AUSTERICÍDIO E REFORMA TRABALHISTA: A GRAMÁTICA DE EXCEÇÃO CONTIDA NO PROJETO DE LEI 6787/2016

Resumo

O ensaio analisa as orientações normativas contidas no PL 6787/2016 que contém a proposição inicial de Reforma Trabalhista enviada pelo Poder Executivo ao Legislativo a partir dos referenciais analíticos formulados por Antonio Casimiro Ferreira, em seu Sociedade de Austeridade e Direito do Trabalho de Exceção. Relaciona o Projeto de Lei com as políticas de austeridade, compreendidas como fórmulas político-econômicas orientadoras de reformas estruturais que implementam um projeto de erosão dos direitos sociais e de liberalização econômica da sociedade, caracterizando-se como um verdadeiro “austericídio” de um projeto de desenvolvimento do Brasil com distribuição de renda. Argumenta que a negociação coletiva é apresentada como um mecanismo disponível aos agentes econômicos para a realização de ajustes pontuais e setoriais em relações de emprego a partir da promoção da flexibilidade precarizadora das condições de trabalho, em dissonância com a ideia de direito que norteia a Constituição de 1988.

Artigo

Austericídio e Reforma Trabalhista:

A gramática de exceção contida no Projeto de Lei 6787/2016

 Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva[1]

Thiago Patrício Gondim[2]

 

 

Resumo: O ensaio analisa as orientações normativas contidas no PL 6787/2016 que contém a proposição inicial de Reforma Trabalhista enviada pelo Poder Executivo ao Legislativo a partir dos referenciais analíticos formulados por Antonio Casimiro Ferreira, em seu Sociedade de Austeridade e Direito do Trabalho de Exceção.  Relaciona o Projeto de Lei com as políticas de austeridade, compreendidas como fórmulas político-econômicas orientadoras de  reformas estruturais que implementam um projeto de erosão dos direitos sociais e de liberalização econômica da sociedade, caracterizando-se como um verdadeiro “austericídio” de um projeto de desenvolvimento do Brasil com distribuição de renda. Argumenta que a negociação coletiva é apresentada como  um mecanismo disponível aos agentes econômicos para a realização de ajustes pontuais e setoriais em relações de emprego a partir da promoção da flexibilidade precarizadora das condições de trabalho, em dissonância com a ideia de direito que norteia a Constituição de 1988.

Palavras-chave: Austeridade, Reforma Trabalhista, PL 6787/2016.

As crises econômicas integram a geografia histórica do capitalismo e são percebidas como oportunidades para a promoção de reconfigurações dentro do sistema[3]. No entanto, a efetividade dos caminhos que surgem para a sua saída depende da relação de forças entre as classes sociais[4]. Recentemente, as crises tem sido utilizadas como uma forma de impor a subordinação de trabalhadores, empresas, organizações não governamentais, governos e sociedades inteiras ao ritmo dos mercados do capitalismo global. A austeridade, enquanto um modelo político-econômico, passou a orientar reformas estruturais que implementam um projeto de erosão dos direitos sociais e de liberalização econômica da sociedade[5]. No Brasil, sua instituição se caracteriza como um verdadeiro “austericídio” por comprometer o projeto de desenvolvimento nacional e de crescimento com distribuição de renda[6].

            Com a constituição de um mercado global caracterizado pela reestruturação produtiva e reorganização da divisão social do trabalho, o mecanismo da concorrência impulsiona os capitalistas a buscarem processos de trabalho mais eficientes, eficazes e produtivos aos objetivos de obtenção de lucros mais elevados que os demais empresários[7]. Por outro lado, as resistências existentes no âmbito da produção são consideradas um dos principais obstáculos potenciais ao contínuo acúmulo de capital e à manutenção do poder por parte dos empregadores e detentores dos meios de produção[8].  Quando orientados por políticas neoliberais, os Estados, em virtude de sua capacidade regulatória, tornam-se agentes centrais neste contexto e passam a concorrer para fornecer padrões normativos de regulação mais atrativos aos interesses do capital. As normas jurídicas produzidas em decorrência destas políticas de austeridade e sob o propósito exclusivo de obtenção de competitividade internacional por meio do rebaixamento dos custos de produção, podem, por sua vez, se apresentar de modo similar àquelas mercadorias que são ofertadas para serem escolhidas no competitivo “mercado de produtos normativos” pelos detentores de capital e investidores[9], não obstante a existência de estudos empíricos que indicam ser negativa a relação entre investimentos estrangeiros e reformas trabalhistas.

