A GRAVAÇÃO DE OITIVAS POR ADVOGADO: A legítima defesa das prerrogativas e do Estado Democrático de Direito

Resumo

O presente artigo científico tem como escopo demonstrar que a gravação de audiência, levada a efeito por advogados, não tem o condão de atrair responsabilidade penal, constituindo um exercício regular de direito (art. 23, III, do Código Penal), previsto no Código de Processo Civil, que é aplicado de forma subsidiária ao Código de Processo Penal (art. 3º, do Código Processual Penal). Ademais, hodiernamente as gravações são levadas a efeito quando o advogado tem suas prerrogativas ofendidas durante acompanhamento, ou não, de clientes em repartições públicas, podem se inserir em contexto de legítima defesa, por vezes necessárias para repelir atos praticados com abuso de poder. Ver-se-á, no presente artigo, que nem sequer o telo do crime de captação ambiental é evitar a gravação de agentes públicos ou de audiências, mas evitar a gravação levada a efeito quando o caso demanda autorização judicial, não estando sujeito a gravação do ato à reserva de jurisdição, cuja reserva legal se aprontou determinar. Ademais, quando da leitura da Lei de Interceptação Telefônica, resta afastado eventual crime, quando a gravação é feita por um dos interlocutores. Não se apegando às prerrogativas, afirma o estudo em questão que deve ser respeitado o direito de imagem de agentes públicos, envolvidos com a segurança pública, não podendo haver publicações ou divulgações que o conduza a desnecessário perigo de ser reconhecido. Também será vista a colisão entre direitos fundamentais que envolvem o assunto e que não constitui qualquer ilicitude o ato de gravação feito por advogado nas hipóteses de gravação de audiência ou abuso de poder de agente público.

Artigo

55ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil

A GRAVAÇÃO DE OITIVAS POR ADVOGADO:

A legítima defesa das prerrogativas e do Estado Democrático de Direito

Pedro Ernesto Raeli Filho*

Agosto/2022

RESUMO

O presente artigo científico tem como escopo demonstrar que a gravação de audiência, levada a efeito por advogados, não tem o condão de atrair responsabilidade penal, constituindo um exercício regular de direito (art. 23, III, do Código Penal), previsto no Código de Processo Civil, que é aplicado de forma subsidiária ao Código de Processo Penal (art. 3º, do Código Processual Penal). Ademais, hodiernamente as gravações são levadas a efeito quando o advogado tem suas prerrogativas ofendidas durante acompanhamento, ou não, de clientes em repartições públicas, podem se inserir em contexto de legítima defesa, por vezes necessárias para repelir atos praticados com abuso de poder. Ver-se-á, no presente artigo, que nem sequer o telo do crime de captação ambiental é evitar a gravação de agentes públicos ou de audiências, mas evitar a gravação levada a efeito quando o caso demanda autorização judicial, não estando sujeito a gravação do ato à reserva de jurisdição, cuja reserva legal se aprontou determinar. Ademais, quando da leitura da Lei de Interceptação Telefônica, resta afastado eventual crime, quando a gravação é feita por um dos interlocutores. Não se apegando às prerrogativas, afirma o estudo em questão que deve ser respeitado o direito de imagem de agentes públicos, envolvidos com a  segurança  pública,  não  podendo  haver  publicações  ou  divulgações  que o conduza a desnecessário  perigo  de  ser  reconhecido.  Também  será  vista  a  colisão  entre  direitos fundamentais que envolvem o assunto e que não constitui qualquer ilicitude o ato de gravação feito por advogado nas hipóteses de gravação de audiência ou abuso de poder de agente público.

Palavras-chave: Gravação de audiências. Lei de interceptações telefônicas. Atipicidade penal. Licitude da gravação de audiências.

  1. INTRODUÇÃO

Não são poucos os casos em que autoridades indeferem o pedido de gravação de audiência ou interpelam o advogado com admoestações, na tentativa de fazê-lo parar de gravar audiências e, na pior das hipóteses, sujeitando-o a receber voz de prisão por captação ambiental não autorizada, crime previsto na Lei de Interceptação Telefônica (Lei n. 9.296/92).

