REFLEXÕES SOBRE MÉTODOS ADEQUADOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS

Resumo

Os Meios Adequados de Solução de Conflitos são uma forma de ampliar à proteção dos direitos individuais e coletivos, oferecendo novas possibilidades de escolhas para a resolução de litígios. Nesse sentido, este estudo visa entender como funciona este método de autocomposição de conflitos chamado de Mediação. A mediação é um instrumento relevante para a construção de resultados céleres na esfera extrajudicial, trazendo com sua instrumentalidade a ressignificação das relações e sua contextualização para além do judiciário.

Artigo

REFLEXÕES SOBRE MÉTODOS ADEQUADOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS

Rachel Rossi[1]

RESUMO

Os Meios Adequados de Solução de Conflitos são uma forma de ampliar à proteção dos direitos individuais e coletivos, oferecendo novas possibilidades de escolhas para a resolução de litígios. Nesse sentido, este estudo visa entender como funciona este método de autocomposição de conflitos chamado de Mediação. A mediação é um instrumento relevante para a construção de resultados céleres na esfera extrajudicial, trazendo com sua instrumentalidade a ressignificação das relações e sua contextualização para além do judiciário.

 

Palavras-chave: Mediação; Justiça restaurativa, Autocomposição; Conflito.

1 INTRODUÇÃO

 

A mediação é o método de solução de conflitos que mais cresce no cenário mundial. Vem sendo empregada para superar desentendimentos provenientes de relações familiares, sucessórias, empresariais e condominiais, entre outros. No Brasil, ainda prevalece a cultura da litigiosidade e da solução por meio da sentença judicial, mas o Código de Processo Civil ao trazer uma alternativa de mudança de perspectiva do conflito, quando introduziu a mediação como etapa inicial do procedimento comum, propiciou a construção de uma nova possibilidade para a resolução dos mesmos.

A mediação apresenta-se assim, como uma nova possibilidade de resolução de conflitos, através da autocomposição. A presente obra visa oferecer alguns modelos de mediação com ênfase, nos seus princípios gerais, nas suas técnicas e nos seus procedimentos. Partindo do pressuposto de que os meios alternativos ou adequados de solução de conflitos marcam a volta de um modelo de resolução de conflitos baseado em ideias comunitárias.

Assim, tanto a atuação de mediadores, como dos tipos de mediação que existem serão o foco desse artigo. Entre os benefícios dos meios alternativos para resolução de conflitos, estão: adequação para as disputas; flexibilidade do processo – o processo é determinado e controlado pelas partes no litígio; custos mais baixos e menor complexidade; escolha de mediadores neutros para negociações diretas; velocidade na resolução dos conflitos; soluções práticas adaptadas às necessidades e interesses das partes; durabilidade de acordos; confidencialidade; preservação das relações e da reputação.

Dessa forma, esse entende-se que os métodos adequados para resolução de conflitos, como a Mediação, por exemplo, podem ser uma das escolhas mais adequadas para reduzir os custos das partes, bem como dar maior celeridade aos processos judiciais, dentre outros benefícios.

2 MÉTODOS ADEQUADOS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS

No Brasil, um dos problemas principais do sistema judiciário brasileiro é a morosidade que engloba uma grande dificuldade na busca por resoluções de litígios, e que, de certa forma, cria uma barreira para o acesso ao judiciário.

A centralização dos poderes nas mãos do Estado evidencia a sua falta incapacidade de gerenciar e resolver os litígios sociais. Os métodos adequados de solução de conflitos – MASC’s podem ser alternativa para países periféricos como o Brasil, que possuem dificuldades no complexo processo de interpretação jurídica, já que os meios tradicionais demonstraram, após o advento da Carta Magna de 1988, uma crise de legitimidade. Dentro dessa seara, o acesso à justiça, defendendo à proteção dos direitos sociais (coletivos), é um grande desafio. Os MASC’ s em inglês ADR – Alternative Dispute Resolution são uma alternativa de tutela jurisdicional que foge dos procedimentos clássicos do processo tradicional de julgamento de sentenças. Entre as características dos MASC’s estão: a maior agilidade e eficiência processual, a redução da intervenção estatal e mais soluções para a resolução de conflitos na conjuntura atual.

As relações interpessoais familiares estão impregnadas de conflitos e a falta de comunicação certamente engloba negativamente na resolução de qualquer litígio. Os conflitos de acordo com Vasconcellos (2014) podem ser: de valores pessoais e religiosos, de informações distorcidas, de divergências sociais, econômicas, políticas, de interesses, dentre outros.