            Neste contexto político regulatório, os direitos sociais são os principais alvos desta pressão do mercado por desregulamentação. O direito do trabalho, por exemplo, sofre com a desestruturação dos pressupostos e funções que o constituem desde a sua criação a partir da emergência de um paradigma denominado como direito do trabalho de exceção[10]. Com efeito, assegura-se a concretização da flexibilidade negativa do mercado de trabalho em suas diferentes dimensões (salarial, de vínculo empregatício, do emprego e de habilidade)[11] e os trabalhadores são desprovidos de uma série de formas de garantia relacionadas ao trabalho que estruturam o Estado social, sob o discurso do medo e da insegurança[12].

            Nos últimos anos, principalmente depois da ocorrência da crise de 2009, as políticas neoliberais se converteram em políticas ultraliberais denominadas como políticas de austeridade. Tais políticas favorecem a transformação da estrutura de poder nas relações laborais por intermédio da fragmentação da organização coletiva e da intensificação dos processos de diferenciação da admissão, execução e extinção do contrato de trabalho que reduzem a efetividade da garantia de representação sob orientação de princípios mercantis[13]. Com a intenção de eliminar o conflito enquanto elemento dinâmico das relações laborais, essas políticas criam obstáculos para a concretização da autonomia coletiva dos trabalhadores e, consequentemente, reduzem as possibilidades de resistência aos interesses do capital com o afastamento dos procedimentos associados à democracia laboral e dificultam a manutenção de um patamar civilizatório mínimo de proteção, afetando a própria natureza do direito do trabalho caracterizada por sua ambiguidade constitutiva.

            A crise econômica se instala no Brasil em fins de 2014 e foi instrumentalizada para a construção de um projeto político em torno de reformas estruturais que atendessem os interesses do mercado.[14] Com a destituição da ex-presidenta Dilma Roussef, em um processo interpretado como um golpe institucional por boa parte da comunidade acadêmica, o novo governo, que na opinião dos autores deste texto carece de legitimidade democrática para promover reformas, sobretudo no segundo semestre de 2016, começou a colocar em prática políticas de flexibilização por austeridade.[15]

            A lógica de tais políticas contrapõe-se aos valores e objetivos reconhecidos pela Constituição de 1988 como estruturantes para a organização e funcionamento do Estado Democrático de Direito no Brasil. Em virtude de um processo constituinte que contou com a pressão dos movimentos sociais em um contexto de redemocratização do país,  a Constituição de 1988 criou mecanismos para a modificação da relação entre Estado e sociedade civil a partir da participação de atores extraestatais e da ampliação da cidadania. No âmbito da relação entre capital e trabalho, institui-se uma organização normativa que condiciona o desenvolvimento econômico ao paradigma da justiça social com a previsão de um patamar civilizatório mínimo de proteção ao trabalhador. Conjuntamente, houve o reconhecimento da autonomia coletiva dos trabalhadores por intermédio da inscrição dos elementos que a estruturam[16] como uma forma de distribuir os recursos de poder ao movimento sindical que, dentro de um horizonte de possibilidades, permitisse a redução das desigualdades e a valorização do trabalho humano.

