Limites e paradigmas da regulação estatal sobre atividades econômicas

Resumo

O artigo aborda os limites e paradigmas da intervenção do Estado sobre a economia. Como resultado de pesquisa empreendida pelo autor, são colhidos e sistematizados os principais pilares a respeito do tema difundidos na doutrina brasileira. Entre outros paradigmas dá-se destaque ao princípio da proporcionalidade, como instrumento de aferição da legitimidade da intervenção econômica estatal. A partir da base teórica apresentada é comentado o caso concreto de declaração de inconstitucionalidade de lei estadual do Rio de Janeiro, a qual objetivava a inclusão obrigatória de cachaças produzidas no referido estado-membro nas cartas de bebidas de bares, restaurantes e hotéis.

Artigo

LIMITES E PARADIGMAS DA REGULAÇÃO ESTATAL SOBRE ATIVIDADES ECONÔMICAS

Flávio Torres Picanço Machado

RESUMO: O artigo aborda os limites e paradigmas da intervenção do Estado sobre a economia. Como resultado de pesquisa empreendida pelo autor, são colhidos e sistematizados os principais pilares a respeito do tema difundidos na doutrina brasileira. Entre outros paradigmas dá-se destaque ao princípio da proporcionalidade, como instrumento de aferição da legitimidade da intervenção econômica estatal. A partir da base teórica apresentada é comentado o caso concreto de declaração de inconstitucionalidade de lei estadual do Rio de Janeiro, a qual objetivava a inclusão obrigatória de cachaças produzidas no referido estado-membro nas cartas de bebidas de bares, restaurantes e hotéis.

PALAVRAS-CHAVE: Direito Econômico; intervenção estatal; princípio da proporcionalidade; inconstitucionalidade; lei estadual

INTRODUÇÃO

Desde o início da década de 1980 temos assistido ao declínio do Estado de Bem-Estar Social, devido a diversos fatores de ordem global, o que teve consequências internas na estrutura e na política dos Estados nacionais.[1] Com efeito, iniciou-se uma onda de reformas administrativas em vários países, com o propósito de diminuir o tamanho do aparato estatal e reposicionar o Estado frente à economia.

Em termos gerais, a ideia central da reorganização do Estado consiste em reduzir a sua participação no domínio econômico, privilegiando o setor privado no desempenho

de atividades econômicas. Esse modelo estatal enxuto e subsidiário à condução da economia por particulares teve origem em orientações neoliberais, propondo uma postura contida do Estado na participação dos processos produtivos.

Note-se, contudo, como mais adiante será explicitado,[2] que há uma contrapartida na preferência pelo setor privado no desenvolvimento de atividades econômicas. Se, por um lado, o Estado se desincumbe da atuação direta no domínio econômico (salvo hipóteses excepcionais), por outro, são dilargadas a abrangência e a especialização de suas funções de planejamento, fiscalização e incentivo dos empreendimentos levados a cabo por particulares. Desse modo, exsurge para o Estado uma função regulatória[3] a demandar-lhe a definição dos escopos de sua interferência na seara econômica.

Com isso, quer-se ressaltar que aos órgãos públicos e entidades estatais caberá a responsabilidade pela intervenção no plano da economia, com o propósito de garantir o bom funcionamento dos mercados e de assegurar a observância dos direitos fundamentais constitucionalmente previstos. Vê-se, assim, que, nesse viés, avulta o papel do Estado na economia, não como agente econômico, mas como um gestor do ambiente econômico.

Para tanto, e em virtude do contexto de um Estado Democrático de Direito, serão necessárias leis e outros atos normativos para legitimar juridicamente a atuação estatal com a finalidade regulatória da economia. Nesse sentido, é válida a menção à percuciente observação de Eros Roberto Grau, para quem “a sociedade capitalista é essencialmente jurídica e nela o Direito atua como mediação específica e necessária das relações de produção que lhes são próprias”.[4]

Tércio Sampaio Ferraz Jr.[5] esclarece que nada há de impróprio na intervenção do Estado na economia em regimes capitalistas de livre mercado. Pelo contrário, o intervencionismo é inerente à economia capitalista, na medida em que a intervenção estatal atua justamente em favor do mercado, com a garantia da propriedade privada dos bens de produção, da liberdade de iniciativa e da livre concorrência. Nesse sentido, não se deve confundir o intervencionismo com o dirigismo, este sim característico de países com economia planificada de forma centralizada pelo Estado. Em sistemas desse tipo, há a propriedade estatal dos bens de produção, a estipulação de preços, e a determinação da quantidade e da distribuição das mercadorias. Não é sobre esse modelo que se está ora a cogitar, mas do sistema capitalista, em que a ênfase recai sobre a otimização de resultados e a eficiência na alocação de recursos escassos, objetivos dependentes, pois, da intervenção estatal, como meio de assegurar que as falhas do mercado não acabem por prejudicar o seu próprio funcionamento.

A regulação econômica estatal é estabelecida pela legislação e atos administrativos normativos, os quais, ao mesmo tempo em que conferem tal poder interventivo ao Estado, impõem os limites às ingerências indevidas. Consequentemente, vislumbra-se o controle do Poder Judiciário sobre o Poder Legislativo (responsável pela elaboração das leis) e sobre o Poder Executivo (responsável pela edição de atos administrativos normativos, além da execução de atos materiais para a conformação das atividades econômicas reguladas).

É certo que o controle judicial sobre a intervenção estatal no domínio econômico requer comedimento e capacidade institucional do Poder Judiciário. Embora não seja objeto de análise específica deste trabalho, é preciso ressaltar que o Poder Legislativo dispõe de legitimidade democrática para a implementação de políticas públicas, ao passo que entidades reguladoras independentes detêm o conhecimento técnico a respeito das atividades sob regulação).[6] Nesse contexto, cabe ao Poder Judiciário exercer o controle de conformação do domínio econômico nos estritos lindes do ordenamento constitucional, onde são encontradas as normas gerais sobre a ordem econômica.

No Brasil, a Constituição Federal abriga normas sobre o domínio econômico em seu “Título VII – Da Ordem Econômica e Financeira”, com destaque, para os fins deste trabalho, ao seu “Capítulo I – Dos Princípios Gerais da Atividade Econômica”. Por influência do direito germânico, o controle judicial sobre o exercício da regulação econômica estatal deve ser pautado pelo princípio da proporcionalidade.