Assim, diante dessa problemática, o presente artigo científico tem como finalidade demonstrar que a gravação realizada pelo advogado, quando acompanhando ou não seu cliente, em audiência ou repartição policial, não tem o condão de atrair responsabilidade penal, já que se trata do exercício regular de um direito previsto no artigo 367, §§ 5º e 6º, do Código de Processo Civil, que também pode ser aplicado ao Código de Processo Penal por analogia, nos termos a que alude o artigo 3º deste diploma processual.

Durante o estudo, ver-se-á que as gravações têm se tornado uma forma de sindicar atos estatais e gerar credibilidade na palavra e nos atos praticados por todos os agentes processuais ou extraprocessuais, como juízes, promotores e delegados de polícia com seus agentes.

Não raro, algumas autoridades prevalecem-se do poder de polícia para restringir a gravação, criando a tensão entre direitos fundamentais, onde de um lado há a supremacia do interesse  público  sobre  o  particular  e do outro o direito de sindicar os atos  jurisdicionais  e administrativos. Com efeito, devemos nos ater a fórmulas de interpretação constitucional para que nenhum dos interesses seja sacrificado, sobretudo o interesse público na lisura dos atos praticados por autoridades, órgãos do poder judiciário e, também, a intimidade e imagem dos envolvidos.

Ao final, o estudo concluirá pela atipicidade penal da conduta do advogado que grava  audiência,  ou  qualquer  ato,  no  exercício  de  suas  prerrogativas,  e  também  pela desnecessidade de autorização do magistrado para que seja gravada a audiência, não podendo o interesse público permitir atos secretos, senão aqueles previstos na Constituição, sob pena de mácula ao Estado Democrático de Direito, que emergiu de situações análogas a essas, quando o indivíduo via-se restringido de ampla publicidade e possibilidade de controle dos atos estatais.

  1. A CONSTITUIÇÃO E A PUBLICIDADE

Ao observarmos a necessária publicidade dos atos estatais, não podemos deixar de observar a Constituição, que é inaugurada com a declaração de que somos regidos por um Estado Democrático de Direito, aquele no qual vigora a vontade da maioria em respeito às minorias, bem como pressupõe um Estado que está pautado nas leis, criando-as e vinculando-se a elas (FRIEDE, 2015).

Vale pontuar que o fenômeno das Constituições escritas decorre da necessária diluição e controle do poder político estatal que, por longo período, estava concentrado nas mãos do Monarca, em regimes absolutistas e ditatoriais, servindo ao arbítrio dos reis e à devassa das liberdades individuais e coletivas (MASSON, 2020).

Nessas espécies de regime político, o direito de defesa nem sequer existia, o réu era mero objeto do processo, não havia publicidade dos atos processuais e era possível tortura como método de se obter confissão, que constituía a prova de maior tarifa para condenação. Ademais, concentrava-se o poder político e persecutórios nas mãos do rei, cabendo ele administrar, legislar e julgar, cabendo a ele investigar, acusar e julgar infrações que atentassem contra o rei ou seu reino (DE LIMA, 2020).

Neste contexto, vale frisar que a publicidade, quando existente, servia de ameaça à sociedade, para reforçar o poder soberano e mostrar, em praças públicas, execuções de pena de morte, que variavam em atear fogo, forca e guilhotina (DE LIMA, 2020).

Decerto,  caminhou  bem  a  sociedade  quando  da  humanização  das  penas,  em assegurar direitos aos acusados de crime e garantir a publicidade dos atos estatais, entregando ao povo, verdadeiro outorgante dos poderes instituídos, a possibilidade de controlar os atos de quaisquer agentes públicos.

Passado este momento histórico, a Carta Política de 1988 é produto da vontade do povo, trazendo um extenso rol exemplificativo de direitos fundamentais, dentre os quais o acesso à informação de interesse particular ou geral, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível  à  segurança  da  sociedade  e  do  Estado,  o  direito  de  controlar  atos  da administração pública por meio de ação popular, o direito de formar a vontade política, votando e sendo votado, dentre outros essenciais à organicidade estatal.

