ADVOCACIA DIGITAL: UMA REALIDADE OU UMA FANTASIA?

Resumo

O presente trabalho busca trazer uma nova expectativa do exercício da advocacia, a qual estava sendo gradualmente inserida na sociedade jurídica, mas que teve o seu avanço impulsionado pela pandemia de 2020. Levando ao questionamento sobre sua efetividade perante a sociedade, o qual iremos poder observar já ansiava por essa mudança de comportamento. Além disso traz algumas alternativas para quem quer inserir o seu escritório no mundo virtual, mas sem perder um endereço físico distinto da sua residência.

Artigo

ADVOCACIA DIGITAL: UMA REALIDADE OU UMA FANTASIA?

 

Autores:

 Ellen Gouvêa Alves,

Advogada, Pós Graduada em Processo e Direito do Trabalho e Previdenciário pela UNESA. Membro atuante da Escola de Prerrogativas da OAB/RJ, a qual possui o cargo de Coordenadora Adjunta de Comunicação. Membro da Comissão de Direito Digital e Diretora de Comunicação do IBRAPEJ.

Natalino Gomes de Souza Filho

Mentor

RESUMO:

O presente trabalho busca trazer uma nova expectativa do exercício da advocacia, a qual estava sendo gradualmente inserida na sociedade jurídica, mas que teve o seu avanço impulsionado pela pandemia de 2020. Levando ao questionamento sobre sua efetividade perante a sociedade, o qual iremos poder observar já ansiava por essa mudança de comportamento. Além disso traz algumas alternativas para quem quer inserir o seu escritório no mundo virtual, mas sem perder um endereço físico distinto da sua residência.

Palavra-chave: digital, advocacia digital, pandemia, home office, coworking

Introdução

No ano de 2020, o mundo parou por causa do nível de letalidade de um novo vírus, o qual impediu a circulação de pessoas pelas ruas, cidades e países, e consequentemente fez com que toda a população se reinventasse. Além disso, houve um aumento na frequência do uso da internet para realizar funções cotidianas, sejam elas profissionais ou sociais.

Entretanto, na advocacia não foi diferente. Muitos escritórios tiveram que se adaptar a uma realidade para que não parasse de desempenhar a sua função e de proteger os direitos dos seus clientes.

Essa mudança brutal e repentina tornou-se tudo muito incerto e instável para uma sociedade advocatícia que era acostumada a uma realidade estável e previsível.

Apesar dessa mudança brusca, algum tempo a advocacia vinha dando pequenos passos em direção ao mundo virtual, já existia movimentos de advogados autônomos, principalmente os jovens, em realizar seus atendimentos de modo virtual, além de investir nas redes sociais e outras plataformas tecnológicas.

Logo, a advocacia digital será uma nova era ou é algo passageiro?

Atualmente, existem vários modos de exercer a profissão, seja presencialmente, ou virtualmente, ou misturando as duas formas, porém esses modelos possuem seus lados positivos e negativos, os quais são importes a serem analisados pelos os advogados, a fim de saber qual desses modelos irão implementar na sua vida profissional daqui por diante.

Vale ressaltar que o novo modo de advogar, visa a possibilita de exercer as atividades laborativas de qualquer lugar do mundo, desde que tenha disponibilidade de sinal de internet e que esteja em posse do token[1].

Já o modo tradicional de advogar, possibilita que o profissional esteja em contato diretamente com seu cliente, podendo conectar-se presencialmente com ele. E ainda, poderá gerar emprego na localidade em que escolheu para estabelecer o seu escritório.

Há, também, um modo misto, a qual mistura o novo com o tradicional, permitindo que o advogado explore as duas outras opções conjuntamente, e adaptando o seu estilo de atendimento para sua necessidade e a de seu cliente.

Ambos os modelos possuem suas desvantagens, porém todos eles exigem que o profissional tenha muita disciplina e organização para executar sua atividade, uma vez que a exigência dos clientes vem crescendo no decorrer dos anos, impulsionados muitas das vezes pelo uso de ferramentas tecnológicas.

1 – Era digital

Com as revoluções tecnológicas avançando pelo mundo e transformando milhares de profissões, ou criando outras, e outras sendo substituídas por máquinas, ela chegou na advocacia, modernizando e facilitando o acesso aos processos, sem a necessidade de imprimir as peças e atos processuais, ou seja, surgiu para facilitar a vida de todos os operadores da justiça.