De certo, o princípio da proporcionalidade vem a ser o principal meio, mas não o único, para aferir a legitimidade da intervenção econômica estatal. Ao lado dele funcionam, como instrumentos de verificação da legitimidade da atuação estatal na esfera econômica, o princípio da subsidiariedade[7] e o princípio da eficiência[8]. Neste estudo será dado foco ao princípio da proporcionalidade como mecanismo de apreciação da legitimidade da regulação estatal da economia feita pelo Poder Judiciário. Nesse viés, estamos seguindo os passos de numerosos estudos sobre regulação econômica realizados pela doutrina brasileira.[9]

É importante esclarecer, conforme salienta Caio Tácito[10], que o controle do Poder Judiciário sobre as leis, segundo juízos de valor baseados na proporcionalidade e na razoabilidade, não tem por finalidade a substituição da vontade dos legisladores pela dos magistrados. O exame destes deve cingir-se à análise da consonância da regulação estatal com a ordem jurídica conforme definida em seus contornos gerais no plano constitucional. Observe-se, então, que as normas conformadoras da economia estatuídas pela Constituição Federal vinculam tanto a intervenção estatal quanto o seu controle, determinando simultaneamente possibilidades e limites para cada um dos três Poderes da República.

O presente trabalho, contextualizado na esfera da ordem econômica constitucional, procura refletir sobre os limites e paradigmas da regulação estatal sobre atividades econômicas exercidas pela iniciativa privada. Com efeito, não se trata de tema novo entre doutrinadores estrangeiros e nacionais, porém permanece sempre a ensejar e a merecer renovadas reflexões, a partir de casos concretos que não cessam de surgir.

A justificativa para o estudo ora proposto se deve a sua grande importância, pelo motivo de debater a aplicação e a intensidade de princípios constitucionais, bem como por discutir a respeito das fronteiras de legitimidade da intervenção estatal na livre iniciativa e circulação de mercadorias, com o propósito de promover outros valores jurídicos.

Como é sabido, a ponderação de princípios é questão que permanentemente gera desafios para os operadores do direito. Significativo desafio, também, consiste em manejar apropriadamente o princípio da proporcionalidade, muitas vezes enunciado, porém poucas vezes operacionalizado em seus três aspectos (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito), para fins de controle e justificativa de sua própria aplicação.

Levando em consideração que as discussões teóricas e acadêmicas têm a finalidade de prover de fundamentos, experiências e conteúdos as atividades práticas vivenciadas por aqueles que atuam no universo jurídico, este trabalho tem por objetivo contribuir, mesmo que modestamente para os debates acerca das fricções entre a livre iniciativa e os outros princípios constitucionais, com a mediação da proporcionalidade. Espera-se que as linhas de raciocínio aqui desenvolvidas ajudem na compreensão do tema investigado, auxiliando aqueles que operam efetivamente nesse ofício.

Para cumprir com a referida proposta de estudo, na sequência será apresentado um caso concreto para análise, do qual serão extraídas determinadas reflexões, além de permitir a ilustração do tema objeto deste trabalho. A isso se seguirá uma abordagem sobre o estado da arte sobre a ordem constitucional econômica no Brasil, para, ao final, ser apresentada uma conclusão precedida de uma análise do caso concreto à luz das referências teóricas abordadas. Esse itinerário conduzirá a um tratamento enriquecedor do assunto, na medida em que sua progressão se estrutura no encadeamento e na sistematização dos principais elementos envolvidos na matéria sob pesquisa.

APRESENTAÇÃO DO CASE PROPOSTO

Como dito, a discussão em torno dos limites da intervenção estatal na economia é renovada incessantemente, a cada caso concreto que se apresenta na realidade fática a demandar a apreciação do Poder Judiciário. Nessas ocasiões, as partes envolvidas na questão acenam com as teorias e os argumentos produzidos em âmbito doutrinário e/ou jurisprudencial, com intuito de defenderem as suas posições.

            Foi assim que recentes julgados do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro trouxeram à baila mais uma vez o referido tema. Menos de um ano após a edição da Lei Estadual RJ nº 7.595, de 23 de maio de 2017, que “Dispõe sobre a inclusão de cachaças produzidas no Estado do Rio de Janeiro nas cartas de bebidas de bares, restaurantes e hotéis”, o Órgão Especial do TJ-RJ declarou a inconstitucionalidade deste diploma legal.

            Estabelece, a lei, em seus dispositivos:

Art. 1º – Os bares, restaurantes e hotéis, localizados no Estado do Rio de Janeiro, que disponibilizarem para seus clientes, carta de bebidas destiladas deverão incluir, pelo menos, 4 (quatro) marcas de cachaças aqui produzidas.

Parágrafo único. Além da marca, a carta de bebidas mencionada no caput deverá conter a informação de procedência – em relação ao nome do Município – da cachaça.

Art. 2º – O estabelecimento que descumprir o determinado nesta Lei terá seu nome incluído em cadastro próprio, ficando excluído de quaisquer futuros benefícios que dependam de autorização do Poder Executivo, incluindo anistia, remissão, concessão de empréstimo, renúncia fiscal e etc., sem prejuízo das penalidades previstas na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 – Código de Defesa do Consumidor.

Art. 3º – Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.

Em 16/04/2018, o julgamento conjunto do Processo nº 0028499-96.2017.8.19.0000 (Representação por Inconstitucionalidade proposta pela Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Estado do Rio de Janeiro) e do Processo nº 0028762-31.2017.8.19.0000 (Representação por Inconstitucionalidade proposta pela Federação Nacional de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares – FNHRBS) acabou por dar provimento aos pedidos de reconhecimento da inconstitucionalidade da lei estadual. As decisões acataram o entendimento de que houve afronta aos princípios da livre iniciativa e da liberdade econômica, proclamados pelos Arts. 5º, 214 e 215 da Constituição Estadual RJ (inspirados nos Arts. 1º, IV, 170 e 174 da Constituição Federal), ferindo a proporcionalidade por excessivas as restrições instituídas face aos princípios supra referidos.[11] Ressalte-se que as duas decisões foram unânimes.

            Nos autos dos processos constam manifestações do Governador do Estado do Rio de Janeiro, da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro e do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, todos opinando pela procedência dos pedidos de declaração de inconstitucionalidade da Lei Estadual RJ nº 7.595/2017.

O Projeto de Lei nº 1.087/2015, que deu origem à lei fulminada pelo Poder Judiciário, apresentava como justificativa a divulgação e o estímulo ao setor produtivo de cachaças do Estado do Rio de Janeiro, in verbis:

Estimular o setor, principalmente considerando que as cachaças produzidas no Estado são as mais certificadas, além de detentoras do maior número de premiações internacionais, em comparação com as demais cachaças produzidas em outras unidades da Federação. Urge a divulgação de nossas cachaças, especialmente levado em consideração que outros Estados, mormente Minas Gerais, promovem seus produtos, que embora de excelente qualidade, perdem na competição com as produzidas aqui no Rio de Janeiro.

Em que pese o propósito, a princípio, louvável dos legisladores, a obrigatoriedade imposta pode acarretar em possíveis questionamentos relativos a vício material da determinação imposta pela lei.

