AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI HENRY BOREL NA LEI Nº 12.318 DE 2010

Resumo

O presente artigo busca esclarecer o surgimento do conceito do fenômeno da alienação parental e sua normatização, através da Lei nº 12.318 de 26.08.2010, a Lei de Alienação Parental, que surgiu no intuito de estancar os diversos conflitos decorrentes da separação ou divórcio dos pais, nas demandas judiciais que envolvem guarda dos filhos, devido à violação dos direitos das crianças e adolescentes, pois retiram da criança e do adolescente o direito à infância e a um crescimento saudável em família. Além disso, apesentar as modificações introduzidas pela lei nº 14.344, de 24.05.2022, denominada Lei Henry Borel e seus reflexos na Lei de Alienação Parental, que emerge diante dos casos com imensa repercussão no Brasil, em prol de uma maior proteção aos casos de violência contra crianças e adolescentes. Por fim, busca demonstrar que o cuidado, a prevenção e convivência, imbuídos de uma parentalidade responsável, pode coibir abusos de todas as naturezas contra as crianças e adolescentes, entre os quais boa parte sofre com os reflexos físicos e psíquicos em decorrência dos conflitos parentais.

Artigo

AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI HENRY BOREL NA LEI Nº 12.318 DE 2010.

Aline da Silva Vieira Chaves [1]

Resumo – O presente artigo busca esclarecer o surgimento do conceito do fenômeno da alienação parental e sua normatização, através da Lei nº 12.318 de 26.08.2010, a Lei de Alienação Parental, que surgiu no intuito de estancar os diversos conflitos decorrentes da separação ou divórcio dos pais, nas demandas judiciais que envolvem guarda dos filhos, devido à violação dos direitos das crianças e adolescentes, pois retiram da criança e do adolescente o direito à infância e a um crescimento saudável em família. Além disso, apesentar as modificações introduzidas pela lei nº 14.344, de 24.05.2022, denominada Lei Henry Borel e seus reflexos na Lei de Alienação Parental, que emerge diante dos casos com imensa repercussão no Brasil, em prol de uma maior proteção aos casos de violência contra crianças e adolescentes. Por fim, busca demonstrar que o cuidado, a prevenção e convivência, imbuídos de uma parentalidade responsável, pode coibir abusos de todas as naturezas contra as crianças e adolescentes, entre os quais boa parte sofre com os reflexos físicos e psíquicos em decorrência dos conflitos parentais.

Palavras-chaveAlienação Parental. Infância.  Abuso Moral. Violência Psicológica. Convivência. Conflitos parentais. Proteção Integral. Prioridade Absoluta.

Sumário – 1. Introdução. 2. O surgimento do fenômeno da Alienação Parental ou Alienação Familiar Induzida. 3. Da Lei de Alienação Parental. 4. A importância da verificação dos estágios de Alienação Parental. 5. As alterações introduzidas pela Lei Henry Borel.  6. Considerações Finais. 7. Referências Bibliográficas.

  1. Introdução:

O presente artigo aborda tema sensível, pois, diante de um quadro de crescente violência doméstica familiar e infantil, foi introduzida a Lei Henry Borel no ordenamento jurídico brasileiro, trazendo alterações nos procedimentos da lei de alienação parental e do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Nesse contexto, cabe esclarecer a distinção entre a alienação parental como fato social, a síndrome de alienação parental que é termo médico, como também o ato de alienação parental tratado através da Lei nº 12.318, de 26.08.2010, com um breve esclarecimento para identificação dos níveis de alienação parental.

Contudo, objetivamos esclarecer que a norma legal é forma de proteção aos direitos das crianças e adolescentes, dentro do sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente, assegurando a proteção integral e prioridade absoluta protegidos pela Carta Magna.

Em tal contexto, com o brutal assassinato do menino Henry Borel, emerge a Lei nº 14.340, de 18 de maio de 2022, que leva seu nome e estabelece procedimentos na Lei de Alienação Parental, com a finalidade de combater a violência doméstica contra crianças e adolescentes, trazendo o aprimoramento da Lei de Alienação Parental.

