LGPD, USO REGULAR DOS APLICATIVOS DE MENSAGENS E O ENQUADRAMENTO DELES COMO MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, SEGUNDO ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

Resumo

A eleição de 2022 será a primeira em que serão aplicadas as regras da Lei Geral de Proteção de Dados, que visa proteger a autodeterminação informativa do eleitor, bem como garantir que os dados coletados não sejam utilizados sem consentimento dele.
Por outro giro temos recentes decisões do Tribunal Superior Eleitoral, que reconhece que as mídias sociais, dentre elas os aplicativos de disparos em massa, são equiparadas aos meios de comunicação social.
A utilização indevida dos meios de comunicação social pode gerar graves consequências como perda do mandato ou cassação do diploma, como nos dizeres do Ministro Alexandre de Moraes que afirmou, em 2022, que o uso abusivo das redes sociais não passará impune como ocorreu em 2020.
Desta forma, o presente artigo visa aclarar como utilizar de forma correta as ferramentas de aplicativos de mensagens instantâneas sem violar a LGPD, bem como infringir a Lei Complementar 64/90, tendo em vista que temos precedentes do Tribunal Superior Eleitoral, que modernizou o entendimento do que seria Abuso de Poder a utilização indevida dessas ferramentas ao incluir esses instrumentos como meios de comunicação sociais aptos a desequilibrar o pleito.

Abstract

The 2022 election will be the first to apply the rules of the General Data Protection Law, which aims to protect the voters' informational self-determination as well as ensure that the data collected is not used without their consent.
On the other hand, we have recent decisions by the Superior Electoral Court that recognize that social media, including mass shooting applications, are equated with social media.
The misuse of social media can generate serious consequences such as loss of mandate or cancellation of the diploma, as in the words of Minister Alexandre de Moraes who stated in 2022 that the abusive use of social networks will not go unpunished as it happened in 2020.
In this way, this article aims to clarify how to correctly use instant messaging application tools without violating the LGPD as well as infringing Complementary Law 64/90, given that we have precedents from the Superior Electoral Court that modernized the understanding of what would be Abuse of Power by including these instruments as means of social communication capable of unbalancing the election.
Keywords: LGPD – Instant Messaging Applications – Abusive Use of Social Communications – Superior Electoral Court.

Artigo

LGPD, USO REGULAR DOS APLICATIVOS DE MENSAGENS E O ENQUADRAMENTO DELES COMO MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, SEGUNDO ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

Carlos Frota*

RESUMO

A eleição de 2022 será a primeira em que serão aplicadas as regras da Lei Geral de Proteção de Dados, que visa proteger a autodeterminação informativa do eleitor, bem como garantir que os dados coletados não sejam utilizados sem consentimento dele.

Por outro giro temos recentes decisões do Tribunal Superior Eleitoral, que reconhece que as mídias sociais, dentre elas os aplicativos de disparos em massa, são equiparadas aos meios de comunicação social.

A utilização indevida dos meios de comunicação social pode gerar graves consequências como perda do mandato ou cassação do diploma, como nos dizeres do Ministro Alexandre de Moraes que afirmou, em 2022, que o uso abusivo das redes sociais não passará impune como ocorreu em 2020.

Desta forma, o presente artigo visa aclarar como utilizar de forma correta as ferramentas de aplicativos de mensagens instantâneas sem violar a LGPD, bem como infringir a Lei Complementar 64/90, tendo em vista que temos precedentes do Tribunal Superior Eleitoral, que modernizou o entendimento do que seria Abuso de Poder a utilização indevida dessas ferramentas ao incluir esses instrumentos como meios de comunicação sociais aptos a desequilibrar o pleito.

Palavras chaves: LGPD – Aplicativos de Mensagens Instantâneas – Uso Abusivo dos Meios de Comunicação Social – Tribunal Superior Eleitoral

ABSTRACT

The 2022 election will be the first to apply the rules of the General Data Protection Law, which aims to protect the voters’ informational self-determination as well as ensure that the data collected is not used without their consent.

On the other hand, we have recent decisions by the Superior Electoral Court that recognize that social media, including mass shooting applications, are equated with social media.

The misuse of social media can generate serious consequences such as loss of mandate or cancellation of the diploma, as in the words of Minister Alexandre de Moraes who stated in 2022 that the abusive use of social networks will not go unpunished as it happened in 2020.