Inicialmente, pode se alegar a afronta ao princípio da livre iniciativa dos proprietários de bares, restaurantes e hotéis, ao serem obrigados a disponibilizarem produtos por exigência legal.

Também é questionável se haveria quebra da igualdade entre produtores e distribuidores de cachaças de outros Estados e do Estado do Rio de Janeiro, alçando estes últimos à posição favorecida no que diz respeito ao acesso aos pontos de venda direta ao consumidor, formando uma espécie de reserva de mercado.

Além disso, a fiscalização do cumprimento da exigência legal originaria um custo para o Estado do Rio de Janeiro, para que fosse feita a inspeção dos estabelecimentos obrigados a incluírem cachaças do Estado em suas cartas de bebidas.

Em vista de todas essas considerações, vislumbra-se a invocação do princípio da proporcionalidade como um instrumento eficiente para equacionar de forma satisfatória eventuais tensões entre princípios constitucionais relativos à economia. Para tanto, a proporcionalidade deve ser utilizada responsavelmente, com o cotejamento criterioso, em cada caso concreto, de seus três aspectos: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

Com o fim de analisar e avaliar as decisões proferidas pelo Órgão Especial do TJ-RJ nos dois processos apresentados acima, os quais culminaram na declaração unânime de inconstitucionalidade da Lei Estadual RJ nº 7.595/2017, com fundamento na violação do princípio da proporcionalidade, propõe-se uma revisão teórica da melhor doutrina. O levantamento do estado da arte sobre a ordem econômica constitucional no Brasil ajudará a prover de subsídios os comentários adicionais a respeito dos julgados relatados.

O ESTADO DA ARTE SOBRE A ORDEM CONSTITUCIONAL ECONÔMICA NO BRASIL[12]

Esta seção será dividida em duas subseções: Ordem constitucional econômica em linhas gerais e O Direito Econômico.

Ordem constitucional econômica em linhas gerais

O estudo que se apresenta está inserido no contexto da ordem constitucional econômica, estabelecida pela Constituição Econômica, sendo esta última definida por Vital Moreira[13] (publicista português, com significativa influência entre os doutrinadores brasileiros) como:

o conjunto de preceitos e instituições jurídicas que, garantindo os elementos definidores de um determinado sistema econômico, instituem uma determinada forma de organização e funcionamento da economia e constituem, por isso mesmo, uma determinada ordem econômica.

            De forma mais sucinta, em outro trabalho, o mesmo autor conceitua a Constituição Econômica da seguinte forma:

o conjunto das normas e dos princípios constitucionais relativos à economia, isto é, que configuram a ordem constitucional da economia.[14]

É válido mencionar que existe, em parte da doutrina, questionamento a respeito da existência efetiva de uma chamada “Constituição Econômica” e de uma “ordem constitucional econômica”. Entretanto, essa reflexão não constitui objeto de análise deste estudo.[15] Desse modo, fique esclarecido que este trabalho parte da premissa de sua real existência.

Defende-se que a ordem constitucional econômica é portadora de uma missão transformadora da realidade econômica nacional, devendo atuar como propulsora do desenvolvimento econômico.[16] Claro está que esse entendimento não possui a expectativa de que as normas constitucionais possam ter o condão de, por si só, provocar alterações no mundo do ser, mas apenas considera que a estipulação de princípios e de regras direcionados à economia seja um estágio para perseguir a prosperidade do país. A efetividade do desenvolvimento econômico nacional depende da instituição de políticas públicas e da implementação de providências concretas tendentes a conformar a atuação dos agentes econômicos, tendo como referência um planejamento econômico inspirado na interpretação das normas constitucionais. Tanto as políticas públicas quanto as providências concretas, como não poderiam deixar de ser, devem estar embasadas em legislação com suporte na Constituição.

De acordo com o ensinamento de André Cyrino, interpretar a Constituição Econômica tem por essência a discussão em torno dos limites do controle da constitucionalidade das leis, bem como de outros atos, sejam estes últimos normativos ou não, comissivos ou omissivos, quando tiverem como fim a intervenção estatal no domínio econômico.[17] Essas palavras podem servir como um complemento às definições de Constituição Econômica dadas por Vital Moreira, apresentadas acima.

Por conta desse último comentário, fica exposto que legisladores (de qualquer dos níveis federativos) e administradores (agentes públicos em geral, independentemente de sua hierarquia) não dispõem de poder ilimitado para influenciar no domínio econômico. Valemo-nos, uma vez mais, das lições de André Cyrino, para elucidar que é precisamente por meio da proporcionalidade que a ordem constitucional econômica define a abrangência e a intensidade da atuação do Estado no plano da economia.[18]

Antes de darmos prosseguimento à explanação sobre o conteúdo e sobre os efeitos da proporcionalidade, aproveita-se, nesse ponto, para consignar que há em respeitável doutrina um debate acerca da natureza da proporcionalidade. Virgílio Afonso da Silva,[19] apoiado na teoria dos direitos fundamentais do filósofo do Direito alemão Robert Alexy, que divide as normas constitucionais em princípios e regras, entende que a proporcionalidade estaria enquadrada no grupo destas últimas, de modo que o correto seria se falar em regra da proporcionalidade. Segundo essa posição, as regras impõem comandos definitivos, devendo a sua aplicação se dar por meio da subsunção. De forma distinta apresenta-se a compreensão de Humberto Ávila, que divide em três categorias as normas constitucionais: princípios, regras e postulados aplicativos normativos. Em sua teoria, o autor considera a proporcionalidade um postulado aplicativo normativo, sendo apropriado utilizar o termo dever de proporcionalidade, o qual consistiria, nas palavras do autor, numa “condição formal ou estrutural de conhecimento concreto (aplicação) de outras normas”.[20] Em nosso estudo será utilizada a expressão princípio da proporcionalidade, em reverência a sua maior difusão na doutrina e na jurisprudência.

Quer seja a proporcionalidade um princípio, uma regra ou um postulado normativo aplicativo, o que se deseja ressaltar aqui é a sua serventia para a aferição da intensidade regulatória da economia. Por conseguinte, a utilização do princípio da proporcionalidade acarreta na exigência de uma atuação estatal na medida exata para a satisfação dos princípios constitucionais voltados à economia, nem mais nem menos, sob pena de, por um lado, causar restrições demasiadas à livre iniciativa, ou, por outro, não ser suficiente para promover os demais valores tutelados pela Constituição.

É preciso observar, acompanhando comentário feito por Floriano de Azevedo Marques Neto,[21] que é muito comum existirem situações em que a regulação estatal é necessária, mas acaba extrapolando os limites da proporcionalidade. Nesses casos, não se está diante de um problema de abrangência regulatória, posto que a atuação do Estado era devida. A hipótese, ora aventada, é de falha regulatória relativa a intensidade da medida interventiva. O princípio da proporcionalidade funciona como um instrumento de medição da calibragem da regulação, de maneira a auxiliar na avaliação de sua correta intensidade. Exorbitar a intensidade cabível significa afrontar a proporcionalidade.