Objetiva nosso estudo, as alterações introduzidas pela a nova lei que modifica os procedimentos em relação à Lei de Alienação Parental, e ainda, trazemos uma breve informação sobre as alterações na Lei nº 8.069, de 13.07.1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Dessa forma, devemos avançar para implementação de políticas e ações voltadas para o esclarecimento à população e à capacitação dos profissionais que atuam da rede de proteção de crianças e adolescentes, para que tenhamos uma sociedade saudável física e psiquicamente, livre das amarras da manipulação e da violência parental e que as crianças e adolescentes desenvolvam-se em ambiente saudável, com direito à infância, ao cuidado e ao amor.

  1. O surgimento do fenômeno da Alienação Parental ou Alienação Familiar Induzida.

A alienação parental é o processo e o resultado da manipulação psicológica de uma criança em mostrar medo, desrespeito ou hostilidade injustificados em relação ao pai ou a mãe e/ou a outros membros da família.[2]

Trata-se de uma forma de abuso psicológico e de violência familiar em desfavor à criança, bem como aos familiares rejeitados; geralmente, é decorrente da separação ou divórcio dos pais, principalmente quando ocorrem demandas judiciais de disputa de guarda dos filhos menores de 18 anos.

Por consequência, a prática de atos de alienação parental fere a Declaração Universal dos Direitos da Criança, prejudicando o princípio da proteção integral, que é o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, da CF/88) e o princípio da prioridade absoluta (art. 227, da CF/88), ratificado pelo art. 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990).

Para Guilherme de Souza Nucci (2014, p. 25) o princípio da proteção integral significa que crianças e adolescentes dispõem de um plus, simbolizado pela completa e indisponível tutela estatal para lhes afirmar a vida digna e próspera, ao menos durante a fase de seu amadurecimento.

Saliente-se que o princípio da proteção integral encontra respaldo no princípio da prioridade absoluta na Constituição Federal em seu art. 227, in verbis:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.         (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010). (Grifo nosso).

Assim, a proteção integral com absoluta prioridade, senão conferidas nesse grau de maximização, tornam-se uma proteção meramente parcial.

Por outro lado, destacamos que para Glícia Brasil (2022, p. 91) o termo síndrome de alienação parental foi sugerido pelo psiquiatra americano Richard Alan Gardner em 1985, após estudo de duas décadas com famílias envolvidas em demandas judiciais de guarda de filhos. Segundo Brasil, o psiquiatra aduz que:

“(…) defendeu a utilização do termo síndrome por se tratar de um conjunto de sintomas, quase sempre juntos. Transtorno mental ou comportamental é definido na literatura médica como um comportamento desviante, anormal, patológico, persistente, mas que nem sempre apresenta todas as características de uma doença no sentido tradicional do termo – razão pela qual na psicologia e na psiquiatria prefere-se o uso do termo nos manuais de classificação diagnósticas mais utilizadas como referências no serviço de saúde: Manual Diagnóstico Estatístico de Desordens Mentais – DSM IV, e Classificação Internacional de Doenças – CID – 10.”

Assim, entendemos que esse conjunto de sintomas está intrinsecamente ligado à nossa sociedade, pois, infelizmente, é uma prática naturalizada, que ocorre em nossos lares, nas escolas, nos consultórios, nas instituições públicas e privadas, e nos mais diversos lugares.

Tomamos por exemplo, na história, o caso de Isabel da Baviera (Elisabeth Amalie Eugenie von Bayern), a Imperatriz Consorte da Áustria[3], esposa do Imperador Franciso José I. Ela foi globalmente conhecida pelo seu apelido, Sisi, mas grafado como Sissi na trilogia do diretor Ernst Marischka, a qual entendemos ter sido uma sequência extremamente romantizada, para quem teve uma vida cercada de tragédias.