Há vários modelos de mediação de conflitos; neste artigo, contudo, serão abordados a Mediação circular-narrativa, Mediação transformativa, Mediação tradicional de Harvard, Mediação penal – Justiça restaurativa.

De regra, recomenda-se, independentemente, do modelo adotado, a realização de encontros preparatórios ou entrevistas de pré-mediação. Na atualidade, a depender da natureza do conflito, das características socioculturais dos mediandos e das habilidades do mediador, alguns modelos ou estilos de mediação podem ser diferentes. Ademais, esses modelos não são regras, pois, dependem das circunstâncias e da vontade dos mediandos, podendo consequentemente, ter o modelo de condução alterada. Veremos a seguir que há modelos direcionados aos acordos, assim como modelos direcionados à relação das partes. (VASCONCELLOS, 2014)

2.1 Mediação Narrativa Circular

Compreendendo cada conflito como único, contendo atores distintos e escaladas não padronizadas, o mediador deve estar apto para lidar com as peculiaridades de cada sessão de mediação. Os modelos direcionados à realização de um acordo que englobam as mediações facultativas e conciliatórias ou a mediação avaliativa priorizam o problema concreto e buscam o acordo. Já os modelos direcionados à relação (circular-narrativo e transformativo) priorizam a transformação do padrão relacional, por meio da comunicação, da apropriação, do reconhecimento e/ou da recontextualização.

Embora os vários modelos de mediação acolham os princípios da autonomia da vontade das partes, da confidencialidade e da inexistência hierárquica do mediador, as respectivas abordagens supõem um mediador com autoridade funcional podendo sugerir, recomendar ou até mesmo induzir. Com relação às mediações que são direcionadas à relação das pessoas, estes modelos obtêm melhores resultados nos conflitos entre pessoas que mantêm relações permanentes ou continuadas, tendo em vista que a sua natureza transformativa supõe uma mudança de atitude em relação ao conflito. (VASCONCELLOS, 2014)

Quando se fala no modelo Circular Narrativo, a comunicação passa a ser circular e é entendida como um todo. Inclui os elementos verbais da “comunicação digital” que têm a ver com o conteúdo e os elementos não verbais (corporais, gestuais etc.) da “comunicação analógica” que tem a ver com as relações. Compreende-se também que existe uma causalidade circular, porque não existe uma causa única que produza certo resultado, sendo ainda, a causalidade retroalimentada, vislumbrando a nutrição pelas conceituações de outras ciências sociais; compartilhamento de teorias da comunicação, terapia familiar sistêmica, entre outros ramos do conhecimento. (GUERERRO, 2015)

Com relação ao seu método, trata-se de aumentar as diferenças; permitindo-se que eles se manifestem e aumentem até certo ponto. Isso contradiz o postulado do Modelo Tradicional de Harvard, porque neste se considera que as pessoas chegam à mediação em um estado de “ordem”; cada parte determinando uma posição e a mantendo-se rigidamente, o que, por vezes, impedindo encontrar alternativas.

Neste modelo chamado de Circular Narrativo, onde se introduz um diálogo circular, o sistema pode se tornar mais flexível criando-se a possibilidade do surgimento de possíveis “estruturas dissipativas” que favorecem a visualização de alternativas, bem como, a obtenção de uma nova ordem. Além disso, como método, as pessoas são legitimadas, a buscarem uma história alternativa construindo juntas uma nova perspectiva  para o problema que poder-se-ia ser visto sob um outro aspecto e contexto.

O objetivo neste modelo é estimular a reflexão, transformando a história que eles trazem para as sessões, para se possível chegarem a um acordo. Este modelo, frise-se, concentra-se nos relacionamentos e acordos. (GUERERRO, 2015)

O Procedimento conforme o modelo circular-narrativo engloba (VASCONCELLOS, 2014):

