MEDIAÇÃO PRÉ-PROCESSUAL

Resumo

É sabido e notório que a mediação, bem como as demais práticas de autocomposição são alternativas mais adequadas para a solução de determinados conflitos. Compreende- se que uma sentença, além de demorada certamente não atenderá a real necessidade daquelas pessoas, logo não mais do que frequente vemos aquelas mesmas pessoas retornando ao Judiciário com novos processos sobre as mesmas questões, especialmente no tocante às relações de família. O judiciário então se tornou palco para questões mal resolvidas de forma demorada e burocrática. Somar ao judiciário, além da mediação processual, a mediação pré-processual, pode-se dizer não ter cabimento algum. Então, apesar de haverem discordâncias sobre o propósito da mediação face aos problemas já tão conhecidos do judiciário e o instituto em si próprio, propõe-se com este artigo, analisar objetivamente a pertinência da mediação pré-processual dentro do judiciário, bem como os reflexos para o mediador e para a advocacia, haja vista que existem as câmaras privadas de mediação com e sem convênio com os Tribunais de Justiça e mediadores autônomos.

Artigo

MEDIAÇÃO PRÉ-PROCESSUAL

  

Analice Coimbra1

RESUMO

  

É sabido e notório que a mediação, bem como as demais práticas de autocomposição são alternativas mais adequadas para a solução de determinados conflitos. Compreende- se que uma sentença, além de demorada certamente não atenderá a real necessidade daquelas pessoas, logo não mais do que frequente vemos aquelas mesmas pessoas retornando ao Judiciário com novos processos sobre as mesmas questões, especialmente no tocante às relações de família. O judiciário então se tornou palco para questões mal resolvidas de forma demorada e burocrática. Somar ao judiciário, além da mediação processual, a mediação pré-processual, pode-se dizer não ter cabimento algum. Então, apesar de haverem discordâncias sobre o propósito da mediação face aos problemas já tão conhecidos do judiciário e o instituto em si próprio, propõe-se com este artigo, analisar objetivamente a pertinência da mediação pré-processual dentro do judiciário, bem como os reflexos para o mediador e para a advocacia, haja vista que existem as câmaras privadas de mediação com e sem convênio com os Tribunais de Justiça e mediadores autônomos.

Palavras-chave: Mediação.Judiciário.Pré-processual.Mediador.Câmara Privada de Mediação.

1   INTRODUÇÃO

  

O presente artigo tem como objetivo analisar a pertinência da mediação pré processual dentro dos Centros de Mediação nos Tribunais de Justiça, observando e reconhecendo as vantagens decorrentes do método de resolução consensual de conflitos, a mediação.

Desde 2006, quando o Conselho Nacional de Justiça, em 23 de agosto, lançou o Movimento pela Conciliação, vem se buscando e descobrindo novas formas, além do processo judicial tradicional, de praticar o Direito.

Juízes, advogados, procuradores, promotores, defensores públicos unidos com o objetivo de promover maior acesso com dignidade à Justiça.

Esse movimento foi iniciado, gostem, concordem ou não, tendo em vista o sobrecarregamento do Judiciário, logo traz meios ALTERNATIVOS de solução de conflitos e alternativos ao que, alternativos ao Judiciário.

A Resolução CNJ nº. 125/2010, que instituiu a Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado dos Conflitos de Interesses, dispõe que objetiva que todos tenham o direito de resolver os conflitos de acordo com sua natureza e características.

A Resolução continua, juntamente com o Código de Processo Civil e a Lei 13.140/15 (Lei da Mediação), afirmando que pretende alcançar o objetivo supramencionado oferecendo e estimulando a utilização dos meios consensuais antes de dar uma sentença nos processos judiciais.

Logo neste artigo, serão brevemente apresentados alguns conceitos básicos sobre a mediação e suas modalidades, como se desenvolvem e como podem ser utilizadas para atingir a sua meta sem replicarem o que ocorre no judiciário hoje e sem serem distorcidas.