Desde o início do casamento, a Imperatriz teve problemas com sua sogra e tia, a Arquiduquesa Sofia, que se intensificou, em virtude de ela ter assumido a criação das filhas de Elisabeth, uma das quais, Sofia, morreu na infância.

O que significa dizer que Elisabeth foi afastada da convivência de suas filhas e, assim, impedida de exercer sua maternidade, cujo papel foi exercido pela avó paterna.

Portanto, não nos restam dúvidas de que a conduta de afastamento de filhos dos genitores é um fato que ocorre há séculos.

Segundo Glícia Brazil (2022, p. 92), que muito bem esclarece o conceito de alienação parental, conforme abaixo:

“A alienação parental é um fenômeno do relacionamento humano que ocorre nas famílias em que os pais são casados ou descasados. Trata-se de uma situação onde a criança ou adolescente é afastado, efetivamente, de seus genitores, com causas ligadas à conjugalidade e à parentalidade, sem que haja uma indução ou intenção de afastamento, podendo ser um fenômeno natural da vida, como por exemplo, a mudança de um dos familiares para outro município, que rompe com a continuidade do convívio que pode gerar um estado de alienação, sem que isso seja um objeto de análise do poder judiciário, uma vez que não houve induzimento, tratando de um fato natural da vida. A alienação parental é gênero, tendo como subtipo a denominada Síndrome de Alienação Parental e Ato de Alienação Parental”.

Pois bem, temos que a alienação parental é um fato social, por outro lado, a síndrome de alienação parental é um termo médico, e ainda, que o ato de alienação parental é previsto na Lei nº 12.318, de 26.08.2010, a qual dispôs sobre os atos de alienação parental em rol não taxativo, alterou o art. 236 do Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei nº 8.069 de 13.07.1990 e conceituou o ato de alienação parental juridicamente, como coação moral e abuso psicológico contra criança e adolescente, os quais são considerados como pessoas em desenvolvimento.

Vejamos o disposto no art. 15 do ECA:

“Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis. (Grifo nosso)”.

  1. Da Lei de Alienação Parental.

A lei de alienação parental é precipuamente um direito da criança e do adolescente, com uma singularidade de medidas protetivas, tal como nas denominadas Lei Maria da Penha, a Lei nº 11.340, de 07.08.2006, e a o Estatuto do Idoso, Lei nº 10.741, de 01.10.2003.

A legislação pátria brasileira adotou o termo ato de alienação parental com a introdução da Lei nº 12.318, promulgada em 26 de agosto de 2010 que conceituou:

Art. 2o Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

Trata a lei da conceituação de atos de alienação parental ou alienação familiar induzida, num rol não taxativo, e ainda traz medidas protetivas à violação dos direitos das crianças e adolescentes assegurados em seu art. 2º da mencionada lei.

Portanto, qualquer ato que venha promover um abuso psicológico, onde o agente que pratica é denominado alienador, ou seja, o pai ou a mãe, familiares, ou ainda a pessoa sob a qual o(s) filho(s) esteja(m) sob guarda ou vigilância, como, por exemplo, a babá, para que repudie ou que dificulte a convivência com o outro genitor, denominado alienado.

Senão, vejamos o parágrafo único do art. 2º da Lei 12.318/2010:

Parágrafo único.  São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:

I – realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;

II – dificultar o exercício da autoridade parental;

III – dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;

IV – dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;

V – omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;

VI – apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;

VII – mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.

Noutra ordem, de acordo com o art. 6º da mencionada lei, caso sejam caracterizados os atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, será promovida em ação declaratória de forma autônoma ou incidental; assim, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso, optar pelos atos descritos nos incisos I a VI, os quais sejam:

I – declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;

II – ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;

III – estipular multa ao alienador;

IV – determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;

V – determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;

VI – determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;

Da leitura das medidas protetivas acima, verificamos a existência de um caráter preventivo e pedagógico com a finalidade de proteger os direitos de crianças e adolescentes assegurados, possibilitando o crescimento saudável e com direito à convivência familiar e comunitária desses seres em desenvolvimento.