Caminhando ainda pelo diploma de maior importância do ordenamento jurídico, verifica-se que todos os julgamentos do poder judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos que sejam necessários à preservação do direito à intimidade e desde que não prejudique o interesse público, sendo estes os termos sobre os quais versa o artigo 93, da Constituição da República Federativa do Brasil.

Com efeito, apenas a lei pode restringir a presença de certos atos às partes e seus advogados, para a preservação da intimidade e desde que este não prejudique o interesse público à publicidade.

Nessa premissa, determina a Constituição que, em regra, os atos do poder judiciário sejam públicos, sendo que, excepcionalmente, haverá sigilo dos atos processuais, visto que esse sigilo sequer pode ser oposto às partes e seus advogados, portanto, segue o próximo tópico a respeito da lei de interceptação telefônica, que traz em seu escopo a interceptação e captação ambiental e os tipos penais correlatos, onde será abordado também sobre o alcance dos tipos penais.

3. A LEI DE INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA E SEU DESIDERATO

A lei de interceptação telefônica veio disciplinar um meio de obtenção de prova de ultima ratio, quando, preenchidos os requisitos legais e constitucionais, é cabível sua decretação para este ato próprio de polícia judiciária, para ter acesso ao conteúdo das comunicações telefônicas.

Denota-se que entra em cena uma nova colisão de direitos fundamentais, os quais são: o direito à intimidade e o direito de persecução penal, esse último baseado novamente na supremacia do interesse público sobre o privado.

A solução de eventual conflito tem previsão na própria Constituição, não sendo necessário que o intérprete siga outro rumo hermenêutico a fim de solucioná-lo. Determina o artigo 5º, XII, da Carta Mágna, que é inviolável o sigilo da correspondência, das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, em último caso, nas hipóteses e na forma da lei, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

Assim, decorre da leitura que é cabível a violação do direito das comunicações travadas em conversa telefônica, quando houver as hipóteses e formas da Lei n.º 9.296/92, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Outrossim, não é necessário sopesar direitos fundamentais, haja vista que a opção do poder constituinte foi no sentido de já resolver a tensão, que normalmente ocorreria nos inúmeros casos concretos cabíveis da medida.

Cumprindo com o mandamento constitucional, restou editada a Lei 9.296/96, trazendo quais as hipóteses e formas necessárias para a medida, sendo, dentre elas, que excepcionalmente a interceptação poderá ser decretada, quando houver indícios de autoria ou participação em infração penal, quando a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis e  quando  o  fato  punível  investigado  constituir  infração  punida  com  pena  de  reclusão (PORTOCARRERO; FERREIRA, 2020).

Vale consignar que o fulcro das gravações ambientais não recai, até então, nas normas  anteriormente  abordadas,  mas  o  raciocínio  empenhado  sobre  colisão  de  direitos, publicidade ou sua falta, será modelado, a fim de se atestar o que para poucos operadores do Direito é óbvio, que o advogado ou a própria parte pode gravar a audiência com o fito de sindicá- la.

A captação ambiental foi introduzida na Lei de Interceptação Telefônica pelo Pacote Anticrime (Lei n.º 13.964/19), que informa que poderá ser autorizada pelo Juiz a captação ambiental, a requerimento do Ministério Público ou de representação do Delegado de Polícia de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústico, quando a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis, igualmente eficazes, e quando houver elementos probatórios razoáveis de autoria e participação em infrações criminais, cuja pena máxima seja superior a 4 (quatro) anos ou em infrações conexas.

Então, antes de seguirmos com as conclusões, define o artigo 8º-A, § 5º, da Lei 9.692/96, que se  aplicam  subsidiariamente  à  captação  ambiental  as  regras  previstas  na  legislação específica para a interceptação. Ou seja, quando houver omissão, aplicam-se as disposições de forma subsidiária.

Ao regulamentar a medida, vejamos que ela se insere também como um meio de obtenção de prova, usado por autoridades incumbidas de poder de polícia judiciária, para obtenção de indícios de autoria e prova de materialidade, quando não houver meio disponível para captar os elementos de prova.

Novamente vemos que há em tensão do direito de intimidade do investigado e do interesse público na persecução penal, que não tem expressamente solução constitucional, atraindo a norma de complementação exposta. Então, apenas quando houver hipóteses e forma da  lei,  para  fins  de  investigação  criminal  ou  instrução  processual  penal,  será  dada  a possibilidade de decretar a captação ambiental.