            Em conformidade com essa chave analítica, apreende-se o recente Projeto de Lei n.º 6.787/2016[17], que altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a lei n.º 6.019/74 sobre o trabalho temporário, apresentado pelo governo Temer sob o título de minirreforma trabalhista, como uma medida que estabelece, entre outras coisas, uma nova regulamentação para a admissibilidade e incorporação da negociação coletiva no ordenamento jurídico brasileiro em atendimento a máxima da prevalência do negociado sobre o legislado, de modo bastante distante das propostas de valorização das negociações coletivas apresentadas pelo movimento sindical autonomista, que pressupõe liberdade sindical, direitos de informação, consulta, participação e sustento concreto à atividade sindical. Por meio do modus operandi das políticas de austeridade, implementa-se a possibilidade de suspensão de um direito pela sua não aplicação sem a necessidade de revogá-lo, tal qual ocorrem nas políticas de exceção. A introdução do Art. 611-A no texto da CLT, ao permitir a formação de dois modelos regulatórios diferenciados cuja escolha fica a cargo de uma decisão privada das partes contratantes, inclusive com a possibilidade de flexibilização do núcleo de direitos fundamentais trabalhistas protegidos pelo princípio do não retrocesso social previsto no caput do Art. 7.º, em algumas hipóteses[18], ensejaria o afastamento da aplicação dos três modelos normativos de admissibilidade e incorporação da negociação coletiva construídos pela doutrina juslaboralista brasileira[19]. Em outras[20], promoveria a ampliação da incidência do regime supletório a partir dos mecanismos da vantagem compensatória e do princípio da intervenção mínima da Justiça do Trabalho na autonomia da vontade coletiva sem realçar a sua natureza excepcional e transitória. Está, pois, em dissonância com os princípios e garantias constitucionais presentes na ordem constitucional de 1988.

            Na exposição de motivos do PL 6787/2016, o governo federal procura apropriar-se discursivamente de uma reivindicação de autonomia das classes trabalhadoras ao afirmar a juridicidade da negociação coletiva. Contudo não o faz, já que apresenta proposição que tão somente amplia as possibilidades derrogatórias dos instrumentos coletivos, sem reconhecer suas possibilidades concretas de intervenção na vida da empresa e de controle do poder econômico. De toda forma, ainda que assim não fosse, em um contexto de recessão e estagnação, em que os indicadores econômicos, como a taxa de desemprego, são analisados sob o prisma da lógica da austeridade que busca forjar uma aparente consenso social quanto ao sacrifício da qualidade do trabalho e de vida como uma variável de ajustamento necessária para a saída da crise[21], deve-se evidenciar que a reforma trabalhista proposta pelo governo, em meio a recentes decisões judiciais [22] e outras proposições legislativas[23], permite a redução das dimensões de eficácia da atuação sindical.

            Deste modo, a negociação coletiva se tornaria um mecanismo disponível aos agentes econômicos para a realização de ajustes pontuais e setoriais em relações de emprego a partir da promoção da flexibilidade precarizadora das condições de trabalho[24]. Em contraponto à autonomia coletiva reconhecida pela Constituição de 1988, o PL 6787/2016, na medida em que amplia os efeitos derrogatórios dos instrumentos resultantes da autonormação, reduz a potencialidade da autotutela (greve e demais mecanismos de ação direta e manifestação sindical) e da auto-organização (como financiamento e redução da liberdade sindical, criminalização dos movimentos sociais e sindicais), aumentando a desigualdade da distribuição de poder entre capital e trabalho no plano coletivo[25]. Fazemos nossa as palavras do jurista Augusto César Leite de Carvalho, quando observa que o texto proposto ao artigo 611-A é um desafio à inteligência acadêmica, e que “o trabalhador brasileiro tem direito à negociação coletiva para melhorar a sua condição social (art. 7º, XXVI, da Constituição), não para ser oferecido em holocausto.”[26] A inversão do modelo normativo de negociação coletiva proposta pelo PL 6787/2016 distancia-se frontalmente das ideias de direito trazidas pela Constituição de 1988 e pelos princípios fundamentais e de direitos humanos reconhecidos pelas principais Declarações de Direitos adotadas na ordem internacional.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Uma ponte para o futuro. Fundação Ulysses Guimarães, PMDB, Brasília, 29 out. 2015.