  1. A importância da verificação dos estágios de Alienação Parental.

Nem tudo é alienação parental. Contudo, devemos estar atentos aos comportamentos apresentados pelas pessoas envolvidas no conflito familiar.

Ocorre que existe uma progressão e gravidade da alienação parental, identificada em três níveis, conforme muito bem leciona o Professor Rolf Madaleno[4]:

  1. Estágio I – leve: a convivência ocorre de forma regular, apenas com dificuldade na troca entre os genitores. A criança ou adolescente demonstra afeto com genitor alienante. Campanha de difamação existente. Vínculos com ambos genitores são fortes. Não há processos judiciais como difamação da imagem do outro genitor. Ocorrem atos de alienação parental que dificultam a convivência com um dos genitores, que devem ser tratados pela lei a qual autoriza que os magistrados apliquem os instrumentos processuais. Pode ocorrer o início da etapa processual;
  2. Estágio II – médio: o tema das agressões se torna consistente e reúne os sentimentos e desejos entre a prole e o genitor alienante, tornando-os cúmplices. Conflitos na entrega ou após as visitas e a campanha de difamação são intensificadas. Afastamento do alienador. Sinais de que há um genitor bom e outro mau. Relação de dependência do menor em relação ao genitor alienante. Visitas sofrem interferências, provocadas por denúncias ou fatores como doenças, festas, atividades escolares e outros eventos que coincidem com o horário da visitação. Início da deterioração do vínculo afetivo. Neste estágio, o judiciário pode atuar – ainda de ofício, aplicando as medidas protetivas do art. 6º da Lei de Alienação Parental. Momento da perícia.
  3. Estágio III – grave: as visitas são difíceis ou não ocorrem, ou ainda, são eivadas de ódio, difamações, provocações. As crianças emudecem, tentam fugir, tem crises de choro e até se tornam agressivas para que impeçam o regime de visitas. O ódio ao genitor não guardião é extremo. O vínculo afetivo é cortado. Após longo período ausente de convivência a criança se acalma ou aceita a situação. O progenitor alienante demonstra uma visão obsessiva para justificar a proteção de seus filhos, esta conduta se projeta como um espelho nos filhos, semelhante à do genitor alienante.

A verificação dos estágios de conduta de alienação parental servem como um indicativo para aplicação das medidas protetivas, com a finalidade de preservar a manutenção do regime de convivência, bem como para coibir condutas que tragam reflexos físicos, como as dermatites, e psíquicos, tais como o isolamento e baixa de rendimento escolar, os quais podem ser decorrentes dos conflitos parentais,

  1. As alterações introduzidas pela Lei Henry Borel.

Henry Borel Medeiros, de quatro anos de idade, foi assassinado no dia 8 de março de 2021, na Barra da Tijuca, Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro.

O crime chocou a sociedade e teve uma grande repercussão no Brasil, sendo muito assemelhado aos casos Isabella Nardoni, ocorrido em 29.03.2008, e Bernardo Boldrini, ocorrido em 04.04.2014.

Casos como esses evidenciam a violência doméstica contra crianças e adolescentes, demonstrando a fragilidade do sistema de proteção integral e absoluta prioridade de direitos das crianças e adolescentes.

Cabe ressaltar que a família é a primeira garantidora de direitos de crianças e adolescentes, em segundo a sociedade, por fim o Estado, mas diante do aumento de casos, demonstra-se que há apenas uma proteção parcial.

Assim sendo, foi proposto o projeto da Lei Henry Borel (PL nº 1.360 de 2021), com a intenção de coibir casos como o do menino Henry Borel, de apenas 4 anos, assassinado em 2021.

Cabe salientar que, em 27.09.2022, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), confirmou a decisão que revogou a prisão preventiva de Monique Medeiros e, no mesmo julgamento, negou a soltura de Jairo de Souza Santos Júnior, o Dr. Jairinho. Ambos são acusados pela morte do menino Henry Borel, filho de Monique.

