RESENHA – EXAMES DE EMPATIA – Leslie Jamison

Artigo

RESENHA

 EXAMES DE EMPATIA

 Leslie Jamison

  

Irineu Carvalho de Oliveira Soares1

 

Exames de empatia foi escrito por Leslie Jamison2, norte americana graduada em literatura inglesa pela Universidade de Harvard, mestre em ficção pela Universidade de Iowa e doutora em literatura inglesa pela Universidade de Yale. Atualmente é professora da Escola de Artes da Universidade de Columbia. A obra, que esteve na lista dos bestsellers do New York Times, traz onze ensaios que misturam memórias da autora, suas experiências jornalísticas e reflexões oriundas das interações com outras pessoas.

Primeiramente venho esclarecer que optei pela utilização da primeira pessoa por se tratar de uma resenha literária, caracterizada por ser uma análise crítica de conteúdo, obtida através das impressões do leitor que vos fala.

Vou descrever e analisar dois dos onze ensaios do livro, encolhidos devido a representatividade de seu conteúdo para com toda a obra.

O primeiro ensaio escolhido, intitulado exames de empatia, deu nome à obra objeto da análise. Ele narra as reflexões da escritora enquanto trabalhava, de forma remunerada, como atriz médica, interpretando pessoas doentes para que os alunos de medicina pudessem exercitar suas habilidades de atendimento e investigação de sintomas.

A mistura entre os papéis interpretados e suas memórias e experiências pessoais provocou um emaranhado de sentimentos e reflexões empáticas, justamente o que o livro se propôs. Com essa combinação, a autora convida o leitor a se aventurar no universo da empatia misturando os roteiros das personagens que interpretou, a narrativa das interações com os estudantes de medicina e a experiência de um aborto vivenciada por ela e seu companheiro.

Grande parte das reflexões trazidas à tona neste ensaio estão concentradas nas avaliações que ela teve que fazer dos estudantes. Ao final de todas as interações, ela teve que preencher formulários que avaliavam o desempenho deles e a empatia era um eixo transversal que permeava todas as perguntas. Esse trabalho enriquecedor trouxe alguns conceitos de empatia, como o que trago abaixo.

Empatia não é apenas lembrar-se de dizer: deve ser realmente difícil – é imaginar como trazer a dificuldade à luz para que possa ser percebida. Empatia não é apenas escutar, é fazer as perguntas cujas respostas precisam ser escutadas. Empatia requer investigação tanto quanto imaginação. Empatia requer saber que você não sabe nada. Empatia significa reconhecer um horizonte de contexto que se estende perpetuamente além do que você pode ver. (p.18).

Este texto pode ser sintetizado com algumas problemáticas levantadas para os leitores: A empatia deve sempre nascer espontânea (involuntária) ou pode ser treinada e adquirida? Será que podemos escolher ter empatia? A empatia é algo que acontece ou é uma escolha que fazemos?

O segundo ensaio, intitulado “A isca do diabo”, narra a experiência da autora como jornalista em uma conferência anual da organização defensora das pessoas com a doença de Morgellons. À primeira vista o texto seria apenas um trabalho de empatia com pessoas que sofrem de uma enfermidade, exceto pelo fato de a enfermidade não ser reconhecida cientificamente.

A doença, segundo o Centro de Controle de Doenças do Estados Unidos (CDC), possui “características clínicas, epidemiológicas, histopatológicas e moleculares de uma dermatopatia inexplicável” (p. 45), e se manifesta de diversas formas, como “feridas, coceira, fadiga, dores e algo chamado formigamento, a sensação de insetos rastejando. Mas, o sintoma que a definia era sempre o mesmo; estranhas fibras emergindo de dentro da pele” (p. 43).

Com base nesse contexto, a autora inicia uma narrativa das suas interações com as pessoas que se dizem acometidas por essa misteriosa doença, a descrição de seus diferentes sintomas e a discriminação que sofrem. Essas histórias são contrastadas por questionamentos como: Como ter empatia com o sofrimento de uma pessoa que sofre com uma doença não comprovada cientificamente? Será que somente conseguimos ter empatia por uma pessoa doente quando temos a certeza de que essa doença realmente existe? Existem pré-requisitos para a compaixão?

Trata-se de uma obra que leva o leitor a reflexões que estimulam o autoconhecimento e reforçam a importância que se deve ter com os obstáculos que podem ser criados na percepção do que nos é apresentado por outras pessoas. A autora não se preocupa com a oferta de respostas, mas com o levantamento de problemáticas. O leitor é que deve criar as suas hipóteses e acolher os seus desfechos com base na sua experiência pessoal.

Recomendo a sua leitura a qualquer profissional que lida com pessoas, especificamente negociadores e mediadores de conflitos que se deparam frequentemente com situações de compreensão empática. Esse livro demonstra que as dúvidas podem servir sim para criar empatia.

Notas:

1 Doutor e Mestre em Sociologia e Direito pela Universidade Federal Fluminense (PPGSD/UFF). Professor e Coordenador de Pesquisa do Curso de Direito do Centro Universitário São José e da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Rio. Membro do Laboratório Fluminense de Estudos Processuais (LAFEP/UFF). E-mail: [email protected] / CV: http://lattes.cnpq.br/9690267141366482

2 JAMISON, Leslie. Exames de empatia. Tradução: Rosaura Eichenberg. São Paulo: Globo Livros, 2016.