  1. Pré-reuniões que são preparatórias, com vistas à boa condução dos encontros subsequentes e compondo-se:
  2. Primeira etapa da reunião sendo conjunta: A primeira etapa se inicia em uma reunião com a realização de um circulo, onde são dadas as explicações sobre o processo de mediação.
  3. Segunda etapa sendo reuniões privadas ou chamadas como caucus: Ocorrem reuniões individuais, as quais são consideradas como segunda etapa, podendo ocorrer, repetidas vezes, conforme as necessidades identificadas.
  4. Terceira etapa sendo uma reunião da equipe: Seria o momento em que o mediador e o comediador se reúnem com a equipe para trocas reflexivas. Esta situação ocorre quando o mediador, que sempre trabalha com o apoio do comediador recebe, na sala de mediação, na presença dos mediandos, os integrantes dessa equipe, e com eles troca ideias a respeito do andamento do processo, permanecendo ali, os mediandos como simples observadores, escutando o que o grupo de mediadores conversa a respeito do problema e dos respectivos comportamentos.
  5. A quarta e última etapa é realizada numa reunião conjunta, onde se procura construir o acordo a partir das opções. Finaliza-se, se for o caso, com a redação de Termo Final de Mediação, construindo-se acordos provisórios ou definitivos. Recomenda-se que o Termo Final de Mediação contemple as os combinados alcançados, lembrando-se que a mediação poderá ser judicial ou extrajudicial, conforme a Lei 13.140/2015.

2.2 Mediação Transformativa

O Procedimento Transformativo é um modelo de Bush e Folger que é caracterizado no aspecto relacional, buscando grande importância à alteridade e reavaliação reflexiva das partes, buscando um reconhecimento mútuo da dignidade humana. O objetivo do modelo transformativo é transformar ou modificar os relacionamentos afetados pelo conflito. Não se pretende que as partes cheguem a um acordo. Entende-se que o essencial é que as mesmas transformem suas relações, restabelecendo os canais de comunicação entre elas. “Ele se concentra mais na” transformação de relacionamentos do que na resolução de conflitos. A comunicação neste modelo concentra-se no aspecto relacional e incorpora a causalidade circular. Referindo-se ao seu método, trabalhando para alcançar o “empowerment“, é entendido como o reforço do papel, de modo que as pessoas possam melhorar seus recursos permitindo-lhes serem atores protagonistas de suas vidas e, consequentemente, responsáveis por suas ações. O co-protagonismo do outro é reconhecido. (GUERERRO, 2015)

O objetivo neste modelo de mediação é modificar o relacionamento entre as partes, independentemente de elas chegarem a um acordo ou não. Centra-se na “transformação relacional” e não na resolução de conflitos, sendo este método oposto ao modelo tradicional de Harvard. Aqui o objetivo da mediação é alcançar a mudança ou transformação que é incentivada quando as pessoas, auxiliadas pelo mediador, começam a tomar conta da situação entendendo o que desejam, o que é importante para eles (reavaliação), começando, consequentemente, a entender um ao outro. (reconhecimento).

Desta forma, pequenas, mas importantes, mudanças são produzidas ao longo do conflito, que são realimentadas, afetando diretamente a interação entre as pessoas, impedindo-as de entrar em uma espiral de difícil saída. O modelo Transformativo é baseado em dois pressupostos fundamentais que irão moldar a maneira pela qual as partes e o mediador irão interagir no processo de mediação que são a autodeterminação das partes para a mediação e o poder humanizador do diálogo. (GUERERRO, 2015)

Desde o início, as partes têm controle absoluto sobre o processo e seu conteúdo, de modo que as técnicas usadas por outras escolas não se encaixam aqui na medida em que limitam essa autodeterminação. Da mesma forma, a facilitação de um diálogo humano criará uma conexão entre as partes e terá efeitos diferentes sobre o que acontece nos tribunais ou na arbitragem. Ambas as premissas adotam a mediação dessa singularidade e valor até, então, inexistente. (VASCONCELLOS, 2014)

Na mediação transformativa, não se fala sobre as fases do processo, a duração do processo, as regras ou qualquer coisa que retarde ou direcione a interação entre as partes. As perguntas são usadas, mas com muita cautela, porque podem interferir nas decisões que são tomadas. O papel do mediador é facilitar a comunicação por meio da escuta ativa e do uso oportuno de técnicas, como reflexão, resumo e questões de verificação e, desta forma, ajudar as pessoas a elaborarem seus próprios resultados com base numa compreensão mais clara e segura de si próprias, da outra parte e da natureza das questões que os dividem (GUERERRO, 2015)

As contribuições desse modelo têm um grande valor para mediação. Além de influenciar a importância da valorização e reconhecimento como chave para avançar através da compreensão e comunicação mútua, faz refletir sobre as consequências. (GUERERRO, 2015)

O modelo transformador é baseado na confiança, no ser humano e nas suas habilidades e requer um mediador profissional e tempo para que essas mudanças ocorram. A mediação pode-se iniciar na sala do mediador, ainda que possa continuar a sua evolução em qualquer outro contexto sem a intervenção do mediador. Levado ao limite como este modelo faz, certamente, reduziria as “medalhas” que nós mediadores colocamos para cada acordo assinado pelas partes (TARUTUCE, 2015).