2   MEDIAÇÃO

  

A mediação consiste em um método, cuja participação é voluntária, ou seja, as pessoas não são obrigadas a participar, nela não há hierarquia entre as pessoas que dela participam e o mediador.

Em uma sessão de mediação duas ou mais pessoas revelam o conflito que os trouxeram até aquele espaço, onde serão ouvidas umas pelas outras, a fim de dialogarem construtivamente identificando seus interesses e necessidades até serem capazes ou não de construírem um entendimento, um acordo.

O mediador durante a mediação atua como um facilitador, um terceiro que deve ser imparcial, independente e livremente escolhido ou aceito, mas munido das ferramentas necessárias para o desenvolvimento da mediação.

Destaca-se que o mediador é fator indispensável à realização da mediação, deste profissional é requerido capacitação permanente ou a mediação pode ser descaracterizada, levando as pessoas a perderem a confiança no instituto.

Mais além, a mediação trata das questões subjetivas, emocionais que, por exemplo, impedem as pessoas de resolverem um conflito sem a intervenção de um juiz, que é quem decidirá quem está certo e errado e qual é a melhor solução para os envolvidos.

Em uma sessão de mediação, é importante destacar que são as próprias pessoas que são responsáveis pela construção de uma solução para a disputa que as levou até ali, e não como oponentes, mas aliados.

Por esta razão, dizia-se que a mediação era mais indicada para conflitos entre pessoas que terão de manter relações permanentes ou continuadas, como por exemplo casais que estão se separando, mas terão um vínculo eterno por causa dos filhos, isto pois, será necessário que conversem e interajam ao longo do tempo sobre as questões envolvendo a progênie, logo a mediação atua na transformação do padrão da comunicação, da autorresponsabilização, sempre observando os princípios da autonomia da vontade, da confidencialidade e da inexistência da hierarquia.

Todavia, hoje muitos mediadores e estudiosos da mediação defendem a sua aplicação em vários tipos de relações, independentemente de serem curtas, não se estenderem ao longo de muitos anos e que em um primeiro olhar mais simplista, envolvem somente questões primordialmente objetivas, pois os envolvidos em um conflito não são capazes de enxergarem suas reais necessidades e acabam se tornando vítimas de suas emoções.

Tal como muitas vezes o consumidor em uma conciliação deseja mais que a empresa se desculpe pelo ocorrido do que deseja a indenização, e não poucas vezes sai insatisfeito com o resultado da sentença ou do acordo.

A mediação pode ser pedida em qualquer momento, antes de um processo  judicial, conhecidas como mediações extrajudiciais ou durante um processo judicial, conhecidas como mediações judiciais, como dito acima as pessoas tem plena autonomia para decidir se participarão, bem como se irão sozinhas ou acompanhadas de seus advogados.

Agora é primordial abrir um parêntese para destacar a importância dos advogados conhecerem a mediação para poderem estar preparados para apresentarem e representarem seus clientes.

A mediação ela pode ser indicada para um determinado conflito antes de se ingressar com um processo e muitas vezes quando não há acordo e as pessoas precisam buscar o judiciário, o empenho realizado durante a mediação reverbera no processo, auxiliando em sua tramitação.

Isto posto, a advocacia precisa aprender para poder lutar para ocupar um espaço nesta nova Política de Tratamento de Conflitos, pois como é sabido o Conselho Nacional de Justiça se posicionou no sentido pela não obrigatoriedade do advogado nas mediações ou conciliações através de nota técnica encaminhada ao Senado Federal no Fórum Nacional de Mediação e Conciliação FONAMEC.

3   MEDIAÇÃO JUDICIAL

  

A mediação judicial ocorre dentro do Tribunal, ela é orientada pela Lei 13.140/2015 e é dividida em três capítulos, sendo o primeiro da mediação, o segundo da mediação envolvendo entes públicos e o terceiro que traz as disposições gerais.