BRASIL. Projeto de lei n. 6.787, dezembro de 2016. Altera o Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 – Consolidação das Leis do Trabalho, e a Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, para dispor sobre eleições de representantes dos trabalhadores no local de trabalho e sobre trabalho temporário, e dá outras providências.

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HARVEY, David. O enigma do capital: e as crises do capitalismo. São Paulo: Boitempo, 2011.

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SUPIOT, Alain. Perspectiva Jurídica de La crisis econômica de 2008. Revista Internacional del Trabajo, v. 129, n. 2, OIT, 2010.

Notas de Rodapé:

[1] Professora Associada da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, onde integra a linha de pesquisa em Democracia, Instituições e Desenhos Institucionais do Programa de Pós-Graduação em Direito – PPGD/UFRJ. Coordenadora do grupo Configurações Institucionais e Relações de Trabalho – CIRT. Desembargadora do Trabalho no TRT da 1ª Região. Doutora em Ciências Jurídicas e mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC-Rio.

[2] Mestrando na linha de pesquisa em Democracia, Instituições e Desenhos Institucionais do Programa de Pós-Graduação em Direito – PPGD/UFRJ e integrante do grupo de pesquisa Configurações Institucionais e Relações de Trabalho – CIRT. Bacharel em História (UFF) e Direito (UFRJ).

[3] HARVEY, David. O enigma do capital: e as crises do capitalismo. São Paulo: Boitempo, 2011.

[4] HARVEY, David. Op. Cit., p. 18.

[5] FERREIRA, Antônio Casimiro. Sociedade da austeridade e direito do trabalho de exceção. Porto: Vida Econômica Editorial, 2014. p. 12-13.

[6] A adjetivação foi utilizada por Mansor Mattos para descrever as medidas fiscais de austeridade que retiram do Estado a capacidade de intervenção sobre o mercado e desarmam sua possibilidade de atuar para conter a recessão e a diminuição da arrecadação, mostrando-se destrutivas. MATTOS, Fernando Augusto Mansor. Avanços e dificuldades para o mercado de trabalho. In: Estudos Avançados, vol. 29, n.º 85,  USP, São Paulo, setembro-dezembro, 2015, p. 80.

[7] HARVEY, David. Op. Cit., p. 63-4.

[8] HARVEY, David. O enigma do capital: e as crises do capitalismo. São Paulo: Boitempo, 2011. p. 20.

[9] O mercado de produtos normativo refere-se à concorrência entre os ordenamentos jurídicos em escala global sob a orientação de se eliminar gradualmente os que menos se prestam a satisfazer as expectativas financeiras dos investidores em um fenômeno denominado “darwinismo normativo”. Por exemplo, com o objetivo de ajudar os “consumidores do direito” em suas escolhas, o Banco Mundial publica desde 2004 um relatório denominado “Doing Business” que compara as legislações de uma série de países para medir a eficácia econômica de cada uma delas. Dentre os critérios de avaliação, o relatório contém indicadores quantitativos referentes à “rigidez” do direito do trabalho destes países, como: (a) dificuldade de contratação; (b) dificuldade para aumentar ou diminuir a jornada de trabalho; (c) dificuldade de dispensa por motivos econômicos; e (d) custo da contratação e da dispensa. Tais indicadores revelam um pensamento que interpreta direitos que protegem os trabalhadores como custos e estabelece pontos de penalização aos Estados que reconhecem estes direitos de modo amplo. SUPIOT, Alain. Perspectiva Jurídica de La crisis econômica de 2008. Revista Internacional del Trabajo, v. 129, n. 2, OIT, 2010.