Talvez, em favor da mesma autodeterminação que o modelo propõe, deve-se considerar o que as partes querem, por que escolheram a mediação e o que esperam do processo. Se o desejo é transformar a interação entre os mediados, melhorar a comunicação, assim como obter reconhecimentos mútuos, este é o modelo de mediação a ser escolhido. Se o que as partes desejam é transformar a relação e com isso serem capazes de alcançarem um acordo sobre um tópico específico, acredita-se que este modelo de mediação traga um contexto no qual a maioria dos mediadores poderão se movimentar, fazendo-se uso de todas aquelas habilidades e ferramentas que há dentro dos limites legais e éticos permitidos para alcançarem os propósitos. (GUERERRO, 2015)

Trabalhar a partir deste modelo dá aos mediadores uma chance de conhecer as fraquezas, a grande responsabilidade para com as partes, o poder das ações, a dificuldade de serem mediadores silenciosos, a importância de se sentir confortável em conflito a deixar evoluir-se no seu ritmo. (GUERERRO, 2015)

2.3 Mediação Linear ou tradicional

A mediação da escola de Harvard, também chamada de mediação linear ou tradicional é um dos modelos mais difundidos e tem como precursores Roger Fisher e William Ury, ambos membros do Harvard Negotiation Project.

Os dois desenvolveram esse método também conhecido como Negociação baseada em princípios que se aplica tanto aos processos de mediação quanto de negociação. Este método baseia-se em cinco premissas: separar a pessoa do problema; foco em interesses, não em posições; geração de opções para win-win (win both); escolha na gestão de critérios objetivos, buscando-se sempre a melhor alternativa a um acordo negociado.

Obviamente, é um modelo, eminentemente, prático onde se busca obter um acordo. Para fazer isso, promove-se uma comunicação linear, através do uso de perguntas abertas, fechadas, reflexivas, dentre outras.

Apesar de o mediador lançar mão de perguntas fechadas neste modelo de mediação, por vezes, percebe-se que pode existir, por parte dos facilitadores, certa restrição ao uso destes tipos de perguntas fechadas, na medida em que estas podem não surtirem respostas flexíveis e poderosas ao procedimento da mediação.

Cabe destacar que este modelo de mediação concentra-se no futuro, apresenta uma técnica amplamente utilizada em diversos processos de mediação, busca lidar com as emoções negativas de forma decisiva, apoia nas técnicas de legitimação, bem como reformula o contexto o mais rapidamente possível (dando muito mais importância à obtenção do acordo). (VASCONCELLOS, 2014)

Evitar o “emaranhamento” em bloqueios que possam surgir de uma alta intensidade emocional é o objetivo deste modelo de mediação, pois ele tenta não perder de vista o fim do processo, que, como dissemos, é a obtenção de um acordo. A comunicação verbal prima sobre a não verbal, e entende o desacordo como a causa do conflito, sem dar excessiva importância às causas ou origens do primeiro.

Portanto, um trabalho sobre a relação entre as partes não é realizado (pelo menos intencionalmente). A expressão do meio ocorre de maneira ordenada, uma vez que o modelo é caracterizado por uma busca de equilíbrio ao longo de todo o processo. (GUERERRO, 2015)

É um processo estruturado mais flexível, no qual o mediador é um facilitador da comunicação. Quanto à celebração das sessões, estas podem ocorrer conjuntamente ou em separado, mantendo a confidencialidade no último caso. O mediador, respeitando este princípio, pode usar as informações obtidas em sessões individuais para promover o acordo. Em relação às vantagens que nos dá este modelo, destacamos que é usado para mediar todos os tipos de conflitos, embora seja, particularmente, desejável naqueles onde uma melhoria na relação não seja necessária entre mediados. Tem-se uma taxa de sucesso de cerca de 70%, superior a outros modelos de mediação, por isso, fala-se de sua confiabilidade, tendo grande aceitação na mediação de conflitos de natureza comercial ou organizacional. (VASCONCELLOS, 2014)