Entretanto, essa revolução não se restringiu aos processos, ela atingiu o modo de como o advogado realiza sua captação de clientes, como transmite sua informação, como se comporta, como trabalha, e como se relaciona.

Além disso, essa transformação começou a questionar os gastos que os advogados possuem para manter uma estrutura somente sua, ou seja, o qual era o verdadeiro valor pago para se manter o seu ponto comercial e de uso exclusivo, preenchendo todos os requisitos dos modelos tradicionais de escritórios.

Esses questionamentos a respeito dos custos de um escritório, e a possibilidade de exercer sua atividade profissional em qualquer lugar, sem a necessidade de estar preso a um espaço físico, ficaram mais evidentes durante a pandemia de 2020, levando a muitos escritórios se adaptarem as tecnologias e colocando seus funcionários para trabalharem remotamente.

Ressalta que já existia alguns modelos de executar os trabalhos de forma remota, algumas dessas possibilidades de exercer seu ofício sem a necessidade de ter um lugar físico só seu, são os compartilhamentos de salas e gastos com outros advogados, e os chamados coworkings[2].

Além disso, existe a possibilidade de usufruir dos escritórios compartilhados oferecidos pelas Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)[3] e outras inovações trazidas pela tecnologia como os chamados home offices, escritórios e endereços virtuais.

2 – O Advogado de tempo integral

É correto afirmar que as alterações de modelo de advogar já eram almejadas pela sociedade, que através da sua mudança comportamental dita quais são as características que o novo advogado deve possuir, são elas: agilidade e eficiência nas soluções dos conflitos.

José Paulo Graciotti diz, em seu livro “Governança Estratégica para Escritório de Advocacia”, que o aumento da conectividade pela sociedade faz com que a cresça pressão sobre os advogados em resolveram os dilemas jurídicos de forma urgente, além da elevação da expectativa por resultados imediatos.

Apesar dos anseios por resultados, essa sociedade requer e exige um profissional que entenda das normais gerais, representadas pelos ramos de direito básico e essencial para todo individuo, como por exemplo: Civil, Constitucional, Penal, Trabalhista, Administrativo e Tributário. Além disso, impõe que o advogado seja um especialista em um determinado ramo, não necessariamente os tradicionais, e ainda seja interdisciplinar, ou seja, que entenda de mais de uma área especificamente, sem se esquecer dos conhecimentos das normais gerais.

Ou seja, a necessidade de que o profissional seja um especialista, sem perder a capacidade de ser generalista, a fim de que os laços de confianças sejam cada vez mais estreitados.

Há também uma crescente onda de que o profissional seja mais claro e honesto possível, sem perder a capacidade ética de seu exercício.

Apesar dessa necessidade intelectual que o novo padrão de advogado precisar ter, ele também necessita de estar disponível para atender os seus clientes de forma full time[4], tornando relativa a delimitação do horário comercial. Essa relativização está ligada ao novo modelo da sociedade, a qual reflete instantaneamente na expectativa dos clientes, reclamando ter um profissional que trabalhe de tempo integral e sem medir esforços para solução de uma questão jurídica, o que reforça os laços de confiança.

Vale ressaltar que essa exigência da nova clientela possui várias frentes, uma delas a eficiência na execução do trabalho, a outra e a possibilidade de acompanhar quase instantaneamente a vida profissional e pessoal do advogado que ela contratou e, também, na migração para novos modelos.

Essa revolução também reflete na mudança de opinião sobre a advocacia e a tecnologia, vendo que a sociedade no seu interior repudia o discurso que a tecnologia irá acabar com a advocacia, obrigando com os advogados se reinventem e aliem o seu escritório as novas tecnologias, visando uma maior efetividade e organização de tempo para a solução dos conflitos que os seus clientes apresentam.

Uma das ferramentas mais usadas pelos clientes para monitorar a vida de seus advogados, e ainda alimentar-se de informações jurídicas, são as redes sociais e as plataformas de pesquisas, como por exemplo o Google.

As plataformas de pesquisa são usas pelos clientes para saber sobre seus dilemas jurídicos, o que muitas das vezes leva que eles tenham uma interpretação equivocada sobre a possibilidade de êxito ou não.