[10] De acordo com Ferreira, o direito do trabalho de exceção “se apresenta como uma ruptura paradigmática com os pressupostos do direito do trabalho, eliminando o conflito enquanto elemento dinâmico das relações laborais e a proteção do trabalhador enquanto condição de liberdade. As funções do direito do trabalho são igualmente questionadas, nomeadamente a função econômico-instrumental sempre dependente dos débeis equilíbrios entre a mercantilização do trabalho e os limites impostos pelo estatuto conferido pelo direito do trabalho ao trabalhador vacila perante as anunciadas alterações ao tempo de trabalho e descanso, enquanto a função de organização das relações de poder na esfera laboral colocada sob o efeito da dispensabilidade dos trabalhadores e do estreitamento da negociação coletiva torna a organização da ‘submissão voluntária’ do trabalhador à autoridade do empregador num exercício de poder despótico, sem contrapoder”. FERREIRA, Antônio Casimiro. Sociedade da austeridade e direito do trabalho de exceção. Porto: Vida Econômica Editorial, 2014. p. 76.

[11] STANDING, Guy. O precariado: a nova classe perigosa. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2013. p. 22.

[12] Segundo Standing, o processo de precarização dos indivíduos que vivem do trabalho está intrinsecamente associada ao desprovimento das seguintes formas de garantia laboral: (i) garantia de mercado de trabalho; (ii) garantia de vínculo empregatício; (iii) garantia no emprego; (iv) segurança do trabalho; (v) garantia de reprodução de habilidade; (vi) segurança de renda; e (vii) garantia de representação. STANDING, Guy. Op. Cit., p. 27-8.

[13] FERREIRA, Antônio Casimiro. Sociedade da austeridade e direito do trabalho de exceção. Porto: Vida Econômica Editorial, 2014.

[14] Ver: GONDIM, Thiago Patrício. O discurso da austeridade no contexto da atual crise econômica brasileira e suas implicações para o direito do trabalho. In: COUTINHO, Aldacy Rachid; WANDELLI, Leonardo Vieira (org.). Anais do II encontro RENAPEDTS. 1.ª ed. Florianópolis: Empório do Direito, 2016.

[15] Ver: SILVA, Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da. A introdução das políticas ultraliberais no Brasil e as reformas trabalhistas: uma ponte para a exceção? In: EINLOFT, Denis; TOSS, Luciane; SEVERO, Valdete Souto (coord.). Direito do Trabalho e pensamento crítico. Porto Alegre: HS Editora, 2016.

[16] De acordo com Silva, inspirada em Correa Carrasco, os elementos estruturantes da autonomia coletiva correspondem às garantias de auto-organização, que se expressa no princípio constitucional da liberdade sindical e da autonomia sindical em sentido estrito; de autotutela, que assegura o direito de greve, de ação sindical e de conflito; e de autonormação, que garante a negociação coletiva. Neste sentido, a autonomia coletiva somente pode ser admitida no mundo jurídico enquanto um mecanismo capaz de equacionar os conflitos associados às relações laborais caso a auto-organização, autotutela e autonormação estiverem presentes e plenamente asseguradas. SILVA, Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da. Relações Coletivas de trabalho. São Paulo: LTr, 2008. p. 99.

[17] BRASIL. Projeto de lei n. 6.787, dezembro de 2016. Altera o Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 – Consolidação das Leis do Trabalho, e a Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, para dispor sobre eleições de representantes dos trabalhadores no local de trabalho e sobre trabalho temporário, e dá outras providências. O presente artigo foi elaborado considerando essa primeira versão do Projeto de Lei 6787/2016 conforme remetido pelo Executivo em dezembro de 2016 e antes dos substitutivos parlamentares.

[18]A hipótese mais grave diz respeito ao inciso II do Art. 611-A que prevê o limite de duzentos e vinte horas para a jornada de trabalho mensal enquanto que, pelos parâmetros definidos no inciso XIII, do Art. 7.º da Constituição Federal, o patamar máximo de horas trabalhadas por mês equivale a menos de duzentas horas. A outra hipótese refere-se ao inciso I que permite o parcelamento do período de férias em até três vezes, tornando possível o afastamento da aplicação da norma legal mais favorável prevista no Art. 134 da CLT, cuja regra determina que o trabalhador goze seu direito à férias por um período contínuo, sendo excepcional a concessão de férias em dois períodos, e sem incorporar por inteiro as vantagens trazidas pela Convenção 132 da OIT tais como exclusão dos dias feriados do cômputo das férias.