De par, ainda, com o mesmo autor, chama-se à atenção para o fato de que a atividade regulatória estatal, ao promover uma determinada finalidade pública constitucional, privilegia simultaneamente certos interesses privados, mas tem como efeito colateral o sacrifício de outros interesses também privados. Ou seja, a intervenção do Estado na economia opõe os beneficiários e os que suportam os ônus da regulação. Note que não há nada de errado nisso, a princípio. Esse é um efeito esperado da regulação econômica. No entanto, as competências interventivas devem sempre ser desempenhadas calculando-se os seus custos decorrentes, os quais não podem superar os benefícios esperados pela regulação, sob pena de torná-la injustificável.[22] Mais uma vez se evidencia a proporcionalidade como um instrumento destinado ao cálculo da análise custo/benefício da intervenção estatal.

Também é importante deixar claro que o fato de determinados agentes econômicos suportarem os ônus de uma regulação econômica não significa o mesmo que a assunção, por eles, de competências regulatórias do Estado. Isso importa que os agentes econômicos, apesar de se sujeitarem a restrições impostas pela regulação (relacionadas ao meio ambiente, ao pleno emprego, ao desenvolvimento regional etc.), têm o direito de exercitar a livre iniciativa, com o objetivo de obter lucro, como sua meta principal. Nesse sentido, em um sistema econômico capitalista, seria desproporcional e ilegítimo o Estado obrigar a uma empresa que concentre as suas atividades com o fim primário de satisfação dos princípios constitucionais da ordem econômica em sua totalidade, relegando a segundo plano a liberdade de iniciativa e a sua finalidade lucrativa. De acordo com esse raciocínio, é ao Estado, imbuído de múnus público, a quem cabe a responsabilidade de desenvolver políticas públicas direcionadas à promoção dos princípios da Constituição Econômica, incluindo a própria livre iniciativa e a livre concorrência. Desvirtuar a busca do lucro como intenção primeira de empresas privadas consiste em restrição desmedida à liberdade econômica.[23]

Não é outro o ensinamento de Edilson Pereira Nobre Júnior, que, de forma específica e incisiva quanto à busca do lucro como objetivo primacial dos agentes econômicos, conclui o seguinte:

Daí se pode rematar que a observância à proporcionalidade, pela legislação restritiva das liberdades econômicas, estaria em deixar intangível a possibilidade de o empresário prosseguir obtendo lucro com a sua atividade, condição indispensável para a manutenção do seu negócio. Forçar o agente econômico à consecução de prejuízos é o mesmo que violar o conteúdo essencial do direito à liberdade de empresa, enveredando a norma limitativa pela senda do excesso.[24]

Como visto, mais uma vez releva-se o princípio da proporcionalidade para verificar a legitimidade de legislação impositiva de restrições à livre iniciativa.

O Direito Econômico

A ordem constitucional econômica brasileira é estabelecida pela Constituição Federal no Título VII “Da Ordem Econômica e Financeira” (Arts. 170 a 192).[25] O seu estudo é feito pelo Direito Econômico que, a despeito das divergências doutrinárias sobre consistir efetivamente em um ramo do direito, é definido por Fábio Konder Comparato como “o conjunto das técnicas jurídicas de que lança mão o Estado contemporâneo na realização de sua política econômica[26].

Mais importante é ressaltar, desde já, o caráter finalístico do Direito Econômico, orientando as interpretações do Direito com vistas a sua funcionalidade e a sua intervenção na realidade prática. É Eros Roberto Grau[27] quem salienta essa característica do Direito Econômico, e acrescenta que isso vale não só para a ordem econômica, mas para qualquer campo disciplinado pelo Direito. Aqui teríamos, nesse sentido, o Direito Econômico como um método para análise e para definição de medidas efetivas.

O fato é que, seja pela via de providências abstratas ou concretas, a regulação estatal da economia tem por escopo harmonizar a liberdade privada com outros direitos protegidos pela Constituição. Para isso, é necessário que o Estado restrinja a liberdade de iniciativa ou induza comportamentos de agentes econômicos, dependendo dos interesses em jogo.[28]

O exercício de composição de direitos albergados na Constituição, diante de casos concretos, ganha relevo especial no Brasil, visto que a nossa Carta Magna é pródiga na enunciação de princípios dirigidos às atividades econômicas, os quais comumente entram em rota de colisão. Diante de uma Constituição compromissória que, devido à conjuntura histórica em que foi concebida, conferiu status constitucional a direitos potencialmente conflitantes entre si, a proporcionalidade se destaca como um importante instrumento da regulação econômica, na medida em que proporciona a equalização dos referidos direitos, garantindo, ainda, a unidade do diploma constitucional.

Sobre a ponderação de princípios constitucionais com base na proporcionalidade, convém reproduzir as palavras de Humberto Ávila, ao asseverar de maneira instrutiva que:

A instituição simultânea de direitos e garantias individuais e de finalidades públicas e normas de competência, como faz a Constituição de 1988, implica o dever de ponderação, cuja medida só é obtida mediante a obediência à proporcionalidade. O dever de proporcionalidade é o dever de atribuir uma proporção ínsita à ideia de relação. O Direito tutela bens que se dirigem a finalidades muitas vezes antagônicas, cuja concretização exige, porque há correlação, uma ponderação dialética ou proporção.[29]

Com o intuito de identificar e sistematizar as espécies de intervenção do Estado na economia, a doutrina do Direito Econômico desenvolveu algumas classificações bastante úteis para a compreensão da matéria. Faz-se necessário conhecer algumas das principais classificações doutrinárias.

Alexandre Santos de Aragão[30] traça uma distinção entre “regulação direta”, aquela que utiliza instrumentos jurídico-coercitivos para obrigar o particular a uma determinada conduta, e “regulação indireta”, aquela que se vale de incentivos para que os particulares conduzam a sua atuação econômica na direção dos fins desejados pelo Estado.

            Outra distinção, feita pelo mesmo autor,[31] e baseada no critério da finalidade, contrapõe “regulação mediata da economia” e “regulação imediata da economia”. A primeira ocorre quando há reflexos na economia em virtude da atuação estatal com a intenção de viabilizar outras finalidades sociais. Teríamos como exemplo deste tipo a vedação, pelo órgão de vigilância sanitária, da presença de determinados produtos químicos nos cigarros, com intuito de proteger a saúde de fumantes e não fumantes. A segunda se consubstancia, esta sim, na intervenção estatal com objetivos propriamente econômicos. Aqui, a circulação ou o consumo de mercadorias, quando regulados pelo Estado, são exemplos marcantes.