In this way, this article aims to clarify how to correctly use instant messaging application tools without violating the LGPD as well as infringing Complementary Law 64/90, given that we have precedents from the Superior Electoral Court that modernized the understanding of what would be Abuse of Power by including these instruments as means of social communication capable of unbalancing the election.

Keywords: LGPD – Instant Messaging Applications – Abusive Use of Social Communications – Superior Electoral Court.

  1. INTRODUÇÃO

            A Lei 9504/97 – Lei Geral das Eleições – ao ser publicada, permitiu praticamente tudo em termos de propaganda eleitoral; nesse período, não se falava em campanha virtual, ela se fazia na rua e com contato direto com o eleitor, no entanto, sob o argumento de diminuir o lixo na rua e conter os custos das eleições foram sendo reduzidos os elementos de propaganda eleitoral de rua na seguinte ordem histórica:

            Em 2006 foi proibida a distribuição de brindes, o exemplo mais típico era a camiseta e chaveiro com número e imagem do candidato, também ocorreu vedação de outdoor e showmício.

            Em substituição ao outdoor, foi autorizada a utilização de placa de quatro metros quadrados, que foi proibida em 2009, sendo substituída por adesivo de meio metro quadrado na janela.

            No ano de 2013 foi estabelecida limitação do total de gastos de campanha para alimentação de 10% e aluguel de veículo em 20% do total arrecadado.

            Quando chegou em 2015, as proibições endureceram e vedou-se todo tipo de propaganda em bens públicos e lugares de uso comum: placas, estandartes, faixas, cavaletes, bonecos e assemelhados foram banidos das ruas.

            Em 2017 foi limitada novamente a utilização de propaganda eleitoral por veículos de som, sendo autorizada somente para comício, carreata, caminhada ou passeata.

            Em 1997, ano que entrou em vigor a Lei das Eleições, apenas uma pequena parte da população brasileira tinha acesso à Internet, ou seja, os marqueteiros políticos não estavam preparados para campanhas virtuais e a legislação ainda não disciplinava nada sobre o tema.

            Somente em 2008, o Tribunal Superior Eleitoral, por meio da Resolução nº 22.718, de 28 de fevereiro de 2008, tratava da campanha eleitoral na Internet, ainda que de forma tímida, pois mesmo a Justiça Eleitoral conhecia pouco as ferramentas disponíveis na rede mundial de computadores

  1. LGPD – LEI GERAL DE PROTEÇAO DE DADOS, DISPAROS EM MASSA E USO REGULAR DOS APLICATIVOS DE MENSAGENS INSTANTÂNEAS

             Neste pleito o TSE adotou uma novidade, que é a permissividade da utilização dos disparos em massa por meio de provedores de aplicação, desde que respeitadas algumas regras, que serão expostas no decorrer do texto.

            Com a robusta redução dos elementos de campanha eleitoral na rua, ela migrou para as redes sociais e, com a entrada em vigor da Lei nº 12.034/2009, primeira legislação a tratar do assunto o mundo virtual, passou a ter relevância jurídica para as eleições; no entanto, como a inovação tecnológica está acima da capacidade de controle de qualquer corte eleitoral no mundo, os debates das nuanças da aplicabilidade legítima dos instrumentos de aplicações de Internet acentuaram-se de forma intensa.

            A resolução TSE nº 23.610, de 18 de dezembro de 2019, com as alterações introduzidas pela Resolução nº 23.671, de 14 de dezembro de 2021, que incorporou sugestões, fruto de audiências públicas realizadas pelo Tribunal Superior Eleitoral, bem como textos do Novo Código Eleitoral, que tramita no Senado Federal, que tratou da propaganda eleitoral por meio de aplicativos de mensagens instantâneas.

            Os problemas abordados no presente artigo são os seguintes:

            A legalidade da utilização de aplicativo de disparo em massa por candidato (a) ou pré-candidato (a).

            O que vem a ser o permissivo insculpido no artigo 28, inciso III da resolução TSE nº 23.610, de 18 de dezembro de 2019, que autoriza a propaganda por “meio de mensagem eletrônica para endereços cadastrados gratuitamente”.

            O que disciplina a legislação sobre disparo em massa.