O texto da Lei Henry Borel altera a Lei de Alienação Parental, para modificar procedimentos relativos à alienação parental, e a do ECA, a fim de estabelecer procedimentos adicionais para a suspensão do poder familiar.

A primeira mudança na lei ocorre no art. 4º, parágrafo único da Lei nº 12.318/2010, que consiste no sistema de garantia de direitos de crianças e adolescentes, para que tenham assegurados a convivência, ou seja, garantia mínima de visitação assistida no fórum ou em entidades conveniadas à Justiça, ressalvados os casos de iminente risco de prejuízo à integridade física e psicológica da criança ou do adolescente.

Neste sentido, segundo a psicóloga Glícia Brazil, aduz sobre quem seria o responsável nos casos de visita assistida, diante do número reduzido de pessoal da equipe multidisciplinar, tendo em vista que os psicólogos e assistentes sociais estão basicamente designados para a atividade pericial. Importante ressaltar que esses profissionais deveriam receber do Tribunal capacitação técnica.

Saliente-se que, na prática, as famílias contratam esses profissionais, para que acompanhem a visita assistida.

No parágrafo 4º do art. 5º houve alteração do texto, para que, nos casos de ausência ou insuficiência de serventuários responsáveis na realização dos estudos multidisciplinares, a autoridade judiciária poderá proceder à nomeação de perito com qualificação e experiência no tema, nos termos dos arts. 156 e 465 da Lei nº 13.105, de 16.03.2015 (Código de Processo Civil).

Em relação às Medidas Protetivas do art. 6º da lei, foi inserido o parágrafo 2º,  que dispõe acerca do acompanhamento psicológico ou o biopsicossocial, que deve ser submetido a avaliações periódicas, com a emissão de, pelo menos, um laudo inicial que contenha a avaliação do caso e o indicativo da metodologia a ser empregada, e de um laudo final, ao término do acompanhamento.

Nesse caso, vale esclarecer que o acompanhamento psicológico não tem natureza pericial, trata-se de uma decisão judicial a ser cumprida, isto é, que, ao final dos encontros, seja elaborado um Relatório de Acompanhamento, o qual é um documento em que será descrito o acompanhamento e a conclusão, podendo gerar orientações, recomendações ou encaminhamentos, ao passo que o Laudo é documento produto de uma perícia.

Saliente-se que o inciso VII do art. 6º, que consistia em declarar a suspensão da autoridade parental, foi revogado.

Por fim, foi incluído o art. 8º-A, dispondo que, sempre que necessário, o depoimento ou a oitiva de crianças e de adolescentes, em casos de alienação parental, serão realizados obrigatoriamente nos termos da Lei nº 13.431, de 4 de abril de 2017, que é a Lei de Depoimento Especial, sob pena de nulidade processual.

Assim, observamos que o legislador destacou sempre que necessário, ou seja, nem sempre será necessário, isto é, a norma deixa em branco sobre o momento em que será realizado o procedimento.

E ainda, na parte final do texto do artigo, determina a obrigatoriedade do procedimento nos termos da Lei de Depoimento Especial.

Pois bem, considerando que o ato de alienação parental, conceituado no art. 3º da Lei nº 12.318/2010, pelo art.4º, inciso II, alínea “b” da Lei nº 13.431/2017, como sendo abuso moral e violência psicológica contra criança e adolescente, parece-se um contrassenso fazer com que esses seres em desenvolvimento, eivados da interferência psicológica parental e familiar, venham a fazer um depoimento ou oitiva nos casos de alienação parental.

Cabe destacar que, a Lei Henry Borel altera não somente a Lei de Alienação Parental, como também, em outros dispositivos legais, os quais destacamos, os parágrafos 3º e 4º ao art. 157 do ECA, que trata da concessão da liminar e da comunicação de indícios de ato de violação de direitos de criança ou de adolescente, quando o juiz comunicará o fato ao Ministério Público e encaminhará os documentos pertinentes.