Já as redes sociais, também servem para exposições de informações jurídicas, uteis para o dia a dia da sociedade; e uma das mais importantes ferramentas que elas possuem é estabelecer uma conexão entre o advogado e o cliente.

Entretanto, elas também servem para que os clientes monitorem a vida social do seu ou futuro advogado, obrigando esse profissional a expor sua rotina diariamente, além de dar satisfação quando ele não realiza nenhum contato virtual.

Essa cobrança de mistura instantânea entre o profissional e o pessoal, faz com que o advogado seja advogado até no seu tempo livre.

É importante destacar que essa exposição nas redes sociais também está sendo avaliada pelos clientes, fazendo com que o profissional seja mais seletivo ao compartilhar, pois determinado compartilhamento poderá levá-lo ao término de algum importante contrato de prestação de serviço jurídico.

É importante destacar que essa exibição e compartilhamentos de conteúdos devem estar alinhados com as regras estabelecidas no Estatuto da Advocacia, no Regulamento Geral da OAB e no Código de Ética e Disciplina.

3 – Novos modelos de escritórios

Durante a transformação gradual da advocacia para o mundo digital foram surgindo possibilidades que visam otimizar o tempo do advogado e de seus clientes, passando a usufruir das facilidades que a internet oferece.

Entretanto, esse novo modelo de escritório não tem a ambição de substituir os escritórios tradicionais (que são os físicos), pelo contrário, é mais uma possibilidade que o advogado deverá considerar quando ele decidir montar o seu escritório ou transformar o seu.

Um dos pontos positivos é a economia financeira que o advogado terá, pois os gastos com a manutenção do espaço, internet e outros requisitos para montar um escritório passaram a ser um valor considerável, dependendo de qual foi o modelo escolhido.

Além da questão financeira, está a flexibilidade de horário e de lugar que os modelos remotos oferecem; ou seja, caso opte pelo modelo de coworking o profissional não tem a obrigação de se deslocar todos os dias ao local para desempenhar a sua função, podendo realizá-las do conforto de sua casa.

Outra forma de escritório que vem crescendo e ganhando espaço, principalmente nas grandes cidades brasileiras, são os escritórios virtuais. Esse modelo é completamente inserido na internet, ou seja, seu funcionamento, seu endereço, sua divulgação, suas reuniões, todas as outras questões estão diretamente ligada no mundo virtual, possibilitando que o profissional atue de onde estiver, exemplo: por motivos de força maior, não poderá retornar a sua residência tendo que permanecer em outro local, porém, caso esse profissional execute seu labor de forma presencial, ele estará impedido de realizar; e, por um outro lado, caso labore de forma virtual, esse acontecimento não irá impedir de desempenhar o seu ofício.

Vale destacar que existe a possibilidade de trabalhar de forma remota, mas sem a necessidade de mencionar o seu endereço, podendo contratar um endereço virtual, o qual será um endereço físico de um ponto comercial bem situado na cidade, porém só irá efetuar o pagamento de mensalidade que possibilita que use o endereço postal.

Ressalta-se que alguns contratos possibilitam que o profissional agende reunião presencial com seu cliente, usufruindo da instalação do espaço físico, sem qualquer acréscimo no seu plano contratado.

Durante o ano de 2020, a modalidade de trabalho em home office [5] ficou conhecida e requisitada por muitos profissionais, uma vez que foi a alternativa encontrada por muitos escritórios de advocacia e tribunais para desempenhar suas funções sem prejuízo as demandas judiciais.

Essa possibilidade de trabalhar diretamente da sua casa possui a expectativa que o profissional aumente o seu desempenho, pois não terá o estresse de se deslocar até a sede do escritório para executar o seu trabalho.

Além disso, esse modelo visa uma flexibilidade na rotina de trabalho do profissional, devendo ele estipular horário para o seu funcionamento, e ainda aumenta o contato físico com os entes mais próximos.

Outro ponto dessa flexibilização é a possibilidade de realizar de qualquer lugar as suas funções laborativas, através de um computador e um bom sinal de internet.

4 – Conclusão

Foi observado que as mudanças de comportamento da sociedade para a mundo virtual já estava em progresso, porém em 2020 teve que evoluir rapidamente, levando ao questionamento, principalmente na advocacia, esse “novo normal” seria permanente ou algo passageiro.