Dentro da década dos anos setenta na Escola de Direito de Harvard, o professor Roger Fisher formou em Willian Ury na terra da negociação. Junto com a ajuda de Bruce Patton publicaram um livro chamado Como chegar ao sim e, um ano depois, Ury publicou Supere o não. Estas obras serviram, posteriormente, como fonte positiva de mediação e práticas profissionais. (VASCONCELLOS, 2014)

Esta escola vem do ramo dos negócios. Está focada em negociação e acordo. Baseia-se em conseguir que as partes cheguem a um acordo que seja equitativo. O procedimento de negociação deve ser duro com o argumento, mas gentil com o povo. A negociação é baseada no respeito e proteção dos direitos do povo. (GUERERRO, 2015)

Outro aspecto importante desta escola é que as pessoas deixam a posição que têm e se concentram nos interesses comuns. O desacordo tem uma causalidade linear. O medidor deve ser mantido em neutralidade por imparcialidade e marcação de distâncias. Deve ser responsável por pedidos, durante as sessões. Deve também ajudar as pessoas a se separarem do problema, a se concentrarem em interesses comuns e não em posições. (VASCONCELLOS, 2014)

Neste modelo, a comunicação tem um sentido linear. “Consiste em dois indivíduos que se comunicam. Cada um expressa seu “conteúdo” e o outro “ouve” o conteúdo, ou não. A função do mediador é ser um facilitador da comunicação, a fim de alcançar um diálogo que seja entendido como uma comunicação bilateral eficaz. Está centrado no verbal. Tem causalidade linear, porque se considera que o conflito tem uma causa – que é o desacordo – e não leva em conta outras causas que possam influenciar a disputa. Uma vez que o contexto em que o conflito ocorre não é levado em consideração, trata-se de eliminar as percepções de erros que foram cometidos no passado que impedem entender o presente e chegar a um acordo no futuro. (GUERERRO, 2015)

Quanto ao seu método, a identificação do conflito pelas partes é importante, ou seja, que as pessoas expressem suas emoções no início do processo como um efeito de catarse. Isso evita que as emoções interfiram no processo mais tarde. A imparcialidade do mediador é alcançada através da (ausência de preconceitos, avaliações, crenças, etc.) e equidistância (não fazendo alianças com nenhuma das partes). Vai do caos à ordem, porque quando as partes chegam, sua situação é caótica e o mediador tem a função de estabelecer a ordem. (VASCONCELLOS, 2014)

O objetivo da mediação Linear é chegar a um acordo, reduzindo as diferenças entre as partes, aumentando, consequentemente, as semelhanças, valores e interesses, pois, atenuando as divergências e acentuando as convergências, o conflito pode desaparecer. Este modelo, portanto, concentra-se no acordo, não levando muito em conta as relações entre as partes, concentrando-se, desta forma, no conteúdo da comunicação ao invés de tentar modificar as relações entre eles. (GUERERRO, 2015)

2.4 Mediação Penal – Justiça restaurativa

Já os Processos restaurativos são processos um pouco mais complexos, é um processo de diálogo e comunicação vítima/agressor em que a vítima pode obter respostas, e ser reparada na medida do possível dos danos causados, a fim de continuar com sua vida, superando o papel perpétuo da vítima e não se sentindo “humilhada”. Trata-se de passar de vítimas para sobreviventes, sendo digno de respeito e consideração. (GUERERRO, 2015)

O infrator deve voluntariamente querer participar, é um ato voluntário de assunção de responsabilidade como se estivessem focando exclusivamente neles, tentando forçar seu arrependimento, essa intervenção deve concentrar-se nos infratores, mas em nenhum caso pode ser chamado de mediação criminal (VASCONCELLOS, 2014)

Estes processos restaurativos como mediação penal pode levar o infrator a pedir desculpas e a vítima a aceitá-la, embora não tenha que ser assim, naturalmente, para as vítimas é positivo para superar as cicatrizes do crime. (TARUTUCE, 2015)

A Justiça Restaurativa é um processo privado sem impacto público e o fato de participar de processos restaurativos como mediação penal é legitimar ou justificar os crimes. Estas iniciativas trabalham principalmente para não prejudicar as vítimas e sobreviventes ainda mais. As principais características da Justiça Restaurativa têm a ver com a responsabilidade pelas consequências da situação conflitiva, a reparação dos referidos danos e a participação daqueles direta e indiretamente envolvidos na situação de conflito. (TARUTUCE, 2015)