Outrossim, a lei criou novas atribuições para o Conselho Tutelar, no art. 136 do ECA, dentre as 12 (doze) atribuições, o rol foi ampliado para 20 (vinte) atribuições, com mais autonomia no exercício da função e mais articulação entre delegacias e o poder judiciário, nas aplicações de medidas protetivas e responsabilização do agressor de qualquer tipo de violência, além de proteger e resguardar a integridade física da vítima ou testemunha de violência; por isso, quem presenciar qualquer tipo de violência, não precisa mais ter medo de denunciar.

Noutra ordem, destacamos a importância para uma parentalidade responsável, cujo princípio está instituído pelo art. 226, parágrafo 7º da Constituição Federal. Vejamos:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

(…)

  • 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

A parentalidade responsável significa dizer que, começa na concepção e se estende enquanto for necessário o acompanhamento dos filhos, respeitando o mandamento constitucional do art. 227, que é uma garantia fundamental.

Assim, como vivemos na era do amor líquido e da fragilidade dos laços humanos já mencionado pelo filósofo Zygmunt Bauman, percebemos que, nas famílias que olham para o conflito e buscam uma solução harmoniosa, ou que recorrem à ajuda profissional, como por exemplo a terapia e a psicanálise, o conflito reduz e os laços afetivos passam a ser reconstruídos. No entanto, quando as famílias insistem no conflito e aumentam a beligerância, quem mais sofre são as crianças e adolescentes.

Infelizmente, existem casos em que a prole torna-se um objeto de disputa; como se fossem uma medalha, sendo conferido o “poderoso título” de guardião ao “melhor” genitor, e aí indagamos sobre qual será o legado para estas crianças e adolescentes de hoje, que se tornarão os adultos de amanhã.

Para o Estado, apontamos que, sendo a alienação parental um fato social, estamos diante de uma questão de políticas públicas, pois, as crianças que crescem em um ambiente de conflito, que podem sofrer danos irreparáveis, sejam eles de ordem física, psicológica, ou ainda terem suas vidas interrompidas em decorrência da violência familiar, como no caso do menino Henry.

Portanto, faz-se necessária a implementação de políticas públicas para dar o apoio Estatal aos vulneráveis, que sofrem da violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes.

Não podemos nos olvidar da denúncia, acionar a Polícia Militar, o Conselho Tutelar, o Ministério Público, a Delegacia (seja ela especializada ou não), lavrar Boletim de Ocorrência, ou realizar denúncia anônima através do Disque 100 e informar os dados conhecidos sobre o caso.

Existem órgãos públicos que auxiliam no atendimento direto da população, servindo como ferramentas de apoio e proteção, tal como o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) e o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS).

  1. Considerações Finais.

A finalidade da legislação do sistema de proteção de direitos de crianças e adolescentes é assegurar-lhes o direito a uma infância com a convivência familiar e comunitária, para que estes seres em desenvolvimento tenham assegurados os direitos de uma proteção integral e prioritária, conforme reza o art. 227 da Constituição Federal.

É fundamental que tenhamos um olhar mais além do que se apresenta nos casos de alienação parental, que constituem atos de abuso moral, pois interferem na formação psicológica, bem como da violência psicológica familiar de forma induzida, para que crianças e adolescentes repudiem o outro genitor, inclusive os respectivos familiares.

É necessário que haja uma maior aproximação para aquelas famílias que se socorrem do Poder Judiciário para que seja um lugar de reconstrução de vínculos afetivos, um local em que seja possível estabelecer convivência e coibir atos que causem prejuízo à formação psicológica de crianças e adolescentes.

Nosso objeto de estudo, busca primordialmente informar e esclarecer que a prevenção é de suma importância para que os filhos tenham seu desenvolvimento em ambiente saudável, assim como não devemos temer denunciar os casos de violência.

Pois bem, toda criança tem o direito de crescer em uma família com cuidado e afeto.