Como podemos analisar, as mudanças de comportamento apenas foram intensificadas, mas que já eram esperadas num futuro muito próximo.

Frisa-se que alguns profissionais já vinham desempenhando algumas funções desse novo modelo, como por exemplo, compartilhamento de informações jurídicas pelas redes sociais (principalmente Facebook e Instagram), e outros estando completamente inseridos nele.

Além disso, os anseios da sociedade em que estamos inseridos mudaram, atualmente visa-se uma maior qualidade de vida, que está diretamente conectada a uma maior eficácia na prestação de serviço e a uma obtenção de um resultado positivo.

Os desafios que essa nova realidade espera da advocacia se apresentam como um maior comprometimento nas causas em que defende, um profissional ético, especializado e interdisciplinar ou até multidisciplinar, sem mencionar que deverá lidar cada vez mais com um aumento de pressão por resultados e, ainda, que possa atender os seus clientes fora do horário comercial convencional, ser mais humano, compartilhando não só seus conhecimentos, mas momentos da sua vida pessoal, exigindo também que possa trabalhar em conjunto com as novas tecnologias, visando aprimorar o seu atendimento e suas funções, sejam elas de gestão, de execução ou financeira.

Diante disto, podemos afirmar que a nova era da advocacia chegou e irá permanecer, convivendo pacificamente com o modelo tradicional, devendo o advogado escolher qual é o modelo que melhor se adapta ao seu estilo de vida.

Referência bibliográficas:

DE MELO, João Ozorio. Veja opções de escritório virtual adotadas nos EUA. Disponível em <https://www.conjur.com.br/2012-nov-21/veja-opcoes-escritorio-virtual-adotadas-pelos-advogados-americanos>. Acessado em 26 de out. de 2020.

FEIGELSON, Bruno; BECKER, Daniel; RAVAGNANI, Giovani. O Advogado do Amanhã – Estudos em homenagem ao Professor Richard Susskind. 1ª ed, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2019.

GRACIOTTI, José Paulo. Governança Estratégica para Escritório de Advocacia. 2ºed, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2019.

HELTON, Thiago. Saiba como funciona um escritório de advocacia virtual. Disponível em: <https://www.aurum.com.br/blog/escritorio-de-advocacia-virtual/>. Acessado em 26 de out. de 2020.

LACERDA, Tales. Tudo o que um advogado precisa saber para criar um escritório virtual e aderir ao home office. Disponível em: <https://migalhas.uol.com.br/depeso/322656/tudo-o-que-um-advogado-precisa-saber-para-criar-um-escritorio-virtual-e-aderir-ao-home-office>. Acessado em 26 de out. de 2020.

MOTIZUKI, Amanda. O que é escritório virtual?: Entenda como ele pode ser útil à sua empresa. Disponível em: <https://conube.com.br/blog/o-que-e-escritorio-virtual/>. Acessado em 26 de out. de 2020.

ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – Seccional do Rio de Janeiro. Manual do Escritório compartilhado da OAB/RJ. 2º ed, Rio de Janeiro, OAB/RJ, 2019.

VITAL, Alan. Advogado Online e Escritório Virtual: Como começar e conseguir atender totalmente pela internet?. Disponível em: <https://blog.advbox.com.br/advogado-online-escritorio-virtual/>. Acessado em 26 de out. de 2020.

Notas:

[1] Token é um gerador de senha eletrônica, porém na advocacia usamos como assinatura, o que possibilita assinarmos qualquer documento de modo virtual/eletrônico.

[2] Coworking é um espaço usado de maneira compartilhada por diferentes profissionais, um lugar voltado para o exercício profissional e com interação entre pessoas de diferentes áreas.

[3] O modelo de compartilhamento da OAB, utiliza a estrutura, maquinários, internet, e outras finalidade oferecidas pela instituição, porém existem regras de usos, as quais precisam ser observadas pelo usuário, e esse modelo não possui nenhum gasto financeiro ao advogado.

[4] full time – a tradução em português dessa expressão em inglês significa tempo integral.

[5] Home office na tradução literal do inglês para o português quer dizer trabalho em casa, o que significa que a execução da atividade profissional é feita dentro das dependências de sua residência.

Palavras Chaves

digital, advocacia digital, pandemia, home office, coworking