O procedimento restaurativo é um procedimento inclusivo; isto é, inclui todas as partes interessadas para encontrar a solução. Além disso, buscam diálogos que permitam determinar quais seriam as consequências da situação de conflito. Desta forma, as partes podem assumir responsabilidades, podem dar lugar à reparação dos danos causados pelo conflito e um compromisso é estabelecido para não causar os danos novamente. Este procedimento tem como objetivo acelerar o procedimento, tentar reduzir os custos associados e tentar descomprimir o sistema penal. (VASCONCELLOS, 2014)

Em outro tipo de procedimento conhecido como pós-sentença, pretende-se que, embora uma sanção já tenha sido estabelecida, as partes tenham acesso a mecanismos restaurativos. Em muitos casos de Justiça Restaurativa pós-sentença, os acordos de reparação podem ser simbólicos e visar à reparação moral da vítima. (TARUTUCE, 2015)

De acordo com Vasconcellos (2014, p. 100): “[os] procedimentos usados para a Justiça Restaurativa dependerão em grande parte do que cada país tenha regulado como um sistema de métodos alternativos de justiça”. Portanto, esses processos serão aplicados em primeiro lugar, nos países onde é contemplado como um método de justiça.

O essencial é que haja uma vítima e um vitimador identificáveis. Além disso, o vitimizador deve aceitar a responsabilidade por seu comportamento. Em seguida, tanto o vitimador quanto a vítima devem voluntariamente consentir em submeter o conflito a um processo restaurativo. O processo que se seguirá dependerá das disposições de cada país, de acordo com as bases legais e com o que as partes estão dispostas. (TARUTUCE, 2015)

Para que o processo restaurativo seja ativado, é necessário que o conflito chegue ao tribunal. O processo deve também reunir as pessoas ao seu redor os representantes envolvidos e/ou comunidade. Se ambas as partes consentiram em iniciar o procedimento, esta fase de recepção começa, consistindo de uma entrevista individual com cada uma das partes no conflito. Eles são informados sobre o conteúdo e a natureza do processo de mediação: partes envolvidas, duração estimada, rrealização, normas e funções da pessoa mediadora (neutralidade, imparcialidade, confidencialidade e objetividade), possíveis efeitos e incidentes no processo judicial.

Nessas entrevistas individuais é possível recolher informações a partir da percepção das partes dos fatos, experiências, emoções, medos, atitudes e possíveis consequências em relação à outra parte, bem como a necessidade e a capacidade de sofrer o processo. (TARUTUCE, 2015) O mediador deve conhecer a situação específica da pessoa acusada com a Justiça e os possíveis benefícios que podem ser alcançados, bem como o nível de responsabilidade assumida em relação ao crime e suas consequências. (VASCONCELLOS, 2014) A vítima pode ter conhecimento das emoções, danos sofridos, consequências derivadas do crime e necessidade e interesse em ser reparado.

Com esta informação, o mediador irá avaliar se deve ou não iniciar a reunião com o início do diálogo, baseado na existência do conflito e sua dimensão, observando que o processo restaurativo não é prejudicial para ambas as partes e que o real interesse das partes é buscar uma solução para o conflito, com base no diálogo, respeito, reconhecimento da verdade e reparação. (TARUTUCE, 2015) O mediador, quando julgar necessário, fornece informações para as partes sobre as possibilidades de acesso a outros serviços de cooperação com a Justiça. Da mesma forma, com o consentimento da pessoa afetada, ela pode obter dessas informações de serviços úteis para o processo restaurativo. (VASCONCELLOS, 2014)

A fase de encontro de diálogo consiste na entrevista conjunta com as duas partes, se ambas desejam e (nos casos de círculos e conferências com a participação de terceiros afetados pela situação, representando os ambientes de ambas as partes, ou a comunidade) e o mediador considera isso possível, uma vez que um acordo pode ser alcançado sem que a vítima e a pessoa ofensora sejam vistas fisicamente, usando outras formas de comunicação indireta.

Esta fase pode durar uma ou várias sessões, dependendo da complexidade do caso, da situação emocional das partes ou do número de vítimas. As ferramentas restaurativas são aplicadas controlando os níveis de tensão, garantindo às partes o uso da palavra, esclarecendo opiniões, resumindo e traduzindo-as.