            A aplicabilidade da LGPD nas eleições de 2022.

            A configuração dos aplicativos de mensagens instantâneas e redes sociais como aptos a ensejar a perda de mandato ou cassação do diploma, por uso Abusivo dos Meios de Comunicação Social.

            De início precisamos destacar como a Resolução TSE nº 23.610[1], de 18 de dezembro de 2019, disciplina os tipos de propagandas vedadas, no que tange a disparo em massa, bem como utilização de serviços de aplicação de Internet, aduz que:

Art. 34. É vedada a realização de propaganda:

II – por meio de disparo em massa de mensagens instantâneas sem consentimento da pessoa destinatária ou a partir da contratação expedientes, tecnologias ou serviços não fornecidos pelo provedor de aplicação e em desacordo com seus termos de uso. (Constituição Federal, art. 5º, X e XI; Código Eleitoral, art. 243, VI; Lei nº 9.504/1997, art. 57-J)

            O primeiro obstáculo à utilização de aplicativos de mensagens é que a legislação veda a utilização dele para disparo em massa sem o consentimento do eleitor, ou seja, a base de dados utilizada deve ocorrer de forma orgânica, também se faz imprescindível a disponibilização de mecanismo para revogação do consentimento com a eliminação dos dados coletados.

            No caso de obtenção de dados de forma orgânica, com a anuência expressa, inequívoca e clara do cidadão, com a finalidade especifica de enviar conteúdo de caráter político, é permitida a utilização de disparo em massa de mensagens.

            Uma ressalva da legislação é que a ferramenta de disparo em massa deve ser proporcionada de forma oficial pelo provedor de aplicação, sendo proibida a contratação de expedientes ou tecnologias para burlar as ferramentas do aplicativo.

            No que tange aos provedores de aplicação, é preciso avaliar se cumpre o que determina a Lei 12.965/14, Marco Civil da Internet que, em caso de ordem judicial, determina o armazenamento de informações pelo período de 6 meses, conforme o art. 15 e parágrafo único, in verbis:

Art. 15. O provedor de aplicações de internet constituído na forma de pessoa jurídica e que exerça essa atividade de forma organizada, profissionalmente e com fins econômicos deverá manter os respectivos registros de acesso a aplicações de internet, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de 6 (seis) meses, nos termos do regulamento.

Parágrafo Único: Ordem judicial poderá obrigar, por tempo certo, os provedores de aplicações de internet que não estão sujeitos ao disposto no caput a guardarem registro de acesso a aplicações de internet, desde que se trate de registros relativos a fatos específicos em período determinado.

            Por outro giro, o artigo 28 da Resolução nº 23.671[2], de 14 de dezembro de 2021, informa como meio legítimo de propaganda o envio de mensagens eletrônicas cadastradas de forma voluntária e gratuita pelo candidato ou candidata, nestes termos:

Resolução nº 23.671, de 14 de dezembro de 2021

Art. 28. A propaganda eleitoral na internet poderá ser realizada nas seguintes formas (Lei nº 9.504 /1997, art. 57-B, I a IV):

III – por meio de mensagem eletrônica para endereços cadastrados gratuitamente pela candidata ou pelo candidato, pelo partido político, pela federação ou pela coligação desde que presente uma das hipóteses legais que autorizam o tratamento de dados pessoais, nos termos dos arts. 7º e 11º da Lei nº 13.709/2018;

  1. a) candidatas, candidatos, partidos políticos, federações ou coligações, desde que não contratem disparos em massa de conteúdo nos termos do art. 34 desta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 57- J);

            A Lei Geral de Proteção de Dados nos arts. 7º e 11º aduz  que a base Legal necessária para o recebimento de mensagens por meio de aplicativo é o consentimento de forma específica e destacada e qual a finalidade, no presente caso, da divulgação de conteúdo político no período permitido eleitoral, destacando-se que o aplicativo deve possuir mecanismo que possibilite, a qualquer momento e de forma unilateral, que a pessoa revogue o consentimento ofertado, com a eliminação das informações coletadas:

Art. 7º O tratamento de dados pessoais somente poderá ser realizado nas seguintes hipóteses:

I – mediante o fornecimento de consentimento pelo titular;

Art. 11. O tratamento de dados pessoais sensíveis somente poderá ocorrer nas seguintes hipóteses:

I – quando o titular ou seu responsável legal consentir, de forma específica e destacada, para finalidades específicas;

Art. 8º O consentimento previsto no inciso I do art. 7º desta Lei deverá ser fornecido por escrito ou por outro meio que demonstre a manifestação de vontade do titular.