            Merece destaque o clássico discrímen de Eros Roberto Grau,[32] que identifica como modalidades de intervenção estatal do domínio econômico a intervenção por absorção ou participação, a intervenção por direção e a intervenção por indução.

            A intervenção por absorção ou participação se dá nas hipóteses em que o Estado atua como um agente econômico, executando efetivamente uma atividade econômica em sentido estrito. Na primeira vertente, a absorção, o Estado opera em regime de monopólio uma determinada atividade produtiva. Já na segunda, a participação, o Estado desenvolve uma atividade produtiva em um contexto de competição com empresas privadas que atuam no mesmo setor.[33] Vale dizer que a redução do papel do Estado na economia, visada pela reforma administrativa desencadeada a partir da década de 1990, tem como objetivo diminuir justamente esse tipo de intervenção estatal, dando prioridade ao setor privado no exercício de atividades produtivas.

            A intervenção por direção é aquela em que o Estado estabelece normas de observância obrigatória para os agentes econômicos em geral. Assim, por meio de normas coercitivas, já que o seu desrespeito tem como consequência a possibilidade de uma sanção, procura-se reger o funcionamento dos mercados.[34]

            A intervenção por indução se propõe a fomentar atividades econômicas mediante normas que estipulam certos benefícios para aqueles que a elas aderirem. Sendo assim, não se tratam de normas impositivas, mas sim normas que procuram tornar atrativa a adesão a determinados comportamentos desejados pelo Estado, por conta de uma finalidade pública. Os agentes econômicos que optarem por adotar aquilo que foi prescrito na norma farão jus a benefícios como redução ou isenção de tributo, preferência para a obtenção de crédito, subsídio, etc. Nota-se que, por meio do oferecimento de condições privilegiadas de participação no mercado, a ideia é seduzir as empresas a orientarem as suas ações em um sentido pré-definido pelo Estado, no âmbito de um planejamento econômico.[35]

            Considerando as modalidades de intervenção descritas acima, pode-se acrescentar que quando o Estado desenvolve, ele próprio, uma atividade econômica, absorvendo ou participando de um setor produtivo, ele intervém na economia. Por outro lado, quando o Estado influencia o comportamento dos agentes econômicos por meio de normas, direcionando ou induzindo as suas ações, a intervenção estatal é sobre a economia.[36] Neste trabalho, a preocupação está voltada para a intervenção estatal sobre a economia.

            Independentemente da modalidade interventiva adotada pelo Estado, é importante assinalar, com base no princípio constitucional da livre iniciativa, que a intervenção econômica só pode e deve ocorrer para proporcionar a correção de distorções do mercado. Isto consiste, concomitantemente, no fundamento e no limite para a legitimidade da intervenção estatal na economia.[37] A regulação econômica terá justificativa se ficar circunscrita a reorganizar a livre iniciativa e a livre concorrência. Havendo excessos nas restrições impostas ao regular funcionamento do mercado, isso consistirá em afronta ao princípio da livre iniciativa.

            O princípio da proporcionalidade tem sido empregado como um instrumento importante para determinar, de forma controlada, a legitimidade da intensidade regulatória sobre a economia. Há na doutrina pátria e estrangeira trabalhos relevantes sobre a utilização desse princípio no Direito Econômico. Entre nós, valem ser mencionados Luís Roberto Barroso[38], Alexandre Santos de Aragão[39] e Virgílio Afonso da Silva[40], todos enfatizando que a correta aplicação desse princípio depende do teste de seus três elementos: adequação (se a medida é apropriada para atingir a finalidade perseguida), necessidade (se a medida tomada é aquela que impõe a menor restrição à liberdade dos agentes econômicos) e proporcionalidade em sentido estrito (se a restrição imposta à liberdade do mercado é compensada pela realização de outro valor constitucional colidente, consistindo numa análise de custo/benefício).

            Por fim, é conveniente relembrar que o princípio da proporcionalidade, em que pese ser o principal instrumento de avaliação da regulação econômica estatal, não se perfaz como o único controle possível. Ainda há, como possibilidades relevantes, os controles exercidos por meio do princípio da subsidiariedade e do princípio da eficiência. O primeiro deles tem como conteúdo a prioridade dada à autonomia privada na condução da vida social e econômica, restando ao Estado o poder-dever de intervenção apenas quando faltarem condições aos particulares de proverem as suas necessidades ou quando existirem interesses públicos dependentes da atuação estatal para que sejam promovidos.[41] Com relação ao princípio da eficiência, pode-se dizer, com um certo esforço de síntese, que o seu conteúdo consiste na exigência de uma atuação estatal calcada na otimização dos meios e dos resultados, com capacidade para apresentar soluções regulatórias de maior qualidade e de menor onerosidade. Entende-se que a eficiência tem o papel de incrementar o controle feito por meio da proporcionalidade, na medida em que exige uma atenção reforçada quanto a melhor alocação de recursos (com base em uma análise econômica do Direito), além de requerer sejam feitos prognósticos dos efeitos sistêmicos da regulação econômica.[42] Tecidas essas considerações, reiteramos que este trabalho privilegia a análise da legitimidade da regulação econômica estatal sob o paradigma da proporcionalidade, deixando os controles relativos à subsidiariedade e à eficiência do Estado em segundo plano, embora mereçam comentários passageiros adiante.

ANÁLISE DO CASE À LUZ DAS REFERÊNCIAS TEÓRICAS

            Após a explanação sobre vários aspectos da produção doutrinária a respeito da ordem constitucional econômica no Brasil, este é o momento de verificar como a proporcionalidade pode ser utilizada, na prática, como instrumento de aferição da legitimidade de uma dada intervenção estatal sobre a economia. Para isso, será utilizado o caso da apelidada “Lei da Cachaça” e a declaração de sua inconstitucionalidade pelo TJ-RJ. O ônus imposto à liberdade dos agentes econômicos por tal regulação econômica foi considerado excessivo pelo Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro.[43] A análise do caso concreto à luz das referências teóricas acima apresentadas ensejará, adicionalmente, algumas reflexões críticas em relação ao posicionamento do Poder Judiciário diante da medida interventiva do Poder Legislativo.

            Como foi dito acima, o controle de proporcionalidade será o paradigma de nosso estudo, devendo ser examinada em seus três elementos (ou três subprincípios) com o propósito de avaliar a correção da intervenção econômica estatal sob perspectiva. Desse modo, passemos a abordar a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito do disposto na Lei Estadual RJ nº 7.595/2017. Antes, resta esclarecer que os três elementos devem ser satisfeitos para que se confirme a proporcionalidade da intervenção econômica. No caso de qualquer um dos elementos ser considerado insatisfatório, injustificável será a regulação estatal, por lhe faltar a proporção devida.