 Os mediadores judiciais para atuar precisam ser pessoas capazes, graduadas há pelo menos dois anos em curso de ensino superior de instituição reconhecida pelo Ministério da Educação e terem obtido capacitação em escola ou instituição de formação de mediadores, reconhecida pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – ENFAM ou pelos tribunais, observados os requisitos mínimos estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça em conjunto com o Ministério da Justiça.

 Na mediação judicial processual, os mediadores serão remunerados quando as partes recolherem custas, caso a parte seja beneficiária da gratuidade de justiça, o mediador não receberá qualquer tipo de remuneração.

 A remuneração dos mediadores, quando é cabível, é de R$ 20,00 por cada processo realizado e que seja homologado acordo judicial, bem como nos casos em que houver designação de mais de um mediador judicial, o valor da remuneração será rateado entre eles.

 Nas mediações judiciais processuais, as partes devem ser assistidas por advogados ou defensores públicos, exceto nas hipóteses dos procedimentos de Juizados.

 Quando o processo é encaminhado pelo juiz para a mediação, ele fica suspenso enquanto durar a mediação, logo se ao final houver um acordo o processo retorna para a homologação deste acordo e se não houver acordo o processo retorna para o juiz dar prosseguimento regular ao feito.

As mediações judiciais pré-processuais, também ocorrem dentro do Tribunal, com a participação de mediador judicial, todavia ela é anterior a existência de um processo judicial.

Na mediação pré-processual é dispensada a participação de advogado, conforme manifestações do CNJ e não há previsão de remuneração para o mediador judicial.

À título de exemplo, no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro basta você entrar no sítio eletrônico do mesmo e solicitar uma mediação pré-processual.

4   MEDIAÇÃO EXTRAJUDICIAL

  

A mediação extrajudicial por sua vez ocorre fora do Tribunal, mas também é orientada pela Lei 13.140/2015, logo tem disposições em comum e mesmos os princípios norteadores.

A mediação extrajudicial ela deve ser buscada pelas pessoas de forma direta ou através de seus advogados, por meio de Câmaras Privadas de Mediação ou Medidores autônomos.

Ela é mais célere do que a mediação judicial por não ter que observar as mesmas burocracias e é recebida pelas pessoas fora de um contexto litigioso, que muitas vezes já conta com petições iniciais agressivas e adversariais.

Havendo acordo na mediação extrajudicial este pode ser ou não levado para homologação, se o acordo alcançado não for homologado ele será um título executivo extrajudicial e se for homologado um título executivo judicial.

Na hipótese de pedido de homologação, será necessária a contratação de um advogado para que o mesmo realize o pedido pelos meios judiciais cabíveis.

A contratação dos mediadores extrajudiciais e a sua remuneração se dá através de contratos, não havendo tabela pré-existente.

5   CONCLUSÃO

  

Partindo-se da ideia de que a Política de Tratamento Adequado de Conflitos faz parte de um movimento que objetiva que mais pessoas tenham acesso com dignidade à Justiça e que esse acesso com dignidade traduz-se em um Poder Judiciário menos sobrecarregado com processos para que princípios como a duração razoável do processo seja atendido, métodos mais adequados como a mediação, a conciliação, dentre outros tem o potencial de auxiliar com esse propósito.

Sendo assim, observe-se o Juizado e a conciliação, a promessa da tramitação mais célere muitas vezes não é cumprida e o instituto da conciliação acabou depreciado, tendo isso como consequência a descrença das pessoas que escolhem nem considerar a possibilidade e preferem esperar por uma sentença.

Incluir a mediação pré-processual aos Cejuscs vai gerar uma sobrecarga de trabalho, lentidão nos agendamentos e processos suspensos por mais de ano, parados no tempo, o que ocorre no sistema judiciário tradicional.