A natureza jurídica das diligências insculpidas na lei é de prova cautelar apta a formar a convicção do magistrado na livre apreciação de provas, nos termos a que alude o artigo 155, do Código de Processo Penal. Assim, ver-se-ão no tópico seguinte os crimes correlatos a essas medidas, onde, abordando o já explanado até então, não configura crime a gravação ambiente, quando feita por advogado no exercício de seu mister, pois sua finalidade foi regulamentar medidas de natureza cautelares processuais penais, não impedir gravações.

  1. INFRAÇÃO PENAL CORRELATA E ATIPICIDADE DA GRAVAÇÃO DE ÁUDIO OU VÍDEO FEITO EM AUDIÊNCIA POR ADVOGADO

Segundo o artigo 10-A, caput, da Lei n.º 9.296/96, constitui crime a captação ambiental sem autorização judicial, quando ela for exigida, cominando a pena de reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa. Assim, aquele que promove uma escuta ambiental ou uma captação ambiental sem autorização judicial, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, incide nas penas cominadas nessa disposição.

Vejamos que o legislador quis incriminar o indivíduo que promove de forma voluntária  e  consciente  a  escuta  ambiental  para  fins  de  persecução  penal,  sem  a  devida autorização judicial que o caso reclama, para fins de obtenção de prova em investigação ou instrução processual.

Quando o advogado, no seu mister, grava uma audiência ele não incorre nesse tipo penal, pois na primeira razão,os bens jurídicos em conflito não são o interesse público e a intimidade do réu ou investigado, como acontece nas diligências abordadas. Na verdade, temos de um lado o direito de defesa técnica associado ao direito da publicidade das audiências e de outro outro lado temos o poder de polícia exercido pelos magistrados e autoridades públicas, em audiências ou oitivas em geral, fato completamente alheio à inviolabilidade das comunicações telefônicas e de seu conteúdo ou de dados do artigo 5º, XII, da Constituição.

                       Devemos lembrar que o exercício da Advocacia constitui função essencial à justiça, indispensável a sua administração, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.

Não há qualquer menção na lei que imponha ao advogado abster-se de gravar. Inclusive, observando de forma sistemática os artigos 376, §§ 5º e 6º, ambos do Código de Processo Civil, com aplicação supletiva ao processo penal, nos termos do seu artigo 3º, em conjunto com o artigo 10-A, § 1º, da Lei 9.296/96, não se considera ilícita a gravação, não se cogita tipicidade formal a conduta de captação ambiental quando feita pelo advogado ou pela parte.

Em primeiro lugar, na hipótese de audiência judicial, quando decretado o sigilo do ato, ele não pode ser oposto contra o advogado, sujeito processual que personifica a defesa técnica, indispensável à caracterização de um processo penal democrático. Pondera-se, no entanto, que a gravação por força dos dispositivos trazidos acima deva servir ao processo com sua juntada no prazo razoável.

Tais conclusões revelam posição da Suprema Corte, ao trancar ação penal que buscava responsabilidade criminal do advogado, o qual gravou audiência, juntou aos autos do processo constituído e não divulgou seu teor de forma midiática:

“Reconheço, portanto, que é juridicamente plausível a pretensão da defesa, mormente se levada em conta a demonstração, pelo que se tem nos autos, de que não houve tentativa  de  divulgação  da  audiência  fora  dos  autos,  bem  como  o  fato  de  as degravações terem sido juntadas no bojo da persecução penal como meio exclusivo de garantir a ampla defesa do paciente, a indicar, salvo melhor juízo, a atipicidade da conduta praticada. ” (Habeas Corpus n.º  193.515/RJ, Min. Relator Dias Toffoli, Supremo Tribunal Federal, 2021)

Em segundo lugar, quando acompanhando, ou não, seu cliente em repartições públicas, a gravação de áudio ou vídeo deve ser feita quando impedido do seu direito de acesso aos autos ou quando observar abuso de poder, gênero cuja espécie é desvio de finalidade e excesso de competência.