            O primeiro exame diz respeito à adequação da exigência legal de que bares, restaurantes e hotéis localizados no Estado do Rio de Janeiro disponibilizem em seus estabelecimentos pelo menos quatro marcas de cachaça produzidas neste estado. A adequação cogita da vocação da medida tomada para promover o fim público almejado. Nesse sentido, pode ser questionada a imposição trazida pela lei ora perscrutada. Nada garante que a simples disponibilidade de cachaças regionais do Rio de Janeiro proporcionará o aumento significativo de sua difusão. Como é sabido, os agentes econômicos agem a partir de estímulos, de forma que, se houvesse uma expressiva demanda pela cachaça produzida nesse estado, a reação natural seria ofertá-las nas cartas de bebidas, sem a necessidade de que isso seja feito mediante uma obrigatoriedade instituída por lei. Conclui-se que disponibilizar as cachaças, por si só, não tem o condão de alcançar o fim público pretendido pelo Estado. Talvez a medida legal tivesse a sua adequação reforçada se a imposição estabelecida fizesse parte de um programa, composto por várias medidas, destinado a difundir a cachaça regional por meio de eventos, publicidade, etc. Entretanto, esse não é o caso aqui. A medida imposta pela lei configura-se isolada. A despeito da proporcionalidade ficar prejudicada já por conta do questionamento de seu primeiro elemento, passemos à análise dos dois elementos seguintes, para que a reflexão proposta não fique incompleta.

            O segundo exame trata da necessidade da medida exigida na lei estadual, perquirindo se a medida adotada é aquela que impõe a menor restrição à liberdade dos agentes econômicos. Mais uma vez a Lei Estadual RJ nº 7.595/2017 pode ser contestada, pois é possível aventar outras medidas menos restritivas à livre iniciativa dos sujeitos abarcados pela incidência da lei. Nesse contexto, seriam apropriadas medidas de incentivo à produção e à distribuição das cachaças do Estado do Rio de Janeiro, por meio de uma intervenção econômica estatal meramente indutiva. Conforme exemplos oferecidos por Marcos Juruena Villela Souto,[44] o fomento de atividades econômicas pode se dar de diversas maneiras, como: benefícios fiscais, empréstimos em condições favoráveis, subsídio, assistência técnica, entre outras ajudas a serem adotadas pelo Estado de acordo os resultados pretendidos.

            O terceiro exame se volta para a verificação da proporcionalidade em sentido estrito, sopesando o custo das restrições impostas a alguns face ao benefício proporcionado a outros. O que se pergunta aqui é se a promoção de determinados direitos ocorre em tal proporção que torne justificável a mitigação da livre iniciativa. A resposta é negativa, pois impõe-se o custo para bares, restaurantes e hotéis de manter em estoque certa quantidade de cachaça sem que haja a certeza de que tal produto será difundido conforme a pretensão da intervenção estatal. Nada garante que a simples disponibilização das cachaças do Estado do Rio de Janeiro – como medida isolada, de acordo com o explicado na análise da adequação – vá aumentar a sua demanda pelos consumidores. Sendo assim, injustificável é a restrição à livre iniciativa nesse caso, porquanto incerta a promoção da finalidade pública almejada pela lei, e em proporção que compense a redução de direitos de outros agentes econômicos.

            Como visto, a partir do cotejamento dos três elementos da proporcionalidade, a Lei Estadual RJ nº 7.595/2017 não passa no teste de sua constitucionalidade. Depreende-se daí que o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro decidiu com propriedade ao dar provimento às duas ações que questionavam a constitucionalidade da lei estadual.

            Cabem, ainda, algumas considerações finais e complementares que, apesar de desbordarem do foco deste trabalho, não podem ser sonegadas, já que enriquecem as reflexões até aqui desenvolvidas.

            De início, caberia invocar o princípio da subsidiariedade para examinar a legitimidade da intervenção econômica estatal pretendida pelo Poder Legislativo do Estado do Rio de Janeiro. O questionamento tem a sua origem na própria justificativa apresentada no projeto da Lei Estadual RJ nº 7.595/2017, supratranscrita.[45] Como justificar que o Estado se mova de sua posição subsidiária à iniciativa privada para uma posição proativa de intervenção na economia, quando o legislador reconhece que as cachaças produzidas em outros estados perdem na competição com as produzidas no Estado do Rio de Janeiro?

            O princípio da eficiência também pode ser trazido à baila em nossas ponderações, sendo ele um meio para incrementar os exames de proporcionalidade. Nesse contexto, é oportuno mencionar que, durante o processo legislativo, não foi apresentado qualquer estudo de mercado sobre o impacto positivo da obrigatoriedade trazida pela lei. É preciso que seja comprovada a capacidade da medida instituída para alcançar a finalidade pretendida, bem como em que proporção isso se daria. Não bastam as boas intenções alegadas pelo legislador para fundamentar o Estado a imiscuir-se no domínio econômico. Há a necessidade de comprovação de ser fundamental que o setor sofra a intervenção regulatória.

            Outro ponto que merece um olhar atento é averiguar se a medida interventiva tem por objetivo não uma finalidade pública, mas sim privilegiar apenas interesses privados. André Cyrino, inspirado no pensamento do norte-americano Cass Sunstein, defende a possibilidade de declarar inconstitucional uma lei dirigida ao benefício de grupos específicos e que seja desacompanhada de qualquer contraprestação ao bem comum.[46] Consequentemente, no caso da lei estadual que obriga determinados estabelecimentos comerciais a disponibilizarem cachaças produzidas no Estado do Rio de Janeiro, seria conveniente investigar se essa medida não objetiva a formação de uma espécie de reserva de mercado para certos agentes econômicos.

            Finalmente, convém sempre lembrar que as medidas impostas por lei comumente têm como reflexo um custo para o Estado. Sendo assim, ao instituir de forma compulsória determinado comportamento, o Estado deveria estar preparado para fiscalizar o seu cumprimento.[47] Da análise da Lei Estadual RJ nº 7.595/2017 não se extrai qualquer preocupação quanto à fiscalização dos agentes econômicos abarcados pela obrigação legal. Que órgão ou entidade estatal será responsável por fazer as inspeções? Sob que condições? Com que frequência? Isso, por certo, tem o seu custo.

CONCLUSÃO

            A reforma administrativa, propagada no Brasil a partir da década de 1990, tem como um de seus princípios diminuir a presença do Estado na economia. Contudo, o que se pretende, bem entendido, não é a retirada total do Estado do domínio econômico, mas somente a redução de sua atuação direta na economia como agente econômico. Ao Estado se resguardam as funções de planejamento, incentivo e fiscalização das atividades econômicas, configurando-se como um Estado regulador.