Com a não exigibilidade do advogado, existe o risco alto das pessoas perderem a confiança no instituto, afinal a presença do advogado é indispensável para garantir que direitos serão preservados.

Nas mediações pré-processuais, para o mediador não há nem sequer previsão de remuneração, pois como não há processo não há custas a serem recolhidas, logo pessoas com alto poder aquisitivo poderão ter acesso tanto quanto pessoas com baixo poder aquisitivo. Isso pode implicar em uma grande perda de receita para o Tribunal também.

Ao final teremos mediadores judiciais insatisfeitos, indisponíveis, sub capacitados, uma demora maior para ter acesso à mediação e no final pessoas desacreditando no instituto.

Existem Câmaras Privadas de Mediação que oferecem um serviço de qualidade, contam com mediadores capacitados e disponibilidade para promoverem real atendimento com dignidade e duração razoável.

Muitas dessas Câmaras tem convênio com os Tribunais de Justiça, casos de gratuidade de justiça poderiam ser atendidos por meio de parcerias firmadas, ademais muitas defensorias públicas já oferecem mediação extrajudicial para seus assistidos.

Mas a questão é a consequência maior que será retornar à estaca zero com um judiciário sobrecarregado e com resultados negativos para toda a sociedade.

O judiciário deveria ser a última porta e não a primeira porta, assim como é nos países de Commom Law.

Em nossa legislação, já existem questões demais que tem a obrigatoriedade de passar pelo judiciário, seja para passar por um processo de conhecimento inteiro ou somente para homologação.

Agora reflitam sobre como seria mais efetivo se as pessoas recebessem incentivo para tentarem uma solução consensual fora do Tribunal primeiro e em último caso, recorressem ao judiciário, a qualidade do acesso à Justiça repercutiria no exercício da profissão de todos os operadores da Justiça, juízes, advogados, promotores, etc.

Afinal, a mediação pré-processual repercute negativamente no exercício profissional do advogado e do mediador principalmente, pois o primeiro rejeita a mediação assim como a mediação o repele e, por conseguinte, continuará indo para o

judiciário, e o segundo trabalhará gratuitamente ou não poderá estar disponível para fazer mediação nos tribunais, pois precisa exercer outro ofício para garantir a sua subsistência.

Por fim, com a existência da mediação judicial pré-processual perde a mediação, perde o judiciário e principalmente as pessoas.

6   REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Ato Normativo Conjunto TJ/CGJ  n°        73/2016.                                  Disponível        em: http://www.tjrj.jus.br/documents/10136/1077812/ato-normativo-73-2016.pdf  Acesso em 28 de setembro de 2021.

BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/156 Acesso em 28 de setembro de 2021.

BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de  2015.  Institui  o  Código  de  Processo Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 de março 2015a. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 28 de setembro de 2021.

BRASIL. Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública; altera a Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997, e o Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972; e revoga o § 2º do art. 6º da Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 de junho de 2015b. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2015/Lei/L13140.htm. Acesso em: 28 de setembro de 2021

Notas: 

1 Advogada pós-graduada em Processo Civil, sócia fundadora do Coimbra Garcia Advocacia e Consultoria Jurídica, mediadora judicial e extrajudicial, atual presidente da Comissão de Mediação da OAB Nova Friburgo, sócia e membro do Instituto Brasileiro de Práticas Integrativas e Câmara Privada de Mediação – MediaTum, Cofundadora da União de Mediadores do Estado do Rio De Janeiro – UNIMERJ, Mentora em Mindset com ênfase em epigenética certificada internacionalmente pela Escola Marinélia Leal em Portugal, Psicanalista em formação pelo Corpo Freudiano Escola de Psicanálise Núcleo Nova Friburgo.Autora do livro Viva a Conciliação e Organizadora e Co-autora do livro Artesãos da Paz: O tecido que mediadores tecem dia a dia.

Palavras Chaves

Mediação.Judiciário.Pré-processual.Mediador.Câmara Privada de Mediação.