Em todo caso, agentes que lidam diuturnamente no combate à criminalidade devem  ter o direito de imagem preservado, devendo evitar exposição midiática ou em redes sociais, pois o excesso não é permitido no ordenamento jurídico, o que se extrai da norma prevista do artigo 23, parágrafo único, do Código Penal1 e também do artigo 187, do Código Civil2.

Por oportuno, quando o patrono de uma parte grava, o fato deve ser considerado atípico, pois este comportamento não se encontra no fim da norma jurídica em comento, que se presta a criminalizar indivíduos que promovem a captação ambiental, quando o caso requeira a decretação judicial, em casos que envolvam hipóteses e formas da lei n.º 9.296/96, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

Ainda que se ventile a ideia de que o advogado esteja se adequando formalmente à norma penal incriminadora, vejamos que o bem jurídico tutelado, intimidade, privacidade e inviolabilidade das comunicações, não estão sob ataque, pois a gravação de audiência prescinde autorização judicial, bastando a juntada nos autos da gravação.

De outro lado, quando o causídico está sob iminente perigo ou sob ataque em suas prerrogativas, a gravação constitui exercício regular do direito, observado o previsto no art. 23, III, do Código Penal, descriminante penal em branco, cuja complementação do caso concreto está nos artigos do Código de Processo Civil outrora citados.

No mais, analisando o contexto construído de que a Constituição ressalvou o sigilo das audiências quando puder comprometer a intimidade das partes, afastando a publicidade do ato de agentes externos, não do advogado constituído, o defensor público ou advogado dativo da causa.

  1. CONCLUSÃO

Por conclusão, a Constituição e as normas legais caminham no sentido de que não constitui crime a gravação de audiências judiciais ou atos atentatórios às prerrogativas do advogado, devendo, em todo caso, a oposição do sigilo servir apenas para sujeitos alheios aos autos da investigação e do processo.

Dentro do processo, todos os sujeitos devem proceder dentro dos parâmetros da boa-fé, urbanidade, razoabilidade, não podendo a defesa exceder seu direito, sob pena de ilicitude  de  seu  comportamento,  seja  gravando  os  rostos  dos  envolvidos  ou  publicando gravações em redes sociais, por quaisquer razões que existam adjacentes a isso.

A gravação, quando posta nos autos, manejada para promover o controle de atos estatais maculados, não pode ser considerada ilícita, sob pena de subverter o tão caro Estado Democrático de Direito, devendo ter o parâmetro máximo da publicidade a Constituição de 1988, que pugna pelo sigilo apenas no caso de proteção à intimidade dos envolvidos, que não é oponível aos advogados ou à parte.

Com efeito, crime de captação ambiental está longe de se configurar quando o advogado exerce um direito, bem como, ainda que se defenda não estar no exercício do seu direito, não é cabível associar o crime do artigo 10-A, caput, da Lei de Interceptações Telefônicas, que apenas se conecta às hipóteses de promovê-la como forma de meio de obtenção de prova ou prova cautelar, salvo se o causídico estiver promovendo investigação defensiva.

Por fim, constitui atípica a gravação dentro das balizas legais para defender as prerrogativas do advogado, que se vê diante de abuso de poder, pois em uma última análise, estar-se-á na legítima defesa do direito do advogado e do Estado Democrático de Direito.

  1. REFERÊNCIAS

FRIEDE, Roy Reis. Ciências Políticas e Teoria do Estado: teoria constitucional e relações internacionais. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 2015.

DE LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal: volume único. 8. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2020.

MASSON, Nathalia. Manual de direito constitucional. Nathalia Masson – 8. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2020.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 193.515/RJ, Data de publicação DJE 22/06/2021 – ATA Nº 107/2021. DJE nº 119, divulgado em 21/06/2021. Disponível em https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6038427, acesso em 14 de agosto de 2022.

Notas:

* Advogado, membro da comissão Jovem Advocacia OAB/RJ-Méier e OAB Mulher, especialista em Direito Penal Econômico pela UniAmérica e Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Augusto Motta – UNISUAM.

1 “O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.”

 

2 “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé e pelos bons costumes. ”

 

Palavras Chaves

Gravação de audiências. Lei de interceptações telefônicas. Atipicidade penal. Licitude da gravação de audiências.