Se até os anos 1990 a produção doutrinária brasileira sobre a regulação econômica era deficitária, esse quadro mudou quantitativa e qualitativamente. Atualmente, dispomos de relevante substrato conceitual e teórico, com o avançado desenvolvimento de investigações no campo do Direito Econômico. Com base nesses estudos podemos dizer, por exemplo, que a intervenção estatal na economia diminuiu nos últimos anos, ao passo que a intervenção estatal sobre a economia ganhou destaque e se sofisticou.

O controle da regulação econômica estatal tem sido exercido primordialmente com os exames relativos à proporcionalidade, cotejando a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito das medidas interventivas. Em complemento à proporcionalidade ainda são possíveis os controles atinentes à subsidiariedade estatal e à eficiência da regulação, bem como aos custos envolvidos nesta, ou mesmo em relação a outros aspectos de ordem prática que se façam relevantes caso a caso.

Por tudo o que foi dito, a decisão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no sentido de declarar a inconstitucionalidade da Lei Estadual RJ nº 7.595/2017, foi acertada e congruente com os entendimentos produzidos em sede doutrinária no âmbito do Direito Econômico. A medida impositiva de que bares, restaurantes e hotéis disponibilizem cachaças produzidas no Estado do Rio de Janeiro se demonstrou, quando submetida aos exames de proporcionalidade, carente de sustentação, pois em descompasso com a ordem econômica constitucional.

 

BIBLIOGRAFIA

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[1] Sobre análises mais aprofundadas a respeito das reformas do Estado ver: PEREIRA, Luiz Carlos Bresser e SPINK, Peter (orgs.). Reforma do Estado e Administração Pública Gerencial. Rio de Janeiro: FGV, 1998.

[2] Ver páginas 13 e 14 deste trabalho. Trata-se de reduzir a intervenção do Estado na economia por participação.

[3] Sobre a função regulatória do Estado ver: SOUTO, Marcos Juruena Villela. “Função regulatória”. In: Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, nº 13, Salvador: Instituto Brasileiro de Direito Público, 2008.

[4] GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e crítica). 19. ed. atual. São Paulo. Malheiros, 2018. p. 29.

[5] FERRAZ JR., Tércio Sampaio. “Congelamento de preços – Tabelamentos oficiais”. In: Revista de Direito Público nº 91, São Paulo: RT, 1989: pp. 76-77.

[6] Maiores detalhes sobre legitimidade democrática do Poder Legislativo, tecnicidade das entidades reguladoras independentes e capacidades institucional do Poder Judiciário podem ser encontrados em: CYRINO, André. Direito Constitucional Regulatório – Elementos para uma interpretação adequada da Constituição econômica brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Processo, 2018. (Especialmente o Capítulo 4 desta obra)

[7] Sobre a utilização do princípio da subsidiariedade no controle judicial da regulação econômica estatal, ver: MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. “Limites à abrangência e à intensidade da regulação estatal”. In: Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, nº 4, Salvador: Instituto de Direito Público da Bahia, 2005: pp. 10-14.

[8] Sobre a utilização do princípio da eficiência no controle judicial da regulação econômica estatal, ver: CYRINO, André. Direito Constitucional Regulatório – Elementos para uma interpretação adequada da Constituição econômica brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Processo, 2018: pp. 167-193.

[9] Por exemplo: ARAGÃO, Alexandre Santos de. “O princípio da proporcionalidade no Direito Econômico”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 223, Rio de Janeiro: Renovar, 2001: pp. 199-230; ÁVILA, Humberto. “Conteúdo, limites e intensidade dos controles de razoabilidade, de proporcionalidade e de excessividade das leis”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 236, Rio de Janeiro: Renovar, 2004: pp. 369-384; JÚNIOR, Edilson Pereira Nobre. “Intervenção estatal sobre o domínio econômico, livre iniciativa e proporcionalidade (céleres considerações)”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 224, Rio de Janeiro: Renovar, 2001: 285-299; BARROSO, Luís Roberto. “A ordem econômica constitucional e os limites à atuação estatal no controle de preços”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 226, Rio de Janeiro: Renovar, 2001: pp. 187-212.

[10] TÁCITO, Caio. “A razoabilidade das leis”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 204, Rio de Janeiro: Renovar, 1996: p. 7.

[11] Cumpre registrar que em ambos os processos há outros questionamentos quanto à dissonância da lei estadual em relação à Constituição do Estado do Rio de Janeiro, especialmente em relação à falta de competência da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro para dispor sobre a matéria. Todavia, o núcleo dos pedidos de declaração de inconstitucionalidade da lei reside justamente no desrespeito aos princípios da livre iniciativa e da liberdade econômica, por conta das restrições desproporcionais que lhes foram impostas.

[12] É importante comentar, de acordo com a observação de Egon Bockmann Moreira, que a produção doutrinária e acadêmica brasileira sobre a regulação pública da economia, entendida como o objeto do chamado “Direito Regulatório”, e tendo como escopo a implementação de ações estatais destinadas a influenciar nos destinos da economia nacional, só começa a ser desenvolvida e a merecer estudos mais aprofundados a partir de meados década de 1990. Assim sendo, pode-se falar que é uma produção teórica ainda recente. Entretanto, no momento atual já dispomos de textos substanciais sobre a regulação econômica no Brasil. É com base em boa parte dessa produção doutrinária que nos sustentamos para discorrer sobre a ordem econômica no Brasil. Sobre um histórico da intervenção estatal brasileira na economia, ver: MOREIRA, Egon Bockmann. “Passado, presente e futuro da regulação econômica no Brasil”. In: Revista de Direito Público da Economia, ano 11, nº 44, Belo Horizonte: Editora Fórum, 2013: 87-118.

[13] MOREIRA, Vital. “Economia e Constituição”. Separata do Boletim de Ciências Econômicas XVII. Coimbra, Faculdade de Direito, 1974. p. 35, apud GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e crítica). 19. ed. atual. São Paulo. Malheiros, 2018. p. 75.

[14] MOREIRA, Vital. “A Metamorfose da Constituição Econômica”. In: Revista de Direito do Estado, nº 2, 2006, apud. CYRINO, André. “Análise econômica da Constituição econômica e interpretação institucional”. In: Constituição, Economia e Desenvolvimento: Revista da Academia Brasileira de Direito Constitucional. vol. 8, nº 15, Curitiba: Academia Brasileira de Direito Constitucional, 2016: p.495.

[15] Para maiores esclarecimentos sobre essa discussão, indicamos: GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e crítica). 19. ed. atual. São Paulo. Malheiros, 2018, pp. 83-86.

[16] CYRINO, André. “Análise econômica da Constituição econômica e interpretação institucional”. In: Constituição, Economia e Desenvolvimento: Revista da Academia Brasileira de Direito Constitucional. vol. 8, nº 15, Curitiba: Academia Brasileira de Direito Constitucional, 2016: p.493.