Em casos que surjam da esfera criminal em que o mediador considera apropriado, e as partes diretamente envolvidas no processo o querem, nesta fase o mediador pode convidar pessoas do ambiente daqueles, ou pessoas da sociedade como vítimas, pessoas que passaram por experiências semelhantes, operadores legais, outros agentes interessados para ajudar na reunião para desenvolver uma solução de diálogo através de técnicas que, no campo da Justiça Restaurativa, são chamadas de Círculos e Conferências. (TARUTUCE, 2015)

Após a reunião de diálogo – e se as partes chegarem a uma decisão comum com base em sua convicção e interesse –, será redigido um documento no qual o Acordo de Reparação seja assinado, o que implicará em um “Plano de Reparação”; acordo que será comunicado ao Órgão Judiciário e ao Ministério Público para os devidos fins. No caso de sua conclusão sem acordo, o mediador também comunicará essa circunstância ao Tribunal e ao Ministério Público, respeitando a confidencialidade do acordo. (VASCONCELLOS, 2014)

Mediadores sabem que o problema material é contaminado pelos ressentimentos, desejos de vingança, etc. A mediação é uma forma para a resolução de conflitos. Na existência da mediação, uma terceira pessoa é eleita. Esta é imparcial e é eleita em comum acordo entre as partes. A mediação pode ser compreendida como um método, na qual uma terceira pessoa auxilia as partes a chegarem a uma solução amigável. Importante destacar que o mediador não realiza o julgamento, ele apenas age como um mediador para tentar pleitear um acordo entre as partes. (VASCONCELOS, 2014)

Entre as vantagens da realização da mediação está a agilização na resolução do litígio, confidencialidade do processo. Além do mais é uma forma mais produtiva e mais justa, haja vista que as partes poderão manter uma mínima relação de diálogo após a realização do litígio. Segundo Tartuce (2015, p. 69), “mediação de conflitos já é conhecida na maior parte do mundo como o procedimento, associado ou não ao sistema judicial tradicional”. Todos os autores consultados coincidem em caracterizar esta abordagem pela ausência de formalismos e pelo que essencialmente a distingue dos outros procedimentos: estar baseada no diálogo, na cooperação e no respeito entre os participantes.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escolha da Mediação como método autocompositivo adequado a solução de conflitos, não se finda em apenas realizar acordos. Existe uma inúmera gama de modelos que oferecem o atendimento das necessidades peculiares trazidas por cada mediando. É importante estar atento às narrativas para vislumbrar qual método utilizar. A mediação não pode ser escolhida de maneira aleatória, nem os mediadores devem atuar de forma improvisada. Há método e modelos próprios que conferem ao mediador os instrumentos necessários para que os mediandos construam as soluções para suas demandas. Cabe ao mediador capacitar-se para que seu trabalho realmente contribua para o restabelecimento da comunicação, o entendimento sobre o conflito, a confiança no método escolhido e a responsabilidade por terem, novamente, a oportunidade de compreenderem suas histórias. A mediação é o método, o mediador é o facilitador do diálogo e os mediandos são os atores da sessão de mediação, cada qual tem lugar e papel distinto, sendo fundamental que harmonizem suas ações para resolverem a controvérsia que os trouxeram a buscar a mediação de conflitos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GUERRERO, Luis Fernando. Os Métodos de Solução de Conflitos e o Processo Civil. Coordenação: Carlos Alberto Carmona. Coleção Atlas de Processo Civil. Atlas, 2015.

TARTUCE, Fernanda. Mediação Extrajudicial e indenização por acidente aéreo. Insuficiência da reforma das leis processuais. [2013]. Disponível em:

http://www.fernandatartuce.com.br/index.php?option=comdocman&task=cat_view&gid=43&Intemed=56&limitstart=10. Acesso em 15/09/2021.

TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. São Paulo: Método, 2015.

VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de conflitos e práticas restaurativas. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

Notas:

[1]     Graduada em Direito (2008); Pós-graduada em Direito Civil e Processo Civil pela Universidade Candido Mendes (2018); Pós-graduada em Mediação de Conflitos com ênfase em Família pela AVM Faculdades Integradas – Campus Barra da Tijuca (2016), Mediadora Judicial do TJ/RJ em 2016; Vice-presidente da comissão de Mediação e Coordenadora adjunta da Coordenação de Soluções de Conflito da OAB Barra.

Palavras Chaves

Mediação; Justiça restaurativa, Autocomposição; Conflito.