C3%AAncia-humana> Acesso em: dia, mês e ano.

[4] MORAND, Serge. Le temps de la solidarité écologique est venu. Libération, 2020. Disponível em: <https://www.liberation.fr/france/2020/05/07/le-temps-de-la-solidarite-ecologique-est-venu_1787298> Acesso em: 10 de maio de 2020.

[5] MINISTÉRIO DA SAÚDE. Painel Coronavírus. Coronavírus/Brasil, 2020. Disponível em: <https://covid.saude.gov.br/ > Acesso em: 16 de maio de 2020.

[6] WERNECK, Guilherme Loureiro; CARVALHO, Marília Sá. A pandemia de COVID-19 no Brasil: crônica de uma crise sanitária anunciada. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 36, n. 5, e00068820, Abr. 2020. Disponível em:<http://cadernos.ensp.fiocruz.br/csp/artigo/1036/a-pandemia-de-covid-19-no-brasil-crnica-de-uma-crise-sanitria-anunciada.> Acesso em: 19 Maio 2020. http://dx.doi.org/10.1590/0102-311X00068820.

[7] JPA, I. Coronavirus Disease 2019: The Harms of Exaggerated Information and Non-Evidence-Based Measures. European journal of clinical investigation, 50, n. 4, 2020 Apr 2020.

[8] KISSLER, S. M.; TEDIJANTO, C.; LIPSITCH, M.; GRAD, Y. Social distancing strategies for curbing the COVID-19 epidemic. 2020-03-24 2020.

[9] ROSE, Geoffrey Arthur; KHAW, Kay-Tee; MARMOT, Michael. Rose’s strategy of preventive medicine: the complete original text. Oxford University Press, USA, 2008.

[10] Micro e pequenas empresas geram 27% do PIB do Brasil. SEBRAE, 2020. Disponível em: <https://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/ufs/mt/noticias/micro-e-pequenas-empresas-geram-27-do-pib-do-brasil,ad0fc70646467410VgnVCM2000003c74010aRCRD.> Acesso em: 04 de maior de 2020.

[11] Governo anuncia medidas de ajuda econômica para micro e pequenas empresas. Governo do Brasil, 2020. Disponível em: <https://www.gov.br/pt-br/noticias/financas-impostos-e-gestao-publica/2020/03/governo-anuncia-medidas-de-ajuda-economica-para-micro-e-pequenas-empresas> Acesso em: 10 de maio de 2020.

[12] REUTERS. BNDES anuncia R$55 bilhões para ajudar no combate à crise do Corona vírus. Exame, 2020. Disponível em: < https://exame.com/economia/bndes-anuncia-r-55-bilhoes-para-ajudar-no-combate-a-crise-do-coronavirus/> Acesso em: 10 de maio de 2020.

[13] https://www.bancodopovo.sp.gov.br/

[14] NUNES, Marcelo Guedes. Riscos e meios de enfrentamento da crise empresarial: desjudicialização, desburocratização e aceleração da economia. Migalhas, 2020. Disponível em: <https://m.migalhas.com.br/depeso/323303/riscos-e-meios-de-enfrentamento-da-crise-empresarial-desjudicializacao-desburocratizacao-e-aceleracao-da-economia>. Acesso em 10 de maio de 2020.

 

Palavras Chaves

Crise Sanitária. Covid-19. Impactos Econômicos. Micro e Pequenas Empresas.