[19] Os três modelos normativos de admissibilidade da negociação coletiva correpondem às relações de suplementaridade, complementaridade e supletoridade. No entanto, uma doutrina jurídica consistente construiu sólidas diretrizes sobre os processos de integração dos resultados das negociações coletivas no ordenamento jurídico e compreendeu que a Constituição de 1988 prestigia os modelos de suplementação e complementação, em detrimento das relações supletórias, contidas e limitadas aos casos excepcionais nela previstos.

[20] De acordo com o parágrafo terceiro do Art. 611-A, essa situação abrange a hipótese de flexibilização de norma legal relativa à salário e jornada de trabalho.

[21] FERREIRA, Antônio Casimiro. Sociedade da austeridade e direito do trabalho de exceção. Porto: Vida Econômica Editorial, 2014. p. 61.

[22] Como exemplo, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 590415-RG/SC, de relatoria do ministro Luis Roberto Barroso, que julgou a validade e os efeitos de Plano de Demissão Incentivada aprovado em negociação coletiva. Um trecho da fundamentação do voto do min. Barroso, em que afirma que no âmbito do direito coletivo do trabalho não se verifica a mesma assimetria de poder presente nas relações individuais de trabalho e, por conseguinte, a autonomia coletiva de vontade não se encontra sujeita aos mesmos limites que a autonomia individual, foi utilizado na exposição de motivos do PL 6787/2016 como argumento favorável ao modelo normativo de admissão e incorporação da negociação coletiva apresentado que se caracteriza pela institucionalização do direito do trabalho de exceção.

[23] Como exemplo, o PLC 30/2016 (antigo PL 4330/2004), que regulamenta a terceirização laboral.

[24] Sobre o tema, não poderíamos deixar de concordar com a seguinte assertiva de Maurício Godinho Delgado na recente edição (fevereiro de 2017) de seu Curso de Direito do Trabalho:”Não obstante esse amplo sucesso da negociação coletiva trabalhista, a partir da regência normativa e dos estímulos constitucionais, usualmente reaparece no país uma curiosa proposição: a ideia de que o incentivo constitucional à negociação coletiva trabalhista supõe a permissão para que esse importante instrumento de gestão social, realizado no seio da sociedade civil, detenha a prerrogativa de piorar, precarizar, rebaixar as condições de vida e de trabalho dos empregados e demais trabalhadores sob sua influência normativa. A curiosa proposição interpretativa não se sustenta, a qualquer título…”. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 16 edição. São Paulo: LTr, 2017. p 111-112.

[25] Em recente artigo publicado na Revista LTr, Maurício Godinho Delgado realça a existência de inúmeros obstáculos à efetividade do principio jurídico de equivalência dos contratantes coletivos, corroborando a tese de que a cultura jurídica brasileira e a jurisprudência dominante contribui para o enfraquecimento contínuo das entidades sindicais, reforçando a fragmentação do sindicalismo e sua atomização em pequenas entidades frágeis, ao mesmo tempo em que suspende-se a Sumula 277 do TST, impedindo a ultratividade relativa das clausulas coletivas negociadas, em um contexto de inexistência de formulas  eficazes de representação nos locais de trabalho e baixa proteção aos dirigentes sindicais. Constituição da República, Estado Democrático de Direito e Negociação Coletiva Trabalhista, Revista LTr: legislação do trabalho, São Paulo,  v. 80, n. 12, dez. 2016. p. 1418-1419.

[26] Carvalho, Augusto César Leite de. Reforma esvazia o direito do trabalho. Opinião, Folha de São Paulo, 12 de março de 2017.  Disponível em http://m.folha.uol.com.br/opiniao/2017/03/1865671-reforma-esvazia-o-direito-do-trabalho.shtml.

Palavras Chaves

Austeridade, Reforma Trabalhista, PL 6787/2016.