[17] CYRINO, André. Direito Constitucional Regulatório – Elementos para uma interpretação adequada da Constituição econômica brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Processo, 2018: p. 193.

[18] CYRINO, André. Direito Constitucional Regulatório – Elementos para uma interpretação adequada da Constituição econômica brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Processo, 2018: p. 71.

[19] SILVA, Virgílio Afonso da. “O proporcional e o razoável”. In: Revista dos Tribunais, vol. 798, São Paulo: RT, 2002: pp. 24-27.

[20] ÁVILA, Humberto. “A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 215, Rio de Janeiro: Renovar, 1999: p. 170.

[21] MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. “Limites à abrangência e à intensidade da regulação estatal”. In: Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, nº 4, Salvador: Instituto de Direito Público da Bahia, 2005: pp. 20-21.

[22] MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. “Limites à abrangência e à intensidade da regulação estatal”. In: Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, nº 4, Salvador: Instituto de Direito Público da Bahia, 2005: p. 21.

[23] Sobre a vedação de o Estado transferir atribuições suas para os particulares, com afronta ao princípio da livre iniciativa, ver:  BARROSO, Luís Roberto. “A ordem econômica constitucional e os limites à atuação estatal no controle de preços”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 226, Rio de Janeiro: Renovar, 2001: p. 201.

[24] JÚNIOR, Edilson Pereira Nobre. “Intervenção estatal sobre o domínio econômico, livre iniciativa e proporcionalidade (céleres considerações)”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 224, Rio de Janeiro: Renovar, 2001: p. 297.

[25] Os princípios gerais da ordem econômica são enunciados no Art. 170 da Constituição Federal. Vários desses princípios são transportados para as Constituições dos estados-membros, em especial o princípio da livre iniciativa. A Constituição do Estado do Rio de Janeiro de 1989 trata “Da Ordem Econômica Financeira e do Meio Ambiente” em seu Título VII, cujo Capítulo I (Arts. 214 a 222) enuncia os princípios gerais da atividade econômica. A livre iniciativa é proclamada, nominalmente, no Art. 5º da CE-RJ.

[26] COMPARATO, Fábio Konder. “O indispensável Direito Econômico”, cit., p. 465, apud GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e crítica). 19. ad. atual. São Paulo. Malheiros, 2018: p. 147.

[27] GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e crítica). 19. ed. atual. São Paulo. Malheiros, 2018. p. 146.

[28] ARAGÃO, Alexandre Santos de. “O conceito jurídico de regulação da economia”. In: Revista de Direito Administrativo e Constitucional, nº 6, Curitiba: Juruá, 2001: p. 74.

[29] ÁVILA, Humberto. “A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 215, Rio de Janeiro: Renovar, 1999: p. 170.

[30] ARAGÃO, Alexandre Santos de. “O conceito jurídico de regulação da economia”. In: Revista de Direito Administrativo e Constitucional, nº 6, Curitiba: Juruá, 2001: pp. 73-74.

[31] ARAGÃO, Alexandre Santos de. “O conceito jurídico de regulação da economia”. In: Revista de Direito Administrativo e Constitucional, nº 6, Curitiba: Juruá, 2001: p. 74.

[32] GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e crítica). 19. ad. atual. São Paulo. Malheiros, 2018: pp. 141-144. É válido esclarecer que o autor considera uma atividade econômica em sentido amplo (a qual constitui gênero) que possui duas espécies: o serviço público e a atividade econômica em sentido estrito. As modalidades interventivas que interessam a este trabalho estão inseridas na espécie atividade econômica em sentido estrito.

[33] A intervenção por absorção, sob regime monopolístico, encontra abrigo no texto constitucional no Art. 177, em rol taxativo. A intervenção por participação, sob regime competitivo, está prevista no Art. 173 da Constituição Federal, com os requisitos necessários à sua efetivação (relevante interesse coletivo ou imperativos da segurança nacional).

[34] A intervenção por direção tem fundamento constitucional no Art. 174, o qual se refere ao Estado brasileiro como “agente normativo e regulador da atividade econômica”.

[35] A intervenção por indução, com a criação de incentivos para setores da economia, tem amparo no Art. 174 da Constituição Federal.

[36] Adotando entendimento similar ao de Eros Roberto Grau a respeito da intervenção estatal na e sobre a economia, ver: ARAGÃO, Alexandre Santos de. “Considerações sobres as relações do Estado e do direito da economia”. In: Revista da EMERJ, v. 20, nº 78, Rio de Janeiro: Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, 2017: pp. 173-174. Obs: Alexandre Santos de Aragão substitui apenas o termo intervenção por atuação do Estado na economia.

[37] BARROSO, Luís Roberto. “A ordem econômica constitucional e os limites à atuação estatal no controle de preços”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 226, Rio de Janeiro: Renovar, 2001: p. 205.

[38] BARROSO, Luís Roberto. “A ordem econômica constitucional e os limites à atuação estatal no controle de preços”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 226, Rio de Janeiro: Renovar, 2001: pp. 206-208.

[39] ARAGÃO, Alexandre Santos de. “O princípio da proporcionalidade no Direito Econômico”. In: Revista de Direito Administrativo, nº 223, Rio de Janeiro: Renovar, 2001: pp. 207-209.

[40] SILVA, Virgílio Afonso da. “O proporcional e o razoável”. In: Revista dos Tribunais, vol. 798, São Paulo: RT, 2002: 34-35.

[41] Maiores aprofundamentos sobre o princípio da subsidiariedade ver: MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. “Limites à abrangência e à intensidade da regulação estatal”. In: Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, nº 4, Salvador: Instituto de Direito Público da Bahia, 2005: pp. 10-14.

[42] Maiores aprofundamentos sobre o princípio da eficiência ver: CYRINO, André. Direito Constitucional Regulatório – Elementos para uma interpretação adequada da Constituição econômica brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Processo, 2018: pp. 167-193.

[43] Os detalhes sobre o case podem ser encontrados nas páginas 5 a 7 deste trabalho.

[44] SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito Administrativo da Economia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002: pp. 41-55.

[45] Ver página 6 deste trabalho.

[46] CYRINO, André. Direito Constitucional Regulatório – Elementos para uma interpretação adequada da Constituição econômica brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Processo, 2018: p. 309.

[47] Sobre os custos dos direitos, indica-se a seguinte obra, inspirada na teoria do norte-americano Cass Sunstein: GALDINO, Flávio. Introdução à teoria dos custos dos direitos: direitos não nascem em árvores. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.

Palavras Chaves

Direito Econômico; intervenção estatal; princípio da proporcionalidade; inconstitucionalidade; lei estadual