  • 5º O consentimento pode ser revogado a qualquer momento mediante manifestação expressa do titular, por procedimento gratuito e facilitado, ratificados os tratamentos realizados sob amparo do consentimento anteriormente manifestado enquanto não houver requerimento de eliminação, nos termos do inciso VI do caput do art. 18 desta Lei.

            É preciso mais cautela ao coletar dados pessoais sensíveis, pois tornam a obtenção de consentimento mais detalhada, por conta de envolverem direitos fundamentais da pessoa, o que pode gerar inclusive a obrigação de emissão de relatório de impacto à proteção de dados pessoais, haja vista os prováveis riscos às liberdades civis e aos direitos fundamentais decorrentes do tratamento[3] (art. 5º, XVII; art. 38):

Art. 5º […] II – dado pessoal sensível: dado pessoal sobre origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa natural;

            Outro aspecto a ser levado em consideração é se outras pessoas podem utilizar o aplicativo para coletar dados de forma gratuita e voluntaria. Sim, é possível, no entanto é preciso ter cautela, a fim de que não ocorra o aliciamento digital das pessoas, como forma de cumprir metas, pois tal atitude pode viciar o consentimento do cidadão (ã), tornando o consentimento nulo.

            A Legislação Eleitoral veda em regra o disparo em massa, no entanto, caso o pré-candidato ou candidata obtenha os dados de forma orgânica e com o consentimento voluntário, com a discriminação da finalidade especifica da utilização deles, é legítima a utilização de disparo em massa pelo controlador das informações.

            É permitida a coleta de dados por meio de aplicativo disponibilizado de forma gratuita por terceiro, ressaltando o cuidado para que não se tenha aliciamento digital de pessoas, o que tornará nulo o consentimento dado.

            Na mensagem enviada ao cidadão (ã) tem que constar de forma especifica que se trata de coleta de dados para envio de material com cunho político-eleitoral, com botão de forma destacada com a opção SIM ou NÃO, além de informar que é direito da pessoa revogar o consentimento a qualquer momento.

            É recomendável que se firme termo de compromisso assinado pelo controlador com quem coletar os dados, no sentido de que boas práticas sejam utilizadas ao solicitar o cadastramento.

            Uma vez que o cidadão não queira mais receber mensagens, o descadastro deve ocorrer em no máximo 48 horas.

  1. DA CONFIGURAÇÃO DOS APLICATIVOS DE DISPAROS EM MASSA COMO MEIO DE COMUNICAÇÃO EM MASSA APTO A ENSEJAR INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL

 

            O Tribunal Superior Eleitoral, em outubro de 2021, julgou Ação de Investigação Eleitoral proposta pela Coligação O Povo Feliz e Novo (PT/PCdoB/ PROS) contra a chapa Bolsonaro – Mourão, em que se discutia se o aplicativo WhatsApp poderia ser meio de comunicação social de massa devido à grande penetração no eleitorado.

            Por ocasião do julgamento, o Tribunal Superior Eleitoral declarou improcedente a investigação, por falta de provas; no entanto, deixou importantes lições de que é possível enquadrar os aplicativos de mensagens instantâneas como meio de comunicação de massa, aptos a ensejar a abertura de investigação eleitoral, conforme demonstrado a seguir.

            O Ministro Luiz Roberto Barroso[4] assentou o entendimento de que é cabível harmonizar as novas tecnologias no conceito de abuso de poder, já que se trata de um tipo aberto, ou seja, é necessário readequar a Lei Complementar 64/90 às novas tecnologias; aduz que:

Deve-se assentar, como premissa deste julgamento, que as condutas descritas, de sistemática disseminação de notícias falsas por meio de disparos em massa podem, em tese, caracterizar abuso de poder econômico e uso indevido de meios de comunicação na internet. Estamos lidando, neste caso, com novas formas de cometimento de velhos ilícitos. Considerando que a propaganda eleitoral tem migrado para o ambiente virtual, é  preciso  acomodar  as  práticas  ilícitas  surgidas  nesse novo paradigma de comunicação  eleitoral  nas  categorias  de  abuso previstas em lei editada na década de 90, de modo a permitir o devido controle da legitimidade das eleições (AIJE – Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº     0601968-80.2018.6.00.0000, voto Ministro Luiz Roberto Barroso)

            E prossegue o Ministro no seu escólio:

Houve recente evolução jurisprudencial no delineamento do uso indevido dos meios de comunicação social para assimilar a nova realidade da comunicação eleitoral. O ilícito deixou de abarcar apenas as mídias tradicionais, o que exigia a demonstração   de tratamento anti-isonômico por parte de emissoras de rádio e tv e dos impressos. Passou-se a admitir a caracterização do ilícito no caso de patente utilização abusiva dos canais, ferramentas e aplicações de internet. Isso pode ocorrer pela amplificação artificial de conteúdos nocivos a partir do emprego de comportamentos inautênticos ilegítimos. (AIJE – Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 0601968-80.2018.6.00.0000, voto Ministro Luiz Roberto Barroso)

            O Relator do processo, Ministro Luis Felipe Salomão[5], que emitiu voto pela improcedência da ação, apresentou proposta acolhida pela maioria dos Ministros do Tribunal Superior Eleitoral, no sentido de que a internet, usada de forma indevida, emoldura-se a uso abusivo dos meios de comunicação social.

PROPOSTA. TESE. DISPAROS EM MASSA. APLICATIVOS DE MENSAGENS INSTANTÂNEAS. POSSIBILIDADE. ENQUADRAMENTO. ABUSO DE   PODER ECONÔMICO. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL.

  1. Os arts. 1º, II e parágrafo único e 14, § 9º, da CF/88, além dos arts. 19 e 22 da LC 64/90 revelam como bens jurídicos tutelados a paridade de armas e a lisura, a normalidade e a legitimidade das eleições.
  2. O abuso de poder econômico configura-se pelo uso desmedido de aporte patrimonial que, por sua vultuosidade e gravidade, é capaz de viciar a vontade do eleitor, desequilibrando a lisura do pleito. Precedentes.
  3. A internet, incluídas as aplicações tecnológicas de mensagens instantâneas, enquadra-se no conceito de “veículos ou meios de comunicação social” a que alude o art. 22 da  LC  64/90.

Além  de  o dispositivo  conter  tipo  aberto,  a  Justiça  Eleitoral  não  pode  ignorar  a realidade: é notório que as Eleições de 2018 representaram novo marco na  forma  de  realizar  campanhas,  com  claras  vantagens  no  uso  da internet pelos atores do processo eleitoral, que podem se comunicar e angariar votos de forma mais econômica, com amplo alcance e de modo personalizado mediante interação direta com os eleitores.

  1. Proposta de tese: o uso de aplicações digitais de mensagens instantâneas, visando promover disparos em massa, contendo desinformação e inverdades em prejuízo de adversários e em benefício de candidato, pode configurar abuso de poder econômico (AIJE – Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 0601968-80.2018.6.00.0000, Relator Ministro Luís Felipe Salomão)

            O Excelentíssimo Sérgio Banhos[6] também votou no mesmo sentido de aprovar a tese defendida pelo relator; aduz que:

Como bem apontou o relator, os meios de comunicação sofreram inegável transformação nos últimos anos, não apenas pela maior presença dos veículos de comunicação na internet – inclusive nas redes sociais –, mas também pela   fragmentação da produção de conteúdo jornalístico, por meio da profusão de formas de comunicação de massa.

Desse modo, entendo que o termo ‘uso indevido dos meios de comunicação’ tem conotação aberta, não restrita a mensagens veiculadas por órgãos de imprensa, razão pela qual entendo que a tese deve ser aprovada. (AIJE – Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 0601968-80.2018.6.00.0000, voto Ministro Sergio Banhos)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

         O Tribunal Superior Eleitoral evoluiu e, juntamente com a Agência Nacional de Proteção de Dados, entendeu que é possível a utilização das ferramentas de aplicativos de mensagens instantâneas para disparo em massa, desde que cumpridas certas exigências da norma.