O sentido de gerar um filho, uma filha, de chamar alguém para a existência é uma das missões mais nobres e sublimes.” [5].

(Dom Eusébio Oscar Scheid, Arcebispo da Arquidiocese do Rio de Janeiro)

  1. Referências Bibliográficas.

 

AGÊNCIA SENADO. Lei Henry Borel: texto traz medidas protetivas para evitar novas agressões. Disponível em:

https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/03/22/lei-henry-borel-texto-traz-medidas-protetivas-para-evitar-novas-agressoes. (22/03/2022). Acesso em 21/10/2022.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Centro Gráfico, 1988.

BRASIL. Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 16.7.1990.

BRAZIL, Glícia Barbosa de Mattos. Psicologia Jurídica: a criança, o adolescente e o caminho do cuidado na justiça. Indaiatuba, SP: Editora Foco, 2022.

BRAZIL, Glícia. Primeiras impressões sobre a nova lei de alienação parental. https://ibdfam.org.br/artigos/1819/Primeiras+impress%C3%B5es+sobre+a+nova+lei+da+aliena%C3%A7%C3%A3o+parental. (24.05.2022). Acesso em: 22/10/2022.

CNN BRASI. Caso Henry: STJ confirma a soltura de Monique e prisão de Dr. Jairinho. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/caso-henry-stj-confirma-soltura-de-monique-e-prisao-de-dr-jairinho/. Acesso em: 21/10/2022.

DIOSECE DE COIMBRA. Crescer me família. Para uma Vida Familiar sadia, harmoniosa e feliz. (04.01.2005). Disponível em:

http://www.diocesedecoimbra.pt/sdpfamiliar/vidafamiliarsadia.htm.Acesso m:22/10/2022.

ISABEL DA BAVIEIRA. Imperatriz da Áustria. In: Wikipedia, a enciclopédia livre. Disponível em:

 https://pt.wikipedia.org/wiki/Isabel_da_Baviera,_Imperatriz_da_%C3%81ustria. Acesso em 21/10/2022.

MADALENO, Ana Carolina Carpes; MADALENO, Rolf. Alienação Parental: Importância de detecção: aspectos legais e processuais. 7ª ed. – Rio de Janeiro: Forense 2021.

NUCCI, Guilherme de Souza. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: em busca da Constituição Federal das Crianças e dos Adolescentes. Rio de Janeiro: Forense, out. 2014.

Notas:

[1] Aline da Silva Vieira Chaves, carioca, advogada familiarista, pós-graduada em Processo Civil pela UCAM (Universidade Cândido Mendes), pós-graduada em Direito das Famílias e Sucessões pelo IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família)/UCAM, Secretária da Comissão Nacional de Mediação do IBDFAM, Coordenadora das Comissões de Direito da 55ª Subseção OAB-RJ/Méier, Presidente da Comissão de Direitos da Criança e do Adolescente da 55ª Subseção OAB-RJ/Méier, Coordenadora e coautora da obra Diálogos de Direitos da Criança e do Adolescente (2022), Editora Conquista; Coautora da obra Conversas sobre Direitos II (2019), Editora Conquista.

[2] Alienação Parental. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Aliena%C3%A7%C3%A3o_parental. Acesso em: 21/10/2022.

[3] ISABEL DA BAVIEIRA, Imperatriz da Áustria. In: Wikipedia, a enciclopédia livre. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Isabel_da_Baviera,_Imperatriz_da_%C3%81ustria. Acesso em 30/10/2022.

[4] MADALENO, Ana Carolina Carpes; MADALENO, Rolf. Alienação Parental: Importância de detecção: aspectos legais e processuais. 7ª ed. – Rio de Janeiro: Forense 2021.

[5] A frase decorre do artigo “Crescer em família. Para uma Vida Familiar sadia, harmoniosa e feliz.”

Palavras Chaves

Alienação Parental. Infância. Abuso Moral. Violência Psicológica. Convivência. Conflitos parentais. Proteção Integral. Prioridade Absoluta