            A regra é a vedação, no entanto, desde que o banco de dados seja formado de forma orgânica, a ferramenta de disparo seja nativa do aplicativo, o dado coletado tenha consentimento do cidadão e tenha-se autorização específica para o envio da mensagem é permitido o disparo em massa de mensagem com conteúdo eleitoral.

            Porém, muito cuidado é necessário para quem utiliza as novas tecnológicas ao arrepio da Lei, pois o Tribunal Superior Eleitoral já firmou entendimento de que as ferramentas de aplicações de internet podem ser enquadradas como meio de comunicação em massa.

            Dessa forma, e por ser um tipo aberto, a mais alta Corte Eleitoral do país deu um passo à frente no sentido de que é possível cassar mandato ou diploma por meio da Ação de Investigação Judicial Eleitoral, tendo em vista que a Lei Complementar 64/90 pode ser interpretada para punir a utilização de novas tecnologias que incorporem velhas práticas nocivas à democracia.

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

 

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. RESOLUÇÃO Nº 23.610, DE 18 DE DEZEMBRO DE 2019. Disponível em:  https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/res/2019/resolucao-no-23-610-de-18-de-dezembro-de-2019. Acessado em 21 de agosto de 2022.

 

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. RESOLUÇÃO Nº 23.671, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2021. Disponível em: https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/res/2021/resolucao-no-23-671-de-14-de-dezembro-de-2021. Acessado em 21 de agosto de 2022.

BRASIL. LEI Nº 13.709, DE 14 DE AGOSTO DE 2018. Lei Geral de Proteção de Dados. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm. Acessado em 21 de agosto de 2022.

 

BRASIL. TSE. https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2021/Outubro/tse-julga-improcedentes-acoes-contra-jair-bolsonaro-e-hamilton-mourao. Acessado em 21 de agosto de 2022.

 

Brasil. TSE. https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2022/Janeiro/tse-lanca-cartilha-sobre-a-lei-geral-de-protecao-de-dados-pessoais. Acessado em 21 de agosto de 2022.

BRASIL. Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997. Estabelece normas para as eleições. Brasília. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9504.htm. Acessado em 21 de agosto de 2022.

SALOMÃO, Luís Felipe. TSE. Acórdão de 28/10/2021. AÇÃO    DE     INVESTIGAÇÃO     JUDICIAL     ELEITORAL     Nº     0601968-80.2018.6.00.0000 – CLASSE 11527 –BRASÍLIA –DISTRITO FEDERAL. Disponível em https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2021/Outubro/tse-julga-improcedentes-acoes-contra-jair-bolsonaro-e-hamilton-mourao Acessado em 21 de agosto de 2022.

*Carlos Frota é Advogado, Professor de Direito Eleitoral e Partidário na Escola do Legislativo do Estado do Rio de Janeiro, Professor de Português Literatura, Presidente da Comissão de Direito Eleitoral do IBRAPEJ, Procurador-Geral da OAB – Subseção Méier e Mestrando em Sociologia Política no IUPERJ- Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro.

 Notas:

[1] Brasil. Tribunal Superior Eleitoral. RESOLUÇÃO Nº 23.610, DE 18 DE DEZEMBRO DE 2019. Disponível em:  https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/res/2019/resolucao-no-23-610-de-18-de-dezembro-de-2019

[2] Brasil. Tribunal Superior Eleitoral. RESOLUÇÃO Nº 23.671, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2021. Disponível em: https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/res/2021/resolucao-no-23-671-de-14-de-dezembro-de-2021

[3] Brasil. LEI Nº 13.709, DE 14 DE AGOSTO DE 2018. Lei Geral de Proteção de Dados. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm

[4] SALOMÃO,  Luís Felipe. TSE. Acórdão de 28/10/2021. AÇÃO    DE     INVESTIGAÇÃO   JUDICIAL ELEITORAL Nº     0601968-80.2018.6.00.0000 –CLASSE 11527–BRASÍLIA –DISTRITO FEDERAL. Disponível em https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2021/Outubro/tse-julga-improcedentes-acoes-contra-jair-bolsonaro-e-hamilton-mourao

[5] Idem

[6] Idem

Palavras Chaves

Aplicativos de Mensagens Instantâneas – Uso Abusivo dos Meios de Comunicação Social – Tribunal Superior Eleitoral